Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO


Nº 

RELATOR: 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000675-59.2015.4.03.6129

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: ISRAEL DE BARROS ARRUDA

 

APELADO: VALDEIR MARQUES SA TELES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

Advogado do(a) APELADO: JOSE SOARES DA COSTA NETO - SP257677-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

Trata-se de apelações criminais interpostas por ISRAEL DE BARROS ARRUDA, nascido em 24.07.1974 (Id 160261494 – fl. 12) e VALDEIR MARQUES SÁ TELES, nascido em 21.03.1988 (Id 160261494 – fl. 20), em face da r. sentença (Id 160261374 – fls. 213/232), publicada em 16.01.2018 e proferida pelo Exmo. Juiz Federal João Batista Machado, da 1ª Vara Federal de Registro/SP, que julgou parcialmente procedente o pedido para condená-los pela prática do crime previsto no art. 289, § 1º, do Código Penal, às penas de 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, respectivamente, a serem cumpridas inicialmente em regime FECHADO, e pagamento de 20 (vinte) e 15 (quinze) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, assim como os absolveu do cometimento do delito tipificado no art.  155, caput, do Código Penal, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal.

Consta da denúncia:

 

DOS FATOS

Consta dos autos que os ora denunciados VALDEIR MARQUES SÁ TELES e ISRAEL DE BARROS ARRUDA, de forma consciente, livre e voluntária, praticaram crime de furto qualificado, introduziram moeda falsa em circulação e, após abordagem policial, guardavam cédulas falsas e substâncias entorpecentes (crack), incorrendo nos crimes descritos nos art. 289, § 1°, art. 155, §4°, inciso II, do Código Penal, bem como nos arts. 33 e 35 da Lei nº. 11.343/06, em concurso de agentes.

Segundo documentos de fls. 45 do Inquérito Policial, por volta da 1h da madrugada do dia 28/12/2014, a partir de denúncia de que indivíduos estariam introduzindo cédulas falsas em circulação, policiais efetuaram a abordagem do veículo Hyundai Tucson, cor prata, placa EMK 3366/SP, conduzido pelos denunciados.

Ao ser abordado, foi realizada a revista pessoal de VALDEIR MARQUES SÁ TELES, sendo encontrado em suas vestes duas cédulas de vinte reais falsas, e no bolso da bermuda de ISRAEL DE BARROS ARRUDA foram localizadas cinco notas de cem reais, sendo quatro falsas e uma autêntica, uma cédula de cinquenta reais, duas cédulas de vinte reais, uma cédula de dez reais, todas falsas.

No interior do veículo, na carteira de VALDEIR MARQUES SÁ TELES foram encontradas mais quatro cédulas de cem reais, duas cédulas de vinte reais, duas cédulas de dois reais, todas falsas, e um cheque do Banco Itaú, agência Barueri, em nome da correntista Juliana Souza Tozzi, preenchido no valor de quinhentos reais, com carimbo de devolução no verso.

Pelas informações dos autos (fls. 46), verifica-se que debaixo do banco do passageiro ainda foi encontrado uma caixa de fósforo, a qual continha seis pedras de crack embaladas individualmente, possivelmente prontas para venda, cuja propriedade da droga nenhum dos denunciados assumiu, declararam, apenas, que não eram usuários e nem traficantes (Auto de Constatação Preliminar de Substância Entorpecente às fls. 30/30v).

Consta às fls. 08 informações a respeito do depoimento da vítima RAFAEL PEREIRA DE OLIVEIRA, que alegou que na noite anterior, por volta das 23h50min, se encontrava na fila de uma adega para efetuar pagamento das bebidas adquiridas, frisando que segurava uma nota de cem reais. Declara que repentinamente uma pessoa se aproximou e, após puxar a nota de sua mão, saiu correndo, oportunidade em que a vítima correu atrás do indivíduo e pediu devolução do dinheiro. Nesse momento, teria sido devolvida uma nota de cem reais, a qual percebeu ser falsa, ocasião em que novamente correu atrás do indivíduo e pediu a nota verdadeira, recebendo outra nota de cem reais. Ao retornar ao caixa do comércio para pagamento de sua conta, foi informado de que a nota também era falsa, todavia, que havia sido anotado o emplacamento do veículo.

A vítima informou a Policia Militar e, após as abordagens, compareceu na unidade policial e reconheceu ISRAEL DE BARROS ARRUDA como o indivíduo que furtou a nota verdadeira e devolveu, duas vezes, nota de cem reais falsa.

No intuito criminoso, utilizaram o mesmo veículo abordado pelos policiais posteriormente, sendo que se ISRAEL DE BARROS ARRUDA dirigiu-se a pessoa da vítima, VALDEIR MARQUES SÁ TELES conduzia o veículo, que inclusive teve a placa anotada por populares, atuando os denunciados em concurso de agentes.

Verifica-se a tipificação de furto na modalidade qualificada em razão do uso de destreza, já que o denunciado ISRAEL DE BARROS ARRUDA subtraiu a nota verdadeira e por duas vezes “fingiu” restituída, demonstrando a intenção criminosa de ludibriar a vítima.

Nesse sentido, diante dos fatos amplamente narrados nos autos, observa-se que os denunciados incorreram nos crimes previstos nos artigos 289, § 1º, art. 155, § 4º, inciso II, do Código Penal, bem como nos arts. 33 e 35 da Lei n° 11.343/06, in verbis:

(...)

Dessa forma, a materialidade delitiva dos crimes apurados evidencia-se pela prática de furto qualificado pelo elemento destreza, com introdução de moeda falsa em circulação, bem como pelos denunciados terem sido pegas com quantidade de cédulas falsas, as quais possivelmente teriam o objetivo de introduzir em circulação ou praticar novos furtos, demonstrando a intenção criminosa dos mesmos, e ainda com drogas ilícitas.

A autoria, por sua vez, revela-se, dentre outras provas, pelas declarações da vítima RAFAEL PEREIRA DE OLIVEIRA, bem como pelo relatório da abordagem policial que prendeu os denunciados em flagrante.

Desta forma, restou amplamente demonstrado que VALDEIR MARQUES SÁ TELES e ISRAEL DE BARROS ARRUDA praticaram crime de furto qualificado, introduziram moeda falsa em circulação e, após abordagem policial, guardavam cédulas falsas e substâncias entorpecentes (crack), com plena ciência quanto ao caráter de reprovabilidade de suas condutas (Id 160261374 – fls. 7/10).

 

Tipificação: art. 155, § 4º, II, e art. 289, § 1º, ambos do Código Penal, e arts. 33 e 35 da Lei n° 11.343/06.

A denúncia foi recebida parcialmente em 01.04.2016, com a alteração da capitulação do primeiro fato para a forma simples (art. 155, caput, do Código Penal) e a determinação de remessa dos autos à Justiça Estadual para análise dos crimes previstos nos arts. 33 e 35 da Lei n° 11.343/2006 (Id 160261374 – fl. 23).

Sobreveio a r. sentença, que condenou VALDEIR MARQUES SÁ TELES e ISRAEL DE BARROS ARRUDA pela acusação relacionada à prática do crime tipificado no art. 289, § 1º, do Código Penal, assim como os absolveu daquela atinente ao cometimento do delito previsto no art. 155, caput, do Código Penal.

Em suas razões de recurso, a defesa de VALDEIR MARQUES SÁ TELES postula a absolvição, ao argumento de que o fato carece de materialidade delitiva, uma vez que a falsificação das cédulas seria grosseira e, por conseguinte, inapta a ludibriar o homem de discernimento médio. Subsidiariamente, requer a desclassificação do crime para a forma prevista no § 2º do art. 289 do Código Penal, para o que sustenta que a cédula foi recebida de boa-fé (Id 160261375 – fls. 21/26).

A Defensoria Pública da União, por sua vez, pede a redução da pena-base de ISRAEL DE BARROS ARRUDA, dado o transcurso de mais de cinco anos desde os fatos utilizados na valoração negativa de seus antecedentes criminais. Consequentemente, pleiteia a estipulação do regime semiaberto para início do cumprimento da sanção (Id 160261375 – fls. 47/64).

Recebidos os recursos, com contrarrazões (Id 160261375 – fls. 65/74), subiram os autos a esta Egrégia Corte.

Oficiando nesta instância, o órgão ministerial opinou pelo desprovimento dos reclamos (Id 160261375 – fls. 77/85).

É o relatório.

À revisão.

 

 


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APELANTE: ISRAEL DE BARROS ARRUDA

 

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V O T O

 

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O DELITO DE MOEDA FALSA

O art. 289, parágrafo 1º, do Código Penal, assim dispõe:

Art. 289 - Falsificar, fabricando-a ou alterando-a, moeda metálica ou papel-moeda de curso legal no país ou no estrangeiro:

Pena - reclusão, de três a doze anos, e multa.

§ 1º - Nas mesmas penas incorre quem, por conta própria ou alheia, importa ou exporta, adquire, vende, troca, cede, empresta, guarda ou introduz na circulação moeda falsa.

 

Trata-se de tipo penal misto alternativo (ou de ação múltipla), que possui, no seu bojo, vários verbos nucleares, de modo que, praticada quaisquer das condutas descritas, estará consumado o crime. Inclusive, a prática, em um mesmo contexto, de dois ou mais dos comportamentos previstos, enseja, em princípio, a responsabilização por uma única infração penal, não se havendo de falar em concurso de crimes. Fabricar é criar (por litografia, cunhagem ou qualquer outro meio) moeda falsa totalmente similar à original. Alterar é modificá-la para que venha a presentar valor maior. Importar é introduzir no país. Exportar é retirar do país. Adquirir é obter de outrem. Vender é alienar a moeda falsa. Trocar é permutar. Ceder é transferir, a qualquer título, a moeda falsa a terceiro. Emprestar é cedê-la, provisoriamente, com a condição de que seja posteriormente restituída. Guardar significa ter a moeda falsa consigo, em depósito ou à sua disposição. Introduzir na circulação significa utilizar-se da moeda falsa para pagar por um serviço ou adquirir um bem (lícito ou ilícito) ou, ainda, doá-la para terceiro de boa-fé.

O crime é instantâneo no que diz respeito às condutas de "falsificar", "fabricar", "alterar", "importar", "exportar", "adquirir", "vender", "trocar", "ceder" e "introduzir" e permanente na modalidade "guardar", já que, nesta hipótese, a consumação se protrai no tempo. A doutrina classifica-o como formal e de perigo abstrato, uma vez que a consumação independe da ocorrência de resultado lesivo, ou seja, é desnecessário que o agente obtenha vantagem ou cause prejuízo a terceiros para que o delito se consume, assim como não se exige que a moeda falsa seja efetivamente posta em circulação, bastando a mera execução de quaisquer das condutas previstas no tipo penal para se presumir, absolutamente, o perigo ao bem jurídico tutelado, este consistente na fé pública relacionada à confiança coletiva na autenticidade da moeda nacional.

Atente-se que, justamente por se tratar de crime cujo bem juridicamente protegido é a fé pública (bem intangível), é pacífico o entendimento da jurisprudência no sentido de que não deve ser admitida a aplicação do princípio da insignificância.

É certo que o princípio da insignificância tem como base de sustentação o postulado da mínima intervenção do Direito Penal (ultima ratio), segundo o qual se deve afastar a aplicação do Direito Penal a fatos de menor importância (e que, portanto, podem ser debelados com supedâneo nos demais ramos da Ciência Jurídica - fragmentariedade do Direito Penal). Dentro desse contexto, a insignificância tem o condão de afastar a tipicidade sob o aspecto material, considerando o reduzido grau de reprovabilidade da conduta e a mínima ofensa ao bem jurídico tutelado, remanescendo, apenas, a tipicidade formal, ou seja, a adequação entre fato e lei penal incriminadora.

Ocorre que, em se tratando das condutas descritas no artigo 289 do Código Penal e seus parágrafos, não se há de falar em mínima ofensividade nem em desinteresse estatal em reprimi-las, já que, independentemente do valor das cédulas falsas ou da quantidade apreendida, tais condutas atingem, necessariamente, a credibilidade da moeda e a segurança de sua circulação.

Nesse sentido, cabe colacionar os seguintes julgados:

 

HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PENAL. PACIENTE DENUNCIADO PELA INFRAÇÃO DO ART. 289, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DE INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FAVORÁVEL À TESE DA IMPETRAÇÃO: NÃO APLICAÇÃO À ESPÉCIE VERTENTE. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS DENEGADO.

1. A existência de decisão neste Supremo Tribunal no sentido pretendido pela Impetrante, inclusive admitindo a incidência do princípio da insignificância ao crime de moeda falsa, não é bastante a demonstrar como legítima sua pretensão.

2. Nas circunstâncias do caso, o fato é penalmente relevante, pois a moeda falsa apreendida, além de representar um valor vinte vezes superior ao do precedente mencionado, seria suficiente para induzir a engano, o que configura a expressividade da lesão jurídica da ação do Paciente.

3. A jurisprudência predominante do Supremo Tribunal Federal é no sentido de reverenciar - em crimes de moeda falsa - a fé pública, que é um bem intangível, que corresponde, exatamente, à confiança que a população deposita em sua moeda. Precedentes.

4. Habeas corpus denegado.

(STF, 1ª Turma, HC 96153/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 26.06.2009)

 

HABEAS CORPUS. CIRCULAÇÃO DE MOEDA FALSA. ALEGAÇÃO DE INEXPRESSIVIDADE FINANCEIRA DOS VALORES IMPRESSOS NAS CÉDULAS FALSAS. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA PENAL AO CASO. NORMA PENAL QUE NÃO SE LIMITA A COIBIR O PREJUÍZO A QUEM RECEBEU MOEDA FALSA. ORDEM DENEGADA.

1. O princípio da insignificância penal é doutrinariamente versado como vetor interpretativo do fato penalmente típico. Vetor interpretativo que exclui da abrangência do Direito Penal condutas provocadoras de ínfima lesão a bem jurídico alheio. Tal forma de interpretação visa, para além de uma desnecessária carcerização, ao descongestionamento de uma Justiça Penal que se deve ocupar apenas das infrações tão lesivas a bens jurídicos dessa ou daquela pessoa quanto aos interesses societários em geral.

2. A norma criminalizadora da falsificação de moeda tutela a fé pública. Bem jurídico revelador da especial proteção à confiabilidade do 'sistema monetário' nacional. Pelo que o valor impresso na moeda falsa não é o critério de análise da relevância, ou da irrelevância da conduta em face das normas penais.

3. Tem-se por violada a fé pública quando a moeda nacional é falsificada seja qual for o valor estampado no papel-moeda. O que impossibilita concluir, no caso, pela inexpressividade da lesão jurídica resultante da conduta do agente.

4. Ordem denegada. (STF, 2ª Turma, HC 97220/MG, Rel. Min. Ayres Britto, DJe de 26.08.2011).

 

Habeas Corpus substitutivo de agravo regimental cabível na origem. Crime de moeda falsa. Inaplicabilidade do princípio da insignificância penal.

1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende que 'a impetração de habeas corpus como substitutivo de agravo regimental inclusive noutra Corte representa medida teratológica' (HC 115.659, Rel. Min. Luiz Fux). Precedentes.

2. Ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal já consolidaram o entendimento de que é 'inaplicável o princípio da insignificância aos crimes de moeda falsa, em que objeto de tutela da norma a fé pública e a credibilidade do sistema financeiro, não sendo determinante para a tipicidade o valor posto em circulação' (HC 105.638, Rel. Min. Rosa Weber). Precedentes.

3. O pedido alternativo de desclassificação da conduta imputada ao paciente, além de implicar um amplo revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, não foi submetido às instâncias judicantes competentes. Logo, a imediata apreciação dessa matéria, pelo Supremo

Tribunal Federal, acarretaria uma indevida supressão de instâncias.

4. Habeas Corpus extinto sem resolução de mérito por inadequação da via processual.

(STF, 1ª Turma, HC 108193, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe de 25.09.2014)

 

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. MOEDA FALSA. DOLO. SUFICIÊNCIA DA PROVA. VERIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. DESCLASSIFICAÇÃO PARA AS CONDUTAS DOS ARTS. 289, § 2º E 171, AMBOS DO CP. INVIABILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. ABSOLVIÇÃO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃOCABIMENTO. BEM JURÍDICO TUTELADO. FÉ PÚBLICA. PROPORCIONALIDADE DA PENA DO ART. 289, I, DO CP. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. As instâncias ordinárias reconheceram suficientemente demonstrado o elemento subjetivo do tipo (dolo). Para afastar tal conclusão seria necessário o reexame do conjunto probatório, providência inviável no recurso especial, pela Súmula n. 7 do STJ.

2. A análise da pretendida desclassificação da conduta praticada para aquela do art. 289, § 2º, do CP é inviável, pela incidência da Súmula n. 7 do STJ, porquanto seria necessária a comprovação de que o réu teria recebido de boa-fé as cédulas falsas.

3. A análise da desclassificação da conduta para aquela do art. 171 do CP demanda revolvimento fático-probatório dos autos, vedado pela Súmula n. 7 do STJ, uma vez que o Tribunal de origem afastou a premissa de falsificação grosseira com base em laudo técnico.

4. A aplicação do princípio da insignificância não é cabível ao crime de moeda falsa, em razão de ser a fé pública o bem jurídico tutelado. Precedentes.

5. A Corte de origem não examinou a questão relativa à proporcionalidade da pena estabelecida do art. 289, § 1º, do CP, o que impede o conhecimento do recurso especial, por falta do indispensável prequestionamento.

6. Agravo regimental não provido.

(STJ, Sexta Turma, AGRESP 1395016, Rel. Rogério Schietti Cruz, DJe de 24.05.2017)

 

PENAL. PROCESSO PENAL. MOEDA FALSA. ARTIGO 289, §1º, DO CP. INAPLICABILIDADEDO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA. PENA-BASE. VALORAÇÃO NEGATIVA DA CULPABILIDADE DO RÉU E DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. AUSENTES AGRAVANTES E ATENUANTES. ART. 66 DO CP. NÃO COMPROVADA CIRCUNSTÂNCIA RELEVANTE. AUSENTES CAUSAS DE AUMENTO E DIMINUIÇÃO. REGIME INICIAL ABERTO MANTIDO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR DUAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. REVERTIDA DE OFÍCIO EM FAVOR DA UNIÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

1. O princípio da insignificância não se aplica ao crime de moeda falsa, uma vez que o objeto juridicamente tutelado pelo tipo penal é a fé pública e, por conseguinte, a confiança que as pessoas depositam na autenticidade da moeda, não sendo possível quantificar o dano causado à sociedade, já que a lei penal visa à segurança da circulação monetária, nada importando a quantidade de exemplares ou o valor representado pelas cédulas contrafeitas.

2. A materialidade delitiva ficou demonstrada pelo Auto de Apreensão de fls. 02/09, bem como pelo laudo pericial de fls. 41/45.

3. A autoria e o dolo restaram igualmente comprovados pelo Auto de Prisão em Flagrante (fl. 02/09), bem como pelos depoimentos prestados em juízo. As circunstâncias nas quais o delito foi praticado indicam que o apelante detinha conhecimento da falsidade das notas.

4. Dosimetria da pena. Na primeira fase, mantida a pena-base fixada na sentença. Valorada negativamente, no entanto, a culpabilidade em razão da quantidade de notas apreendidas, ao invés das consequências do crime. Mantida a valoração negativa das circunstâncias do crime, em razão do réu ter se utilizado de menor de idade. Na segunda fase, ausentes agravantes e atenuantes. Não se trata de hipótese de incidência da atenuante inominada/genérica prevista no artigo 66 do Código Penal, eis que não comprovada circunstância relevante a ensejar sua aplicação. Na terceira fase não há causas de aumento e de diminuição, restando mantida a pena definitiva em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa.

5. Regime inicial aberto mantido.

6. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. O crime em questão não foi cometido com violência ou grave ameaça e, apesar da culpabilidade do réu ter sido considerada negativamente, a medida se mostra socialmente recomendável.

7. De ofício, prestação pecuniária revertida em favor da União, consoante entendimento desta Turma.

8. Determinada a expedição de carta de sentença para início de execução provisória da pena, conforme entendimento fixado pelo E. STF no HC 126.292-SP reconhecendo que 'A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal'. (Grifo nosso)

(TRF3, Décima Primeira Turma, ACR nº 00091273320154036105, Relator Desembargador Federal José Lunardelli, e-DJF3 Judicial 1  de 23.06.2017)

 

PROCESSO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. MOEDA FALSA .PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VALOR IRRELEVANTE. INAPLICABILIDADE. AUTORIA. COMPROVADA.

1. O bem jurídico tutelado no crime de moeda falsa previsto no art. 289 do Código Penal é a fé pública, que é atingida independentemente da quantidade de cédulas utilizadas no delito.

2. A abordagem do réu se deu em razão de denúncia de que vendia cédulas falsa s. Indicadas características do acusado, esse foi localizado portando as notas, cuja falsidade restou comprovada. O réu não apresentou elementos para demonstrar minimante a sua versão quanto à origem das cédulas. Portanto, pode-se concluir que o réu comercializava as cédulas falsa s, estando comprovada a autoria delitiva e o dolo na prática do delito do art. 289, § 1º, do Código Penal, razão pela qual deve prevalecer o voto condutor, mantida a condenação do acusado.

3. Embargos infringentes desprovidos. (TRF3, Quarta Seção, Embargos Infringentes nº 2007.61.81.009951-9- SP, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, D.E. de 08.05.2017)

 

Além disso, para que se possa atribuir a um sujeito a autoria do delito de moeda falsa, é indispensável a presença do dolo, isto é, da vontade livre e consciente de se praticar quaisquer das modalidades referenciadas. Em outras palavras, é preciso haver ciência inequívoca, por parte do agente, acerca da falsidade da moeda.

Destaque-se que, nas hipóteses em que o agente alega desconhecimento acerca da contrafação, deve o intérprete apurar a existência de dolo a partir dos detalhes e circunstâncias que envolvem os fatos criminosos. Se, por um lado, não se pode adentrar a consciência do indivíduo, por outro, é possível identificar a presença do elemento anímico analisando-se fatores externos, tais como, a reação do agente diante da descoberta da falsidade, o local em que as cédulas falsas foram encontradas, as alegações relacionadas à origem das cédulas espúrias, ou, ainda, a coerência da versão apresentada pelo agente e eventuais mentiras desveladas pelas provas, por exemplo.

Sobre esse tema, preleciona Vera Lúcia Feil Ponciano:

 

(...) se o acusado estiver sendo processado por ter introduzido em circulação moeda falsa recebida de má-fé, e a defesa vem alegar que ele as recebeu de boa-fé, pode haver sérias dúvidas acerca do conhecimento da falsidade da moeda pelo réu. Se, por exemplo, ele introduziu em circulação cédulas falsas e foi preso, não havendo confissão extrajudicial ou judicial, somente a análise profunda de todas as provas será capaz de possibilitar um decreto condenatório com base no art. 289, §1º, podendo o delito ser desclassificado para o art. 289, §2º, do CP.

Nos processos que versem sobre esse crime, dificilmente haverá testemunha afirmando que o réu tinha conhecimento da falsidade, e o próprio acusado não vai afirmar isso. É preciso, então, analisar as circunstâncias que envolveram o crime, por exemplo: a) se o sujeito aduz que não lembra de quem recebeu a moeda; b) se afirma que recebeu como pagamento de um trabalho realizado, em razão de sua atividade de autônomo, mas não indica o nome da pessoa que lhe entregou: c) se objetivou trocar R$ 100,00 (cem reais) ou U$ 100,00 (cem dólares) para pagamento de despesas de pequeno valor; d) se o agente é voltado para a criminalidade; e) se, tendo consigo dinheiro legítimo, usou a moeda falsa; f) se, no momento da prisão em flagrante, o sujeito ofereceu propina para os policiais, visando a soltura.

Todavia, havendo fundadas dúvidas sobre a ciência da falsidade pelo sujeito que a introduziu em circulação, deve ser aplicado o princípio do in dubio pro reo, porque essa modalidade de crime não admite a forma culposa.

(PONCIANO, Vera Lúcia Feil. Crimes de moeda falsa. 1ª ed. 2ª tir. Curitiba. Juruá Editora, 2002, pág. 144-145)

Válida, nesse passo, a menção aos seguintes julgados:

PENAL. PROCESSO PENAL. MOEDA FALSA. ARTIGO 289, §1º, DO CP. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. ELEMENTO SUBJETIVO COMPROVADO. APURAÇÃO MEDIANTE FATORES EXTERNOS. DOSIMETRIA. PENA-BASE MANTIDA. AUSÊNCIA DE ATENUANTES E AGRAVANTES. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. SITUAÇÃO SOCIOECONÔMICA DO RÉU. ALTERAÇÃO EX OFFICIO.APELAÇÃO IMPROVIDA.

1. A materialidade delitiva restou demonstrada pelo auto de exibição e apreensão (fls. 9/11) em conjunto com o laudo pericial de nº 4457/11 (fls. 14/16), o qual concluiu pela falsidade das cédulas apreendidas com o réu.

2. Restou asseverado que a cédula apreendida possui atributos capazes de iludir pessoas desconhecedoras dos elementos de segurança das cédulas autênticas. Tanto é verdade que, nos termos de seu depoimento, PATRÍCIO relata que demorou algum tempo para perceber a falsidade das notas, tendo que falar com os policiais para se assegurar de tal fato.

3. A autoria e o dolo restaram comprovados pelos depoimentos prestados em juízo, os quais se encontram em consonância com a apuração dos fatos realizada na esfera policial.

4. O conjunto probatório presente nos autos evidencia que foi RICHARD quem repassou as cédulas falsas a PATRÍCIO em troca dos ingressos para o show da cantora Ivete Sangalo. Na seara policial, PATRÍCIO fez o reconhecimento positivo de RICHARD, declarando não haver qualquer dúvida quanto a ser a referida pessoa a responsável por comprar seus convites. O curto espaço de tempo entre o momento em que a nota foi repassada e a conversa entre PATRÍCIO e os policias militares, quando aquele apontou para o ora acusado, leva à conclusão de que dificilmente poderia haver erro no reconhecimento de quem havia lhe entregue as notas minutos antes.

5. Uma vez encaminhado à Delegacia, foi encontrado na posse de RICHARD, além de outros bens, dois ingressos com 'abadás', que muito provavelmente foram provenientes da transação realizada com PATRÍCIO (fl. 06).

6. O interrogatório do réu revela-se em certo ponto contraditório, na medida em que primeiramente RICHARD diz não saber quem é PATRÍCIO, não se recordando de sua fisionomia, mas posteriormente relata que este chegou a lhe oferecer os ingressos que estava vendendo, os quais não foram comprados por considerar que o preço estava muito alto para posterior revenda.

7. RICHARD afirma que não tentou se evadir do local quando PATRÍCIO conversava com os policiais, ao passo que as duas testemunhas narram claramente que o acusado começou a correr ao perceber a movimentação.

8. A apuração do elemento subjetivo do delito deverá se dar pelas circunstâncias que permeiam o fato, uma vez que inviável adentrar a consciência do acusado.

9. No caso dos autos, o dolo pode ser entendido como a ciência da falsidade das notas que portava e que repassou. Tal ciência pode ser aferida principalmente por duas razões: (i) o fato de RICHARD ter corrido quando PATRÍCIO saiu de seu carro e (ii) o local onde a transação se realizou.

10. A fuga revela que o Réu tinha conhecimento de que tinha cometido conduta delitiva. Sabendo do risco que teria ao ser abordado pela polícia, tentou evadir-se do local. Revela, de outra sorte, que foi ele quem de fato vendeu os ingressos para PATRÍCIO, uma vez que, de acordo com os testemunhos, foi quando este saiu do carro que RICHARD começou a tentar fugir.

11. O local (em frente a um evento com grande movimentação) e hora (durante a noite) onde a transação se realizou são bastante apropriados para a colocação de moeda falsa em circulação.

12. Não há fatores a aumentarem a pena-base acima do piso legal. Ausente agravantes e atenuantes, bem como causas de aumento ou diminuição.

13. A pena de prestação pecuniária fixada em sentença, de três salários mínimos, encontra-se em desacordo com a situação socioeconômica do réu. Apesar de sua profissão de cabelereiro, que lhe rende cerca de R$ 1.000,00 (mil reais) por mês (fl. 34), o acusado encontra-se preso, e tem dois filhos, para quem envia dinheiro sempre que possível, conforme narrado no interrogatório, cujo áudio está disponível na mídia digital de fl. 176. Tal prestação pecuniária poderia colocar em dificuldade sua subsistência, podendo contribuir inclusive para o cometimento de outras práticas delituosas.

14. De ofício, diminuição de prestação pecuniária para o pagamento de 1 (um) salário mínimo, a ser pago em favor da União Federal. 15. Apelação improvida.

(TRF3, Décima Primeira Turma, ACR n.º 0010041-27.2011.4.03.6109, Relator Desembargador Federal José Lunardelli, j. 26.09.2017)

 

PENAL. MOEDA FALSA. ART. 289, § 1º, DO CP. NULIDADE. AUTO DE APREENSÃO. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO. AUTORIA. MATERIALIDADE. COMPROVADAS. DOLO. CONSUMAÇÃO.

A falta de assinatura de uma testemunha no auto de apreensão não enseja a nulidade do ato, constituindo-se em mero vício de forma. O agente que guarda e que introduz na circulação moeda que sabe ser inautêntica comete o delito descrito no art. 289, § 1º, do CP. O reconhecimento fotográfico é aceito pelo ordenamento processual como um meio de prova, a ser avaliado para a condenação com os demais elementos colhidos na instrução processual. A dificuldade para aferimento e comprovação do dolo no crime do art. 289 do CP exige a verificação dos elementos indicativos externos que expressam a vontade do agente, contendo em si todos os detalhes e circunstâncias que envolvem o evento criminoso, tais como a reação diante da descoberta da falsidade da cédula, o local onde elas foram encontradas, as mentiras desveladas pelas provas, entre outros. Demonstrado que o réu tinha ciência quanto à falsidade das moedas, está elidida a tese de ausência de dolo sob a alegação de desconhecimento de sua inautenticidade.

(TRF4, Oitava Turma, ACR n.º 2006.71.11.002982-9, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, D.E. de 20.05.2010)

 

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. MOEDA FALSA . ARTIGO 289, §1º, DO CP. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA. INOCORRÊNCIA. DOLO CONFIGURADO E DEMONSTRADO. DESTINAÇÃO DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. APELAÇÃO DESPROVIDA. (...)

7. Dolo evidenciado em razão da ausência de comprovação da origem das cédulas espúrias. Precedentes. (...)

(TRF3, Primeira Turma, Ap. 00069556520074036181, Desembargador Federal Hélio Nogueira, e-DJF3 Judicial 1 de 07.07.2017)

 

Outra questão importante diz respeito à qualidade da falsificação. Para que o delito de moeda falsa se configure, é necessário que se evidencie a chamada imitativo veri (imitação da verdade), ou seja, é preciso que a(s) cédula(s) falsa (s) seja(m) parecida(s) com a(s) verdadeira(s) a ponto de ser(em) apta(s) a enganar homem médio. Em se constatando a ocorrência de falsificação grosseira, isto é, de falsificação perceptível a olho nu pela maioria das pessoas, deverá haver, em princípio, o reconhecimento da hipótese de crime impossível por absoluta impropriedade do objeto (inteligência do art. 17 do CP), ou, caso o agente tenha conseguido enganar uma pessoa específica, a desclassificação para o delito de estelionato, nos termos da Súmula nº 73 do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

Súmula 73. A utilização de papel moeda grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, da competência da Justiça Estadual.

Feitas essas considerações, passa-se à análise dos fatos descritos na presente ação penal.

 

 ANÁLISE DO CASO CONCRETO

O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de VALDEIR MARQUES SÁ TELES e ISRAEL DE BARROS ARRUDA pela prática dos crimes previstos nos arts. 155, § 4º, II, e 289, § 1º, ambos do Código Penal, e arts. 33 e 35, ambos da Lei n° 11.346/2006, uma vez que, em 28.12.2014, no Município de Ilha Comprida/SP, mediante prévio ajuste, o segundo teria subtraído das mãos de Rafael Pereira de Oliveira uma cédula de R$ 100,00 (cem reais), entregando-lhe no lugar dela, ao ser alcançado por ele, uma nota falsa de mesmo valor, conduta reiterada em seguida, quando a vítima percebeu o engodo e o alcançou novamente. A contrafação da segunda nota entregue a Rafael Pereira de Oliveira sob pretexto de devolução da autêntica que havia sido subtraída, entretanto, foi constatada apenas quando, algum tempo depois, na mesma noite, ele tencionou fornecê-la como pagamento por bens que pretendia adquirir em um comércio. Por ele informados do ocorrido, policiais militares localizaram o veículo em que transitavam os réus e, em revista pessoal, encontraram outras cédulas falsas com eles, além de mais algumas no interior do automóvel, bem como pedras de crack sob o banco do passageiro, acondicionadas em uma caixa de fósforos.

Recebida em parte a denúncia – o fato atinente ao crime de furto qualificado foi subsumido à forma simples do delito (art. 155, caput, do Código Penal) e, quanto aos ilícitos capitulados na Lei de Drogas, foi determinada a remessa dos autos à Justiça Estadual, em razão da ausência de conexão probatória –, sobreveio a r. sentença, que condenou os réus pela prática do crime previsto no art. 289, § 1º, do Código Penal, assim como os absolveu do cometimento do injusto insculpido no art. 155, caput, do mesmo diploma normativo, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal.

Em suas razões de recurso, a defesa de VALDEIR MARQUES SÁ TELES postula a absolvição, ao argumento de que o fato carece de materialidade delitiva, uma vez que a falsificação das cédulas seria grosseira e, por conseguinte, inapta a ludibriar o homem de discernimento médio. Subsidiariamente, requer a desclassificação do crime para a forma prevista no § 2º do art. 289 do Código Penal, para o que sustenta que a cédula foi recebida de boa-fé.

A Defensoria Pública da União, por sua vez, pede a redução da pena-base de ISRAEL DE BARROS ARRUDA, dado o transcurso de mais de cinco anos desde os fatos utilizados na valoração negativa de seus antecedentes criminais. Consequentemente, pleiteia a estipulação do regime semiaberto para início do cumprimento da sanção.

 

MATERIALIDADE, AUTORIA DELITIVA E DOLO

A materialidade delitiva está comprovada por auto de prisão em flagrante (Id 160261494 – fls. 4/5), auto de exibição e apreensão (Id 160261494 – fls. 29/34), boletim de ocorrência (Id 160261374 – fls. 75/81), laudo pericial (Id 160261374 – fls. 53/61) e pela prova oral coligida ao feito, que demonstra, da mesma maneira, a autoria do injusto.

No ponto, sustenta a defesa de VALDEIR MARQUES SÁ TELES que a sentença deve ser reformada e o réu absolvido, uma vez que estaria ausente a materialidade delitiva, dado o caráter supostamente grosseiro da falsificação.

Contudo, sem razão.

Embora o perito signatário do laudo pericial acostado aos autos não tenha emitido opinião acerca da aptidão das cédulas analisadas para ludibriarem o homem de discernimento médio, a conjuntura dos fatos autoriza a conclusão de que possuíam qualidade suficiente para tanto.

É bem verdade que se encontra isolada nos autos a versão apresentada por Rafael Ferreira de Oliveira, ouvido somente em delegacia de polícia (Id 160261494 – fl. 11), de que ISRAEL DE BARROS ARRUDA teria subtraído de suas mãos uma cédula verdadeira de R$ 100,00 (cem reais) quando estava prestes a pagar por bebidas em um comércio, entregando-lhe, quando foi alcançado, outra, falsa, a pretexto de restituí-la, cédula esta que foi recusada e, em seguida, substituída por outra, também inautêntica, o que teria sido percebido somente quando retornou ao estabelecimento para pagar pelas mercadorias, uma vez que, como mencionado, ele prestou declarações apenas na fase inquisitiva e os réus, por outro lado, forneceram narrativas distintas.

De qualquer forma, salienta-se, desde logo, que, caso assim realmente fosse, já estaria demonstrada a boa qualidade da falsificação de ao menos uma das cédulas apreendidas, ou seja, a de R$ 100,00 (cem reais) que teria sido aceita por Rafael Ferreira de Oliveira, ao crer que se tratava da mesma que pouco antes dele havia sido furtada.

Mais plausível, contudo, é que, como ISRAEL DE BARROS ARRUDA afirmou em ambas as etapas da persecução penal (Id 160261494 – fls. 12/13 e mídia audiovisual acostada à fl. 268 dos autos físicos), no que foi acompanhado em juízo por VALDEIR MARQUES SÁ TELES (interrogatório também registrado na mídia audiovisual acostada à fl. 268 dos autos físicos)  – ainda que tenham ambos assegurado, no intuito de evitarem a condenação, que eles também desconheciam a contrafação – é que a cédula falsa tenha sido fornecida pelo primeiro a Rafael Ferreira de Oliveira, que conheceram no local, para que este adquirisse bebidas para todos, de maneira que, com tal conduta, não correriam (ou assim imaginavam) risco de serem descobertos caso a nota não fosse aceita pelo funcionário do estabelecimento.

A esse respeito, bem asseverou o magistrado prolator da sentença:

Ora, não é crível que os acusados, acabando de conhecer uma pessoa na rua, lhe entregassem a importância de cem reais para a realização da compra de bebidas. Essa versão, então, apenas tem sentido se os réus já soubessem da falsidade da nota. Assim, tudo leva a crer que entregaram a nota para terceiro, a fim de que este repassasse o dinheiro falso no mercado. Desta forma, caso a falsidade da moeda de Real fosse identificada pela caixa da loja, não teriam sido eles que teriam tentado coloca-la em circulação. Bem como, estariam livres para se evadir do local, o que veio a acontecer na ocasião.

Então, ao entregar a nota a Rafael, os acusados, presumivelmente, já sabiam da falsidade da mesma moeda. Pois, caso contrário, não entregariam tal quantia a um desconhecido, visto que este, entre outras possibilidades, poderia fugir do local levando consigo o dinheiro, não havendo garantias, nem sequer confiança entre os envolvidos, de que Rafael iria cumprir o combinado (comprar bebidas).

Portanto, resta claro que os acusados, ISRAEL E VALDEIR, sabiam que a nota era falsa, bem como que enganaram o terceiro Rafael, na noite dos fatos, tendo entregado a ele uma nota de cem reais para que realizasse a compra de bebidas no local (Id 160261374 – fl. 224).

 

Assim, é evidente que Rafael Ferreira de Oliveira tomou por verdadeira a cédula falsa e, com ela, tencionou comprar bebidas em um comércio. De resto, é razoável supor que as demais cédulas contrafeitas, que os réus guardavam consigo e no interior do veículo, possuíam qualidade de falsificação similar àquela entregue a mencionada pessoa.

De tal forma, não há como acolher o pleito absolutório formulado com fundamento na alegada inaptidão das cédulas apreendidas para enganarem o homem médio.

 

DA DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA DO RÉU VALDEIR MARQUES SÁ TELES PARA O TIPO ESTAMPADO NO § 2º DO ART. 289 DO CÓDIGO PENAL

Melhor sorte não assiste à defesa de VALDEIR MARQUES SÁ TELES no que diz respeito ao pedido subsidiário de desclassificação do crime para a forma prevista no § 2º do art. 289 do Código Penal.

Dispõe o § 2º do art. 289 do Código Penal:

§ 2º - Quem, tendo recebido de boa-fé, como verdadeira, moeda falsa ou alterada, a restitui à circulação, depois de conhecer a falsidade, é punido com detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

 

É elemento indispensável para a aplicação do §2º do art. 289 do Código Penal, a demonstração de boa-fé do acusado ao receber moeda falsa, o que não restou comprovado, não havendo que se cogitar nesta figura privilegiada, permanecendo a configuração do crime estampado no § 1º do art. 289 do Código Penal.

Nesse sentido:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. MOEDA FALSA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. FALSIFICAÇÃO APTA A ENGANAR O HOMEM MÉDIO. CRIME IMPOSSÍVEL INOCORRENTE. CONDENAÇÃO E DOSIMETRIA DA PENA MANTIDAS. (...) 3. Impossibilidade de desclassificação do delito para a forma privilegiada do art. 289, § 2º, do Código Penal, eis que não há prova da boa-fé do acusado. (...)

(Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 67879 0009324-56.2012.4.03.6181, DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/05/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:.) - destaque nosso.

 

PENAL E PROCESSO PENAL. MOEDA FALSA. DESCLASSIFICAÇÃO. ART. 289, §2º. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA. MANUTENÇÃO. PENA DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA REVERTIDA EM FAVOR DA UNIÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (...)3. O dolo, por sua vez, é evidenciado pelas circunstâncias do fato, notadamente pela quantidade de cédulas falsas apreendidas (várias com números de série repetidas) e a ocultação sob as vestes do acusado. Configuração do tipo penal estampado no artigo 289, §1º, do Código Penal. 4. A desclassificação para a modalidade privilegiada prevista no artigo 289, §2º, do Código Penal requer o preenchimento dos requisitos legais e, in casu, não há prova de que o apelante recebeu as notas espúrias de boa-fé. (...)

(ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 68994 0005718-93.2007.4.03.6181, DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/02/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.) - destaque nosso.

 

Com efeito, ainda que tenham apresentado narrativas similares em juízo (mídia audiovisual acostada à fl. 268 dos autos físicos) – embora um tenha imputado ao outro a inciativa de deixar o local dos fatos após a cédula falsa entregue a Rafael Ferreira de Oliveira ter sido recusada no estabelecimento comercial –, ocasião em que sustentaram que desconheciam a contrafação, os réus, na fase inquisitiva da persecução penal, confessaram que tinham ciência da inautenticidade das cédulas.

Com efeito, ISRAEL DE BARROS ARRUDA, naquela oportunidade, declarou:

Frisa que tinha conhecimento de que Valdeir estava de posse de dinheiro falso, que ele havia recebido de um indivíduo lá em São Paulo, sobre a venda de uma motocicleta (Id 160261494 – fls. 12/13).

 

De igual forma, o apelante VALDEIR MARQUES SÁ TELES consignou:

O interrogando admitiu que as cédulas eram suas, que tinha conhecimento de que parte delas eram falsas, contendo cédulas de cem reais, alegando o interrogando que recebeu em São Paulo, há cerca de dois meses atrás, referente a venda de uma motocicleta, que vendeu por mil e quatrocentos reais (...) (Id 160261494 – fls. 20/21).

 

Embora VALDEIR MARQUES SÁ TELLES tenha posteriormente modificado em parte sua narrativa, ao afiançar que não sabia que as cédulas eram falsas, manteve a versão de que foram obtidas com a venda de uma motocicleta, alegação, contudo, que deixou de comprovar – ônus que lhe incumbia, a teor do que dispõe o art. 156 do Código de Processo Penal – uma vez que não forneceu qualquer elemento que demonstrasse a propriedade prévia de um veículo do tipo ou sua transferência a terceiro, como algum documento comprobatório da alienação, nem arrolou como testemunha a pessoa que o teria adquirido.

O policial militar Aécio Ferreira, aliás, um dos responsáveis pelo atendimento da ocorrência, ouvido somente na fase administrativa, declarou:

Indagados sobre a procedência das notas falsas, o conduzido Valdeir disse que havia vendido uma motocicleta para um indivíduo, tendo recebido mil e duzentos reais em cédulas, que sabia serem falsas. Quanto ao conduzido Israel, disse que o dinheiro estava em poder dele, recebeu de um serviço prestado, não especificando o tipo de serviço (Id 160261494 – fls. 6/7).

 

Na mesma direção foram as palavras de Rafael Ludgero Abreu Roberto (Id 160261494 – fls. 9/10).

Assim, não há como aceitar o argumento da defesa do réu no que tange à desclassificação para o crime previsto no art. 289, § 2º, do Código Penal.

 

DA DOSIMETRIA DA PENA

O cálculo da pena deve atentar aos critérios dispostos no artigo 68 do Código Penal, de modo que, na primeira etapa da dosimetria, observando as diretrizes do artigo 59 do Código Penal, o magistrado deve atentar à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, e estabelecer a quantidade de pena aplicável, dentro de uma discricionariedade juridicamente vinculada, a partir de uma análise individualizada e simultânea de todas as circunstâncias judiciais.

Na segunda fase de fixação da pena, o juiz deve considerar as agravantes e atenuantes, previstas nos artigos 61 a 66, todos do Código Penal.

Finalmente, na terceira etapa, incidem as causas de diminuição e de aumento da pena.

No presente caso, o r. juízo a quo fixou a sanção dos réus ISRAEL DE BARROS ARRUDA e VALDEIR MARQUES SÁ TELES nos seguintes termos:

 

- do réu ISRAEL DE BARROS ARRUDA

Circunstâncias judiciais (1ª fase)

Na primeira fase de aplicação da pena, da análise das circunstâncias judiciais previstas no art. 59, caput, do Código Penal, infere-se o seguinte: a) quanto à culpabilidade, o grau de reprovabilidade e o dolo apresentam-se normais à espécie; b) há nos autos do processo registro de que o réu possua maus antecedentes [consigno que para tanto, utilizo os dados da folha de antecedentes expedida pelo IIRGD, documento dotado de fé pública, o qual contem todos os dados suficientes para um juízo seguro sobre os antecedentes e/ou reincidência (como, o n° da ação penal, o tipo de crime, a data da condenação, quantidade de pena imposta, e outras - precedente ACR 00073033020014036105/TRF3R)] - no caso o processo nº. 1251/1994, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Santana, condenado à pena de 10 dias-multa, pela prática da infração penal prevista no art. 19, da Lei de Contravenções Penais – apontado na fl. 11, coluna da direita, parte inferior, do apenso de Folhas de Antecedentes; bem como o processo nº 341/1995, da 2ª Vara Criminal da Comarca de Santana, condenado à pena de 15 dias de detenção em regime aberto - apontado na fls. 12, coluna da direita, parte superior, do apenso de Folhas de Antecedentes. Registro que deixo de considerar os demais apontamentos dos IPL's e/ou ações penais em andamento; c) não há elementos objetivos que permitam analisar a conduta social e a personalidade do réu; d) os motivos são comuns ao crime; e) as circunstâncias do crime não são desfavoráveis ao acusado; f) o crime não apresentou consequências, em razão da apreensão das cédulas falsas; g) nada a ponderar a respeito do comportamento da vítima.

Assim, à vista dessas circunstâncias, fixo a pena-base em 03 (três) anos e 03 (três) meses de reclusão.

 

Circunstâncias agravantes e atenuantes (2ª fase)

Nesta fase da dosimetria da pena, verifica-se a ocorrência da agravante da reincidência, para tanto, utilizo novamente os dados da folha de antecedentes expedida pelo IIRGD, conforme exposto acima. O réu aparece como tendo sido condenado à pena de 10 anos, 06 meses e 03 dias de reclusão, em regime fechado, pela prática do crime de extorsão mediante sequestro (art. 159, do Código Penal), no autos do processo nº. 16865/1999, conforme documento de fls. 12, coluna da direita, na parte inferior, do apenso de Folhas de Antecedentes. Segundo aqueles dados, a execução da pena gerou os autos nº. 000371151/0000, da 3ª Vara de Execuções Criminais-SP, tendo a decisão de extinção da pena privativa de liberdade sido proferida em 30.05.2013, de acordo com o documento de fls. 13, coluna da esquerda, parte inferior, do apenso de Folhas de Antecedentes.

Portanto, o acusado é reincidente. Assim, acrescento 1/6 da pena-base (06 meses e 15 dias) a pena intermediária. Logo, fixo a pena intermediária em 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias reclusão.

 

Causas de aumento e diminuição de pena (3ª fase)

Não há causa de aumento ou diminuição da pena, pelo que torno a pena definitiva do réu, ISRAEL DE BARROS ARRUDA, em 3 (três) anos, 9 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão.

 

Pena de multa

Nos termos do art. 49 do Código Penal, e tendo em vista a aplicação da pena corporal acima do mínimo legal, arbitro a pena de multa em 20 (vinte) dias-multa, proporcional ao quantum da pena aplicada, fixado o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, ante a ausência de maiores informações acerca da condição econômico-financeira do acusado.

 

Regime de Cumprimento de Pena

Quanto ao regime inicial de cumprimento de pena, observando-se os critérios do art. 33, §2º, do Código Penal, dada a quantidade de pena e a reincidência do acusado, deverá ser o fechado. Tal se deve, segundo a jurisprudência do nosso Regional, porquanto, 'A regra estabelecida pelo Código Penal dispõe que o condenado reincidente deve iniciar o cumprimento de sua pena sempre no regime fechado, pouco importando o montante de sua pena. Réu reincidente, possuidor de circunstâncias judiciais desfavoráveis, deve cumprir a pena em regime inicial fechado, ainda que a condenação não exceda a oito anos (DELMANTO, Celso e outros, Código Penal Comentado, 8ª ed; São Paulo, Saraiva, 2010, p. 220). Na espécie, o recorrido é reincidente, conforme se verifica da certidão (sem numeração) dos autos em apenso, segundo a qual transitou em julgado a sentença condenatória em 12.05.03, enquanto que os fatos referidos na denúncia ocorreram em 02.06.07 (TRF da 3ª Região, Acr n. 2007.60.05.000683-0, Rei. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 13.12.10).

 

Substituição da Pena Privativa de Liberdade

Ante a reincidência em crime doloso do réu ISRAEL, não restaram preenchidos os requisitos exigidos pelo artigo 44 do Código Penal. Desta feita, deixo de substituir a pena privativa de liberdade.

Em face da pena ser superior a 02 (dois) anos e da reincidência do acusado, não há que se falar de aplicação do sursis, nos termos do artigo 77, do CP.

 

- do réu VALDEIR MARQUES SÁ TELES

Na fixação da pena base pela prática do crime do artigo 289, §1º, do Código Penal, parto do mínimo legal de 03 (três) anos de reclusão.

 

Circunstâncias judiciais (1ª fase)

Na primeira fase de aplicação da pena, da análise das circunstâncias judiciais previstas no art. 59, caput, do Código Penal, infere-se o seguinte: a) quanto à culpabilidade, o grau de reprovabilidade e o dolo apresentam-se normais à espécie; b) não há nos autos do processo registro de que o réu possua maus antecedentes; c) não há elementos objetivos que permitam analisar a conduta social e a personalidade do réu; d) os motivos são comuns ao crime; e) as circunstâncias do crime não são desfavoráveis ao acusado; f) o crime não apresentou consequências, em razão da apreensão das cédulas falsas; g) nada a ponderar a respeito do comportamento da vítima.

Assim, à vista dessas circunstâncias, fixo a pena-base em 03 (três) de reclusão.

Circunstâncias agravantes e atenuantes (2ª fase)

Nesta fase da dosimetria da pena, verifica-se a ocorrência da agravante da reincidência, para tanto, utilizo os dados da folha de antecedentes expedida pelo IIRGD. O réu aparece como tendo sido condenado à pena de 10 dias-multa, pela prática do crime de desacato (art. 331, do CP), no processo nº. 461/2012, da 3ª Vara da Comarca de Embu das Artes, conforme documento de fls. 19, coluna da direita, do apenso de Folhas de Antecedentes.

Portanto, o acusado é reincidente. Assim, acrescento 1/6 da pena-base (06 meses) a pena intermediária: Logo, fixo a pena intermediária em 03 (três) anos e 06 (seis) meses reclusão.

 

Causas de aumento e diminuição de pena (3ª fase)

Não há causa de aumento ou diminuição da pena, pelo que torno a pena definitiva do réu, VALDEIR MARQUES SÁ TELES, em 03 (três) anos e 06 (seis) meses reclusão.

 

Pena de multa

Nos termos do art. 49 do Código Penal, e tendo em vista a aplicação da pena corporal acima do mínimo legal, arbitro a pena de multa em 15 (quinze) dias-multa, proporcional ao quantum da pena aplicada, fixado o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, ante a ausência de maiores informações acerca da condição econômico-financeira do acusado.

 

Regime de Cumprimento de Pena

Quanto ao regime inicial de cumprimento de pena, observando-se os critérios do art. 33, §2º, do Código Penal, dada a quantidade de pena e a reincidência do acusado, deverá ser o fechado. Tal se deve, segundo a jurisprudência do nosso Regional, porquanto, 'A regra estabelecida pelo Código Penal dispõe que o condenado reincidente deve iniciar o cumprimento de sua pena sempre no regime fechado, pouco importando o montante de sua pena. Réu reincidente, possuidor de circunstâncias judiciais desfavoráveis, deve cumprir a pena em regime inicial fechado, ainda que a condenação não exceda a oito anos’ (DELMANTO, Celso e outros, Código Penal Comentado, 8ª ed, São Paulo, Saraiva, 2010, p. 220). Na espécie, o recorrido é reincidente, conforme se verifica da certidão (sem numeração) dos autos em apenso, segundo a qual transitou em julgado a sentença condenatória em 12.05.03, enquanto que os fatos referidos na denúncia ocorreram em 02.06.07 (TRF da 3ª Região, Acr n. 2007.60.05.000683-0, Rei. Des, Fed. André Nekatschalow, j. 13.12.10).

 

Substituição da Pena Privativa de Liberdade

Ante a reincidência em crime doloso do réu, não restaram preenchidos os requisitos exigidos pelo artigo 44 do Código Penal. Desta feita, deixo de substituir a pena privativa de liberdade.

Em face da pena ser superior a 02 (dois) anos e da reincidência do acusado, não há que se falar de aplicação do sursis, nos termos do artigo 77, do CP.

 

Direito de Apelar em Liberdade (ambos os réus)

Faculto a interposição de recurso em liberdade, dado que ausentes os requisitos do art. 312 do CPP, não se justificando seja determinada a reclusão dos acusados, VALDEIR e ISRAEL, nesta fase da ação penal. Acresço mais, diante do fato de terem respondido ao processo soltos, em liberdade (Id 160261374 – fls. 227/231).

 

Pena-Base

Na primeira fase da dosimetria, a pena de ISRAEL DE BARROS ARRUDA foi estipulada em 03 (três) anos e 03 (três) meses de reclusão, em razão da valoração negativa de seus antecedentes criminais.

Pretende sua defesa o abrandamento da sanção, para o que sustenta que entre os apontamentos criminais utilizados e a prolação da sentença condenatória transcorreram mais de cinco anos.

Contudo, sem razão.

Cinge-se a questão ora em debate em saber se é possível o reconhecimento de maus antecedentes a importar em valoração negativa da pena base sob o pálio do art. 59 do Código Penal quando tiver escoado lapso superior a 05 anos atinente ao período depurador que retira a eficácia do título penal condenatório para fins de assentamento da ocorrência de reincidência (art. 64, I, do Código Penal: Para efeito de reincidência: I - Não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação (...)).

O debate foi objeto de julgamento perante o C. Supremo Tribunal Federal, tendo sido fixado o Tema 150 da Repercussão Geral: Não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal, cuja respectiva ementa transcreve-se a seguir:

DIREITO PENAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. DOSIMETRIA. CONSIDERAÇÃO DOS MAUS ANTECEDENTES AINDA QUE AS CONDENAÇÕES ANTERIORES TENHAM OCORRIDO HÁ MAIS DE CINCO ANOS. POSSIBILIDADE. PARCIAL PROVIMENTO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal só considera maus antecedentes condenações penais transitadas em julgado que não configurem reincidência. Trata-se, portanto, de institutos distintos, com finalidade diversa na aplicação da pena criminal. 2. Por esse motivo, não se aplica aos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição previsto para a reincidência (art. 64, I, do Código Penal). 3. Não se pode retirar do julgador a possibilidade de aferir, no caso concreto, informações sobre a vida pregressa do agente, para fins de fixação da pena-base em observância aos princípios constitucionais da isonomia e da individualização da pena. 4. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, mantida a decisão recorrida por outros fundamentos, fixada a seguinte tese: Não se aplica ao reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal.

(RE 593818, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-277  DIVULG 20-11-2020  PUBLIC 23-11-2020)

 

Por oportuno, é importante ressaltar que, por meio do aludido julgamento, assentou-se, ainda, que o reconhecimento de maus antecedentes sem a limitação prevista no art. 64, inciso I, do Código Penal, é ato discricionário do Juízo competente na análise do caso concreto, em observância aos princípios da isonomia e da individualização da pena. De outro lado, a reincidência é de aplicação obrigatória na segunda fase da dosimetria da pena.

Na hipótese dos autos, o réu foi definitivamente condenado pela prática da contravenção penal prevista no art. 19 da Lei de Contravenções Penais, através de decisão transitada em julgado em 12.07.1995, no processo nº 000001251/1994 (Id 160261373 – fl. 12). Além disso, foi condenado pelo cometimento do injusto previsto no art. 32 da Lei de Contravenções Penais, com decisão transitada em julgado em 16.10.1995, no processo n° 000000583/1995 (Id 160261373 – fl. 13).

Assim, revela-se correta a avaliação desfavorável do vetor atinente aos antecedentes do réu, que, aliás, foi beneficiado pelo cálculo empregado pelo juízo a quo, que incrementou sua pena somente em 03 (três) meses, metade do montante que seria alcançado caso fosse utilizada a fração usual de 1/6 (um sexto).

A pena inicial de VALDEIR MARQUES SÁ TELES, por outro lado, foi estipulada no mínimo legal, ou seja, em 03 (três) anos de reclusão.

 

Agravantes e Atenuantes

Na segunda fase do dimensionamento, a pena de ISRAEL DE BARROS ARRUDA foi novamente incrementada, desta vez em razão da reincidência.

Efetivamente, foi condenado nos autos 00001685/1999 pela prática do crime previsto no art. 159 do Código Penal, tendo a pena sido extinta em 30.05.2013 (160261373 – fls. 14/15). Disso resultou aumento de 1/6 (um sexto), totalizando 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão.

Quanto a VALDEIR MARQUES SÁ TELLES, foi também reconhecida em seu desfavor a agravante da reincidência, pois foi condenado nos autos n. 0000461-12.2012.8.26.0176 pela prática do crime previsto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, com sentença transitada em julgado em 10.12.2014 (Id 160261373 – fl. 20), de maneira que sua pena foi elevada em 1/6 (um sexto), para 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão.

 

Causas de Diminuição e de Aumento

Não foram reconhecidas causas de diminuição ou de aumento na terceira etapa do cálculo dosimétrico, pelo que permaneceram as penas dos réus nos mesmos patamares.

 

Pena de Multa

Obedecida a necessária proporcionalidade com as penas privativas de liberdade, ficam as penas de multa de ambos os réus reduzidas para 11 (onze) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.

 

Da Substituição da Pena Privativa de Liberdade

Deixou o magistrado singular de substituir as penas privativas de liberdade por restritivas de direitos, em razão da reincidência dos réus (art. 44, II, do Código Penal).

 

Regime de Cumprimento da Pena Privativa de Liberdade

Foi estipulado o regime FECHADO para o início do resgate das sanções, em razão da reincidência dos réus. Contudo, como estabelece a Súmula 269 do Superior Tribunal de Justiça, “é admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais”. Ainda que os antecedentes de ISRAEL DE BARROS ARRUDA tenham sido valorados negativamente, as demais circunstâncias judiciais não foram sopesadas desfavoravelmente, assim como as de VALDEIR MARQUES SÁ TELES também lhe são favoráveis. Por conseguinte, acolhe-se o pleito do primeiro de abrandamento do regime inicial para o SEMIABERTO, providência adotada DE OFÍCIO no tocante ao segundo réu.

 

Das Penas Definitivas

Ficam as penas privativas de liberdade mantidas em 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão para ISRAEL DE BARROS ARRUDA e em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão para VALDEIR MARQUES SÁ TELES, a serem cumpridas no regime inicial SEMIABERTO, e pagamento de 11 (onze) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.

 

CONCLUSÃO

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso interposto por ISRAEL DE BARROS ARRUDA e por negar provimento àquele veiculado por VALDEIR MARQUES SÁ TELES, para manter a condenação de ambos pela prática do crime previsto no art. 289, § 1º, do Código Penal, às penas de 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, respectivamente, abrandado, para os dois, o regime inicial de cumprimento para o SEMIABERTO, sendo de ofício para VALDEIR MARQUES SÁ TELES, e pagamento de 11 (onze) dias-multa para cada, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.

Oficie-se ao r. Juízo das Execuções Penais.



E M E N T A

 

 

PENAL. CRIME DE GUARDA E INTRODUÇÃO EM CIRCULAÇÃO DE MOEDA FALSA. ART. 289, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSOS DAS DEFESAS DE AMBOS OS RÉUS. PLEITO ABSOLUTÓRIO. SUSTENTADA AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE DELITIVA. IMPROCEDÊNCIA. APTIDÃO DAS CÉDULAS PARA LUDIBRIAREM O HOMEM DE DISCERNIMENTO MÉDIO CONSTATADA. PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O 2º DO MESMO ARTIGO IGUALMENTE REJEITADO. DOSIMETRIA DA PENA. REQUERIDO ABRANDAMENTO DA SANÇÃO BASILAR. AVENTADA NECESSIDADE DE AFASTAMENTO DA VALORAÇÃO NEGATIVA DOS ANTECEDENTES CRIMINAIS. IMPOSSIBILIDADE. PERÍODO DEPURADOR DE CINCO ANOS PREVISTO NO ART. 64, I, DO CÓDIGO PENAL, QUE SE LIMITA AO RECONHECIMENTO DA REINCIDÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE ÓBICE À AVALIAÇÃO DESFAVORÁVEL DOS ANTECEDENTES A PARTIR DE CONDENAÇÕES CRIMINAIS TRANSITADAS EM JULGADO EM DATA QUE TRANSPONHA REFERIDO LAPSO TEMPORAL. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DAS SANÇÕES. PENAS INFERIORES A QUATRO ANOS DE RECLUSÃO. RÉUS REINCIDENTES. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS EM SUA MAIORIA FAVORÁVEIS. ABRANDAMENTO PARA O REGIME SEMIABERTO. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 269 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PLEITO DE UM DOS RÉUS ACOLHIDO NO PONTO. MEDIDA ADOTADA DE OFÍCIO QUANTO AO OUTRO. APELAÇÃO DE UM DOS RÉUS PARCIALMENTE PROVIDA.

- A materialidade do crime de moeda falsa encontra respaldo em auto de prisão em flagrante, boletim de ocorrência, auto de exibição e apreensão, laudo pericial e na prova oral coligida ao feito, que demonstra, da mesma maneira, a autoria do crime.

- Não merece acolhimento o pleito absolutório formulado pela defesa de um dos réus com fundamento na aventada inaptidão das cédulas apreendidas para enganarem o homem de discernimento médio, uma vez que uma delas foi entregue a terceiro para que adquirisse bebidas, pessoa que, sem perceber a contrafação, tentou fazê-lo, entregando-a ao funcionário do caixa de um estabelecimento comercial, que a recusou.

- Para aplicação do § 2º do art. 289 do Código Penal deve haver a demonstração de boa-fé do acusado ao receber moeda falsa, o que não restou comprovado pela defesa, não havendo que se cogitar nesta figura privilegiada.

- O limite de cinco anos previsto no art. 64, I, do Código Penal, é aplicável somente à possibilidade de reconhecimento da agravante da reincidência e não impede a valoração negativa dos antecedentes criminais do réu a partir de condenações transitadas em julgado em data pretérita que ultrapasse tal lapso.

- A questão foi objeto de julgamento perante o C. Supremo Tribunal Federal, tendo sido fixado o Tema 150 da Repercussão Geral: Não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal.

- Se as penas aplicadas são inferiores a quatro anos de reclusão e as circunstâncias judiciais são, em sua maioria, favoráveis aos réus, é cabível a fixação do regime inicial semiaberto para o cumprimento das sanções. Inteligência da Súmula 269 do Superior Tribunal de Justiça.

- Apelação interposta por ISRAEL DE BARROS ARRUDA parcialmente provida e desprovida a veiculada por VALDEIR MARQUES SÁ TELES, para manter a condenação de ambos pela prática do crime previsto no art. 289, § 1º, do Código Penal, às penas de 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, respectivamente, abrandado, para os dois, o regime inicial de cumprimento para o SEMIABERTO, sendo de ofício para VALDEIR MARQUES SÁ TELES,  e pagamento de 11 (onze) dias-multa para cada, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por ISRAEL DE BARROS ARRUDA e por negar provimento àquele veiculado por VALDEIR MARQUES SÁ TELES, para manter a condenação de ambos pela prática do crime previsto no art. 289, § 1º, do Código Penal, às penas de 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, respectivamente, abrandado, para os dois, o regime inicial de cumprimento para o SEMIABERTO, sendo de ofício para VALDEIR MARQUES SÁ TELES, e pagamento de 11 (onze) dias-multa para cada, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.