Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000328-20.2018.4.03.6004

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: JOAO PEDRO FERRARI COLOMBO

Advogados do(a) APELANTE: NARA JUDIT RODRIGUES PEREIRA - MS20178-A, ARIVAN SILVEIRA - MS17126-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000328-20.2018.4.03.6004

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: JOAO PEDRO FERRARI COLOMBO

Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO GONCALVES DE ASSUNCAO BERMUDES - MS17510-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por JOÃO PEDRO FERRARI COLOMBO em face de ato praticado pelo COMANDANTE DO 6º DISTRITO NAVAL DA MARINHA DO BRASIL e CAPITÃO DE MAR E GUERRA CHEFE-GERAL DOS SERVIÇOS DO 6º DISTRITO NAVAL DA MARINHA DO BRASIL, objetivando provimento judicial que lhe assegure a matrícula no Curso de Formação a ser realizado pelo Comando do 6º Distrito Naval de Ladário/MS e consequente nomeação no cargo de Engenheiro Mecânico da Marinha do Brasil.

Relata o impetrante, que efetivou sua inscrição no Processo Seletivo de Profissionais de Nível Superior das Áreas de Apoio à Saúde, Técnica e de Engenharia, para a prestação do Serviço Militar Voluntário (SMV) como Oficiais Temporários da Marinha do Brasil - Comando do 6º Distrito Naval, publicado no dia 09.11.2017, para ingresso na única vaga para o Cargo de Engenheiro Mecânico, nos termos do Aviso de Convocação nº 01/2017.

Narra que, em 25/04/2018, foi publicada a relação dos voluntários aprovados e classificados na primeira fase, sendo classificado em 1º lugar.

Aduz que, para sua surpresa, foi publicado o resultado da etapa referente a Verificação Documental (VD), Verificação de Dados Biográficos (VDB) e Prova de Títulos (PT), no qual seu nome constou como eliminado.

Alega que, embora a organização do certame não tenha informando expressa e claramente o motivo da eliminação, é certo que se deu por conta da Certidão de Antecedentes Criminais apresentada, na qual consta que o impetrante responde a ação penal, autos nº 0004241-75.2017.8.12.0110, em trâmite na 1ª Vara Criminal de Campo Grande – MS (id 77454481).

Pugna pela aplicação do Princípio da Presunção de Inocência para reforma do julgado, viabilizando sua nomeação ao cargo pretendido.

Informações prestadas pelas autoridades coatoras, confirmando que “(...) no caso em apreço, o candidato foi eliminado por ter sido denunciado em ação penal, fato este constatado durante etapa da Verificação de Dados Biográficos, conforme explicações contidas no Apêndice “G”, que concluiu que o candidato poderia ser eliminado, uma vez que, ao ser denunciado, não preencheu os requisitos exigidos para os demais candidatos do certame (...)”, (id 77454904).

Por sentença, o MM. Juízo a quo denegou a segurança.  Sem honorários advocatícios, nos termos da Lei nº 12.016/09 (id 89076793).

Irresignado, o impetrante apela da sentença, reiterando os termos da inicial, repisando que sua eliminação do processo seletivo, em função de ser réu em ação penal em curso, viola o princípio constitucional da presunção de inocência, previsto no art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal de 1988, pois sequer houve desfecho do processo criminal em questão (id 77454992).

O Ministério Público Federal nesta instância opina pelo provimento da apelação (id 91833951).

Com as contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000328-20.2018.4.03.6004

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: JOAO PEDRO FERRARI COLOMBO

Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO GONCALVES DE ASSUNCAO BERMUDES - MS17510-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

A questão cinge-se acerca da eliminação do impetrante, ora apelante, do processo seletivo para provimento do cargo de Engenheiro Mecânico da Marinha do Brasil, decorrente de denúncia em ação penal.

Pois bem. O artigo 28, incisos XII e XIX da Lei 6.880/80, estabelece:

"Art. 28. O sentimento do dever, o pundonor militar e o decoro da classe impõem, a cada um dos integrantes das Forças Armadas, conduta moral e profissional irrepreensíveis, com a observância dos seguintes preceitos de ética militar:

(...)

XIII - proceder de maneira ilibada na vida pública e na particular;

XIV - observar as normas da boa educação;

(...)"

O edital nº 01/2017, que rege o concurso em questão, dispõe no item 3.3, alínea “l”, que:

3.3. São condições necessárias à inscrição:

(...)

l) não estar na condição de réu em ação penal.

De rigor observar que as normas supramencionadas têm por escopo requisitos fundamentais para à prestação de serviço às forças armadas, em especial, a Marinha do Brasil, contudo, ainda assim, deve-se obediência às normas legais.

Anoto que também que o edital é a lei do concurso, todavia, não poderá constar deste, qualquer requisito ou exigências que irão conflitar com as normas e princípios constitucionais.

O artigo 5º da Constituição Federal em seu inciso LVII, dispõe:

"(...)

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória".

No caso, a exclusão da impetrante do certame apoiada na exigência constante na alínea "l" do item 3.3, qual seja, " não estar na condição de réu em ação penal", viola o princípio constitucional da presunção de inocência.

Assim, é bem de ver que a Administração Pública não poderia excluir o candidato do certame em decorrência da existência de ação penal em curso, pois, o fato do impetrante encontrar-se respondendo ao processo nº 0004241-75.2017.8.12.0110, o qual versa sobre o delito de omissão de socorro, não impede o seu chamamento e tampouco pode implicar em sua eliminação do certame.

O Plenário do e. Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Recurso Extraordinário nº 560.900-DF, com repercussão geral reconheceu que, sem previsão constitucionalmente adequada e instituída por lei, não é legítima a cláusula de edital de concurso público que restrinja a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito ou ação penal.

Tema 22 - Restrição à participação em concurso público de candidato que responde a processo criminal.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. IDONEIDADE MORAL DE CANDIDATOS EM CONCURSOS PÚBLICOS. INQUÉRITOS POLICIAIS OU PROCESSOS PENAIS EM CURSO. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. 1. Como regra geral, a simples existência de inquéritos ou processos penais em curso não autoriza a eliminação de candidatos em concursos públicos, o que pressupõe: (i) condenação por órgão colegiado ou definitiva; e (ii) relação de incompatibilidade entre a natureza do crime em questão e as atribuições do cargo concretamente pretendido, a ser demonstrada de forma motivada por decisão da autoridade competente. 2. A lei pode instituir requisitos mais rigorosos para determinados cargos, em razão da relevância das atribuições envolvidas, como é o caso, por exemplo, das carreiras da magistratura, das funções essenciais à justiça e da segurança pública (CRFB/1988, art. 144), sendo vedada, em qualquer caso, a valoração negativa de simples processo em andamento, salvo situações excepcionalíssimas e de indiscutível gravidade. 3. Por se tratar de mudança de jurisprudência, a orientação ora firmada não se aplica a certames já realizados e que não tenham sido objeto de impugnação até a data do presente julgamento. 4. Recurso extraordinário desprovido, com a fixação da seguinte tese de julgamento: “Sem previsão constitucional adequada e instituída por lei, não é legítima a cláusula de edital de concurso público que restrinja a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito ou ação penal”.

(STF, RE 560900/DF, Rel. Ministro ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, Julg.: 06/02/2020, Repercussão Geral – Mérito, DJe-204 DIVULG 14-08-2020 PUBLIC 17-08-2020).

Assim, de rigor o reconhecimento do direito à nomeação e posse do apelante no cargo pretendido.

Ante o exposto, dou provimento à apelação do impetrante, para determinar sua nomeação e posse no cargo Engenheiro Mecânico da Marinha do Brasil, previsto no Concurso Público nº 01/2017 – Marinha do Brasil – Comando do 6º Distrito Naval, nos termos da fundamentação.

Incabível a cobrança de honorários advocatícios, por força do disposto no art. 25 da Lei n° 12.016/2009. Custas “ex lege”.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. AÇÃO PENAL EM ANDAMENTO. EXCLUSÃO DE CANDIDATO. IMPOSSIBILIDADE. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (ART.5º, INC. LVII DA CF). APELO PROVIDO.

1. As normas supramencionadas têm por escopo requisitos fundamentais para à prestação de serviço às forças armadas, em especial, a Marinha do Brasil, contudo, ainda assim, deve-se obediência às normas legais.

2. No mais, é de se reconhecer também que o edital é a lei do concurso, contudo, não poderá constar deste, qualquer requisito ou exigências que irão conflitar com as normas e princípios constitucionais.

3. No caso, a exclusão do impetrante do certame apoiada na exigência constante na alínea "l" do item 3.3, qual seja, " não estar na condição de réu em ação penal", viola o princípio constitucional da presunção de inocência.

4. Apelo provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do impetrante, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA (Relator), com quem votaram o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE e a Des. Fed. MARLI FERREIRA. Ausente, justificadamente, a Des. Fed. MÔNICA NOBRE, por motivo de férias , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.