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RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002185-68.2020.4.03.6344 RELATOR: 42º Juiz Federal da 14ª TR SP RECORRENTE: MARIA DA GLORIA BUZATO ROSA Advogado do(a) RECORRENTE: CRISTIANO HENRIQUE PEREIRA - SP221167-A RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso da parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade híbrida ou mista desde a Data de Entrada do Requerimento – DER, 18/02/2020. Insurge-se a recorrente alegando que o conjunto probatório é suficiente para permitir o reconhecimento do período de todo o período de atividade rural citado na inicial, mais precisamente de 10/03/1967 a 10/03/1977, tendo a autora atingido a carência e a idade necessárias à concessão do benefício. Não foram apresentadas contrarrazões. É o breve relatório.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002185-68.2020.4.03.6344 RELATOR: 42º Juiz Federal da 14ª TR SP RECORRENTE: MARIA DA GLORIA BUZATO ROSA Advogado do(a) RECORRENTE: CRISTIANO HENRIQUE PEREIRA - SP221167-A RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Da atividade rural O trabalhador rural passou a ser segurado obrigatório a partir da Lei n. 8.213/91. O período em que exerceu suas atividades antes da lei é computado para efeitos de aposentadoria por tempo de contribuição, sem ser necessário comprovar o recolhimento de contribuições previdenciárias, conforme dispõe o art. 55, § 2º da Lei n° 8.213/91. A situação é a mesma se a atividade foi exercida em regime de economia familiar. Nesse sentido, estabelece a Súmula n° 24 da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência: “O tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior ao advento da Lei n. 8.213/91, sem o recolhimento de contribuições previdenciárias, pode ser considerado para a concessão de benefício previdenciário do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), exceto para efeito de carência, conforme a regra do art. 55, § 2º, da Lei n. 8.213/91”. Nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e de acordo com a jurisprudência consubstanciada na Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça, é possível a comprovação do trabalho rural mediante a apresentação de início de prova documental, devendo esta, quando insuficiente, ser complementada por prova testemunhal. Início de prova material, conforme a própria expressão traduz, não indica completude, mas sim começo de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica discutida, desde que associada a outros dados probatórios. O art. 106 da Lei 8.213/91 dispõe sobre a forma de comprovação do exercício da atividade rural. Contudo, o rol de documentos a que alude o art. 106 da mesma Lei nº 8.213/91 não é taxativo, cedendo passo ao exame das provas coligidas aos autos segundo o prudente arbítrio do juiz, a teor do que dispõe o artigo 131 do Código de Processo Civil. Ademais, se é certo que a prova material deve ser contemporânea aos fatos (Súmula 34 da TNU) que se pretende provar, não se afigura razoável o estabelecimento a priori de um período com relação ao qual a prova documental - natureza mais comum da prova material - tenha eficácia, seja tal período de um mês, um semestre ou um ano, como tem se orientado a autarquia. Ou seja, a existência de início de prova material e o período com relação ao qual esta produz efeitos deve ser avaliado em concreto, considerando-se o conjunto probatório integralmente. Em razão da dificuldade de se obter provas para a comprovação da atividade rural, entendo que qualquer documento confeccionado na época abrangida pelo pedido pode servir de início de prova material, desde que hábil e idôneo que, quando integrado às demais provas dos autos leve à convicção de que houve a prestação de serviço. Ressalto ainda que os documentos em nome dos genitores ou cônjuges e companheiros(as) aproveitam ao requerente, pois desenvolvido o trabalho em regime de economia familiar, os atos negociais, em regra, são formalizados em regra pelo seu chefe de família, em regra o pai. A jurisprudência pátria, a propósito, é tranquila quanto à aceitação de documentos em nome do pai como início de prova material a comprovar trabalho rural (Precedentes do STJ e TNU). Inicialmente, cabe salientar que a aposentadoria por idade é devida ao trabalhador urbano ou rural que, cumprida a carência legal do benefício, tenha completado 65 anos de idade, se homem, ou 60 anos, se mulher, no caso da aposentadoria por idade urbana e 60 anos, se homem, ou 55 anos de idade, se mulher, no caso da aposentadoria por idade rural, tudo nos termos do art. 48 e §1º da Lei n.º 8.213/91. A carência legal, em regra, é de 180 (cento e oitenta) meses, nos termos do art. 25, inciso II, da Lei n.º 8.213/91. Todavia, o art. 142 da mesma lei reduz o prazo em questão, para os trabalhadores inscritos na Previdência Social Urbana até 24/07/1991, de acordo com a tabela nele prevista. Há que se ressaltar ainda que não se exige a concomitância dos requisitos para a concessão do benefício, bastando que se comprove a carência necessária correspondente ao ano em que o segurado completa a idade mínima. Nesse sentido, a norma do art. 3º, § 1º, da Lei 10.666/2003, segundo a qual, “na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício”. Assim, não há que se falar na aplicação da regra do art. 24, parágrafo único, da Lei 8.213/91, que impõe o recolhimento de no mínimo um terço do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência, quando verificada a perda da qualidade de segurado que, pois a lei dispensou a demonstração desta quando o segurado tenha atingido a idade exigida e a quantidade de meses de contribuição necessários para a carência relativa ao ano de implementação da idade. Trabalhador rural, nos termos do §1º acima citado, são aqueles referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11, ou seja, trabalhador rural empregado, contribuinte individual, trabalhador avulso ou segurado especial. Para tanto, o §2º do mesmo dispositivo legal exigia que o segurado comprovasse o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido. Porém, posteriormente, a Lei 11.718/2008, alterando a redação da lei, introduziu o §3º, o qual passou a prever que “os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher”, instituindo assim o que se passou a denominar de aposentadoria por idade híbrida. Assim, a aposentadoria por idade passou a ser disciplinada da seguinte forma: Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. § 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. § 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. § 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. § 4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. Com a nova regra do §3º, atentou-se o legislador a uma realidade muito comum no nosso país, em que boa parte dos trabalhadores rurais deixaram o campo para migrarem para os grandes centros urbanos, permitindo que houvesse o cômputo do tempo de exercício de atividade rural juntamente com o tempo de atividade urbana para fins de cumprimento da carência exigível para a concessão do benefício de Aposentadoria por Idade, observando, com isso, os princípios constitucionais da universalidade da cobertura e atendimento e da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais. Administrativamente, o INSS sustenta a impossibilidade de o trabalhador urbano obter os benefícios do cômputo de carência híbrida previsto no §3º do art. 48 da LBPs, argumentando que a novel norma explicitamente aduziu apenas a “trabalhadores rurais” que não disponham de todo o período necessário para o adimplemento da carência exigida pelo benefício em tempo exclusivamente rural, partindo, portanto, de uma interpretação literal do citado dispositivo legal, a excluir da sua incidência os trabalhadores rurais que passaram a ser urbanos na época do requerimento. Entendo, porém, que a interpretação do §3º do art. 48 da LBPS não deve ser literal, mas sim teleológica e atenta à mens legis na qual se baseou a gênese do citado dispositivo legal, ou seja, o notório fato de que vários trabalhadores rurais perderam essa condição em razão do êxodo rural para os centros urbanos ocorrido nas últimas décadas. De outra forma, não faria qualquer sentido a alteração legislativa, estaria o legislador a punir duramente os segurados que optaram pela busca da melhoria de vida no cenário urbano, acarretando, desse modo, a impossibilidade de usufruir da contagem híbrida prevista no §3º do art. 48 da LBPS, como pretende a autarquia previdenciária. Ademais, caso mantida tal interpretação, acabaríamos por impor a muitos trabalhadores urbanos - que já há muito deixaram o vínculo com a terra - terem que fazer o caminho inverso, ou seja, migrarem para a zona rural para exercerem novamente o labor campesino, por pelo menos um dia, para que possam ser qualificados novamente como trabalhadores rurais para só então, a partir daí, requererem as suas aposentadorias por idade com a utilização da contagem híbrida para fins de carência, incentivando, ademais, fraudes. Resta claro, portanto, que a exigência de que o segurado seja trabalhador rural quando do requerimento administrativo para a concessão da aposentadoria por idade híbrida prevista no §3º do art. 48 da LBPS atenta contra os fins sociais a que a norma se dirige, bem como viola as exigências do bem comum, que devem guiar o intérprete da lei. Poder-se-ia invocar ainda a norma do art. 55, §2º da Lei 8.213/91, que impede a contagem do tempo em que não houve recolhimento de contribuições para efeito de carência, in verbis: “O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência”, conforme dispuser o regulamento.” Porém, penso que esta não pode se sobrepor à novel redação do art. 48, §§ 3º e 4º da referida lei, que criou nova modalidade de aposentadoria permitindo aqueles que somassem tempo de serviço urbano e rural pudessem computar no prazo da carência o período rural, independente do recolhimento de contribuições. Nesses casos, porém, não se aplica o redutor da idade rural, mas mantém-se a idade da aposentadoria urbana, de 65 e 60 anos para homens e mulheres, respectivamente. No mesmo sentido da possibilidade de concessão da aposentadoria por idade híbrida, independente do exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício já decidiu a TNU: INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (ART. 17 DO RITNU). PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA HÍBRIDA POR IDADE. ARTIGO 48, § 3º, LEI 8.213/91. ATIVIDADE RURAL OU URBANA ANTES DO REQUISITO ETÁRIO OU REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. INDIFERENÇA. IDADE MÍNIMA A SER CONSIDERADA – A MESMA EXIGIDA PARA A APOSENTADORIA POR IDADE DO TRABALHADOR URBANO. CÔMPUTO DO TEMPO RURAL ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 8.213/91, PARA FINS DE CARÊNCIA, SEM RECOLHIMENTOS. POSSIBILIDADE. ENTENDIMENTO DO STJ. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. QUESTÃO DE ORDEM 20/TNU. (...) 4. Assim, o autor interpôs o presente incidente de uniformização, alegando divergência do acórdão hostilizado com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e da TNU, no sentido de que cabível a concessão da aposentadoria por idade híbrida ou mista, não importando a natureza da atividade do segurado ao tempo do requerimento administrativo ou cumprimento do requisito etário. Como paradigmas, citou o REsp 1.367.479/RS e PEDILEF 5000957-33.2012.4.04.7214. (...) 13. Em face do exposto, CONHEÇO E DOU PARCIAL PROVIMENTO ao incidente para, com fulcro na Questão de Ordem 20 desta TNU, anular a sentença e acórdão, determinando o retorno dos autos ao juízo de origem para novo julgamento, com adequação ao seguinte entendimento: (a) a Lei n.º 11.718/2008, ao alterar o art. 48 da Lei n.º 8.213/91, conferiu ao segurado o direito à aposentadoria híbrida por idade, possibilitando, na apuração do tempo de serviço, a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o urbano; (b) para fins do aludido benefício, irrelevante a natureza do trabalho exercido no momento anterior ao cumprimento da idade mínima ou requerimento da aposentadoria (rural ou urbano); (c) o tempo de serviço rural anterior ao advento da Lei n. 8.213/91 – objeto de discussão e exame no presente feito - pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições. (d) para a aposentadoria híbrida, o requisito etário é o mesmo exigido para a aposentadoria por idade urbana, ou seja, 65 (sessenta e cinco) anos para o homem e 60 (sessenta) para a mulher, não havendo a redução de idade em cinco anos, prevista para a aposentadoria por idade rural. 14. Incidente julgado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 17, VII, do Regimento Interno da TNU, aprovado pela Resolução CJF-RES-2015/00345, de 02/06/2015. (PEDILEF Nº 5009416-32.2013.4.04.7200. Relatora: Juíza Federal Ângela Cristina Monteiro. DJ: 20/1016). DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA MISTA OU HÍBRIDA. CONTAGEM DE TEMPO RURAL PARA APOSENTADORIA URBANA. APLICAÇÃO EXTENSIVA DO ATUAL DO ARTIGO 48, § 3º E 4O. DA LEI DE BENEFÍCIOS. DIRETRIZ FIXADA PELA SEGUNDA TURMA DO SUPERIOR TRIBUNA DE JUSTIÇA NO RECURSO ESPECIAL 1.407.613. ISONOMIA DO TRABALHADOR RURAL COM O URBANO. APOSENTADORIA POR IDADE NA FORMA HÍBRIDA PERMITIDA TAMBÉM PARA O URBANO QUANDO HOUVER, ALÉM DA IDADE, CUMPRIDO A CARÊNCIA EXIGIDA COM CONSIDERAÇÃO DOS PERÍODOS DE TRABALHO RURAL.PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO. (PEDILEF 50009573320124047214. Relator: Juiz Federal Bruno Carrá. DOU: 19/12/2014). 7. Como se vê, a sentença e o acórdão recorrido encontram-se dissonantes do posicionamento consolidado desta Corte Uniformizadora, razão pela qual devem ser anulados para novo julgamento. 8. Incidente conhecido e parcialmente provido para reafirmar a tese no sentido de que: (a) a Lei n.º 11.718/2008, ao alterar o art. 48 da Lei n.º 8.213/91, conferiu ao segurado o direito à aposentadoria híbrida por idade, possibilitando, na apuração do tempo de serviço, a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o urbano; (b) para fins do aludido benefício, irrelevante a natureza do trabalho exercido no momento anterior ao cumprimento da idade mínima ou requerimento da aposentadoria (rural ou urbano); (c) o tempo de serviço rural anterior ao advento da Lei n. 8.213/91 pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições. (d) para a aposentadoria híbrida, o requisito etário é o mesmo exigido para a aposentadoria por idade urbana, ou seja, 65 (sessenta e cinco) anos para o homem e 60 (sessenta) para a mulher, não havendo a redução de idade em cinco anos, prevista para a aposentadoria por idade rural. Nos termos da Questão de Ordem nº 20 da TNU, anulação da sentença e do acórdão, determinando-se o retorno dos autos à origem para que seja proferido novo julgamento, conforme a tese jurídica fixada por esta Corte. Assim, para concessão da aposentadoria por idade híbrida, com a aplicação do disposto no §3º do art. 48 da LBPS, deve o homem ter a idade de 65 (sessenta e cinco) anos de idade e a mulher 60 (sessenta), devendo a renda mensal do benefício ser calculada, nesta hipótese, com a observância da regra do inciso II do art. 29 da LBPS, computando-se no período de atividade rural, para efeito de salário-de-contribuição, o valor de um salário mínimo nos termos do §4º do art. 48 da LBPS. Em reforço a essa conclusão, cabe também registrar a redação do §4º do art. 51 do Decreto n.º 3.048/99, incluído pelo Decreto n.º 6.722/2008, que veio regulamentar o novo preceito legal: Art. 51. (...) § 2º Os trabalhadores rurais de que trata o caput que não atendam ao disposto no § 1o, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos, se mulher. § 3º Para efeito do § 2º, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado na forma do disposto no inciso II do caput do art. 32, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo do salário-de-contribuição da previdência social. § 4º Aplica-se o disposto nos §§ 2º e 3º ainda que na oportunidade do requerimento da aposentadoria o segurado não se enquadre como trabalhador rural. (Incluído pelo Decreto nº 6.722, de 2008). (destaque em negrito nosso) Como se vê, o Regulamento da Previdência Social admitiu expressamente a possibilidade da soma de tempo urbano com rural, inclusive quando o segurado não mais se enquadre como trabalhador rural no momento do requerimento da benesse, como aqui defendido. Por essas razões, entendo que o respectivo dispositivo legal deve ser interpretado a fim de permitir que qualquer segurado que tenha sido trabalhador rural possa computar para efeito de carência o tempo de atividade rural juntamente com o tempo de atividade urbana. O assunto já está pacificado nos Tribunais Superiores. O Superior Tribunal de Justiça enfrentou a questão ao apreciar o TEMA 1007: “O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.” O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, reconheceu que o assunto é infraconstitucional, negando repercussão geral e não admitindo o recurso extraordinário, como se percebe pelo teor do TEMA 1104 daquela corte: “É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à definição e ao preenchimento dos requisitos legais necessários para a concessão de aposentadoria híbrida, prevista no art. 48, § 3º da Lei nº 8.213/91.“ Passo à análise do caso concreto. A sentença deixou de reconhecer o trabalho rural da autora, entendendo frágil o conjunto probatório documental, assim como a prova oral. Considerou ainda inviável o reconhecimento do tempo rural em período anterior aos 12 anos de idade. Observa-se que a parte autora requereu o benefício em 18/02/2020, quando contava com mais de 60 anos de idade. O INSS reconheceu 121 contribuições para fins de carência (fls. 107 do evento 04). Nasceu em 10/03/1958 e requer o reconhecimento de atividade rural como segurada especial entre 10/03/1967 e 10/03/1977. Afasto, de início, a vedação trazida pelo juízo sentenciante, no sentido de não ser possível, em nenhuma hipótese, o reconhecimento do trabalho rural anterior aos doze anos de idade. Recentemente, a TNU fixou a tese do Tema 219, no seguinte teor: "É possível o cômputo do tempo de serviço rural exercido por pessoa com idade inferior a 12 (doze) anos na época da prestação do labor campesino". Nos termos do que restou assentado no voto (PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (TURMA) Nº 5008955-78.2018.4.04.7202/SC), "caso haja comprovação de que a pessoa com idade inferior a 12 (doze) anos tenha, de fato, exercido atividade rural, deve-se reconhecer o labor campesino efetivamente comprovado, e não fechar os olhos para a realidade fática, prejudicando aqueles a quem se deveria conferir maior proteção social (...) Quanto à aferição do efetivo labor rural do menor de 12 anos de idade, trata-se de matéria de fato a ser analisada à luz do caso concreto." Assim, não há que se afastar, de plano, a certidão de nascimento do irmão da autora, nascido em 1967, a qual foi considerada extemporânea pelo juízo recorrido, e somente analisou as provas do período a partir de 10/03/1970. No mais, entendo que há prova material suficiente para comprovação da atividade rural em regime de economia familiar pela autora. No meio rural, como já exposto, muitas vezes a prova documental se faz difícil de produzir, tanto que a jurisprudência admite a prova emprestada, ou seja, que documentos em nome dos familiares - genitores, cônjuge, irmãos - sejam utilizados em favor do requerente, havendo demais indícios que levem à conclusão no sentido do efetivo labor rural. No caso, há comprovação de que o pai da autora era proprietário rural de pequeno imóvel e certidões escolares dos irmãos da autora, comprovando a frequência em escola rural, assim como certidões de nascimento dos irmãos, constando a profissão do pai como lavrador. É fato notório que famílias que viviam na zona rural em pequenas propriedades exerciam em conjunto o labor rural, todos os seus integrantes em auxílio mútuo, daí vindo a definição de segurado especial, que é o caso da autora. Quanto ao período demonstrado, embora não se exija um documento relativo a cada ano a ser reconhecido, há que haver outros elementos de prova que permitam a extensão do reconhecimento para período anterior ou posterior aos documentos apresentados. No caso, o documento mais antigo é de 1961 (certidão de propriedade rural), tendo a autora postulado o reconhecimento do período a partir de 1967 e a certidão de registro de imóveis juntada aos autos demonstra que o imóvel rural de propriedade do pai da autora foi vendido em 30/6/1976. Assim, seria possível estender o reconhecimento do período rural até a data final pretendida pela autora caso a prova testemunhal corroborasse suas alegações, porém, esta não foi firme e detalhada o suficiente para estender o reconhecimento além do período comprovado materialmente. Destaco que a ausência de prova testemunhal, ou eventuais contradições não afastam a possibilidade de reconhecimento do tempo rural se há outras provas materiais suficientes, o que é o caso dos autos. Nestas condições entendo possível o reconhecimento do tempo rural, em regime de economia familiar, pelo período de 10/03/1967 a a 30/06/1976. O INSS computou administrativamente 121 meses de carência, os quais, somados ao período acima reconhecido, computa tempo suficiente para concessão da aposentadoria por idade híbrida, sendo a carência mínima de 180 meses. Ante o exposto, dou provimento ao recurso da autora, para julgar parcialmente procedente o pedido inicial e condenar o INSS a conceder à autora o benefício de aposentadoria por idade híbrida, desde a DER, em 18/02/2020. Condeno o réu ainda ao pagamento das diferenças em atraso, desde a DER, corrigidas na forma da resolução 658/2020 do CJF, com eventuais atualizações subsequentes. Dado o caráter alimentar do benefício previdenciário, concedo a tutela de urgência, oficiando-se o réu para implantar o benefício à autora no prazo de 45 dias a contar da ciência deste. Deixo de fixar honorários advocatícios, devidos apenas pelo recorrente vencido. É o voto.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
E M E N T A
RECURSO DE SENTENÇA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA OU MISTA.
1.Trata-se de recurso da parte autora contra sentença que julgou procedente em parte o pedido de concessão de aposentadoria híbrida (ou mista).
2. Conjunto material probatório para comprovação do trabalho rural em regime de economia familiar. Prova emprestada em nome dos familiares. Prescindibilidade da prova oral.
3. Reconhecimento dos períodos conforme comprovação por prova documental. Inviabilidade de estender a período posterior por ausência de prova que corrobore.
4. Recurso provido. Benefício concedido.