Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001414-84.2013.4.03.6005

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: OI S.A. - EM RECUPERACAO JUDICIAL

Advogados do(a) APELANTE: PATRICIA YAMASAKI - PR34143-A, LUIZ RODRIGUES WAMBIER - PR7295-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO ESTADUAL, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001414-84.2013.4.03.6005

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: OI S.A. - EM RECUPERACAO JUDICIAL

Advogado do(a) APELANTE: LUIZ RODRIGUES WAMBIER - PR7295-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO ESTADUAL, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de apelação interposta pela OI S/A, visando a reforma da r. sentença que, em sede de ação civil pública, julgou procedente o pedido para condenar a apelante à obrigação de não fazer consistente em se abster de efetuar a cobrança de tarifas interurbanas entre as localidades de Aral Moreira e o distrito de Vila Marquês/MS, bem como ressarcir os consumidores que efetuaram os pagamentos de tais ligações na modalidade interurbana entre as localidades no valor correspondente ao dobro da diferença entre as tarifas local e interurbana, montante que deve ser corrigido pelo IGPM, desde o pagamento, e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação.

Em seu recurso, a OI S/A, suscita, preliminarmente, a nulidade da r. sentença (decisão ultra petita - a condenação em preservação dos documentos, divulgando tal possibilidade por meio de jornal de grande circulação, foi além do pedido inicial).

No mérito, defende a legalidade da conduta, vez que a cobrança da tarifa interurbana entre as regiões de Aral Moreira e Vila Marquês pautou-se na regra do art. 1º, do Decreto nº 2.534/98, em consonância com a Resolução ANATEL nº 85/98, sendo competência exclusiva da ANATEL, nos termos dos artigos 19 e 103 da Lei nº 9.472/97, estabelecer os critérios de estrutura tarifária para cada modalidade de serviço telefônico.

Por outro lado, afirma que, ao determinar a devolução em dobro, a r. sentença incidiu em violação ao artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, o qual, a seu ver, deve ser interpretado restritivamente, somente incidindo a sanção de devolução em dobro quando houver prova do dolo ou de conduta abusiva ou leviana (má-fé) do fornecedor.

No mais, destaca que a r. sentença contraria o entendimento adotado pelo C. STJ no REsp nº 572.070/PR, pelo qual se reconheceu a autonomia da Agência Reguladora para o estabelecimento da tarifação, não cabendo ao Poder Judiciário adentrar ao mérito das normas e procedimentos regulatórios que inspiraram a configuração das áreas locais.

Por fim, aduz que a determinação de exibição de documentos, referente a fatos ocorridos desde 1998 (ou seja, há mais de vinte anos), configura obrigação impossível, contrariando o artigo 22 da Resolução ANATEL nº 426/2005, que estabelece o dever das concessionárias de manter em seus arquivos os dados referentes à prestação de telefonia pelo prazo de cinco anos.

Com contrarrazões, subiram os autos a este Egrégio Tribunal Regional Federal.

Com vista à Procuradoria Regional da República da 3ª Região, foi ofertado o parecer, com manifestação pelo não provimento ao recurso.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001414-84.2013.4.03.6005

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: OI S.A. - EM RECUPERACAO JUDICIAL

Advogado do(a) APELANTE: LUIZ RODRIGUES WAMBIER - PR7295-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO ESTADUAL, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

 

 

 

 

 

 

V O T O

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL ajuizou a presente ação civil pública em face da OI S/A, objetivando a condenação da requerida na obrigação de não fazer consistente em não mais efetuar  cobrança de tarifas interurbanas nas chamadas telefônicas realizadas entre a cidade de Aral Moreira e o distrito de Vila Marquês, bem com ressarcir o dano referente aos valores indevidamente cobrados e recebidos dos consumidores que efetuaram tais ligações em dobro.

Pois bem.

Passo à análise das alegações invocadas no apelo, sem me ater, entretanto, à ordem em que foram colocadas.

Afasto, de imediato, a alegação de nulidade da r. sentença, haja vista que o MM. Juízo a quo entendeu que as obrigações de fazer impostas à apelante são necessárias ao cumprimento da sentença e se adequam ao aditamento dos pedidos iniciais feito pelo Ministério Público Federal.

Por outro lado, em que pese não ser o caso de anular a r. sentença, entendo que o pedido de divulgação da preservação dos documentos, por meio de jornal de grande circulação, não faz parte do pedido, devendo ser excluído da condenação.

A propósito:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E DIREITO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. INSTITUIÇÃO HOSPITALAR. ERRO MÉDICO. PROCEDIMENTO DE CATETERISMO CORONARIANO. TETRAPLEGIA. VIOLAÇÃO DE LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. NÃO OCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL. REQUISITOS. REEXAME DE PROVAS. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. JULGAMENTO ULTRA PETITA. EXCESSO. EXTIRPAÇÃO. PENSÃO MENSAL. ATO ILÍCITO. PENSÃO PREVIDENCIÁRIA. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS. VALOR. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA Nº 282/STF.

(...)

5. A consequência do reconhecimento do vício de julgamento por ter sido ultra petita não é a nulidade do acórdão, mas somente a extirpação do excesso.

6. Recurso especial parcialmente conhecido e, na parte conhecida, não provido.

(STJ, REsp nº 1539428/RJ, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, DJe de 26/02/2016)

No tocante à preservação dos documentos, esta determinação nada mais é do que obrigação já imposta pelo art. 22 da Resolução ANATEL nº 426/2005, vigente à época.

Já no mérito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que os critérios adotados pela ANATEL, para delimitação da chamada área local para efeito de cobrança de tarifa de telefonia fixa local ou interurbana, observam dados técnicos, não necessariamente vinculados à divisão político-geográfica dos Municípios (STJ, REsp nº 1009902/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe de 11/09/2009).

Ressalto, também, que o Plano Geral de Outorga de Serviços de Telecomunicações, disciplinado à época pelo Decreto nº 2.534/98, discriminou as modalidades do serviço telefônico fixo comutado, definindo serviço local como aquele destinado à comunicação entre pontos fixos determinados situados em uma mesma área local (art. 1º, § 2º, I, do Decreto nº 2.534/98): “o serviço local destina-se à comunicação entre pontos fixos determinados situados em uma mesma Área Local”.

No caso, como bem observado pelo Ministério Público Federal, "além de haver continuidade urbana entre o distrito de Vila Marques e o Município de Aral Moreira/MS, situados num raio de menos de 10 Km de distância, o primeiro trata-se de distrito pertencente ao segundo, encontrando-se, assim, subordinado administrativa e economicamente ao referido Município".

Como se vê, antes de se tratar de questão de natureza técnica e discricionária da empresa concessionária dos serviços de telefonia, o estabelecimento da cobrança de tarifa longa distância, para as ligações efetuadas entre as localidades, configurou, em realidade, violação a critérios objetivos estampados no Plano Geral de Outorga de Serviços de Telecomunicações e até mesmo em resoluções da própria ANATEL.

Ainda que se tratasse de critério técnico, destaco que a relação entre os usuários e as empresas concessionárias de telefonia são regidas pelo Código de Defesa do Consumidor que, como todos sabem, combate práticas abusivas.

Saliento, por oportuno, que é possível a análise, pelo Poder Judiciário, da legalidade dos atos da Administração Pública, bem como a observância, na atividade discricionária dos entes estatais, dos critérios e limites estabelecidos em lei.

No tocante à devolução dos valores pagos, o Código de Defesa do Consumidor dispõe (art. 42, parágrafo único) que “o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”. Na hipótese dos autos, não há que se falar em engano justificável, haja vista tratar-se de conhecida empresa de telefonia, conhecedora das regras pertinentes ao setor.

Por fim, nos termos do art. 22 da Resolução ANATEL nº 426/2005, vigente à época, a concessionária deveria manter, em seus arquivos, os dados referentes à prestação de telefonia pelo prazo mínimo de cinco anos.

Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação interposta pela OI S/A, apenas para restringir o período de obrigatoriedade de preservação de dados pela concessionária aos cinco anos anteriores à propositura da ação. Excluo da condenação a determinação de divulgação da preservação dos documentos por meio de jornal de grande circulação. Mantenho, no mais, a r. sentença.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA REJEITADA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COBRANÇA DE TARIFAS INTERURBANAS. DELIMITAÇÃO DA CHAMADA ÁREA LOCAL PARA EFEITO DE COBRANÇA - CRITÉRIOS TÉCNICOS. DEFINIÇÃO DE SERVIÇO LOCAL - CRITÉRIOS OBJETIVOS ESTAMPADOS NO PLANO GERAL DE OUTORGA DE SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES E NAS RESOLUÇÕES DA ANATEL. RELAÇÃO ENTRE OS USUÁRIOS E AS EMPRESAS CONCESSIONÁRIAS DE TELEFONIA REGIDAS PELO CDC. COMBATE A PRÁTICAS ABUSIVAS. ANÁLISE, PELO PODER JUDICIÁRIO, DA LEGALIDADE DOS ATOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, BEM COMO A OBSERVÂNCIA, NA ATIVIDADE DISCRICIONÁRIA DOS ENTES ESTATAIS, DOS CRITÉRIOS E LIMITES ESTABELECIDOS EM LEI. POSSIBILIDADE.

- O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL ajuizou a presente ação civil pública em face da OI S/A, objetivando a condenação da requerida na obrigação de não fazer consistente em não mais efetuar cobrança de tarifas interurbanas nas chamadas telefônicas realizadas entre a cidade de Aral Moreira e o distrito de Vila Marquês, bem como ressarcir o dano referente aos valores indevidamente cobrados e recebidos dos consumidores que efetuaram tais ligações, em dobro.

- A alegação de nulidade da r. sentença deve ser afastada, haja vista que o MM. Juízo a quo entendeu que as obrigações de fazer impostas à apelante são necessárias ao cumprimento da sentença e se adequam ao aditamento dos pedidos iniciais feito pelo Ministério Público Federal.

- Por outro lado, em que pese não ser o caso de anular a r. sentença, o pedido de divulgação da preservação dos documentos, por meio de jornal de grande circulação, não faz parte do pedido, devendo ser excluído da condenação.

- No tocante à preservação dos documentos, esta determinação nada mais é do que obrigação já imposta pelo art. 22 da Resolução ANATEL nº 426/2005, vigente à época.

- Já no mérito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que os critérios adotados pela ANATEL para delimitação da chamada área local para efeito de cobrança de tarifa de telefonia fixa local ou interurbana, observam dados técnicos, não necessariamente vinculados à divisão político-geográfica dos Municípios (STJ, REsp nº 1009902/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe de 11/09/2009).

- Ressalta-se, também, que o Plano Geral de Outorga de Serviços de Telecomunicações, disciplinado à época pelo Decreto nº 2.534/98, discriminou as modalidades do serviço telefônico fixo comutado, definindo serviço local como aquele destinado à comunicação entre pontos fixos determinados situados em uma mesma Área Local (art. 1º, § 2º, I, do Decreto nº 2.534/98): “o serviço local destina-se à comunicação entre pontos fixos determinados situados em uma mesma Área Local”.

- No caso, como bem observado pelo Ministério Público Federal, “além de haver continuidade urbana entre o distrito de Vila Marques e o Município de Aral Moreira/MS, situados num raio de menos de 10 km de distância, o primeiro trata-se de distrito pertencente ao segundo, encontrando-se, assim, subordinado administrativa e economicamente ao referido Município”.

- Como se vê, antes de se tratar de questão de natureza técnica e discricionária da empresa concessionária dos serviços de telefonia, o estabelecimento da cobrança de tarifa longa distância, para as ligações efetuadas entre as localidades, configurou, em realidade, violação a critérios objetivos estampados no Plano Geral de Outorga de Serviços de Telecomunicações e até mesmo em resoluções da própria ANATEL.

- Ainda que se tratasse de critério técnico, a relação entre os usuários e as empresas concessionárias de telefonia são regidas pelo Código de Defesa do Consumidor que, como todos sabem, combate práticas abusivas.

- Salienta-se, por oportuno, que é possível a análise, pelo Poder Judiciário, da legalidade dos atos da Administração Pública, bem como a observância, na atividade discricionária dos entes estatais, dos critérios e limites estabelecidos em lei.

- No tocante à devolução dos valores pagos, o Código de Defesa do Consumidor dispõe (art. 42, parágrafo único) que “o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”. Na hipótese, não há que se falar em engano justificável, haja vista tratar-se de conhecida empresa de telefonia, conhecedora das regras pertinentes ao setor.

- Nos termos do art. 22 da Resolução ANATEL nº 426/2005, vigente à época, a concessionária deveria manter, em seus arquivos, os dados referentes à prestação de telefonia pelo prazo mínimo de cinco anos.

- Apelação parcialmente provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação interposta pela OI S/A, nos termos do voto da Des. Fed. MÔNICA NOBRE (Relatora), com quem votaram o Des. Fed. MARCELO SARAIVA e o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.