APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003186-69.2005.4.03.6100
RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MAIRAN MAIA
APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE FARMACIA DO ESTADO DE SAO PAULO
APELADO: EDSON MATRICARDI
Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE SILVA OLIVEIRA - SP184308-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003186-69.2005.4.03.6100 RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MAIRAN MAIA APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE FARMACIA DO ESTADO DE SAO PAULO APELADO: EDSON MATRICARDI Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE SILVA OLIVEIRA - SP184308-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Cuida-se de embargos de declaração opostos pelo CRF/SP, por meio dos quais se pretende seja sanada omissão havida no acórdão, no atinente à possibilidade do técnico em farmácia assumir responsabilidade técnica por drogaria tão somente até a entrada em vigor da Lei 13.021/2014, por se tratar de relação jurídica de trato continuado. O acórdão está assim ementado: PROCESSUAL CIVIL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. TÉCNICO EM FARMÁCIA. RESPONSABILIDADE POR DROGARIA. VIGÊNCIA DA LEI N° 3.820/60. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL. INSCRIÇÃO NO CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. I. Instado o incidente de retratação em face do v. acórdão recorrido, por encontra-se em dissonância com o entendimento consolidado pelo C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n° 1.243.994/MG - TEMA 727. 2. Consoante entendimento proferido pelo C. STJ no julgamento do REsp repetitivo n° 1.243.994: "É facultado aos técnicos de farmácia, regularmente inscritos no Conselho Regional de Farmácia, a assunção de responsabilidade técnica por drogaria, independentemente do preenchimento dos requisitos previstos nos arts. 15, § 3 0 , da Lei 5.991/73, c/c o art. 28 do Decreto 74.170/74, entendimento que deve ser aplicado até a entrada em vigor da Lei n. 13.021/2014". 3. Embora a Lei n° 13.021/2014, aprovada em 08 de agosto de 2014 e vigente desde 22 de setembro de 2014, tenha estabelecido em seu art. 5°, que apenas farmacêuticos habilitados na forma da lei poderão atuar como responsáveis técnicos por farmácias de qualquer natureza, seja com manipulação de fórmulas, seja drogaria, verifica-se dos presentes autos, que o autor efetuou seu requerimento na vigência da Lei n° 3.820/60 e n° 5.991/73 que asseguravam, como única exigência, que as farmácias e drogarias funcionariam sob responsabilidade de profissional inscrito no Conselho Regional de Farmácia. 4. Verifica-se que à época da impetração do presente mandamus, o impetrante encontrava-se registrado de forma provisória no competente órgão de classe, cujo registro é fundado em sentença que julgou procedente o pedido do autor nos autos da ação declaratória n° 2003.61.00.008016-2, que declarou seu direito à inscrição profissional no quadro de não-farmacêuticos (técnico em farmácia). 5. Tendo o impetrante requerido o direito à assunção da responsabilidade técnica para a drogaria, anteriormente à vigência da Lei n° 13.021/2014, é de rigor a procedência do seu pedido. 6. Juizo de retratação exercido, nos termos do Recurso Especial n° 1.243.994/MG - TEMA 727, para negar provimento à remessa oficial e à apelação do Conselho Regional de Farmácia, mantendo a r. sentença que julgou procedente o pedido do impetrante. Aos embargos opostos foi apresentada resposta. É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003186-69.2005.4.03.6100 RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MAIRAN MAIA APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE FARMACIA DO ESTADO DE SAO PAULO APELADO: EDSON MATRICARDI Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE SILVA OLIVEIRA - SP184308-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Conforme previsto no artigo 1.022 do CPC, consistem os embargos de declaração em instrumento processual utilizado para eliminar do julgamento obscuridade ou contradição, ou para suprir omissão sobre tema cujo pronunciamento se impunha. Depreende-se, pois, que, como regra, os embargos de declaração possuem caráter integrativo e não modificativo. A nova decisão integra-se à decisão embargada de molde a resultar uma só decisão ou um só julgado. No entanto, a doutrina e a jurisprudência admitem a atribuição de efeitos infringentes aos embargos de declaração em hipóteses excepcionais, em que, sanada obscuridade, contradição ou omissão, seja modificada a decisão embargada. In casu, os embargos merecem acolhimento. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.021, de 08 de agosto de 2014, versando sobre o exercício e a fiscalização de atividades farmacêuticas, a responsabilização técnica por farmácias de manipulação e drogarias ficou a cargo exclusivo do farmacêutico habilitado na forma da lei, sendo vedado ao profissional de nível médio exercer tal mister. Leiam-se os arts. 3º, 5º e 6º do dispositivo legal, por imprescindíveis ao deslinde do feito: Art. 3º Farmácia é uma unidade de prestação de serviços destinada a prestar assistência farmacêutica, assistência à saúde e orientação sanitária individual e coletiva, na qual se processe a manipulação e/ou dispensação de medicamentos magistrais, oficinais, farmacopeicos ou industrializados, cosméticos, insumos farmacêuticos, produtos farmacêuticos e correlatos. Insta consignar não ter a lei em comento discriminado hipóteses nas quais, excepcionalmente, seria permitida a prestação de assistência farmacêutica e assegurada a responsabilização técnica por drogarias e farmácias ao profissional de nível médio. Ao contrário, a lei é clara ao conferir o exercício da função exclusivamente ao farmacêutico graduado na forma da lei. Nessa senda, foi firmado entendimento no C. STJ, ao julgar o REsp 1.243.994/MG, representativo de controvérsia, quanto à limitação temporal aos profissionais diversos do farmacêutico para responderem por farmácias e drogarias, qual seja, a entrada em vigor da Lei nº 13.021/2014. Confira-se a íntegra da Ementa proferida na Corte Especial: "PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ N. 8/2008. POSSIBILIDADE DE TÉCNICO EM FARMÁCIA, INSCRITO NO RESPECTIVO CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA, ASSUMIR A RESPONSABILIDADE TÉCNICA POR DROGARIA. RECONHECIMENTO, INDEPENDENTEMENTE DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PREVISTOS NOS ARTS. 15, § 3º, DA LEI 5.991/73, C/C O ART. 28 DO DECRETO 74.170/74, ATÉ A ENTRADA EM VIGOR DA LEI 13.021/2014. Assim, quer ao oficial, quer ao técnico ou prático de farmácia, profissionais de nível médio, é vedado assumir responsabilidade técnica por drogarias e farmácias, a partir da novel legislação.
Parágrafo único. As farmácias serão classificadas segundo sua natureza como:
I - farmácia sem manipulação ou drogaria: estabelecimento de dispensação e comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos em suas embalagens originais;
II - farmácia com manipulação: estabelecimento de manipulação de fórmulas magistrais e oficinais, de comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, compreendendo o de dispensação e o de atendimento privativo de unidade hospitalar ou de qualquer outra equivalente de assistência médica.
Art. 5º No âmbito da assistência farmacêutica, as farmácias de qualquer natureza requerem, obrigatoriamente, para seu funcionamento, a responsabilidade e a assistência técnica de farmacêutico habilitado na forma da lei.
Art. 6º Para o funcionamento das farmácias de qualquer natureza, exigem-se a autorização e o licenciamento da autoridade competente, além das seguintes condições:
I - ter a presença de farmacêutico durante todo o horário de funcionamento;
II - ter localização conveniente, sob o aspecto sanitário;
III - dispor de equipamentos necessários à conservação adequada de imunobiológicos;
IV - contar com equipamentos e acessórios que satisfaçam aos requisitos técnicos estabelecidos pela vigilância sanitária.
1. A Lei n. 13.021, de 8 de agosto de 2014, no seu art. 5º, estabeleceu que apenas farmacêuticos habilitados na forma da lei poderão atuar como responsáveis técnicos por farmácias de qualquer natureza, seja com manipulação de fórmulas, seja drogaria.
2. A par disso, permanece a importância de se pacificar o entendimento a ser aplicado nos casos regidos pelas normas anteriores. A relevância prática da definição do posicionamento a ser seguido é percebida notadamente naquelas hipóteses que envolvam cobrança de multa de drogaria por haver admitido a atuação de técnicos em farmácia no mister de responsáveis técnicos.
3. Assim, para efeitos de aplicação do disposto no art. 543-C do CPC, firma-se a compreensão no seguinte sentido: É facultado aos técnicos de farmácia, regularmente inscritos no Conselho Regional de Farmácia, a assunção de responsabilidade técnica por drogaria, independentemente do preenchimento dos requisitos previstos nos arts. 15, § 3º, da Lei 5.991/73, c/c o art. 28 do Decreto 74.170/74, entendimento que deve ser aplicado até a entrada em vigor da Lei n. 13.021/2014.
4. No caso concreto, o pedido veiculado no recurso especial foi a concessão ao recorrente do direito de assunção de responsabilidade técnica por drogaria. Assim, levando em conta que, desde a edição da Lei 13.021/2014, não é mais possível a emissão de Certificado de Responsabilidade Técnica por drogaria à técnico de farmácia, há de ser julgado improcedente o pleito.
5. Recurso especial a que se nega provimento. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução/STJ n. 8/2008."
(REsp 1.243.994 / MG, Relator Ministro OG FERNANDES, Primeira Seção, j. 14/06/2017, DJe 19/09/2017)
Mister ressaltar ter sido reconhecida a constitucionalidade dos artigos acima, em sede de repercussão geral, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 1.156.197/DF (Tema 1049), de Relatoria do Ministro Marco Aurélio):
“DROGARIA – TÉCNICO EM FARMÁCIA – RESPONSABILIDADE – IMPOSSIBILIDADE – LEI Nº 13.021/2014 – CONSTITUCIONALIDADE.
Surgem constitucionais os artigos 5º e 6º, inciso I, da Lei nº 13.021/2014, no que previsto ser do farmacêutico a responsabilidade técnica por drogaria – Considerações.”
Por conseguinte, acolho os embargos de declaração com efeitos modificativos, a fim de limitar a possibilidade de o impetrante assumir a responsabilidade técnica por farmácias e drogarias até a data de entrada em vigor da Lei nº 13.021/2014.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO PRESENTE. ACOLHIMENTO COM EFEITOS INFRINGENTES.
1. Os embargos de declaração visam à correção de obscuridade, contradição, omissão ou erro material (art. 1.022 do CPC). Doutrina e jurisprudência admitem a atribuição de efeitos infringentes aos embargos de declaração em hipóteses excepcionais, em que, sanado o vício, seja modificada a decisão embargada.
2. Firmado entendimento no C. STJ, ao julgar o REsp 1.243.994/MG, representativo de controvérsia, quanto à limitação temporal aos profissionais diversos do farmacêutico para responderem por farmácias e drogarias, qual seja, a entrada em vigor da Lei nº 13.021/2014. Omissão presente na espécie.
3. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos, para sanar a omissão constatada, de sorte a limitar a possibilidade de o impetrante assumir a responsabilidade técnica por farmácias e drogarias até a data de entrada em vigor da Lei nº 13.021/2014.