Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0008738-58.2019.4.03.6315

RELATOR: 28º Juiz Federal da 10ª TR SP

RECORRENTE: ANA PAULA DE OLIVEIRA

Advogado do(a) RECORRENTE: MARIA ELI PIRES DE CAMARGO - SP113003-N

RECORRIDO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL, BV FINANCEIRA
PROCURADOR: DEPARTAMENTO JURÍDICO - CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

Advogado do(a) RECORRIDO: FABRICIO DOS REIS BRANDAO - PA11471-A
Advogados do(a) RECORRIDO: MAURI MARCELO BEVERVANCO JUNIOR - SP360037-A, LUIZ RODRIGUES WAMBIER - SP291479-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0008738-58.2019.4.03.6315

RELATOR: 28º Juiz Federal da 10ª TR SP

RECORRENTE: ANA PAULA DE OLIVEIRA

Advogado do(a) RECORRENTE: MARIA ELI PIRES DE CAMARGO - SP113003-N

RECORRIDO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL, BV FINANCEIRA
PROCURADOR: DEPARTAMENTO JURÍDICO - CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

Advogado do(a) RECORRIDO: FABRICIO DOS REIS BRANDAO - PA11471-A
Advogados do(a) RECORRIDO: MAURI MARCELO BEVERVANCO JUNIOR - SP360037-A, LUIZ RODRIGUES WAMBIER - SP291479-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de recurso interposto face da sentença que julgou procedente em parte os pedidos da parte autora, para condenar as corrés CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e BV FINANCEIRA ao pagamento de (i) indenização por danos materiais no valor de R$ 9.020,00, valor para julho de 2019, na proporção de 50% para cada uma, com atualização monetária desde então e juros desde a citação; (ii) indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00 para cada uma, para a data da sentença, com incidência de juros e correção monetária desde essa data 

A BV FINANCEIRA recorreu, aduzindo que o pagamento do boleto foi feito por descuido da parte autora, tratando-se de culpa exclusiva dessa, tanto mais porque trata-se de fraude perpetrada por terceiro. 

 

Na sentença, estabeleceu-se: 

Entendo que a parte autora se desincumbiu satisfatoriamente de seu ônus probatório. Com sua petição inicial comprovou que fez o pagamento de um boleto no valor de R$ 9.020,00, que contém diversas informações sobre o seu contrato de financiamento de veículo, o nome do Banco Votorantim e a informação “desconto contratual disponibilizado através do Banco Inter parceiro da BV Financeira e intermediador de pagamentos (p. 11); o comprovante de pagamento (p. 12); o boletim de ocorrência (pp. 9/10); conversa por whatsapp (pp. 15/21) e e-mail, supostamente com a BV, sendo o email assinado por Paloma Aparecida Gomes Carlino, em nome do departamento jurídico (p. 22).  

Com relação à CEF, a parte autora sustenta que teria responsabilidade, pois agente do banco que recebeu o pagamento deveria ter conferido os dados do boleto e verificado que o comprovante de pagamento tinha pagador diverso. De fato, embora do boleto constasse o nome da autora como pagadora e a BV Financeira como beneficiária, o comprovante de pagamento divergia desses dados, constando o Banco Inter como beneficiário e Paloma Aparecida Gonçalves Carlino como pagadora. Além disso, o comprovante de pagamento indica que se trata de um depósito por boleto. Por se tratar de divergências evidentes, especialmente para aqueles que lidam diariamente com diversos boletos, como é o caso dos bancários, entendo que deveria a corré ter reportado à autora a divergência, de forma a confirmar a regularidade da operação. Assim, ainda que a fraude tenha sido perpetrada por terceiros, entendo que há responsabilidade da CEF em razão da não informação à consumidora da divergência existente. Igualmente, entendo que há responsabilidade da BV Financeira, na medida em que, de algum modo, os dados do contrato da autora com a corré BV foram disponibilizados a fraudadores, que efetuaram a cobrança da dívida da autora. A disponibilização desses dados trouxe credibilidade à fraude, possibilitando sua perpetração. Destaco que, diferente do alegado pela corré BV, o boleto não é “evidentemente fraudado”, pois possui o logotipo da corré, os dados do contrato, os dados da autora e até um campo com informações sobre uma suposta parceria com o Banco Inter. Igualmente, não se sustenta a afirmação de que não há no boleto qualquer sinal de identificação da ré, pois o nome, logotipo e CNPJ da ré constam do boleto. Diante desse quadro e, considerando as já citadas normas de responsabilidade dos prestadores de serviços, cabível a condenação de ambas ao ressarcimento dos danos materiais sofridos pela autora, na proporção de metade para cada do valor de R$ 9.020,00, valor para julho de 2019. Passo à análise do pedido de indenização por danos morais. O Código Civil trouxe previsão expressa acerca da reparação do dano moral, prevendo em seu art. 186 que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” Para Yussef Said Cahali, dano moral "é a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranquilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos, classificando-se desse modo, em dano que afeta a parte social do patrimônio moral(honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade, etc.), dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.)" (Dano Moral, 2ª ed., São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 20). Entendo que o problema ocorrido, que fez com que a autora pagasse um boleto de alto valor, acreditando ter quitado o contrato, causou abalo emocional evidente, demonstrado na inicial pela troca de mensagens com aquele que se passou pela BV Financeira, associado ao valor de seu salário, que demonstra que a quitação tinha valor expressivo. No que se refere ao quantum indenizável, a estimativa por parte do magistrado deve levar em consideração as condições das partes, a gravidade da lesão e as circunstâncias fáticas. Devem-se também levar em consideração dois fatores: o valor da indenização deve servir de desestímulo ao réu à repetição de casos como o aqui tratado, e, de outro lado, também não poderá servir de enriquecimento sem causa ao autor. No caso, contudo, tenho que o principal responsável pelos danos morais sofridos pela parte autora é o fraudador, de forma que reputo excessivo o pedido de indenização em face dos corréus. Com base nisso, fixo a indenização em R$ 2.000,00 para cada um dos corréus. Tratando-se de arbitramento, o valor é para a data da presente sentença. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por ANA PAULA DE OLIVEIRA, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para condenar as corrés CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e BV FINANCEIRA ao pagamento de (i) indenização por danos materiais no valor de R$ 9.020,00, valor para julho de 2019, na proporção de 50% para cada uma, com atualização monetária desde então e juros desde a citação; (ii) indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00 para cada uma, para a data da sentença, com incidência de juros e correção monetária desde essa data. Os valores deverão sofrer a incidência de juros moratórios e correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal."

 

 

 

 

 

 


RELATÓRIO

JUIZ FEDERAL CAIO MOYSÉS DE LIMA: Trata-se de ação movida por ANA PAULA DE OLIVEIRA em face da CAIXA ECONOMICA FEDERAL – CEF e da BV FINANCEIRA, com o objetivo de obter indenização por danos morais e materiais, nos valores de R$ 9.020,00 e R$ 30.000,00, respectivamente.

Narra a inicial o seguinte:

A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, condenando as corrés CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e BV FINANCEIRA ao pagamento de (i) indenização por danos materiais no valor de R$ 9.020,00, valor para julho de 2019, na proporção de 50% para cada uma, com atualização monetária desde então e juros desde a citação; (ii) indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00 para cada uma, para a data da sentença, com incidência de juros e correção monetária desde essa data.

Diz a fundamentação:

Entendo que a parte autora se desincumbiu satisfatoriamente de seu ônus probatório.

Com sua petição inicial comprovou que fez o pagamento de um boleto no valor de R$ 9.020,00, que contém diversas informações sobre o seu contrato de financiamento de veículo, o nome do Banco Votorantim e a informação “desconto contratual disponibilizado através do Banco Inter parceiro da BV Financeira e intermediador de pagamentos (p. 11); o comprovante de pagamento (p. 12); o boletim de ocorrência (pp. 9/10); conversa por whatsapp (pp. 15/21) e e-mail, supostamente com a BV, sendo o email assinado por Paloma Aparecida Gomes Carlino, em nome do departamento jurídico (p. 22).

Com relação à CEF, a parte autora sustenta que teria responsabilidade, pois agente do banco que recebeu o pagamento deveria ter conferido os dados do boleto e verificado que o comprovante de pagamento tinha pagador diverso.

De fato, embora do boleto constasse o nome da autora como pagadora e a BV Financeira como beneficiária, o comprovante de pagamento divergia desses dados, constando o Banco Inter como beneficiário e Paloma Aparecida Gonçalves Carlino como pagadora. Além disso, o comprovante de pagamento indica que se trata de um depósito por boleto.

Por se tratar de divergências evidentes, especialmente para aqueles que lidam diariamente com diversos boletos, como é o caso dos bancários, entendo que deveria a corré ter reportado à autora a divergência, de forma a confirmar a regularidade da operação.

Assim, ainda que a fraude tenha sido perpetrada por terceiros, entendo que há responsabilidade da CEF em razão da não informação à consumidora da divergência existente.

Igualmente, entendo que há responsabilidade da BV Financeira, na medida em que, de algum modo, os dados do contrato da autora com a corré BV foram disponibilizados a fraudadores, que efetuaram a cobrança da dívida da autora. A disponibilização desses dados trouxe credibilidade à fraude, possibilitando sua perpetração.

Destaco que, diferente do alegado pela corré BV, o boleto não é “evidentemente fraudado”, pois possui o logotipo da corré, os dados do contrato, os dados da autora e até um campo com informações sobre uma suposta parceria com o Banco Inter.

Igualmente, não se sustenta a afirmação de que não há no boleto qualquer sinal de identificação da ré, pois o nome, logotipo e CNPJ da ré constam do boleto.

Diante desse quadro e, considerando as já citadas normas de responsabilidade dos prestadores de serviços, cabível a condenação de ambas ao ressarcimento dos danos materiais sofridos pela autora, na proporção de metade para cada do valor de R$ 9.020,00, valor para julho de 2019.

Passo à análise do pedido de indenização por danos morais.

[...]

Entendo que o problema ocorrido, que fez com que a autora pagasse um boleto de alto valor, acreditando ter quitado o contrato, causou abalo emocional evidente, demonstrado na inicial pela troca de mensagens com aquele que se passou pela BV Financeira, associado ao valor de seu salário, que demonstra que a quitação tinha valor expressivo.

No que se refere ao quantum indenizável, a estimativa por parte do magistrado deve levar em consideração as condições das partes, a gravidade da lesão e as circunstâncias fáticas. Devem-se também levar em consideração dois fatores: o valor da indenização deve servir de desestímulo ao réu à repetição de casos como o aqui tratado, e, de outro lado, também não poderá servir de enriquecimento sem causa ao autor.

No caso, contudo, tenho que o principal responsável pelos danos morais sofridos pela parte autora é o fraudador, de forma que reputo excessivo o pedido de indenização em face dos corréus.

Com base nisso, fixo a indenização em R$ 2.000,00 para cada um dos corréus.

Tratando-se de arbitramento, o valor é para a data da presente sentença. 

A BV Financeira recorre, sustentando, em síntese, que o pagamento do boleto foi feito por descuido da parte autora, tratando-se de culpa exclusiva desta, tanto mais porque se trata de fraude perpetrada por terceiro.

A CEF comprovou o cumprimento da sentença, juntando os depósitos dos valores devidos.

É o relatório.

 

VOTO - VENCEDOR

JUIZ FEDERAL CAIO MOYSÉS DE LIMA (RELATOR DESIGNADO):

Assiste razão à recorrente.

A responsabilização civil, seja com fulcro na legislação consumerista, seja pela disciplina geral inserta no Código Civil, exige nexo de causalidade entre a conduta do responsável e o evento danoso.

No presente caso, é fato incontroverso que a BV Financeira não produziu diretamente o dano, pois o boleto foi emitido por terceiro desconhecido.

Por conseguinte, o alegado nexo de causalidade entre a conduta da BV Financeira e o evento danoso teria natureza normativa, consistente na omissão em cumprir dever que cabia à corré, omissão essa que precisa ter sido determinante para a ocorrência do evento danoso.

Por conseguinte, a definição da responsabilidade da BV Financeira depende da resposta a três perguntas: (i) em que consistiria esse dever; (ii) se houve descumprimento desse dever; e (iii) se o descumprimento do dever foi determinante para a ocorrência do evento danoso.

Muito embora a petição e o recurso não especifiquem de forma clara qual teria sido o dever descumprido pela BV Financeira, creio que os preceitos legais que melhor se adequam aos fundamentos fáticos e jurídicos descritos na inicial são os seguintes:

a) art. 6º, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor - CDC (Lei n.º 8.078, de 11 de setembro de 1990), segundo o qual o consumidor tem o direito à “proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos”;

b) arts. 7º e 17, entre outros, da Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD (Lei n.º 13.709, de 14 de agosto de 2018), que define de forma rigorosa os casos em que pode haver o tratamento de dados pessoais, excluindo, por consequência, todos os demais casos ali não previstos; e

c) art. 1º da Lei Complementar n.º 105, de 10 de janeiro de 2001, que estabelece o dever das instituições financeiras de conservar sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.

No que se refere ao dever de garantir a segurança do consumidor (art. 6º, I, do CDC), parece-me que referido dever não se estende ao ponto de criar, para o fornecedor, obrigação de proteger o consumidor contra toda e qualquer conduta delituosa, especialmente se praticada por terceiros, fora de suas dependências e sem uso de seus meios operacionais. Isso porque a segurança dos cidadãos contra crimes comuns é principalmente dever do Estado (art. 144 da Constituição Federal), que dele se desincumbe por meio dos órgãos de segurança pública.

É certo que tal dever pode ser assumido por entes privados em relação a certas pessoas ou certos bens, mas para tanto é preciso que a assunção da responsabilidade se dê por ato inequívoco de vontade, o que não ficou demonstrado nos autos.

No que diz respeito aos preceitos da LGPD e da Lei Complementar n.º 105/2001, é preciso observar que, embora o suposto vazamento de informações pudesse, realmente, configurar quebra dos deveres ligados à preservação do sigilo bancário e dos dados pessoais, no caso em análise não há prova de que o suposto vazamento ocorreu por ato praticado pela BV Financeira ou por qualquer de seus agentes.

A respeito disso, cumpre observar que as informações contidas no contrato de financiamento não eram de conhecimento exclusivo da BV Financeira, mas também da própria parte autora. Além disso, pela prova documental juntada aos autos, verifica-se que havia, ainda, um terceiro não identificado, comprador do automóvel objeto do financiamento, que também poderia, em tese, ter acesso aos dados do contrato e das parcelas em atraso.

Assim, não só a corré, mas qualquer das outras pessoas mencionadas poderia ter vazado as informações, de forma consciente ou não. Nesse contexto, não é razoável presumir que o suposto vazamento se deu por culpa exclusiva da instituição financeira.

Afastada, desse modo, a prova do nexo de causalidade, não há como atribuir responsabilidade à BV Financeira pelos danos sofridos pela parte autora.

Diante do exposto, voto por dar provimento ao recurso da corré BV Financeira, para julgar improcedente a ação em relação a ela.

Sem condenação em honorários, porque somente o recorrente vencido deve arcar com as verbas sucumbenciais, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei nº 10.259/2001.

É o voto.


 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
10ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0008738-58.2019.4.03.6315

RELATOR: 28º Juiz Federal da 10ª TR SP

RECORRENTE: ANA PAULA DE OLIVEIRA

Advogado do(a) RECORRENTE: MARIA ELI PIRES DE CAMARGO - SP113003-N

RECORRIDO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL, BV FINANCEIRA
PROCURADOR: DEPARTAMENTO JURÍDICO - CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

Advogado do(a) RECORRIDO: FABRICIO DOS REIS BRANDAO - PA11471-A
Advogados do(a) RECORRIDO: MAURI MARCELO BEVERVANCO JUNIOR - SP360037-A, LUIZ RODRIGUES WAMBIER - SP291479-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

No presente caso não há dúvida acerca do prejuízo perpetrado pela parte autora em razão do pagamento de boleto fraudulento, no valor de R$ 9.020,00, questão que não mais é controvertida. Limita-se a questão acerca da responsabilidade da corré. 

Primeiramente, há que se considerar que a controvérsia está subsumida aos ditames do Código de Defesa do Consumidor (CDC), haja vista que a relação jurídica entre instituições bancárias e respectivos clientes constitui relação de consumo, conforme entendimento jurisprudencial consolidado na Súmula nº 297 do C. Superior Tribunal de Justiça (“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”).  

Além da aplicação das regras protetivas do CDC à controvérsia retratada nos autos, é relevante trazer à colação precedente vinculativo do C. STJ, firmado quando do julgamento de recurso representativo de controvérsia:  

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS. DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FORTUITO INTERNO. RISCO DO EMPREENDIMENTO. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno. 2. Recurso especial provido. (STJ, REsp 1197929/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/08/2011, DJe 12/09/ 2011)  

 

No precedente qualificado supracitado, o STJ assentou que desde a edição da Súmula nº 28/STF já se admitia a responsabilidade das instituições financeiras por eventos fraudulentos praticados por terceiros alheios à relação contratual havida entre banco e correntista, o que decorria dos riscos inerentes à atividade econômica exercida por tais pessoas jurídicas. Assentou o STJ, também, que embora a jurisprudência admitisse a atenuação da responsabilidade dos bancos em caso de comprovação de culpa concorrente do correntista, tal entendimento não mais encontraria aplicabilidade após o advento do Código de Defesa do Consumidor – CDC, haja vista que o artigo 14, § 3º, da lei consumerista autoriza o afastamento da responsabilidade do fornecedor do produto ou do serviço apenas em caso de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.  

Assim, como pontuou o relator Ministro Luís Felipe Salomão em seu voto no RESP nº 1.197.929/PR:  

 “(...) no caso de correntista de instituição bancária que é lesado por fraudes praticadas por terceiros - hipótese, por exemplo, de cheque falsificado, cartão de crédito clonado, violação do sistema de dados do banco -, a responsabilidade do fornecedor decorre, evidentemente, de uma violação a um dever contratualmente assumido, de gerir com segurança as movimentações bancárias de seus clientes. Ocorrendo algum desses fatos do serviço, há responsabilidade objetiva da instituição financeira, porquanto o serviço prestado foi defeituoso e a pecha acarretou dano ao consumidor direto.”  

Situação não menos comum – e também analisada pelo STJ no acórdão citado – envolve a reparação de danos experimentados por não-correntistas, ou seja, por terceiros inocentes que tenham seus nomes e dados pessoais utilizados por falsários para obtenção de crédito e utilização de dinheiro entregue pelos bancos.  

Nesses casos, pontificou o STJ, mais uma vez, a responsabilidade objetiva das instituições financeiras, por incidência, nessa hipótese, da regra de equiparação prevista no artigo 17 do CDC (verbis: “Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento”).  

É bem verdade que o cometimento de fraudes por terceiros poderia ensejar a atração da regra de exclusão de responsabilidade prevista na parte final do artigo 14, § 3º, do CDC (“culpa exclusiva de terceiro”).  

Todavia, a fraude praticada por terceiros tem sido considerada como reveladora de um fortuito interno, ou seja, um ato ou fato inerente à própria atividade econômica desenvolvida pelas instituições financeiras, o qual, se não pode ser evitado, é, no mínimo, previsível e passível de alguma espécie de controle ou atuação remediadora por parte dos bancos.  

Em síntese, o que se tem como orientação jurisprudencial consolidada – e adotada por este Juízo – é que subsiste a responsabilidade objetiva das instituições financeiras por conta de prejuízos experimentados por correntistas (consumidores dos serviços bancários) ou pessoas legalmente equiparadas, sempre que os citados prejuízos forem decorrência de fraudes perpetradas por criminosos, responsabilidade essa que somente pode ser elidida se comprovada culpa exclusiva da vítima ou de terceiro a esta equiparável, assim não considerada a atuação criminosa dos próprios falsários ou fraudadores, configurando-se fortuito interno pelo qual deve ser responsabilizada a fornecedora do serviço bancário. 

Na hipótese dos autos, não obstante o fato fraudulento tenha autoria de terceiro, mostra-se razoável concluir que os dados contratuais, de posse da recorrente foram indevidamente fornecidos possibilitando o ilícito. Há provas de que o boleto fraudulento continha dados relativos ao contrato entre as partes, além dos dados pessoais da parte autora. Referido ilícito, no entanto, também foi facilitado pela conduta pouco cautelosa da parte autora ao, por exemplo, não conferir o comprovante de pagamento no ato. Como assentado na fundamentação acima, a culpa concorrente, nessas hipóteses, não afasta a responsabilidade da ré. 

Voto – Ante o exposto, nego provimento ao recurso. 

Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil e do art. 55 da Lei nº 9.099/95, considerando a baixa complexidade do tema. 

É o voto. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Dispensada a ementa, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei nº 10.259/2001.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por maioria (ficando vencida a Juíza Relatora - Claudia Hilst Menezes - voto vencedor - Dr. Caio Moysés de Lima), dar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.