Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Seção

AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5020463-18.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA

AUTOR: MARIA CELINA DO NASCIMENTO

Advogado do(a) AUTOR: ANA MARIA FRIAS PENHARBEL - SP272816-N

REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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3ª Seção
 

AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5020463-18.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA

AUTOR: MARIA CELINA DO NASCIMENTO

Advogado do(a) AUTOR: ANA MARIA FRIAS PENHARBEL - SP272816-N

REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

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R E L A T Ó R I O

 

O Senhor Desembargador Federal Newton De Lucca (Relator): Trata-se de ação rescisória proposta por Maria Celina do Nascimento em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, com fundamento no art. 966, incs. V e VIII, do CPC, visando desconstituir a sentença proferida nos autos do processo nº 1001309-78.2019.8.26.0582, que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade rural.

Alega que após o processamento da ação originária, foi designada audiência de instrução e julgamento, em modo virtual, com oitiva de testemunhas.

Acrescenta que, “conforme gravação realizada em audiência o MM. Juiz informou que, após expediente seria liberado a sentença do processo no mesmo dia, o qual a patrona aguardou a deliberação, pois até então não tinha notícia se seria procedente ou improcedente o pedido, pois não foi dado nenhuma decisão em audiência.” (doc. nº 183.095.533, p. 3).

Informa não ter ocorrido a disponibilização do termo, nem da sentença, de modo que a patrona da autora passou a acreditar que a decisão seria publicada no DJE.

Dias depois, porém, veio a saber que o pedido havia sido julgado improcedente, arquivando-se os autos.

Assevera que nunca houve publicação da sentença e que, no termo, constou que a mesma estaria disponível no sistema e-SAJ após a audiência, o que não ocorreu.

Entende ter havido cerceamento de defesa, pois tal situação ocasionou a perda do prazo recursal.

Destaca que a sentença não foi disponibilizada no dia da audiência, em 02/09/2020, tendo sido assinada pelo magistrado em 04/09/2020, às 11h26min.

Anota que, de acordo com os arts. 269, 270 e 272, do CPC, as intimações dos atos processuais devem ocorrer por meio eletrônico ou pela publicação no órgão oficial. Cita, ainda, o art. 1.003, caput e §1º, do CPC.

Entende que o processo originário contém erro formal, devendo ser rescindida a sentença que transitou em julgado, devolvendo-se o prazo recursal, nos termos do art. 283, do CPC. Afirma ter havido erro do Juízo a quo ao não abrir o prazo recursal, nem publicar a sentença de improcedência.

Requer a desconstituição do julgado, anulando-se os atos posteriores à sentença e devolvendo-se o prazo recursal ou, então, que seja deferido à autora, o benefício de aposentadoria por idade rural.

A petição inicial veio acompanhada de documentos (nºs 183.095.545 a 183.095.572).

Ordenada a emenda da inicial (doc. nº 193.121.028) e cumprida a determinação (doc. nº 199.434.326), foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.

Indeferida a tutela de urgência (doc. nº 221.560.232).

Citada, a ré apresentou contestação (doc. nº 254.387.854) alegando, preliminarmente, carência da ação, tendo em vista o caráter recursal da rescisória. Aduz não se encontrar caracterizada a hipótese de prova nova, uma vez que os documentos apresentados não atendem aos requisitos legais. Afasta, também, o erro de fato, por entender que a parte autora pretende apenas a rediscussão do quadro fático-probatório, uma vez que os fundamentos de fato e de direito foram objeto de controvérsia e pronunciamento judicial. Sustenta inexistir violação manifesta à norma jurídica, por não ter ocorrido interpretação aberrante da lei, destacando que o julgamento da causa se deu em conformidade com o conjunto probatório produzido.

Quanto ao juízo rescisório, alega não ter sido comprovado o exercício de atividade rural pelo período de carência (15 anos).

A autora se manifestou sobre a contestação (doc. nº 256.268.245).

Dispensada a produção de provas, apenas a autora apresentou razões finais (doc. nº 257.377.026).

É o breve relatório.

 

 


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V O T O

 

 

O Senhor Desembargador Federal Newton De Lucca (Relator): A matéria preliminar confunde-se com o mérito e com ele será analisada.

A parte autora fundamenta seu pedido no art. 966, incs. V e VIII, do CPC, que ora transcrevo:

 

"Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:

..............................................................................................

V - violar manifestamente norma jurídica;

..............................................................................................

VIII - for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.  

§ 1º Há erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado." 

 

Há violação manifesta à norma jurídica nas hipóteses em que a decisão rescindenda ofender frontalmente comando incontroverso estabelecido por norma da ordenação jurídica válida e vigente à época dos fatos.

Como bem destacou o E. Ministro Marco Buzzi, “O êxito do pedido rescisório, fundamentado na regra do artigo 966, V, do CPC/2015, depende da demonstração inequívoca de que a decisão rescindenda, no momento da aplicação do preceito normativo tido por violado, tenha transgredido sua essência, ou seja, sua literalidade, de modo evidente, direto e manifesto.” (AgInt nos EDcl na AR nº 5.853/MT, Segunda Seção, v.u., j. 13/02/19, DJe 01/03/19). 

No presente caso, merece acolhimento a alegação de ofensa à norma.

Com efeito, a gravação da audiência realizada em 02/09/2020 -- por meio do “link de acesso” que consta da sentença (doc. nº 183.095.572, p. 82) --, revela que, após a oitiva das testemunhas, a patrona da autora foi informada que, até o final do expediente, a sentença seria “liberada” juntamente com o termo. Outrossim, no trecho final do termo de audiência, consta o quanto segue (doc. nº 183.095.572, p. 84): “Saem os presentes intimados, que a sentença estará disponível no sistema SAJ após as audiências, sendo desnecessária à publicação.” (sic)

Entretanto, os registros relativos à emissão eletrônica da sentença demonstram que esta foi assinada digitalmente e liberada nos autos apenas em 04/09/2020, às 11h26min (doc. nº 183.095.572, p. 82/84), ou seja, 2 (dois) dias após a realização da audiência.

Outrossim, em 22/04/2021, foi certificado nos autos de Origem, o trânsito em julgado da sentença, ocorrido em 19/10/2020 (doc. nº 183.095.572, p. 85).

Desta forma, é perceptível a violação aos arts. 270 e 272, do CPC, que prescrevem que o advogado deverá ser intimado dos atos processuais, por meio eletrônico ou mediante publicação no órgão oficial.

Igualmente não foi observado o art. 1.003, §1º, do CPC, uma vez que a autora foi considerada intimada, sem que a sentença tenha sido proferida em audiência.

Procede, portanto, o pedido de desconstituição do julgado, devendo ser restituído o prazo recursal pertinente.

Registro que, no presente caso, por tratar-se de violação à lei de caráter processual, a procedência da rescisória esgota seus efeitos com a desconstituição da coisa julgada, não havendo juízo rescisório a ser examinado. Sobre o tema, reproduzo o escólio de José Carlos Barbosa Moreira:

 

"Após o julgamento de procedência no iudicium rescindens, que produz a invalidação da sentença, a regra é que, reaberto o litígio por esta julgado, caiba desde logo ao próprio tribunal emitir sobre ele novo pronunciamento, que de ordinário poderá favorecer ou não o autor vitorioso no iudicium rescindens. Em certas hipóteses, porém, não é assim que se passam as coisas. Com efeito, pode acontecer:

a) que a rescisão da sentença, por si só, esgote toda a atividade jurisdicional concebível - (...)

b) que, embora insuficiente a rescisão, o remédio adequado à correção do que erradamente se fizera não consista na imediata reapreciação da causa pelo próprio tribunal que rescinde a sentença, tornando-se necessária a remessa a outro órgão - v.g., quando tiver ocorrido incompetência absoluta (...); ou, ainda, quando a invalidade da sentença houver sido mera consequência de vício que afetara o processo anterior, de tal sorte que este precisará ser refeito, na medida em que aquele o haja comprometido (exemplos: a citação fora nula, sem convalidação; deixara de intimar-se o Ministério Público, apesar de obrigatória a sua intervenção)."

(in Comentários ao Código de Processo Civil, Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, vol. V: arts. 476 a 565, 15ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 207/208, grifos meus)

 

Por fim, destaco que a existência de violação à norma é motivo claro e suficiente para conduzir à rescisão do julgado, mostrando-se desnecessária a análise do erro de fato. Nesse sentido já decidiu essa E. Terceira Seção, conforme precedente abaixo transcrito, in verbis:

 

AÇÃO RESCISÓRIA. MATÉRIA PRELIMINAR. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PEDIDO RESCISÓRIO FUNDAMENTADO NOS INCISOS IV (VIOLAÇÃO A COISA JULGADA) E SUBSIDIARIAMENTE VI (PROVA FALSA) DO ARTIGO 485 DO CPC. AJUIZAMENTO DE AÇÕES IDÊNTICAS. AFRONTA À COISA JULGADA. RESCISÃO DO JULGADO NOS TERMOS DO ART. 485 IV DO CPC. EXTINÇÃO DA DEMANDA ORIGINÁRIA NOS TERMOS DO ART. 267 V DO CPC. PREJUDICADO O PLEITO DESCONSTITUTIVO ABALIZADO NO ART. 485 VI DO CPC.

I - A Autarquia Previdenciária é dispensada do depósito prévio previsto no art. 488, II, do Código de Processo Civil (ex vi legis, Súmula nº 175, do E. Superior Tribunal de Justiça) e, nos termos do artigo 24, da Lei nº 10.522/02, exonerada de autenticar as cópias reprográficas de quaisquer documentos que apresentem em juízo.

II - Ajuizamento de duas ações idênticas, objetivando a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural.

III - Ao considerar ser indispensável a existência de início de prova material para a valoração da prova testemunhal, o v. acórdão examinou o mérito do pedido deduzido judicialmente na primeira demanda e, como efeito, conferiu ao julgado uma decisão definitiva, formando assim, coisa julgada material.

IV - A Súmula 149 do E. STJ, ao defender que a "a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário", não impôs condição da ação e sequer pressuposto processual. Isso porque, a jurisprudência, emanada de Tribunais Superiores, como fonte formal do direito que é, não detém poder vinculante sobre os juízes inferiores, ao contrário, atua como um indicativo, um referencial apto a auxiliá-los no momento de sentenciar.

V - Tendo sido negado o benefício de aposentadoria por idade rural, nos autos de nº 341/93, o ajuizamento de uma segunda ação, autos de nº 691/97, com idêntico pedido e causa de pedir, caracteriza a intenção da ré, em obter um novo julgamento da ação anterior, utilizando-se deste segundo feito, como substitutivo da ação rescisória, não proposta em tempo hábil para rescindir o julgamento anteriormente mal instruído.

VI - Caracterizada ofensa a coisa julgada, não pode prosperar a pretensão formulada pela demandante no feito subjacente, impondo-se sua extinção, sem exame do mérito, com fulcro no artigo 267, V, do Código de Processo Civil.

VII - Cada um dos possíveis fundamentos da rescisória, enumerados no art. 485, é suficiente por si só para fundamentar o pedido desconstitutivo, de tal sorte que, encontrando-se o pedido rescisório embasado em mais de um inciso, haverá cumulação de ações, diversas e autônomas entre si, conexas pelas partes e pelo petitum. Admitido um dos fundamentos para rescisão, prejudicados estão os demais.

VIII - Acolhido o pedido rescisório com fundamento no art. 485, IV, do CPC, prejudicado está o pleito sob o prisma do inciso VI do mesmo dispositivo legal.

IX - Isenta de honorária, por ser beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita - artigo 5º inciso LXXIV da Constituição Federal (Precedentes: REsp 27821-SP, REsp 17065-SP, REsp 35777-SP, REsp 75688-SP, RE 313348-RS).

X - Matéria preliminar rejeitada. Procedência da ação rescisória. Ação originária extinta, sem exame do mérito, nos termos do art. 267, V, do CPC.

(AR 2001.03.00.005499-0/SP, Terceira Seção, Rel. Des. Fed. Walter do Amaral; Rel. p/ o Acórdão, Des. Federal Marianina Galante, j. em 25/06/09, por maioria, DJe de 29/09/09, grifos meus)

 

Ante o exposto, julgo procedente a rescisória para, com fundamento no art. 955, inc. V, do CPC, desconstituir a coisa julgada formada no processo originário, a fim de que seja restituído o prazo para a interposição dos recursos cabíveis contra a sentença. Arbitro os honorários advocatícios em R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais). Comunique-se o MM. Juiz a quo do inteiro teor deste.

É o meu voto.

 

Newton De Lucca

Desembargador Federal Relator



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. ART. 966, INCS. V E VIII, DO CPC. VIOLAÇÃO À NORMA. SENTENÇA. INTIMAÇÃO. INEXISTÊNCIA. INFRAÇÃO AOS ARTS. 270, 272 E 1.003, §1º, DO CPC. RESCISÃO DA COISA JULGADA PARA FINS DE DEVOLUÇÃO DO PRAZO RECURSAL. PROCEDÊNCIA DA RESCISÓRIA.

I- Há violação manifesta à norma jurídica nas hipóteses em que a decisão rescindenda ofender frontalmente comando incontroverso estabelecido por norma da ordenação jurídica válida e vigente à época dos fatos.

II- A gravação da audiência realizada em 02/09/2020 -- por meio do “link de acesso” que consta da sentença -- revela que, após a oitiva das testemunhas, a patrona da autora foi informada que, até o final do expediente, a sentença seria “liberada” juntamente com o termo. Outrossim, no trecho final do termo de audiência, consta o quanto segue: “Saem os presentes intimados, que a sentença estará disponível no sistema SAJ após as audiências, sendo desnecessária à publicação.”

III- Os registros relativos à emissão eletrônica da sentença demonstram que esta foi assinada digitalmente e liberada nos autos apenas em 04/09/2020, às 11h26min, ou seja, 2 (dois) dias após a realização da audiência.

IV- É perceptível a violação aos arts. 270 e 272, do CPC, que prescrevem que o advogado deverá ser intimado dos atos processuais, por meio eletrônico ou mediante publicação no órgão oficial. Igualmente não foi observado o art. 1.003, §1º, do CPC, uma vez que a autora foi considerada intimada sem que a sentença tenha sido proferida em audiência.

V- Por tratar-se de violação à lei de caráter processual, a procedência da rescisória esgota seus efeitos com a desconstituição da coisa julgada, não havendo juízo rescisório a ser examinado. Sobre o tema: MOREIRA, José Carlos Barbosa, Comentários ao Código de Processo Civil, Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, vol. V: arts. 476 a 565, 15ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 207/208.

VI- Rescisória procedente.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por unanimidade, decidiu julgar procedente a rescisória para, com fundamento no art. 955, inc. V, do CPC, desconstituir a coisa julgada formada no processo originário, a fim de que seja restituído o prazo para a interposição dos recursos cabíveis contra a sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.