Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Nº 0010464-67.2008.4.03.6181

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

RECORRENTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

RECORRIDO: WILLIAM CESAR PERES

Advogado do(a) RECORRIDO: JAIRO ARAUJO RODRIGUES DOS SANTOS - SP65835-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Nº 0010464-67.2008.4.03.6181

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

RECORRENTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

RECORRIDO: WILLIAM CESAR PERES

Advogado do(a) RECORRIDO: JAIRO ARAUJO RODRIGUES DOS SANTOS - SP65835-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra sentença terminativa (Id 256283025) que, após desclassificar a conduta apontada na denúncia para a tipificada pelo artigo 171, §3º, do Código Penal, declarou extinta a punibilidade de William Cesar Peres, com fundamento nos artigos 107, inciso IV, e 109, inciso III, e 110 (com redação anterior à Lei 12.234/2010), todos do Código Penal c.c. o artigo 61 do Código de Processo Penal.

A acusação, em razões recursais, requer a reforma da decisão (id. 256283027), pois as condutas descritas pela denúncia em desfavor de William Cesar enquadram-se no tipo do artigo 312 do Código Penal e, apesar deste crime ser crime próprio, no caso houve a efetiva colaboração do recorrido no peculato perpetrado pelo corréu Ary Coelho, funcionário da Caixa Econômica Federal, que facilitou o trâmite interno para a indevida liberação de valores depositados em contas vinculadas do Fundo de Garantia e Tempo de Serviços – FGTS

A defesa de William Cesar Peres ofereceu contrarrazões recursais (id. 256283031) e o  Juízo de primeiro grau manteve a decisão recorrida (id. 256283132).

A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo provimento do recurso em sentido estrito para que seja afastada a desclassificação para o crime de estelionato e, consequentemente, seja afastado o reconhecimento da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal (id. 257463498).

É o relatório.

Dispensada a revisão, a teor dos artigos 34 e 235, do Regimento Interno desta Corte Regional.

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Nº 0010464-67.2008.4.03.6181

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

RECORRENTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

 

RECORRIDO: WILLIAM CESAR PERES

Advogado do(a) RECORRIDO: JAIRO ARAUJO RODRIGUES DOS SANTOS - SP65835-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

O Ministério Público Federal, em sede recursal, insurge-se contra a sentença terminativa (Id 256283025), que, nos autos da Ação Penal n. 0010464-67.2008.4.03.6181/SP, após desclassificar a conduta delitiva atribuída a William Cesar Peres para aquela prevista pelo artigo 171, §3º, do Código Penal, extinguiu sua punibilidade, em razão da prescrição da pretensão punitiva estatal, em sua modalidade retroativa, relacionada à prática do delito previsto pelo artigo 171, §3º, do Código Penal, com fundamento nos artigos 107, inciso IV, e 109, inciso III, e 110 (com redação anterior à Lei 12.234/2010), todos do Código Penal, c. c. o artigo 61 do Código de Processo Penal (cfr. Id 256283027).

O recurso merece provimento.

Os elementos dos autos mostram-se suficientes para indicar que, em 05/08/2005, William Cesar Peres e Ary Coelho Campello foram denunciados como incursos nas penas previstas pelo artigo 312, caput e §1º, c. c. o artigo 29, ambos do Código Penal (Id 256282464, págs. 19/22).

Narra a denúncia que Ary Coelho Campello, em 01/12/1999, na Agência Sé da Caixa Econômica Federal, em São Paulo/SP, concorreu, valendo-se de facilidade que lhe proporcionava sua qualidade de funcionário da Caixa Econômica Federal, responsável pela liberação dos saques das contas vinculadas do Fundo de Garantia e Tempo de Serviços – FGTS, para que R$9.082,67 (nove mil e oitenta e dois reais e sessenta e sete centavos), depositados em conta vinculada pertencente a Noemias Camargo fossem indevidamente levantados por William Cesar Peres.

Relatou o Ministério Público Federal que referidos valores teriam sido sacados por William Cesar Peres, que, apresentando-se como advogado, supostamente inscrito na OAB/SP sob n. 60.932/SP, induzia em erro funcionários da Caixa Econômica Federal, para o fim de possibilitar indevidos levantamentos de valores depositados em contas vinculadas ao Fundo de Garantia e Tempo de Serviços – FGTS.

Acrescentou a acusação que a participação de William Cesar em referida prática delitiva estaria evidenciada, em razão de informações prestadas por funcionários da Caixa Econômica Federal que o identificaram como a pessoa que sacou já mencionado valor de conta vinculada do Fundo de Garantia e Tempo de Serviços – FGTS pertencente a Noemias Camargo. Enquanto que as informações obtidas administrativamente por aquela instituição financeira também dão conta de que Ary Coelho Campello foi o funcionário que, em conluio com William Cesar, participou da liberação de já mencionados valores.

De posse destes fatos, concluiu o órgão acusatório que Ary Coelho Campello e William Cesar Peres atuaram em conjunto, pois a ambos interessava a colaboração do outro na prática do crime – Ary Coelho desejaria que o saque fosse formalmente realizado por outra pessoa, ocultando sua participação no crime; enquanto William Cesar desejaria ter a colaboração de um funcionário da Caixa Econômica Federal, para lograr êxito em encobrir a prática delitiva por si perpetrada (sendo descoberta apenas a partir de suspeita levantada por Júlio Cezarotti, funcionário da CEF não envolvido com a fraude supracitada).

Com efeito, em razão de Ary Coelho Campello e William Cesar Peres desviarem e subtraírem valores públicos, de que Ary Coelho tinha a posse em razão do cargo público por ela ocupado, o Ministério Público Federal denunciou-os como incursos nas penas do artigo 312, caput e §1º, do Código Penal, c. c. o artigo 29 do mesmo diploma legal.

A denúncia foi recebida em 03/08/2007 (cfr. Id 256282465, págs. 104/105).

Em razão de William Cesar Peres, citado por edital, não comparecer à Audiência de Instrução e Julgamento aprazada para 11/03/2008, o Juízo de primeiro grau determinou, em 10/06/2008, a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional contra si (cfr. Id 256282465, pág. 150).

Remanescendo apenas Ary Coelho Campello no feito originário, houve sua condenação como incurso nas penas do artigo 312, §1º, do Código Penal, a 2 (dois) anos de reclusão (cfr. Id. 256283008).

Por sua vez, em razão da citação de William Cesar Peres verificada em 25/05/2021 (Id 256282480), deu-se início ao processamento do presente feito, com apresentação de defesa prévia (Id 256282989/991); audiência de instrução e julgamento (Id 256283013/018); apresentação de alegações finais pela acusação (Id 256283020) e memoriais por parte de sua defesa (Id 256283024).

Finda a instrução processual, ocorreu prolação de sentença, pela qual, Sua Excelência, após entender não ser possível reconhecer, no particular, a comunicabilidade da condição de funcionário público elementar do crime de peculato a William Cesar, desclassificou sua conduta para o crime previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal, e, por tal razão, concluiu pela extinção de sua punibilidade, quanto aos fatos apurados neste feito, com fundamento nos artigos 107, inciso IV, e 109, inciso III, e 110 (com redação anterior à Lei 12.234/2010), todos do Código Penal, e artigo 61 do Código de Processo Penal (Id 256283025).

Os elementos constantes dos autos mostram-se suficientes para indicar que a materialidade do delito previsto pelo artigo 312, caput e §1º, do Código Penal:

a) Boletim de Ocorrência n. 1989/2000, indicando que William Cesar Peres, técnico de contabilidade, portador do RG 11.367.957/SP, apresentava-se como advogado de causas trabalhistas, usando o nome de Wilson Cardoso Pereira e cartão de identidade de advogado n. 60.932 (Id 256282464, págs. 29/33, 164 e 240/241);

b) Alvará de levantamento em que autoriza Wilson Pereira, OAB 60.932, a proceder ao levantamento de todas as quantias que se encontram depositadas junto à Caixa Econômica Federal em contas inativas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, com os respectivos acréscimos legais, consignadas sob as referências numéricas 90821931565 e 90530736313 (cfr. Id 256282454, págs. 80 e 82);

c) auto de prisão em flagrante de Wilson Cardoso Pereira (Id 256282455, págs. 25, 29, 31, 37, 51, 53, 55, 58, 60 e 62);

d) Procedimento Administrativo de Apuração Sumária promovido pela Agência Sé da Caixa Econômica Federal n. 1/0021.00487/1999, em que indica que Ary Coelho Campello possui senha de liberação restrita, pela qual é autorizado a proceder liberação de valores superiores a R$5.000,00 (cinco mil reais), com o objetivo de alavancar a captação na área de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (Ids 256282453, pág. 88, 89, 90, 106, 112, 117, 126/127 e 131/132 e Id 256282454/463);

e)  comprovante de que não havia valores disponíveis para saque em conta vinculada de Fundo de Garantia e Tempo de Serviços – FGTS pertencente Noemias Camargo (Id 256282456, págs. 14, 15, 25/26 e 28; Id 256282459, pág. 12);

f) Processo administrativo promovido pela CEF, indicando as circunstâncias em que se deu a prisão em flagrante de William Cesar Peres (Id 256282457, págs. 160/161);

g) Extratos de lançamentos da conta vinculada de Fundo de Garantia e Tempo de Serviços – FGTS pertencente a Noemias Camargo (Id 256282458, págs. 64, 185/186, 191, 213/214, 230; Id 256282462, pág. 65);

h) valores levantados de contas vinculadas ao Fundo de Garantia e Tempo de Serviços – FGTS por Wilson Cardoso Pereira, em nome de Noemias Camargo (c/c 9.116910087-0; 9.120833480-3; 9.120659048-9), cfr. Id 256628458, págs. 230, 232/236, 238 e 242, e Id 256282459, pág. 12);

f) Ofício enviado pela OAB indicando que Wilson Pereira não está inscrito nos seus quadros e que o número de OAB 60.932 pertence à advogada Maria Cecília Labate Maiolini Rebello Pinho (Id 256282463, pág. 33).

Com efeito, tenho por suficientemente demonstrada a materialidade do delito atribuído pela denúncia a William Cesar Peres.

De outro giro, o Juízo de primeiro grau, ao proferir sentença (Id 256283026), a despeito de não reconhecer a participação delitiva de Ary Coelho Campello em conluio com William Cesar, nos autos originários (Acr 2005.61.81.000497-4) o condenou de Ary Coelho como incurso nas penas do artigo 171, §3º, do Código Penal, manifestando-se, naquela ocasião, na forma seguinte (Id 256282465, págs. 178/182):

0 réu foi denunciado por ter, valendo-se da qualidade de funcionário da Caixa Económica Federal, permitido saque do FGTS, que sabia ser fraudulento, realizado por WILLIAN, que na ocasião se fez passar por um advogado de nome WILSON CARDOSO PEREIRA.

Nos termos da denúncia o réu desviou recursos de que tinha a posse em razão do seu cargo reverto do correu Willian, que colaborou para que a empreitada criminosa permanecesse desconhecida.

A materialidade foi demonstrada.

Os valores do FGTS depositados em nome de NOEMAIS CAMARGO foram levantados de maneira fraudulenta, o que pode ser comprovado pela declaração do próprio Noemias impugnando o saque quando dele teve conhecimento (fis. 67).

(...)

A autoria do delito é certa e deve ser atribuída ao réu.

Ele confirmou ter sido o responsável pela liberação dos valores. Não havia, diga-se, como negar eis que a sua matrícula ficou registrada no sistema da Caixa. Em sua defesa, alegou, entretanto, que não havia como constatar a irregularidade. Evidentemente erros ocorrem em hipóteses semelhantes, principalmente se considerarmos a grande quantidade de pessoas atendidas na agência, conforme comprovado pelo procedimento administrativo. Também é verdade que algumas fraudes praticadas - falsificações nas assinaturas dos alvarás e termos de rescisão - podem não ser detectadas pelos funcionários das agências que não possuem treinamento específico para tanto.

Ocorre que nos fatos apurados houve uma sucessão de coincidências que não podem ser creditados ao acaso, mormente quando há a constatação de que o episódio não foi um fato isolado, como comprovou o procedimento administrativo.

Comprovam, assim a autoria, além do levantamento ter sido efetuado pelo réu conforme registro de sua matricula no sistema, os seguintes fatos: 1) os documentos relativos ao levantamento de NOEMIAS não foram encontrados nos arquivos da Caixa. A defesa argumenta (fls, 386, último parágrafo) que, nos termos dos depoimentos de servidores da Caixa, o sistema de guarda de documentos era frágil. Por mais frágil que fosse o sistema para a guarda dos documentos, todavia, seria improvável que, coincidentemente, houvesse o desaparecimento de vários documentos, todos relacionados a saques fraudulentos, efetuados pelo réu; 2) vários dos documentos desaparecidos e que estavam relacionados a levantamentos irregulares tiveram como procurador a mesma pessoa, WILSON CARDOSO PEREIRA, que na verdade é WILLIAN CESAR PERES, correu nesta ação. Ou seja, por várias vezes a mesma pessoa efetuou diversos saques com ARY sem que ele desconfiasse da veracidade dos documentos apresentados, documentos estes que nunca foram encontrados e 3) o Relatório de Apuração Sumária demonstra que ARY realizou outros saques irregulares, tendo sido inclusive preso em flagrante por um destes delitos.

Desta forma entendo que restou comprovado que o réu ARY COELHO CAMPELLO, previamente ajustado com WILIAN CÉSAR PERES efetuou saque irregular em conta de FGTS pertencente a NOEMIAS CAMARGO.

Embora o Parquet tenha capitulado o delito como peculato, entendo tratar-se de estelionato, com a causa de aumento prevista em seu do §3º,

Não se pode dizer que o caixa de um determinado banco tenha a posse de todo o dinheiro que nele se encontra. Também não houve, nos termos do § V do artigo 312, mera subtração de valores, mas obtenção de vantagem ilícita mediante fraude (alvarás, falsos ou inexistentes) o que caracteriza o delito de estelionato. 0 delito do § 1* teria ocorrido se o caixa tivesse subtraído os valores sem estar respaldado pelo documento fraudado, Nesse sentido a jurisprudência a seguir colacionada:

(...)

Posteriormente este posicionamento foi reformado por este Tribunal por ocasião do julgamento da Apelação Criminal n. 2005.61.81.000497-4, cujo acórdão cito a seguir:

PENAL. ESTELIONATO. RECLASSIFICAÇÃO JURÍDICA PARA PECULATO. ARTIGO 312, §1º, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMROVADAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. RECURSO DA ACUSAÇÃO PROVIDO EM PARTE. RECURSO DA DEFESA DESPROVIDO.

1. Materialidade e autoria comprovadas. A caracterização do delito de peculato-furto ocorre com a subtração do bem, valendo-se o agente da facilidade do emprego, cargo ou função. In casu, o réu na qualidade de funcionário da instituição bancária tinha o que a jurisprudência nomeia de disponibilidade jurídica do bem, in casu, dos valores depositados na conta vinculada do FGTS, e aproveitando-se da fragilidade dos controles sobre os procedimentos internos da instituição, realizou o levantamento indevido do montante de R$ 9.082,67 (nove mil, oitenta e dois reais e sessenta e sete centavos), em favor do comparsa, que se fazia passar por advogado.

2. Reclassificação jurídica dos fatos de estelionato qualificado para o delito de peculato. Réu condenado pelo crime previsto no artigo 312, §1º, do Código Penal, nos exatos termos da denúncia.

3. Dosimetria. Pena fixada no mínimo legal. Inexistência de condenações com o trânsito em julgado aptas a indicar a personalidade voltada para a prática delitiva e a má conduta social (Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça). Valor subtraído não permite recrudescimento da pena-base.

4. Recurso da acusação parcialmente provido e da defesa desprovido.

Com efeito, em razão destes elementos, penso encontrar-se suficientemente demonstrado, pelos elementos dos autos, conluio entre Ary Coelho Campello e William Cesar Peres, razão pela qual entendo ser possível a condenação de William Cesar, estranho aos quadros da administração, pelo cometimento do crime do art. 312 do CP, diante da ciência da condição elementar de funcionário público de Ary Coelho.

De fato, nos termos do que preconiza o artigo 29 do Código Penal,  quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade", nesse particular, aplica-se a chamada teoria unitária ou monista, adotada, em regra, pelo legislador.

Assim, conclui-se que todos os envolvidos em uma infração penal (unidade de crime) respondem por ele (pluralidade de agentes), levando-se em conta a culpabilidade de cada agente no momento da individualização da pena.  

Transpondo para teoria do domínio do fato, no sentido de que respondem criminalmente não apenas o autor intelectual do delito, mas aqueles que possuíam o domínio funcional do fato, que se caracteriza por uma atuação conjunta e coordenada baseada na divisão de tarefas, sendo que cada indivíduo possui um papel relevante para a realização do crime, agindo em colaboração recíproca e voluntária uns com os outros, não há como não imputar a William Cesar Peres a prática delitiva capitulada pelo artigo 312, caput e §1º, do Código Penal.

Assim, tendo-se em vista que os crimes atribuídos a William Cesar Peres ocorreram em 1º.12.1999 (Id 256282464, págs. 19/22), ou seja, em data anterior à vigência da Lei n. 12.234, de 05/05/2010, não se aplica ao particular o disposto no artigo 110, §1º, do Código Penal, que veda utilizar-se como termo inicial da prescrição data anterior à da denúncia.

Desta forma, considerando-se que a suspensão do curso do prazo prescricional determinada, em 10/06/2008, pelo Juízo sentenciante, com fundamento no artigo 366 do Código de Processo Penal, (Id 256282465, pág. 150), referido curso tornou seu curso em 29/06/2011, quando foi encontrado para receber sua citação (cfr. Id 256282465, pág. 183, e Id 256282480).

Nesse particular, considerando-se a pena máxima, em abstrato, atribuída ao delito de peculato (artigo 312, §1º, do Código Penal) corresponder a 12 (doze) anos, o prazo prescricional, a teor do disposto no artigo 109, II, do Código Penal, corresponderia a 16 (dezesseis) anos.

No entanto, em razão de William Cesar Peres, nascido em 1º de janeiro de 1950, possuir idade superior a 70 (setenta anos) anos, o prazo prescricional reduz-se à metade, perfazendo 8 (oito) anos (cfr. artigo 115 do Código Penal).

Considerando-se os marcos interruptivos da prescrição de que trata o artigo 117 do Código Penal, não há falar em prescrição da pretensão punitiva, dado que entre a data dos fatos (01/12/1999 – Id 256282464, págs. 19/22) e o recebimento da denúncia (em 03/08/2007 – Id 256282465, págs. 104/105), não se operou prazo superior a 8 (oito) anos, tampouco verificou-se referido prazo, entre ao recebimento da denúncia e aquele em que se deu a suspensão do prazo prescricional (10/06/2008 – Id 256282465, pág. 150), ocasião em que decorreu interregno de 10 meses e 8 dias.

Retornando o curso do prazo prescricional pelo período faltante (artigo 366 do Código de Processo Penal), considera-se o tempo remanescente de sete anos, dois meses e vinte e dois dias.

Desta forma, verifica-se que entre o retorno do decurso do prazo prescricional (em 20/05/2021 – cfr. Id 256282465, pág. 183, e Id 256282480) e a presente data, transcorreu prazo pouco superior a 1 (um) ano.

Com efeito, tendo-se em vista a idade do acusado (superior a 70 anos) e o fato de entre os marcos interruptivos da prescrição de que trata o artigo 117 do Código Penal operar-se prazo inferior a sete anos, dois meses e vinte e dois dias anos, não há falar em extinção da punibilidade de William Cesar Peres, pois não ocorreu a prescrição da pretensão punitiva estatal.

Por estes fundamentos, dou provimento ao recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal para atribuir aos fatos imputados a William Cesar Peres a capitulação do tipo do artigo 312, §1º, do Código Penal e determino o retorno ao juízo de origem para regular prosseguimento.

É o voto.

 



E M E N T A

 

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL.  RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PECULATO-FURTO. CONCURSO DE AGENTES. COAUTORIA. AUTOR INTELECTUAL. DOMÍNIO FUNCIONAL DO FATO. ARTIGO 29 DO CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL. 

1. Pela teoria do domínio do fato respondem criminalmente não apenas o autor intelectual do delito, mas todos que possuíam o domínio funcional, caracterizado por uma atuação conjunta e coordenada baseada na divisão de tarefas.

2. No crime de peculato, é possível a condenação de agente estranho aos quadros da administração, quando ciente da condição elementar de funcionário público do comparsa.

3. Recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal provido. 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por unanimidade, decidiu, dar provimento ao recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal para atribuir aos fatos imputados a William Cesar Peres a capitulação do tipo do artigo 312, §1º, do Código Penal e determinar o retorno ao juízo de origem para regular prosseguimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.