Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5003982-95.2020.4.03.6181

RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI

APELANTE: JUAREZ SOUZA MENDES

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5003982-95.2020.4.03.6181

RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI

APELANTE: JUAREZ SOUZA MENDES

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:  

 

R E L A T Ó R I O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Trata-se de apelação criminal interposta por JUAREZ SOUZA MENDES em face da sentença proferida pelo Juízo Federal da 4ª Vara Criminal Federal de São Paulo/SP, que condenou o réu apenas pelo cometimento dos delitos previstos nos artigos 29, § 1º, III, e 32, caput, ambos da Lei 9.605/98, em concurso material, absolvendo-o, todavia, da imputação delitiva descrita no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal.

Narra a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (ID 255038169):

Aos 17 (dezessete) dias do mês de julho de 2018, JUAREZ SOUZA MENDES foi autuado pelo IBAMA em local situado à Rua Belo Horizonte n.° 158, Jardim das Pedras, São Paulo/SP, por ter em cativeiro 20 (vinte) aves silvestres em situação irregular, sendo que 18 (dezoito) pássaros se encontravam sem anilhas e 02 (dois) com anilhas falsas por adulteração. Ademais, 09 (nove) animais apresentavam sintomas indicativos de maus-tratos. No dia e local dos fatos, a equipe de fiscalização do IBAMA foi formada pelos seguintes Agentes Ambientais Federais: Hugo Américo Rubert Schaedler, João Alves de Brito Filho e Marcelo Zanetti Leite (fl. 08vº). No entanto, primeiramente, cumpre esclarecer uma ocorrência que não faz parte desta denúncia, qual seja, possível solicitação irregular de anilhas. Explica-se. A fiscalização do IBAMA, propriamente dita, teve início dias antes, no dia 13/07/2018, por meio de uma diligência para entrega de anilhas em endereço no qual não se localizou o denunciado e tampouco o seu plantel. Alguns dias depois, no local correto do plantel do denunciado, o IBAMA constatou que não havia filhotes para anilhar, motivo pelo qual ficou registrado nestes autos de que a infração administrativa de irregular "solicitação de anilhas" seria objeto de autuação à parte (fl. 09). Consignada a ressalva acima sobre a ocorrência "solicitação irregular de anilhas" que, por sua vez, não faz parte dos fatos investigados aqui, passa-se a tratar, novamente, dos fatos do inquérito policial em questão, relativos especificamente à apreensão dos seguintes pássaros silvestres: - 07 (sete) Coleirinhas (Sporophila caerulescens), 03 (três) Papa-capim (Sporophila nigricollis), 02 (dois) Canários da terra (Sicalis flaveola ssp) e 08 (oito) Picharros (Saltator similis), nos termos do Termo de Apreensão do IBAMA (07vºe 50), Ficha de Entrada e Parecer Técnico do Centro de Recuperação de Animais Silvestres - CRAS/PET (fls. 08 e 20) e Auto de Apreensão da DELEMAPH (fl. 24). Constatou-se, ainda, que, entre os 20 (vinte) pássaros, havia 02 (dois) com as seguintes anilhas: SISPASS 2,2 BA/A 005815 e SISPASS 3,5 SP/A 054166 que, posteriormente, foram atestadas pelo CRAS/PET e pela Perícia Criminal Federal como falsa por adulteração (corte) - folhas 20 e 36/38. Quanto ao uso de anilhas, convém salientar que a anilha é um documento federal materializador de um sinal público, obtido junto ao IBAMA, semelhante a um anel de metal, preso à pata do animal, cujo objetivo é a identificação de passeriformes silvestres para controle do IBAMA nos termos da legislação vigente. Assim, toda ave silvestre pertencente a criador registrado no IBAMA deve portar referido sinal público e, assim, comprovar que o animal que a ostenta está devidamente regularizado perante o referido órgão ambiental. Desse modo, a materialidade do crime previsto no artigo 296, § 1°, inciso III, do Código Penal está evidenciada pelo parecer do CRAS/PET e pelo Laudo de Perícia Criminal que, categoricamente, concluíram que as anilhas são falsas por adulteração, ambas por corte (fls. 20 e 36/38). Outrossim, a materialidade do crime previsto no artigo 29, § 1º, inciso III, da Lei n.° 9.605/98 está demonstrada pela ausência de anilha em 18 (dezoito) pássaros silvestres apreendidos, bem como, repita-se, pelo uso de anilha falsa em outras 02 (duas) aves apreendidas. Quanto à autoria, sendo JUAREZ SOUZA criador amadorista registrado no IBAMA à época, é patente que este sabia que é proibido manter pássaros silvestres sem anilhas em cativeiro, ou seja, sem permissão, licença ou autorização da autoridade competente. Frise-se que, perante a Autoridade Policial, o denunciado confessou que 08 (oito) picharros e 04 (coleirinhas) pertenciam a ele (fls. 68/69). Embora não tenha admitido a posse de todos os 20 (vinte) pássaros apreendidos, entre as 12 (doze) aves que JUAREZ SOUZA disse serem de sua propriedade, existiam aves sem anilha e pelo menos um passeriforme com anilha falsa (fl. 20), que seria 01 (um) dos 08 (oito) picharros que o denunciado confirmou serem de sua posse (fls. 68/69). De fato, JUAREZ SOUZA MENDES tinha pleno conhecimento do caráter ilícito de sua conduta e, considerando sua condição de criador amadorista registrado no IBAMA, torna-se incabível qualquer alegação de desconhecimento sobre o que seja uma anilha inidônea. No mais, a Perícia Criminal Federal, que examinou as informações fornecidas pela equipe do CRAS/PET (Parecer n.° 28571 de folha 20), concluiu que 45% (quarenta cinco por cento) dos pássaros, ou seja, 09 (nove) aves, apresentavam sintomas indicativos de maus-tratos (fl. 38), sendo que, entre os animais com maus tratos, havia 04 (quatro) picharros (fl. 34) que, como já asseverado acima, o próprio denunciado afirmou serem de sua propriedade (fl. 69). Dentre os maus-tratos reportados, estavam presentes em certas aves os seguintes: lesão na fronte e empenamento deficitário, que podem ser causados por captura recente do animal em arapuca. Além do mais, havia sintomas em alguns passeriformes como: escore magro, rêmiges gastas e retrizes quebradas que, via de regra, são causados por estresse ou má-nutrição (fls. 33/35). Configurado, dessa maneira, o crime de maus-tratos previsto no artigo 32, caput, da Lei n.° 9.605/1998. Portanto, resta cabalmente provado que o denunciado possuía e mantinha ilegalmente em cativeiro espécimes da fauna silvestre, algumas com maus-tratos, bem assim fazia uso de sinal público falsificado em anilha IBAMA, com pleno conhecimento da ilicitude de todas as suas condutas dolosas. Diante do exposto, o Ministério Público Federal denuncia JUAREZ SOUZA MENDES, com incurso nos artigos 29, § 1º, inciso III e artigo 32, caput, da Lei n.° 9.605/98 c/c artigo 296, § 1º, inciso III, do Código Penal.  [...]

A denúncia foi recebida em 09/12/2020 (ID 255038391).

Resposta à acusação (ID 255038403), apresentada pela Defensoria Pública da União.

Decisão afastando as hipóteses de absolvição sumária previstas no artigo 397 do Código de Processo Penal e determinando o prosseguimento do feito (ID 255038419).

Decisão indeferindo pedido de reconsideração formulado pela defesa (ID 255038440) e, por conseguinte, mantendo a decisão que determinou o prosseguimento do feito, por não visualizar a possibilidade de propor acordo de persecução penal naquela oportunidade, “considerando que o ora acusado foi beneficiado por outro acordo penal há menos de um ano, e diante da negativa do MPF em oferecer tal acordo, assim como a decisão da 4ª CCR do MPF que confirmou tal entendimento”.

Auto de Infração n. 9174710 lavrado em 17/07/2018 (ID 255038170, p. 10); Termo de apreensão n. 780035 de 19/07/2018 referente a vinte passeriformes (ID 255038170, p. 11); Ficha-controle de entrada de animais no CRAS-PET n. 28571 de 19/07/2018 (ID 255038170, p. 12); Relatório de apuração de infrações administrativas ambientais elaborado em 20/07/2018 pelo agente ambiental federal Hugo Américo Rubert Schaedler (ID 255038170, p. 13-17); parecer técnico do CRAS-PET datado de 01/10/2018 (ID 255038171, p. 4-6); Auto de Apreensão n. 2243/2018 lavrado em 14/11/2018 (ID 255038171, p. 9); Laudo Pericial Criminal Federal n. 4535/18/NUCRIM/SETEC/SR/PF/SP relativo às anilhas (ID 255038171, p. 17-26); boleto e respectivo recibo de pagamento relativo à aquisição de anilhas Capri (ID’s 255038472 e 255038473); relatório policial (ID 255038173, p. 20-21); Ofício n. 383/2021/SUPES-SP/IBAMA (ID 255038467); depoimentos das testemunhas em juízo (ID's 255038448, 255038449, 255038450, 255038452, 255038453, 255038454, 255038455 e 255038456); interrogatórios do acusado em sede policial (ID 255038173, p. 15-16) e em juízo (ID’s 25503845, 255038457, 255038458, 255038459 e 255038460).

Alegações finais da acusação (ID 255038469) e da defesa (ID 255038471).

Após regular instrução, sobreveio a sentença sob ID 255038474, que julgou parcialmente procedente a denúncia para (i) absolver JUAREZ SOUZA MENDES da imputação do artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal; e (ii) condená-lo a 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de pena privativa de liberdade, em regime inicial aberto, sendo 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de detenção e 11 (onze) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática delitiva descrita no artigo 32, caput, da Lei 9.605/98 (em continuidade delitiva, considerando os diversos passeriformes vítimas de maus-tratos, já aplicada a fração mínima de aumento correspondente a 1/6, incidente sobre a respectiva pena definitiva fixada em três meses de detenção e dez dias-multa), e 07 (sete) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa, pela imputação do crime previsto no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98 (em continuidade delitiva, considerando os diversos passeriformes em cativeiro irregular, já aplicada a fração mínima de aumento correspondente a 1/6, incidente sobre a respectiva pena definitiva fixada em seis meses de detenção e dez dias-multa), em concurso material entre si, substituída a soma das penas corporais por uma única restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade, em entidade a ser designada pelo Juízo da execução penal, pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade imposta e em tempo não inferior a sete horas semanais.

Publicada a sentença em 03/09/2021 (ID 255038474).

Apela JUAREZ SOUZA MENDES (ID 255038481), pleiteando a reforma parcial da r. sentença, para absolvê-lo também das imputações delitivas remanescentes descritas nos artigos 29, § 1º, III, e 32, ambos da Lei 9.605/98, com fundamento no artigo 386, VII, do CPP, alegando que o próprio órgão de fiscalização (IBAMA) teria sido o responsável pela irregularidade constatada relativa à ausência de anilhas em parte dos pássaros silvestres apreendidos em seu poder, por supostamente não lhe ter remetido em tempo hábil as respectivas anilhas que deveriam ser colocadas nos tarsos de tais passeriformes quando ainda eram filhotes, bem como que as lesões posteriormente verificadas nas aves apreendidas em seu domicílio e subsequente situação precária das gaiolas (tidos como possíveis sinais de maus-tratos) teriam, eventualmente, decorrido do transporte e depósito inadequados realizados pelos próprios funcionários dos IBAMA, considerando o momento da apreensão e a data da perícia.

Contrarrazões ministeriais (ID 255038484), pelo não provimento do apelo da defesa.

Parecer da Procuradoria Regional da República (ID 256551845), pelo não provimento do recurso da defesa.

É o relatório.

À revisão.

 

 


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APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5003982-95.2020.4.03.6181

RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI

APELANTE: JUAREZ SOUZA MENDES

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

V O T O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

O réu foi condenado apenas pela prática delitiva descrita nos artigos 29, § 1º, III, e 32, caput, ambos da Lei 9.605/98, cada qual em continuidade delitiva interna (artigo 71 do CP) e em concurso material entre si (artigo 69 do CP), ficando, todavia, absolvido da imputação do delito do artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, nos termos da r. sentença.

Em suas razões recursais (ID 255038481), a defesa de JUAREZ SOUZA MENDES pleiteia reforma parcial da r. sentença, para absolvê-lo também das imputações delitivas remanescentes descritas nos artigos 29, § 1º, III, e 32, ambos da Lei 9.605/98, com fundamento no artigo 386, VII, do CPP, alegando que o próprio órgão de fiscalização (IBAMA) teria sido o responsável pela irregularidade constatada relativa à ausência de anilhas em parte dos pássaros silvestres apreendidos em seu poder, por supostamente não lhe ter remetido em tempo hábil as respectivas anilhas que deveriam ser colocadas nos tarsos de tais passeriformes quando ainda eram filhotes, bem como que as lesões posteriormente verificadas nas aves apreendidas em seu domicílio e subsequente situação precária das gaiolas (tidos como possíveis sinais de maus-tratos) teriam, eventualmente, decorrido do transporte e depósito inadequados realizados pelos próprios funcionários dos IBAMA, considerando o momento da apreensão e a data da perícia.

O apelo defensivo comporta parcial provimento. Senão, vejamos:

I - DA IMPUTAÇÃO DE MAUS-TRATOS

O apelante foi condenado, inclusive, pelo cometimento do delito previsto no artigo 32, caput, da Lei 9.605/98, por ter, em tese, praticado atos de maus-tratos contra 09 (nove) das 20 (vinte) aves silvestres encontradas irregularmente em seu poder.

O crime de maus-tratos a animais silvestres encontra-se tipificado no artigo 32 da Lei 9.605/98 (g.n.):

 [...] Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. § 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. § 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.

No tocante à imputação delitiva descrita no artigo 32, caput, da Lei 9.605/98, não ficou suficientemente demonstrado nos autos que “JUAREZ” tenha, de fato, realizado qualquer dos núcleos do tipo incriminador de maus-tratos, razão pela qual de rigor a reforma da r. sentença condenatória, para absolvê-lo do delito de maus-tratos, em observância ao princípio jurídico da presunção de inocência (in dubio pro reo), com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, considerando as observações genéricas e inconclusivas do Parecer Técnico do CRAS-PET relativamente à presença de maus-tratos em pássaros da fauna silvestre (ID 255038171, p. 4-6), elaborado apenas em 01/10/2018, vale dizer, mais de dois meses depois de essas aves teriam sido apreendidas por agentes ambientais federais em poder do acusado no dia 17/07/2018, comportando provimento, nessa parte, o apelo defensivo.

Segundo o referido Parecer Técnico do CRAS-PET (fl. 61), elaborado tardiamente e fora do local original da apreensão, teriam sido constatados, em tese, os seguintes "sinais" de maus-tratos:

Foram constatados sinais de maus tratos, de acordo com a Comissão de Ética, Bioética e Bem-estar Animal (Cebea) do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV): O termo sofrimento se refere a questões físicas tais como ferimentos, contusões ou fraturas, e a questões psicológicas, como imposição de situações que gerem medo, angústia ou pavor, entre outros sentimentos negativos. A privação das espécies ao meio ambiente natural e do exercício de suas funções biológicas no local onde vivem, como alimentação natural adequada a espécie, exercício do vôo, vida em grupo, reprodução, entre outros; Péssimas condições de higiene dos bebedouros, comedouros e gaiolas com acumulo de fezes e restos de alimentos em processo de decomposição, colocando em risco a saúde animal e humana. Presença de ONICOGRIFOSE (crescimento excessivo das unhas) E/OU ANORMALIDADES DE RANFOTECA (crescimento excessivo do bico) são sinais frequentes em aves mantidas com poleiros de material e/os espessura inapropriados (FERRO, CANO PLÁSTICO, ALUMINIO) que os impeçam [sic] de desgaste, limpeza e afiamento das unhas e bico Presença de LESÃO NA FRONTE (lesões recentes na região da cera e da comissura lateral do bico), E/Ou EMPENAMENTO DEFICITARIO (penas gastas, quebradas OU ausentes), E/Ou AGITAÇÃO são sinais frequentes em animais recém capturados na natureza com intolerância ao cativeiro, causadas pela tentativa constante de fuga. Presença de um ou mais sintomas como DESCAMAÇÃO DE PELE; O DESBOTAMENTO DE PENAS, EDEMA PERIOFTALMICO, PESO INADEQUADO PARA A ESPECIE (regular, magro ou obeso), LINHAS DE ESTRESSE NAS PENAS, são sinais de doenças com origem nutricional, causados pelo fornecimento de alimentação inadequada e/ou privação de espaço. Presença de lesões ou doença sem tratamento: PODERMATITE Presença de animais ainda FILHOTES e ou IMATUROS, naturalmente dependentes, indefesos e delicados. Presença de LIPOMA: Segundo Sinhorini, J. A. Neoplasias em aves domésticas e silvestres mantidas em domicílio: avaliação anatomopatológica e imuno-histoqulmica. 131f. Dissertação (Mestrado em Ciências) - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnica, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. “... os lipomas em subcutâneo são os tumores mais prevalentes em aves, especialmente nos papagaios. No Brasil há um costume cultural de alimentar essas aves com sementes de girassol, amendoim e milho, associado a manutenção das aves em gaiolas pequenas e penas das asas (rêmiges) cortadas, impedindo-as de realizar qualquer tipo de exercício físico. Devido a esses fatores é muito alta a taxa de animais com problemas nutricionais, sugerindo a como a provável causa de encontro de lipoma nessas aves...”. O diâmetro das anilhas foi o primeiro elemento de segurança estabelecido para anilhas pois é ele quem garante que uma anilha tenha sido aplicada em uma ave ainda filhote (de 7 a 15 dias de vida), nascido em cativeiro, e não em uma ave adulta, capturada na natureza. As anilhas são propositadamente justas, de acordo com o diâmetro de cada espécie de ave a ser identificada, não sendo possível inseri-la pela pata da ave adulta, caso haja tentativa pode-se até causar lesões como fraturas, luxações e ou perda de dígitos. Portanto sinais de adulteração como cortes, lixamentos, deformações e falsificações com inscrições não compatíveis com o fabricante, diâmetros não correspondentes a instrução normativa, sugerem que a ave foi capturada da natureza e não nascida no cativeiro, e inserção de dados falsos no sistema de controle de criadores amadores de passeriformes - sispass IBAMA, visando o esquentamento de aves de origem ilícita.

A propósito, observo não terem sido registrados quaisquer indícios ou sinais aparentes de maus-tratos no Auto de Infração n. 9174710 lavrado em 17/07/2018 (ID 255038170, p. 10), no Termo de apreensão n. 780035 de 19/07/2018 (ID 255038170, p. 11), na Ficha-controle de entrada de animais no CRAS-PET n. 28571 de 19/07/2018 (ID 255038170, p. 12), no Auto de Apreensão n. 2243/2018 lavrado em 14/11/2018 (ID 255038171, p. 9) ou tampouco no Relatório de apuração de infrações administrativas ambientais elaborado em 20/07/2018 pelo agente ambiental federal Hugo Américo Rubert Schaedler e respectivas fotografias (ID 255038170, p. 13-17), em que pese as informações constantes no Parecer Técnico do CRAS-PET tardiamente elaborado em 01/10/2018 por médica veterinária, as quais posteriormente serviram de base para o Laudo Pericial Criminal Federal n. 4535/18/NUCRIM/SETEC/SR/PF/SP de 27/12/2018 (ID 255038171, p. 17-26), que, de maneira frágil, inferiu que “dentre os vinte (20) animais apreendidos, nove (09) ou 45% apresentavam sintomas indicativos de maus-tratos, sendo que dois (02) apresentavam sinal que via de regra é causado por captura recente”.

Ouvido na qualidade de testemunha comum (ID’s 255038448), o agente ambiental federal do IBAMA Hugo Américo Rubert Schaedler declarou, pelo que se recorda, não terem sido constatados possíveis maus-tratos no momento da apreensão dos passeriformes na casa do réu, inclusive porque a maior parte dessas aves se encontravam em gaiolas individuais e relativamente limpas, com alimentação e água, não havendo, por exemplo, eventual acúmulo de fezes ou tampouco comida mofada. As aves foram levadas dentro das gaiolas em que haviam sido encontradas, as quais, por sua vez, eventualmente teriam ficado encostadas uma às outras no momento de serem transportadas, por meio da camionete padrão do IBAMA.

Ouvido na qualidade de testemunha comum (ID’s 255038450, 255038455 e 255038456), o agente ambiental federal do IBAMA Marcelo Zanetti Leite declarou não se recordar com detalhes sobre o caso, limitando-se a confirmar o conteúdo constante no relatório elaborado. Não tem lembrança nem mesmo da pessoa do réu.

Ouvido na qualidade de testemunha comum (ID’s 255038449 e 255038454), o agente ambiental federal do IBAMA João Alves de Brito Filho declarou, também, recordar-se apenas vagamente de ter participado da diligência ambiental na presente hipótese.

Interrogado em sede policial (ID 255038173, p. 15-16) e em juízo (ID 25503845, 255038457 e 255038459), o acusado confirmou a apreensão de aves silvestres encontradas em sua residência, contudo negou a ocorrência de eventuais maus-tratos, uma vez que sempre tratou bem os animais em sua posse. Todos os dias trocava comida e água, conforme constatado pelos fiscais na ocasião dos fatos. No mais, alegou que, no dia da apreensão, os fiscais teriam, inadvertidamente, colocado todos os passarinhos em gaiolas encostadas uma à outra. Explicou ainda que o picharros chegam a brigar entre si quando colocados juntos na mesma gaiola, assim como os trincas-ferro quando colocados em gaiolas encostadas uma à outra.

Tampouco restou caracterizada no caso concreto a necessária presença do elemento subjetivo específico do delito em epígrafe, "consistente na vontade de maltratar o animal, agindo com crueldade, por qualquer motivo, inclusive puro sadismo" (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, v. 2, p. 523).

II - DO DELITO DE GUARDA ILÍCITA DE ESPÉCIMES DA FAUNA SILVESTRE

Quanto ao crime do artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, a materialidade e autoria delitivas restaram suficientemente comprovadas, mormente, pelo Auto de Infração n. 9174710 lavrado em 17/07/2018 (ID 255038170, p. 10), pelo Termo de apreensão n. 780035 referente a passeriformes (ID 255038170, p. 11), pela Ficha-controle de entrada de animais no CRAS-PET n. 28571 de 19/07/2018 (ID 255038170, p. 12), pelo Relatório de apuração de infrações administrativas ambientais elaborado em 20/07/2018 pelo agente ambiental federal Hugo Américo Rubert Schaedler (ID 255038170, p. 13-17) e pelo parecer técnico do CRAS-PET datado de 01/10/2018 (ID 255038171, p. 4), bem como pelas provas orais produzidas em juízo (ID's 255038448, 255038449, 255038450, 255038452, 255038453, 255038454, 255038455, 255038456, 25503845, 255038457, 255038458, 255038459 e 255038460).

Conforme se depreende do Parecer Técnico do CRAS-PET elaborado em 19/07/2018 (ID 255038171, p. 4), foram examinados 20 (vinte) aves silvestres nativas da fauna brasileira, apreendido em poder do acusado em cativeiro domiciliar ilegal (ID 255038170, p. 11), dos quais, notadamente, 18 (dezoito) encontravam-se desprovidos de quaisquer anilhas identificadoras, a saber, 06 (seis) coleirinha (Sporophila caerulescens), 03 (três) papa-capim (Sporophila nigricollis), 02 (dois) canário-da-terra-verdadeiro (Sicalis flaveola brasiliensis) e 07 (sete) picharro (Saltator similis), portanto, em nítido desacordo com o disposto no artigo 32, inciso II, da Instrução Normativa IBAMA n. 10, de 20/09/2011 (g.n.):

Art. 32 - Todos os Criadores Amadores e Comerciais de Passeriformes deverão: [...]

II - Manter todos os pássaros do seu plantel devidamente anilhados com anilhas invioláveis, não adulteradas, fornecidas pelo IBAMA ou fábricas credenciadas ou, ainda, por federações, clubes ou associações até o ano de 2001 ou por criadores comerciais autorizados.

III - Portar relação de passeriformes atualizada no endereço do plantel, conforme modelo do Anexo III.

Ouvido na qualidade de testemunha comum (ID’s 255038448, 255038452 e 255038453), o agente ambiental federal do IBAMA Hugo Américo Rubert Schaedler declarou que inexistiam quaisquer filhotes na casa do réu no momento da autuação, não havendo, portanto, justificativa idônea para que o acusado tivesse vindo a solicitar eventual entrega de anilhas junto ao IBAMA. Ademais, existia um número grande de aves irregulares no local (animais não anilhados e não constantes na relação do criador, encontrados no quintal da residência), de tal sorte que a licença para criador amador estava sendo utilizada apenas como uma “fachada”. As aves estavam em gaiolas, presas no muro, logo na entrada da garagem à direita. Também foram encontradas algumas outras aves na parte de cima onde havia um anexo da casa. Todas essas aves encontradas estariam sem anilhas, exceto duas delas que, embora estivessem anilhadas, não constavam na relação de passeriformes do acusado, até então com licença ativa. No mais, esclareceu que as anilhas só poderiam ter sido solicitadas ao IBAMA pelo acusado após o efetivo nascimento de filhotes das aves de seu plantel, em detrimento da declaração de nascimento falsamente realizada pelo réu.

Interrogado em sede policial (ID 255038173, p. 15-16), o acusado confirmou a apreensão de 20 (vinte) aves silvestres, no dia 17/07/2018, em sua residência, das quais, alegadamente, apenas 08 (oito) picharros e 04 (quatro) coleirinhas seriam de sua propriedade, ao passo que os demais passeriformes pertenceriam “aos inquilinos de sua residência e um deles a um garoto que chegou no local quando da fiscalização”. No mais, justificou, de maneira frágil, que os pássaros silvestres de sua propriedade acabaram ficando sem as necessárias anilhas identificadoras em razão de o próprio Ibama ter deixado de lhe entregá-las, em detrimento da solicitação de anilhas por ele realizada três anos antes da presente fiscalização.

Interrogado em juízo (ID’s 255038451, 255038457, 255038458, 255038459 e 255038460), o réu passou a admitir que, em meio à demora em receber as anilhas identificadoras por ele solicitadas um ano antes ao IBAMA, seu único erro teria sido deixar de avisar o referido órgão ambiental sobre o nascimento dos filhotes de seus picharros, que somente poderiam vir a ser por ele anilhados até o oitavo dia de nascidos. Naquela ocasião, realmente deveria ter ligado para o IBAMA solicitando que seus agentes de fiscalização fossem até sua casa buscar de volta tais filhotes, os quais acabaram perdendo o tempo adequado para serem anilhados. Apesar disso, afirmou, de modo inconsistente, que teria licença para criar todos os pássaros objeto de apreensão, incluindo os coleirinhas, papas-capim e canários-da-terra. No tocante à origem dos pássaros, afirmou ter comprado, por mero hobby, os casais de seus passarinhos de outros criadores amadores também registrados no IBAMA. Alegou ainda que quando o fiscal do IBAMA Hugo chegara à porta da casa dele, havia um rapaz menor de idade chamado Ryan com um picharro nas mãos, que o teria trazido ao local apenas para pôr para cantar, ocasião em que o referido fiscal do IBAMA veio a considerar que tal passarinho, supostamente, teria saído de dentro da casa do réu, sendo, portanto, de sua responsabilidade. Na sequência, passou a declarar, de modo contraditório, que o canário-da-terra na verdade seria do inquilino da sua mãe (morador da casa de cima), e não seu, até porque não criava nem tinha anilha de canário-da-terra, mencionando que, entre os 20 pássaros apreendidos em seu poder, somente 04 (quatro) deles não seriam seus (a saber, um picharro pertencente ao rapaz de 16 anos e os outros três pertencentes ao inquilino de sua mãe que morava na casa de cima, porém não estava presente no dia da fiscalização), de tal modo que os 16 (dezesseis) passarinhos restantes seriam seus (todos eles sem anilhas identificadoras), em contraste nesse ponto com a quantidade informada em seu próprio interrogatório policial. Em seguida, passou a sustentar que, em verdade, não teria quaisquer filhotes na ocasião dos fatos (os seis ovos colocados pela fêmea dele não teriam logrado chocar) e que, diante de sua expectativa de demora na entrega das anilhas pelo IBAMA, teria vindo a solicitá-las ao referido órgão ambiental antes mesmo do eventual nascimento de filhotes. No mais, admitiu ter ciência sobre a necessidade de seus passarinhos estarem todos anilhados, tendo falhado em não avisar o IBAMA sobre a situação irregular de seus filhotes que teriam passado da hora de colocação das respectivas anilhas, por alegado receio quanto ao destino incerto de tais passeriformes, quando viessem a ser devolvidos ao referido órgão ambiental.

Destarte, ao contrário do sustentado pela defesa, ficaram suficientemente comprovadas a materialidade e autoria delitivas, assim como o dolo do réu, em relação à prática delitiva descrita no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, sob a forma consumada (apreensão de, pelo menos, dezoito pássaros silvestres da fauna brasileira, irregularmente mantidos em cativeiro domiciliar pelo réu, em, 17/07/2018, no Município de São Paulo/SP, sem qualquer autorização do IBAMA), sendo mantido, de rigor, o decreto condenatório nesse ponto, à míngua de qualquer das causas de absolvição previstas no artigo 386 do Código de Processo Penal. Tampouco há de se cogitar erro sobre a ilicitude do fato (seja inevitável, seja evitável) ou sobre os elementos do tipo, ou mesmo eventual excludente de culpabilidade, incompatíveis com o presente contexto delitivo, cujas circunstâncias não autorizam a concessão do perdão judicial previsto no artigo 29, § 2º, da Lei 9.605/98, inclusive, pela expressiva quantidade de aves silvestres claramente irregulares apreendidas em seu poder (parte dos quais sequer admite ser sua), além da larga experiência do acusado, admitidamente criador de passeriformes desde 2007, registrado no IBAMA sob CTF n. CTF/APP 980403 (ID’s 25503845, 255038457, 255038458, 255038459 e 255038460).

III - DA DOSIMETRIA E SUBSTITUIÇÃO

JUAREZ SOUZA MENDES foi, originalmente, condenado a 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de pena privativa de liberdade, em regime inicial aberto, sendo 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de detenção e 11 (onze) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática delitiva descrita no artigo 32, caput, da Lei 9.605/98 (em continuidade delitiva, considerando os diversos passeriformes vítimas de maus-tratos, já aplicada a fração mínima de aumento correspondente a 1/6, incidente sobre a respectiva pena definitiva fixada em três meses de detenção e dez dias-multa), e 07 (sete) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa, pela imputação do crime previsto no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98 (em continuidade delitiva, considerando os diversos passeriformes em cativeiro irregular, já aplicada a fração mínima de aumento correspondente a 1/6, incidente sobre a respectiva pena definitiva fixada em seis meses de detenção e dez dias-multa), em concurso material entre si, substituída a soma das penas corporais por uma única restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade, em entidade a ser designada pelo Juízo da execução penal, pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade imposta e em tempo não inferior a sete horas semanais.

Tendo em conta a oportuna absolvição do delito do artigo 32 da Lei 9.605/98 (maus-tratos), passo a análise da dosimetria da imputação delitiva remanescente descrita no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98.

Na primeira fase da dosimetria, mantenho as penas-base já fixadas pelo Juízo Federal de origem no mínimo patamar legal, a saber, 06 (seis) meses de detenção, e 10 (dez) dias-multa, adstrito ao princípio da non reformation in pejus, à míngua de recurso da acusação.

Na segunda fase da dosimetria, não há circunstâncias agravantes. Embora presente a atenuante de confissão espontânea prevista no artigo 65, inciso III, "d", do Código Penal, a pena permanece inalterada nesta etapa, nos limites da Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, que veda seja a pena intermediária fixada abaixo do mínimo legal.

Na terceira fase, inexistem causas de aumento e de diminuição a serem reconhecidas na presente hipótese.

A propósito, ainda que ex officio e em benefício do réu, excluo a continuidade delitiva e sua respectiva fração de aumento, equivocadamente, aplicadas pelo magistrado sentenciante em relação ao delito remanescente previsto no art. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, uma vez que, independentemente da quantidade de aves silvestres apreendidas em poder do réu em cativeiro domiciliar ilegal na ocasião dos fatos, não há de se falar em múltiplas condutas delitivas perpetradas contra a fauna silvestre, mas em crime único.

Dessa forma, fixo definitivamente a nova pena privativa de liberdade de JUAREZ SOUZA MENDES em apenas 06 (seis) meses de detenção, e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do delito remanescente capitulado no art. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, ainda que de ofício e em benefício do réu.

Nos termos do artigo 33, §2º, "c", e §3º, do Código Penal, mantenho fixado o regime prisional inicial aberto.

Ademais, nos moldes dos artigos 44, § 2º, primeira parte, e 46, ambos do Código Penal, e dos artigos 6º, 8º e 9º, ambos da Lei 9.605/98, substituo a nova pena corporal por uma única restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena substituída, a ser especificada pelo Juízo de Execução Penal.

Ante o exposto, dou parcial provimento ao apelo da defesa, reformando a r. sentença, para absolver o acusado JUAREZ SOUZA MENDES do delito do artigo 32, caput, da Lei 9.605/98, em observância ao princípio jurídico da presunção de inocência (in dubio pro reo), com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, e de ofício e em benefício do réu, excluo a continuidade delitiva e sua respectiva fração de aumento, equivocadamente, aplicadas pelo magistrado sentenciante em relação ao delito remanescente previsto no art. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, ficando ora definitivamente fixada sua nova pena privativa de liberdade em apenas 06 (seis) meses de detenção, em regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, substituída a nova pena corporal por uma única restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena substituída, a ser especificada pelo Juízo de Execução Penal.

É o voto.

Comunique-se ao Juízo de Execução Criminal.



E M E N T A

PENAL. PROCESSUAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ACUSAÇÃO DE MAUS-TRATOS CONTRA PASSERIFORMES APREENDIDOS EM PODER DO RÉU. CRIME DO ARTIGO 32, CAPUT, DA LEI 9.605/98. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS DA MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS, BEM COMO DE SEU ELEMENTO SUBJETIVO ESPECÍFICO. PRINCÍPIO JURÍDICO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. ARTIGO 386, VII, DO CPP. CRIME DO ARTIGO 29, § 1º, III, DA LEI 9.605/98. APREENSÃO DE, PELO MENOS, DEZOITO PÁSSAROS SILVESTRES DA FAUNA BRASILEIRA IRREGULARMENTE MANTIDOS EM CATIVEIRO DOMICILIAR PELO ACUSADO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS SUFICIENTEMENTE COMPROVADAS, À MÍNGUA DE ERRO SOBRE OS ELEMENTOS DO TIPO OU TAMPOUCO SOBRE A ILICITUDE DO FATO (SEJA EVITÁVEL, SEJA INEVITÁVEL). DOLO CONFIGURADO. DOSIMETRIA NO TOCANTE AO DELITO AMBIENTAL REMANESCENTE. PENA DEFINITIVA ORA FIXADA NO MÍNIMO PATAMAR LEGAL, FICANDO EXCLUÍDA, AINDA QUE DE OFÍCIO E EM BENEFÍCIO DO RÉU, A CONTINUIDADE DELITIVA INTERNA EQUIVOCADAMENTE APLICADA PELO JUÍZO FEDERAL DE ORIGEM, POR SE TRATAR DE CRIME ÚNICO IN CASO, INDEPENDENTEMENTE DA QUANTIDADE DE AVES SILVESTRES APREENDIDAS EM CATIVEIRO DOMICILIAR ILEGAL EM PODER DO ACUSADO, TODAS OBJETO DA MESMA AUTUAÇÃO AMBIENTAL. SUBSTITUIÇÃO DA NOVA PENA CORPORAL APLICADA AO RÉU POR UMA ÚNICA RESTRITIVA DE DIREITOS CONSISTENTE EM PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE. RECURSO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDO.

1. O réu foi condenado apenas pela prática delitiva descrita nos artigos 29, § 1º, III, e 32, caput, ambos da Lei 9.605/98, cada qual em continuidade delitiva interna (artigo 71 do CP) e em concurso material entre si (artigo 69 do CP), ficando, todavia, absolvido da imputação do delito do artigo 296, § 1º, III, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, nos termos da r. sentença.

2. Em suas razões recursais (ID 255038481), a defesa de JUAREZ SOUZA MENDES pleiteia reforma parcial da r. sentença, para absolvê-lo também das imputações delitivas remanescentes descritas nos artigos 29, § 1º, III, e 32, ambos da Lei 9.605/98, com fundamento no artigo 386, VII, do CPP, alegando que o próprio órgão de fiscalização (IBAMA) teria sido o responsável pela irregularidade constatada relativa à ausência de anilhas em parte dos pássaros silvestres apreendidos em seu poder, por supostamente não lhe ter remetido em tempo hábil as respectivas anilhas que deveriam ser colocadas nos tarsos de tais passeriformes quando ainda eram filhotes, bem como que as lesões posteriormente verificadas nas aves apreendidas em seu domicílio e subsequente situação precária das gaiolas (tidos como possíveis sinais de maus-tratos) teriam, eventualmente, decorrido do transporte e depósito inadequados realizados pelos próprios funcionários dos IBAMA, considerando o momento da apreensão e a data da perícia.

3. No tocante à imputação delitiva descrita no artigo 32, caput, da Lei 9.605/98, não ficou suficientemente demonstrado nos autos que “JUAREZ” tenha, de fato, realizado qualquer dos núcleos do tipo incriminador de maus-tratos, razão pela qual de rigor a reforma da r. sentença condenatória, para absolvê-lo do delito de maus-tratos, em observância ao princípio jurídico da presunção de inocência (in dubio pro reo), com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, considerando as observações genéricas e inconclusivas do Parecer Técnico do CRAS-PET relativamente à presença de maus-tratos em pássaros da fauna silvestre (ID 255038171, p. 4-6), elaborado apenas em 01/10/2018, vale dizer, mais de dois meses depois de essas aves teriam sido apreendidas por agentes ambientais federais em poder do acusado no dia 17/07/2018, comportando provimento, nessa parte, o apelo defensivo.

4. Por outro lado, ao contrário do sustentado pela defesa, ficaram suficientemente comprovadas a materialidade e autoria delitivas, assim como o dolo do réu, em relação à prática delitiva descrita no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, sob a forma consumada (apreensão de, pelo menos, dezoito pássaros silvestres da fauna brasileira, irregularmente mantidos em cativeiro domiciliar pelo réu, em, 17/07/2018, no Município de São Paulo/SP, sem qualquer autorização do IBAMA), sendo mantido, de rigor, o decreto condenatório nesse ponto, à míngua de qualquer das causas de absolvição previstas no artigo 386 do Código de Processo Penal. Tampouco há de se cogitar erro sobre a ilicitude do fato (seja inevitável, seja evitável) ou sobre os elementos do tipo, ou mesmo eventual excludente de culpabilidade, incompatíveis com o presente contexto delitivo, cujas circunstâncias não autorizam a concessão do perdão judicial previsto no artigo 29, § 2º, da Lei 9.605/98, inclusive, pela expressiva quantidade de aves silvestres claramente irregulares apreendidas em seu poder (parte dos quais sequer admite ser sua), além da larga experiência do acusado, admitidamente criador de passeriformes desde 2007, registrado no IBAMA sob CTF n. CTF/APP 980403 (ID’s 25503845, 255038457, 255038458, 255038459 e 255038460).

5. O réu foi, originalmente, condenado a 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de pena privativa de liberdade, em regime inicial aberto, sendo 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de detenção e 11 (onze) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática delitiva descrita no artigo 32, caput, da Lei 9.605/98 (em continuidade delitiva, considerando os diversos passeriformes vítimas de maus-tratos, já aplicada a fração mínima de aumento correspondente a 1/6, incidente sobre a respectiva pena definitiva fixada em três meses de detenção e dez dias-multa), e 07 (sete) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa, pela imputação do crime previsto no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98 (em continuidade delitiva, considerando os diversos passeriformes em cativeiro irregular, já aplicada a fração mínima de aumento correspondente a 1/6, incidente sobre a respectiva pena definitiva fixada em seis meses de detenção e dez dias-multa), em concurso material entre si, substituída a soma das penas corporais por uma única restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade, em entidade a ser designada pelo Juízo da execução penal, pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade imposta e em tempo não inferior a sete horas semanais.

6. Ainda que ex officio e em benefício do réu, ficou ora excluída a continuidade delitiva e sua respectiva fração de aumento, equivocadamente, aplicadas pelo magistrado sentenciante em relação ao delito remanescente previsto no art. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, uma vez que, independentemente da quantidade de aves silvestres apreendidas em poder do réu em cativeiro domiciliar ilegal na ocasião dos fatos, não há de se falar em múltiplas condutas delitivas perpetradas contra a fauna silvestre, mas em crime único, ficando ora definitivamente fixada sua nova pena privativa de liberdade em apenas 06 (seis) meses de detenção, em regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, substituída a nova pena corporal por uma única restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena substituída, a ser especificada pelo Juízo de Execução Penal.

7. Apelo defensivo parcialmente provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PROVIMENTO ao apelo da defesa, reformando a r. sentença, para absolver o acusado JUAREZ SOUZA MENDES do delito do artigo 32, caput, da Lei 9.605/98, em observância ao princípio jurídico da presunção de inocência (in dubio pro reo), com fundamento no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, e de ofício e em benefício do réu, excluir a continuidade delitiva e sua respectiva fração de aumento, equivocadamente, aplicadas pelo magistrado sentenciante em relação ao delito remanescente previsto no art. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98, ficando ora definitivamente fixada sua nova pena privativa de liberdade em apenas 06 (seis) meses de detenção, em regime inicial aberto, e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, substituída a nova pena corporal por uma única restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena substituída, a ser especificada pelo Juízo de Execução Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.