RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0004715-86.2020.4.03.6201
RELATOR: 5º Juiz Federal da 2ª TR MS
RECORRENTE: ANA CRISTINA ALVES GONCALVES
Advogados do(a) RECORRENTE: RODRIGO COELHO DE SOUZA - MS17301-A, WELLINGTON COELHO DE SOUZA JUNIOR - MS15475-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
RELATÓRIO Dispensado o relatório (artigo 38 da Lei 9.099/95 c.c. artigo 1º da Lei 10.259/2001).
VOTO Pretende a parte autora a reforma da sentença de improcedência do pedido inicial de concessão de benefício por incapacidade. A sentença foi proferida nos seguintes termos: I - RELATÓRIO Trata-se de pedido de concessão do benefício por incapacidade temporária com conversão em benefício por incapacidade permanente. O INSS apresentou contestação-padrão no sistema JEF. Dispenso o relatório, na forma da lei (art. 38, Lei nº 9.099/95), aplicável por força do art. 1º da Lei 10.259/01. Decido. II – FUNDAMENTO QUESTÕES PRÉVIAS Incompetência As preliminares suscitadas pela Autarquia não merecem acolhida. Não restou provado, no caso concreto, que o valor da causa tenha superado o limite de alçada deste JEF e não se trata de moléstia decorrente de acidente de trabalho. Prescrição No que tange a incidência da prescrição aplica-se ao caso em análise o enunciado da Sumula 85 do STJ, uma vez que se trata de prestações sucessivas, ou seja, encontram-se prescritas, apenas as parcelas anteriores ao quinquênio que antecedeu a propositura da ação. MÉRITO II.2. Mérito A Emenda Constitucional nº 103/2019, a chamada Reforma da Previdência, ao conferir nova redação ao art. 201, I, da Constituição Federal, substituiu a referência aos eventos de doença e invalidez pela expressão “eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho”. Não obstante a mudança de denominação, os requisitos para concessão continuam sendo os estabelecidos na Lei nº 8.213/91. Porém, no que tange a regra de cálculo, os benefícios concedidos após 13.11.19 estão sujeitos ao disposto no art. 26, da EC nº 103/19. Nesta quadra, registro, que, em se tratando de restabelecimento de benefício concedido anteriormente à EC nº 103/19, as regras de cálculo serão as da Lei nº 8.213/91. Destarte, os requisitos indispensáveis à obtenção dos benefícios previdenciários por incapacidade são: i) a qualidade de segurado; ii) a carência, ressalvadas as hipóteses legais de dispensa; iii) incapacidade temporária para o exercício da atividade laborativa habitual, para o auxílio por incapacidade temporária [auxílio-doença]; iv) incapacidade permanente para o exercício da atividade laborativa habitual, somada a insuscetibilidade de reabilitação para o exercício de outra atividade que garanta a sobrevivência, na hipótese de aposentadoria por incapacidade permanente [aposentadoria por invalidez]. No caso em tela, conforme se extrai do laudo pericial, a autora apresenta tendinopatia dos flexores e extensores do punho e tendinopatia do supraespinal de ombro direito, e está temporariamente incapaz para o exercício de atividade laborativa. Quanto ao início da incapacidade, o perito afirmou não ser possível atestar (ID 167366694). O INSS alega que não há incapacidade para o exercício da atividade de auxiliar de cozinha, havendo mera redução dessa capacidade. Lembra que cabe ao empregador ou a própria parte autora, no exercício de sua atividade autônoma proceder ao remanejamento para tarefas compatíveis com as limitações encontradas. A parte autora alega que seu benefício foi cessado indevidamente em 22.09.2017, sendo evidente que não havia recuperação sua capacidade laborativa. Em análise ao CNIS, verifica-se que a parte autora sequer gozou do benefício por incapacidade temporária em 22.09.2017, tudo indica que foi implantado equivocadamente, pois teve início em 22.09.2017 e fim no mesmo dia (fls. 02, do ID 167366681). Considerando como existente a incapacidade, o perito não fixou a DII, neste caso, deve ser considerada a data da realização da perícia médica judicial, em 21.07.2021. O último vínculo empregatício da autora se encerrou em 10.2016, a partir daí não mais verteu contribuições ao RGPS. A data do início da incapacidade (DII) é 21.07.2021, quando a autora já havia perdido a qualidade de segurada, que se manteve até 15.12.2017. Diante disso, o indeferimento do pedido é medida legal que se impõe em razão da falta de qualidade de segurado na época da consolidação da incapacidade. III – DISPOSITIVO Posto isso, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, resolvendo o mérito nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Defiro a gratuidade da justiça requerida, observado o art. 98, § 3º, do CPC. Sem custas e sem honorários nesta instância judicial, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95. Oportunamente, providencie-se a baixa definitiva. P.R.I. Campo Grande/MS, data conforme registro da assinatura eletrônica constante no sistema. O recurso não merece prosperar. De pronto, consigno que o art. 46 combinado com o parágrafo 5º do art. 82, ambos da Lei nº 9.099/95, facultam à Turma Recursal dos Juizados Especiais a remissão aos fundamentos adotados na sentença. Por sua vez, o mencionado parágrafo 5º do artigo 82 da Lei nº 9.099/95, dispõe “se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.”. O Colendo Supremo Tribunal Federal já reconheceu a constitucionalidade, vale dizer, a não violação ao dever constitucional de motivação das decisões judiciais (art. 93, inc. IX, da CF/88), da utilização da denominada técnica da fundamentação per relationem, consoante se infere na leitura do seguinte precedente da jurisprudência da excelsa corte, verbis: “(...) O Supremo Tribunal Federal tem salientado, em seu magistério jurisprudencial, a propósito da motivação “per relationem”, que inocorre ausência de fundamentação quando o ato decisório – o acórdão, inclusive – reporta-se, expressamente, a manifestações ou a peças processuais outras, mesmo as produzidas pelo Ministério Público, desde que, nestas, se achem expostos os motivos, de fato ou de direito, justificadores da decisão judicial proferida. Precedentes. Doutrina. O acórdão, ao fazer remissão aos fundamentos fático-jurídicos expostos no parecer do Ministério Público – e ao invocá-los como expressa razão de decidir –, ajusta-se, com plena fidelidade, à exigência jurídico-constitucional de motivação a que estão sujeitos os atos decisórios emanados do Poder Judiciário (CF, art. 93, IX).” (ADI 416 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 16/10/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-215 DIVULG 31-10-2014 PUBLIC 03-11-2014) grifei. Nessa toada, a sentença, no mérito, não merece reparos, uma vez que se fundamentou em norma jurídica e orientação jurisprudencial aplicáveis à espécie. O Juiz “a quo” motivou o entendimento adotado no que tange ao não preenchimento dos requisitos exigidos para concessão do benefício, com base nos elementos e circunstâncias constantes dos autos. A autora alega que a incapacidade é muito anterior à data da perícia. Alega que benefícios foram concedidos administrativamente em decorrência das mesmas moléstias alegadas na inicial, desde o ano de 2005. De fato, a parte autora recebeu auxílio-doença em alguns períodos, o último entre 19/11/2010 02/06/2015, o qual foi cessado em virtude do seu retorno voluntário ao labor, conforme consta de decisão transitada em julgado proferida nos autos n. 0001697-62.2017.4.03.6201. Aliás, o Acórdão em Embargos proferido no bojo dos autos supramencionados (ID 218653109), elucidam a estranha anotação no CNIS da autora, com data de início e cessação de um auxílio-doença na mesma data de 22/09/2017. Equivocadamente houve a juntada de acórdão de demanda diversa naqueles autos, o que ocasionou a expedição de ofício de cumprimento, posteriormente revogada em sede de embargos de declaração. Vale dizer, o último vínculo válido no CNIS da parte autora é mesmo com a empresa EBS Supermercados LTDA, entre 01/06/2012 e 20/10/2016, como mencionado em sentença. E o mais importante, no lapso entre 2016 e a data da perícia há apenas a documentação médica trazida com a inicial para comprovação da incapacidade laborativa da parte autora, toda ela datada do ano de 2020, mesmo porque o pedido formulado foi de concessão do benefício a partir de junho/2020. Assim, ainda que se trate das mesmas doenças, considerando o vazio documental sobre o que ocorreu no lapso entre os anos de 2016 e 2020, não há o mínimo lastro probatório para se concluir que a incapacidade verificada pelo expert no momento do exame pericial é uma continuidade da incapacidade verificada no ano de 2016, mormente se tendo em vista que a parte autora retornou ao mercado de trabalho voluntariamente e por isso teve seu benefício cessado. Desse modo, por vislumbrar a coerência e correção do entendimento firmado na origem, deixo de declarar outros fundamentos, para adotar como razão de decidir a argumentação utilizada na decisão atacada. No mais, consigno ser suficiente que sejam expostas as razões de decidir do julgador, para que se dê por completa e acabada a prestação jurisdicional, não havendo a necessidade de expressa menção a todo e qualquer dispositivo legal mencionado, a título de prequestionamento. Assim, não vislumbro dos argumentos deduzidos no processo qualquer outro fundamento relevante capaz de, em tese, infirmar a conclusão ora adotada. Posto isso, voto por negar provimento ao recurso, confirmando a sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos, os quais dou por transcritos, com base no art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei nº 10.259/2001, somados aos argumentos ora expendidos. Condeno a parte recorrente vencida ao pagamento de custas e honorários advocatícios, estes no importe de 10% sobre o valor corrigido da causa, conforme previsão do artigo 55, segunda parte, da Lei nº 9.099/95, observada a concessão de gratuidade judiciária. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO INOMINADO INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA. AUSÊNCIA DE QUALIDADE DE SEGURADA NA DII. RETROAÇÃO DO TERMO INICIAL DA INCAPACIDADE. AUSÊNCIA DE PROVAS QUE INFIRMEM A CONCLUSÃO PERICIAL. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.