APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5018766-63.2019.4.03.6100
RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA
APELANTE: LAURA TERESA AMBROSIO
APELADO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5018766-63.2019.4.03.6100 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: LAURA TERESA AMBRÓSIO APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): Trata-se de recurso de apelação interposto por LAURA TERESA AMBRÓSIO contra a r. sentença que julgou improcedente, denegando a segurança do mandamus interposto em face da UNIÃO FEDERAL, por meio do qual pleiteia o processamento do pedido de naturalização sem a apresentação da certidão de antecedentes criminais, emitida no país de origem e de passaporte válido. Inconformada, a parte autora alega que faz jus, em tese, à naturalização como direito, por ser detentora de autorização de residência com prazo indeterminado e de acordo com os marcos temporais estabelecidos na Lei nº 13.445/2017, no Decreto nº 9.199/2017 e na Portaria Interministerial nº 11/2018. Declara que a regularização migratória, com a correta e adequada identificação dos imigrantes, é de interesse da própria Administração Pública, não sendo razoável impor a exigência de documentação impossível de ser obtida para processamento de pedido de naturalização, devendo haver flexibilização dessas exigências. Por fim, afirma que o Registro Nacional Migratório - RNM do estrangeiro contém todas as informações necessárias a sua correta identificação, incluindo sua filiação, e pode ser utilizado para sua posterior identificação como cidadão brasileiro naturalizado. Além disso, não haveria porque se exigir certidão de antecedentes criminais, eis que foram apresentadas quando da aquisição da autorização de residência anterior e, desde então, a parte impetrante reside em território nacional. Ausente de contrarrazões, subiram os autos a esta Corte, para julgamento. O Ministério Público Federal se manifestou pelo provimento do recurso. É o relatório.
DECLARAÇÃO DE VOTO A fim de deixar consignadas nos autos as razões que me levaram a divergir do voto proferido pela i. Relatora, procedo à presente declaração de voto. Trata-se de mandado de segurança objetivando provimento jurisdicional para determinar que a autoridade coatora processe o pedido de naturalização ordinária sem a apresentação da certidão de antecedentes criminais emitida no país de origem e passaporte válido. É pertinente esclarecer que, de fato, a certidão de antecedentes criminais é uma das exigências constantes na Lei nº 13.445/2017 (lei de migração) para o procedimento de naturalização. Confira-se: “Art. 65. Será concedida a naturalização ordinária àquele que preencher as seguintes condições: I - ter capacidade civil, segundo a lei brasileira; II - ter residência em território nacional, pelo prazo mínimo de 4 (quatro) anos; III - comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e IV - não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei.” Por sua vez, dispõe o art. 12, II, ‘b’ da Constituição Federal: “Art. 12. São brasileiros: (...) II - naturalizados: (...) b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira.” No caso concreto, a apelante, angolana, ingressou no Brasil em 17 de janeiro de 2015. Estruturou sua vida e obteve autorização de residência por reunião familiar, válida até 2024. O pedido de naturalização, nos termos legais, restou indeferido porque a apelante não possui certidão de antecedentes no país de origem e passaporte válido. Ocorre que a impetrante já obteve, sob a égide do regime anterior, o visto permanente, conforme demonstra sua Cédula de Identidade de Estrangeiro expedida em 17/07/2015 (ID 136339865 – pág. 6), ocasião em que já lhe foi exigida a certidão de antecedentes criminais em questão. Assim, em que pese a ausência de condição de refugiado da impetrante, circunstância que flexibilizaria a exigência, entendo que o caso é de concessão da ordem, tendo em vista os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. No mesmo sentido, os precedentes desta Corte: MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. ESTRANGEIRO. PEDIDO DE NATURALIZAÇÃO. REUNIÃO FAMILIAR. CERTIDÃO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS EXPEDIDA PELO PAÍS DE ORIGEM. LEI 13.445/2017. RECURSO DE APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO DESPROVIDOS. 1. Trata-se de mandado de segurança impetrado por estrangeiro com o fito de obter o processamento do pedido de autorização de residência no Brasil sem a necessidade de apresentação da certidão de antecedentes criminais emitida pelo país de origem. 2. Compulsando os autos, verifica-se que a impetrante, nacional da República da Angola, ingressou no Brasil em 11/09/2106 (ID 137404488, página 03), aqui estudou e, desde 02/01/2020, é titular de empresa individual ativa junto à Receita Federal (ID 137404504, página 01), tendo estruturado completamente sua vida e constituído núcleo familiar no país (dois filhos, ID de n.º 137404488, página 01), inexistindo razões para lhe exigir, para naturalização, certidão de antecedentes criminais do país onde não mais reside. 3. Por outro lado, a impetrante já obteve, sob a égide do anterior regime jurídico do estrangeiro, o visto permanente, correspondente à atual condição de residente, conforme demonstra sua Cédula de Identidade de Estrangeiro expedida em 31/01/2017 (ID 137404488, páginas 03-04), ocasião em que também lhe foi exigido o documento em questão, nos termos do que dispunha o art. 27, inciso IV, do revogado Decreto nº 86.715/81. Desse modo, exigir que a impetrante retornasse ao seu país de origem para fins de obtenção de certidão de antecedentes criminais não se mostra razoável, principalmente porque a impetrante não possui recursos financeiros para a viagem ou para contratar a prestação de serviços, tanto que é beneficiária da assistência judiciária gratuita e representada nos autos pela Defensoria Pública da União. Ademais, é pacífico o entendimento desta Terceira Turma, no sentido de se afastar a exigência da certidão de antecedentes criminais em casos similares ao apresentado nos presentes autos (precedentes da Terceira Turma deste Tribunal). 4. Recurso de apelação e reexame necessário desprovidos. (APELAÇÃO CÍVEL ..SIGLA_CLASSE: ApCiv 5027436-90.2019.4.03.6100 ..PROCESSO_ANTIGO: ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, ..RELATOR: Des. Fed. Denise Avelar, TRF3 - 3ª Turma, Intimação via sistema DATA: 14/12/2020 ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2: ..FONTE_PUBLICACAO3:.) “APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL. ESTRANGEIRO. PEDIDO DE NATURALIZAÇÃO. ATESTADO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS E PASSAPORTE VÁLIDO. INEXIGIBILIDADE DIANTE DA EXCEPCIONALIDADE DO CASO. RECURSO PROVIDO. 1. A exigência de documento impossível de ser obtido pelo requerente de naturalização é medida que ofende os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como atenta contra a dignidade da pessoa humana, razão pela qual merece censura pelo Poder Judiciário. 2. Na singularidade, é fato inconteste que o impetrante/apelante goza da condição de refugiado, possuindo autorização permanente de residência no Brasil, em razão da grave crise humanitária pela qual passa seu país de origem (Síria), situação que o impede de obter os documentos referenciados na inicial (passaporte e antecedentes criminais emitidos no país de origem) e, consequentemente, de pleitear sua naturalização. 3. Importante destacar que a Lei nº 9.474/97, que define mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951, em seu art. 43 expressamente prevê que, "no exercício de seus direitos e deveres, a condição atípica dos refugiados deverá ser considerada quando da necessidade da apresentação de documentos emitidos por seus países de origem ou por suas representações diplomáticas e consulares". Nesse sentido, ainda, previa a Portaria MJ nº 1.949/15, vigente quando da propositura desta ação, em seu art. 12 a dispensa dos referidos documentos para os refugiados que venham a requerer sua naturalização. A mesma redação é repetida pela Portaria Interministerial nº 11/18, atualmente vigente. 4. Apelação provida.” (APELAÇÃO CÍVEL ..SIGLA_CLASSE: ApCiv 5021362-88.2017.4.03.6100 ..PROCESSO_ANTIGO: ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, ..RELATORC:, TRF3 - 6ª Turma, Intimação via sistema DATA: 02/03/2020 ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2: ..FONTE_PUBLICACAO3:.) Assim, a ordem deve ser concedida para permitir que seja afastada a necessidade de apresentação de certidão de antecedentes criminais atualizada no país de origem e passaporte válido, devendo a impetrante cumprir os demais requisitos legais para a análise de seu pedido de naturalização. Diante do exposto, dou provimento à apelação, nos termos da fundamentação. É o meu voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
Recurso de apelação interposto por LAURA TERESA AMBRÓSIO contra sentença que denegou a segurança impetrado contra a UNIÃO FEDERAL, por meio do qual pleiteia o processamento do pedido de naturalização sem a apresentação da certidão de antecedentes criminais, emitida no país de origem e de passaporte válido.
A eminente Relatora votou no sentido de desprover o recurso por entender que:
Com efeito, a negativa de aceitar os documentos, pela autoridade impetrada, decorre de interpretação literal da Lei de Migração e de seu decreto regulamentador. Portanto, não haveria que se falar em ilegalidade do ato administrativo impugnado.
Narra o voto que a autora, natural da Angola, entrou regularmente no território brasileiro em 17 de janeiro de 2015, obtendo autorização de residência por reunião familiar ainda naquele ano, válida ate 10 de julho de 2024. Posteriormente, ingressou com pedido de naturalização, porém, foi-lhe solicitada uma extensa lista de documentos, entre os quais a certidão de antecedentes criminais e passaporte válido, que lhe foram negados pelo consulado angolano em São Paulo.
Segundo a Lei nº 13.445/2017 (Lei de Migração), a residência poderá ser autorizada ao imigrante que tenha filho brasileiro, com intuito de reunião familiar. Veja-se:
“Art. 30. A residência poderá ser autorizada, mediante registro, ao imigrante, ao residente fronteiriço ou ao visitante que se enquadre em uma das seguintes hipóteses:
I - a residência tenha como finalidade:
(...)
i) reunião familiar;
(...)
Art. 37. O visto ou a autorização de residência para fins de reunião familiar será concedido ao imigrante:
(...)
II - filho de imigrante beneficiário de autorização de residência, ou que tenha filho brasileiro ou imigrante beneficiário de autorização de residência;
O Decreto nº 9.199/2017, por sua vez, que regulamenta a Lei de Migração, exige a apresentação de declaração de ausência de antecedentes criminais em qualquer país. Veja-se:
“Art. 129. Para instruir o pedido de autorização de residência, o imigrante deverá apresentar, sem prejuízo de outros documentos requeridos em ato do Ministro de Estado competente pelo recebimento da solicitação:
(...)
VI - declaração, sob as penas da lei, de ausência de antecedentes criminais em qualquer país, nos cinco anos anteriores à data da solicitação de autorização de residência.
Registre-se que a impetrante comprovou ter marido e filhos no Brasil (ID 136339865 - fl. 02).
O Estatuto dos Refugiados (Convenção da ONU de 1951) prevê a flexibilização das exigências documentais e regras procedimentais, diante das condições especiais dos refugiados, que se apresentam em situação de urgência ante a fuga do país de origem. O mesmo tratamento foi conferido pelos artigos 43 e 44 da Lei nº 9.474/1997. O art. 20 da Lei de Migração - Lei nº 13.445/2017 prevê a flexibilização documental para a identificação civil do solicitante de refúgio, verbis:
Art. 20. A identificação civil de solicitante de refúgio, de asilo, de reconhecimento de apatridia e de acolhimento humanitário poderá ser realizada com a apresentação dos documentos de que o imigrante dispuser.
O Decreto 9.199/2017 regulamentador complementa a lei no seguinte sentido:
Art. 68. O registro de dados biográficos do imigrante ocorrerá por meio da apresentação do documento de viagem ou de outro documento de identificação aceito nos termos estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública.
(...)
§ 2oO registro e a identificação civil das pessoas que tiveram a condição de refugiado ou de apátrida reconhecida, daquelas a quem foi concedido asilo ou daquelas beneficiadas com acolhida humanitária poderão ser realizados com a apresentação dos documentos de que o imigrante dispuser.
Art. 121. No exercício de seus direitos e deveres, a condição atípica do refugiado será considerada pelos órgãos da administração pública federal quando da necessidade de apresentação de documentos emitidos por seu país de origem ou por sua representação diplomática ou consular.
A jurisprudência desta corte regional está consolidada no sentido da flexibilização das exigências documentais quando o pedido de visto ou autorização de residência tiver como requerente pessoa oriunda de países que notadamente enfrentam crises sociais e humanitárias. Tal entendimento é fundado no fato de que esses estrangeiros imigram para o Brasil no intuito de obterem melhores condições de vida, porém muitas das vezes enfrentam dificuldades sociais e financeiras que os impossibilitam de apresentar a documentação necessária, que, muitas vezes, também lhes é sonegada em razão do pedido de refúgio.
Dos precedentes jurisprudenciais destaca-se o entendimento de que é de rigor a mitigação da rigidez burocrática procedimental nesses casos, considerado que a regularização migratória é de interesse primordial da própria administração pública e representa condição essencial para que estrangeiros possam usufruir de seus direitos fundamentais no exercício da vida civil no Brasil. Confira-se: TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5012307-79.2018.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal DENISE APARECIDA AVELAR, julgado em 18/06/2020, Intimação via sistema DATA: 23/06/2020; TRF 3ª Região, 4ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5027246-94.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, julgado em 26/05/2020, Intimação via sistema DATA: 29/05/2020; TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 5026842-13.2018.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 06/02/2020, Intimação via sistema DATA: 12/02/2020;TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5015457-98.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CECILIA MARIA PIEDRA MARCONDES, julgado em 03/10/2019, Intimação via sistema DATA: 09/10/2019.
No caso, a impetrante demonstrou que pediu refúgio quando entrou no país. De todo modo, é natural de Angola, país em que há histórico de acentuada pobreza, fome, alta incidência de doenças, além de terrorismo e conflitos internos, com permanente violação aos direitos humanos e à democracia. Comprovou também que é hipossuficiente, razão pela qual não é de se exigir que providencie documentos que não tem condições financeiras de obter, sob pena de violação dos princípios da razoabilidade e da isonomia. Nesse cenário, uma vez que a impetrante solicitante tanto de refúgio quanto de regularização imigratória, aplicável por analogia a dispensa prevista no artigo 20 da Lei nº 13.445/2017.
Destarte, diante da impossibilidade de apresentação do documento exigido, a sentença deve ser reformada.
Diante do exposto, voto para DAR PROVIMENTO ao apelo, a fim de determinar que a autoridade impetrada processe o pedido de naturalização sem exigência de apresentação de certidão de antecedentes criminais emitido pelo país de origem.
ANDRÉ NABARRETE
DESEMBARGADOR FEDERAL
mcc
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V O T O
A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora):
A Constituição Federal contempla, em seu artigo 5º, inciso LXIX, o remédio do mandado de segurança para a proteção de direito líquido e certo, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.
A presente ação foi proposta com o escopo de assegurar o processamento do pedido de naturalização sem a apresentação da certidão de antecedentes criminais, emitida no país de origem e de passaporte válido.
A autora, natural da Angola, adentrou regularmente no território brasileiro em 17 de janeiro de 2015, obtendo autorização de residência por reunião familiar ainda naquele ano, válida ate 10 de julho de 2024. Posteriormente, ingressou com pedido de naturalização, porém, foi-lhe solicitada uma extensa lista de documentos, entre os quais a certidão de antecedentes criminais e passaporte válido, que lhe foram negados pelo consulado angolano em São Paulo.
Acerca de tal matéria, determina a Lei nº 13.445/2017 (Lei de Migração)
“Art. 65. Será concedida a naturalização ordinária àquele que preencher as seguintes condições:
I - ter capacidade civil, segundo a lei brasileira;
II - ter residência em território nacional, pelo prazo mínimo de 4 (quatro) anos;
III - comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e
IV - não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei.”
Complementando o dispositivo supra está o art. 234 do Decreto 9.199/17, que regulamenta a Lei de Migração, acerca dos documentos necessários para instruir o pedido de naturalização:
Art. 234. O pedido de naturalização ordinária se efetivará por meio da:
I - apresentação da Carteira de Registro Nacional Migratório do naturalizando;
II - comprovação de residência no território nacional pelo prazo mínimo requerido;
III - demonstração do naturalizando de que se comunica em língua portuguesa, consideradas as suas condições;
IV - apresentação de certidões de antecedentes criminais expedidas pelos Estados onde tenha residido nos últimos quatro anos e, se for o caso, de certidão de reabilitação; e
V - apresentação de atestado de antecedentes criminais expedido pelo país de origem.
Nota-se, pois, que a Lei de Migração condicionou o requerimento de naturalização à prova de que o estrangeiro não possui condenação penal ou, se possuir, que já tenha sido reabilitado nos termos da legislação. A demonstração da ausência de condenação penal no país de origem, demanda comprovação por meio de atestado de antecedentes criminais junto ao país de origem.
Com efeito, a negativa de aceitar os documentos, pela autoridade impetrada, decorre de interpretação literal da Lei de Migração e de seu decreto regulamentador. Portanto, não haveria que se falar em ilegalidade do ato administrativo impugnado.
Nesse sentido, a apreciação do pedido de naturalização deve ser instruída com toda documentação prevista na legislação, inexistindo direito líquido e certo amparado na ausência de documentos essenciais. Seria o caso de subtrair do Estado, no exercício de ato de soberania nacional, o exame de fatos e circunstâncias relevantes à apreciação da condição dos estrangeiros que irão fixar residência em seu território, para que não sejam nocivos à população do país. Dessa forma, não cabe qualquer discricionariedade ao agente público, tampouco ao Poder Judiciário, sob pena de infringir o princípio da legalidade e a separação dos poderes.
Ainda, não se pode equiparar a condição da impetrante à de apátrida, pois a própria documentação juntada aos autos demonstra que ela é nacional da Angola. Também não merece guarida o argumento de que a certidão de antecedentes criminais foi apresentada quando da aquisição da autorização de residência, pois bastaria apresentá-la novamente para resolver a pendência documental.
Pelo que restou demonstrado nos autos, considero que o ato administrativo que não permitiu o processamento do pedido de naturalização sem a apresentação dos documentos necessários seguiu os trâmites legais, sem que houvesse irregularidade que justificasse a atuação judiciária, razão pela qual deve ser mantido em respeito à legalidade e à separação dos poderes, convergindo com os posicionamentos anteriormente adotados por este e. TRF da 3ª região, a saber:
MANDADO DE SEGURANÇA - APELAÇÃO - REEXAME NECESSÁRIO - NATURALIZAÇÃO - DOCUMENTAÇÃO - DIREITO AUSÊNCIA DE LÍQUIDO E CERTO - DISCRICIONARIEDADE DO ESTADO - RECURSO E REMESSA NECESSÁRIA PROVIDOS.
1. “O pedido de naturalização será apresentado e processado na forma prevista pelo órgão competente do Poder Executivo” (artigo 71, da Lei Federal nº. 13.445/17).
2. A norma brasileira não destoa dos padrões internacionais.
3. É oportuno lembrar que o Brasil é reconhecido internacionalmente, de longa data, como País defensor e praticante de uma das mais generosas políticas de imigração do mundo.
4. Política de Estado. A cargo do Poder Executivo.
5. Apelação e reexame necessário providos.
(ApelRemNec / SP nº 5001759-24.2020.4.03.6100. Relator Desembargador Federal TORU YAMAMOTO. 6ª Turma do TRF3. Data do Julgamento: 28/05/2021. Data da Publicação: 01/06/2021)
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE NATURALIZAÇÃO. RECEBIMENTO E PROCESSAMENTO. ATESTADO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS EXPEDIDO PELO PAÍS DE ORIGEM. LEGALIDADE.
1. A naturalização de estrangeiros encontra-se prevista na Lei de Migração (Lei 13.445/2017, artigos 66 a 75), regulamentada pelo Decreto 9.199/2017, exigindo do interessado “não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei” (artigos 65, IV, da lei e 233, IV, do regulamento). Para tal comprovação o Decreto 9.199/2017 prevê, expressamente, no artigo 234, “IV - apresentação de certidões de antecedentes criminais expedidas pelos Estados onde tenha residido nos últimos quatro anos e, se for o caso, de certidão de reabilitação; e V - apresentação de atestado de antecedentes criminais expedido pelo país de origem”.
2. O atestado de antecedentes criminais expedido pelo país de origem para fins de instrução do pedido de naturalização de estrangeiro encontra o devido respaldo legal, não se cogitando de sua substituição por certidões de antecedentes criminais emitidas pelos órgãos judiciários brasileiros, pois estas são também (inciso IV), cumulativamente àquele (inciso V, do artigo 234, do Decreto 9.199/2017), exigidas para instrução e processamento do requerimento de naturalização ordinária.
3. A Lei de Migração condicionou a naturalização à prova de que o estrangeiro não possui condenação penal ou, se possuir, que já tenha sido reabilitado nos termos da legislação (artigo 65, IV). A demonstração de que não possui condenação penal, seja no país de origem, seja no Brasil, é convergente com a exigência legal, tendo o Decreto 9.199/2017 disposto, neste sentido, que a comprovação se faz através de atestado quanto aos antecedentes criminais junto ao país de origem, e por certidões criminais no período de residência do estrangeiro no país, a corroborar, como inequívoco, o entendimento de que não se dispensa o atestado de antecedentes criminais do país de origem com base na inexistência de antecedentes criminais certificada pelos Estados em que a pessoa estrangeira tenha residido no Brasil nos últimos quatro anos, até porque a cobertura territorial e temporal é distinta em cada caso, e nenhuma delas é irrelevante segundo a legislação pátria.
4. É fundamental distinguir que se discute, na espécie, pedido de naturalização, e não de regularização migratória, institutos jurídicos distintos no regime constitucional e legal vigente. Ainda que a regularização migratória seja essencial à permanência regular do estrangeiro no território nacional, precedendo à naturalização, disto não decorre que, cumpridos os requisitos para regularização, tem o estrangeiro direito líquido e certo à naturalização, enquanto forma de aquisição da nacionalidade brasileira. ]
5. O status constitucional da pessoa frente ao Estado soberano é distinto em cada situação, e conquanto todos os residentes e, mesmo aos que apenas transitam em território nacional, sejam garantidos os direitos fundamentais, reveste-se de especiais contornos, por seus fins e efeitos político-jurídicos, o procedimento de aquisição da nacionalidade brasileira. Além do mais, sequer restou comprovado, na espécie, que tenha a impetrante ofertado tal documento quando da anterior obtenção de permanência com base em reunião familiar.
6. Embora a impetrante esteja abrangida na hipótese do artigo 12, II, a, da Constituição Federal, e artigo 237 do Regulamento da Lei de Migração, por ser oriunda de país lusófono, ambos os preceitos não dispensam a comprovação de idoneidade moral, conceito dentro do qual se pode inserir, validamente, a averiguação de antecedentes criminais como elemento objetivo de comprovação do requisito constitucional.
7. Apelação desprovida.
(ApCiv / SP nº 5001727-19.2020.4.03.6100. Relator Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA. 3ª Turma do TRF3. Data do Julgamento: 22/02/2021. Data da Publicação: 25/02/2021)
Ante o exposto, nego provimento à apelação, mantendo a r. sentença em seus exatos termos.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL SOBRESTADA. ART. 8º DA LEI N. 12.514/11 ALTERADO PELA LEI N. 14.195/21. INAPLICABILIDADE AOS FEITOS AJUIZADOS ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DA LEI N. 14.195/21. RECURSO REPETITIVO DE CONTROVÉRSIA N. 1.404.796 – SP. RECURSO PROVIDO.
- Cinge-se a controvérsia acerca da alegação do indevido sobrestamento da execução fiscal, nos termos do art. 8º, § 2º da Lei 12.514/2011.
- Referido artigo foi alterado pela Lei nº 14.195 de 26 de agosto de 2021, a qual passou a prever o arquivamento dos executivos fiscais de valor inferior a 5 (cinco) vezes o constante do inciso I do caput do art. 6º, observado o disposto no seu § 1º (todos da Lei n. 12.514/11).
- Já na vigência anterior, o art. 8º definia que “Os Conselhos não executarão judicialmente dívidas referentes a anuidades inferiores a 4 (quatro) vezes o valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente.”
- Em caso análogo, decidiu o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Repetitivo, submetido à sistemática do artigo 543-C, § 1º, do Código de Processo Civil/1973 que “é inaplicável o art. 8º da Lei nº 12.514/11 ("Os conselhos não executarão judicialmente dívidas referentes a anuidades inferiores a 4 (quatro) vezes o valor cobrado anualmente da pessoa física ou jurídica inadimplente ") às execuções propostas antes de sua entrada em vigor.” (REsp 1.404.796 - SP, Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, 26/03/2014-grifei).
- Assim, uma vez que ao tempo do ajuizamento da execução fiscal a Lei nº. 14.195/21 não estava em vigor, a propositura da demanda não pode ser atingida pela nova lei que impõe valor total inferior a 5 (cinco) vezes o constante do inciso I do caput do art. 6º da Lei, observado o disposto no seu § 1º.
- Agravo de instrumento provido para determinar o regular prosseguimento da execução fiscal.