AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5018923-95.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
AGRAVANTE: RODRIGO MOURA SILVA
Advogado do(a) AGRAVANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A
AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5018923-95.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AGRAVANTE: RODRIGO MOURA SILVA Advogado do(a) AGRAVANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de agravo de instrumento, sem pedido de efeito suspensivo, interposto em face de decisão proferida pelo Juízo da 4ª Vara Federal de Campinas que indeferiu o pedido de tutela de urgência consistente na determinação de suspensão da tramitação do PAD nº 04/2021 – SR/PF/SP. Sustenta o agravante que, nos autos do PAD em tela, foram colacionados dados extraídos de seu celular (que havia sido apreendido judicialmente) que não se relacionam com o objeto inicial do processo. Alega que, em razão disso, foi realizado indevido aditamento do PAD com inserção de nova acusação totalmente alheia à investigação inicial. Sustenta que, sendo a nova acusação referente ao consumo de drogas ilícitas, deveria haver prévio laudo de constatação da natureza da substância. Por fim, alega que houve indevida violação de sua intimidade com o devassamento de aplicativo de mensagens. Houve apresentação de contrarrazões e parecer do Ministério Público. É o breve relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5018923-95.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AGRAVANTE: RODRIGO MOURA SILVA Advogado do(a) AGRAVANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Versa o caso dos autos sobre a possibilidade de aditamento de PAD em razão do encontro fortuito de indícios de nova infração funcional, não elencada na portaria inicial. O processo disciplinar no âmbito da Polícia Federal é disciplinado pela Lei nº 4.878/1965, em seus artigos 52 a 57, dispondo sobre sua instauração, comissão processante, garantia de contraditório e ampla defesa do investigado, responsabilidades, dentre outras disposições. Já a Instrução Normativa nº 76/2013 – DG/DPF detalha os procedimentos disciplinares no âmbito da Polícia Federal e, quanto à instauração do procedimento de rito ordinário, dispõe (grifei): Art. 112. O processo administrativo disciplinar desenvolve-se nas seguintes fases: I – instauração, com a publicação de extrato da portaria instauradora; II – inquérito administrativo, que compreende instrução, defesa e relatório; e III – julgamento. Art. 113. A portaria inaugural conterá a exposição do fato a ser apurado, com todas as suas circunstâncias até então conhecidas, o número do protocolo do expediente, a qualificação do acusado e a classificação provisória da infração. Art. 114. É obrigatório o aditamento da portaria quando necessário: I – modificar a narração do fato imputado ao acusado; II – incluir fatos novos conexos com os anteriores; e III – incluir outros acusados. § 1º A comissão processante proporá à autoridade instauradora, fundamentadamente, o aditamento da portaria. § 2º A autoridade instauradora decidirá, motivadamente, pelo aditamento ou, se mais conveniente, pela instauração de outro processo disciplinar. (...) Art. 118. Para instruir o processo, a comissão realizará as diligências que forem necessárias, utilizando-se de todos os meios de prova admitidos em direito, inclusive o emprego de provas emprestadas e de informações fiscais e bancárias, atentando-se aos casos de necessidade de autorização judicial. § 1º Na hipótese de depoimentos, declarações e interrogatórios divergentes, poderá ser realizada acareação, a critério da comissão. § 2º As informações protegidas por sigilo deverão ser autuadas em apartado, separadamente para cada um dos investigados, e apensadas aos autos. Do que se depreende dos artigos 52 a 57 da Lei nº 4.878/1965 e dos artigos 114, II e 118 da Instrução Normativa nº 76/2013 – DG/DPF, que regem o processo disciplinar no âmbito da Polícia Federa, é possível o uso, na apuração disciplinar, de todas as provas admitidas em direito, mesmo que haja eventual necessidade de autorização judicial nos casos legalmente exigidos. Também se depreende que, em sendo encontrados indícios de novos fatos conexos àquele inicialmente investigado, pode haver aditamento da portaria instauradora, ficando a critério da autoridade competente decidir (com a devida motivação) se prosseguirá com a apuração nos mesmos autos ou se haverá instauração de novo processo. A legitimidade do encontro fortuito de elementos que demonstrem o cometimento de outras irregularidades não vislumbradas inicialmente, desde que com lastro em regular ordem judicial autorizadora, é plenamente aceita pela jurisprudência pátria, independentemente de nexo de causalidade com a conduta que ensejou a diligência investigatória. Nesse sentido, confiram-se os julgados do e. STF: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. INSTAURAÇÃO. PERÍODO ANTERIOR À EC 61/2009. SESSÃO PRESIDIDA POR CONSELHEIRO NÃO INTEGRANTE DO STF. LEGITIMIDADE À ÉPOCA. COMPETÊNCIA DO CNJ. NÃO SUBSIDIARIEDADE. DESNECESSIDADE DE PRÉVIA SINDICÂNCIA NO ÂMBITO DO TRIBUNAL LOCAL. DILIGÊNCIAS SUFICIENTES. INVESTIGAÇÃO NA ESFERA CRIMINAL. ENCONTRO FORTUITO DE PROVAS. UTILIZAÇÃO EM PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. POSSIBILIDADE. INFRINGÊNCIA À PRERROGATIVA DE FORO. AUSÊNCIA. DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA. APROVEITAMENTO DE PROVAS. LEGITIMIDADE. OMISSÃO. CONTRADIÇÃO. INOCORRÊNCIA. CARÁTER MERAMENTE INFRINGENTE. DECLARATÓRIOS OPOSTOS SOB A VIGÊNCIA DO CPC/1973. 1. Inexistente descompasso lógico entre os fundamentos adotados e a conclusão do julgado, a afastar a tese veiculada nos embargos declaratórios de que contraditório o decisum. 2. Não se prestam os embargos de declaração, não obstante sua vocação democrática e a finalidade precípua de aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, para o reexame das questões de fato e de direito já apreciadas no acórdão embargado. 3. Ausente contradição e omissão justificadoras da oposição de embargos declaratórios, nos termos do art. 535 do CPC de 1973, a evidenciar o caráter meramente infringente da insurgência. 4. Embargos de declaração rejeitados. (MS 28003 ED, Relator(a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-020 DIVULG 02-02-2018 PUBLIC 05-02-2018) Ementa: PROCESSO PENAL E CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL. INQUÉRITO POLICIAL. DECISÃO JUDICIAL. PRECLUSÃO LÓGICA E CONSUMATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. NATUREZA INQUISTIVA DO PROCEDIMENTO. PRECEDENTES. NULIDADE DAS PROVAS. INEXISTÊNCIA. ENCONTRO FORTUITO DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I – Não se opera preclusão lógica e consumativa de decisão judicial no âmbito do inquérito policial, uma vez que este possui natureza inquisitiva, e não litigiosa. II – O encontro fortuito de provas não induz a sua nulidade, desde que licitamente obtidas. III – A cooperação entre órgãos públicos afigura-se legítima, e até mesmo recomendável, quando há proteção de um mesmo bem jurídico, a lisura no trato da coisa pública. IV – A demonstração de prejuízo, de acordo com o art. 563 do CPP, é essencial à alegação de nulidade, seja ela relativa ou absoluta. V – Agravo regimental a que se nega provimento. (Pet 7794, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 30/10/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-238 DIVULG 08-11-2018 PUBLIC 09-11-2018) No caso dos autos, o agravante teve contra si instaurado o PAD nº 04/2021 – SR/PF/SP para apurar o cometimento de infrações disciplinares descritas no PARECER Nº 21788488/2022-NUDIS/COR/SR/PF/SP, a saber, ter repassado informações sigilosas de inquéritos policiais a investigados, orientado investigados e testemunhas na prestação de depoimentos, repassado fotos e informações sigilosos a terceiros, fraudado documento em inquérito policial, mantido contato pessoal com investigados, dentre outras condutas. Por determinação judicial proferida nos autos do processo criminal nº 5006200-96.2021.403.6105, em trâmite na 1ª Vara Federal Criminal de Campinas/SP, o aparelho celular do agravante foi apreendido e, na averiguação feita pela polícia, foram localizadas trocas de mensagens que demonstravam indícios de novas irregularidades, consistentes na aquisição e uso de drogas ilícitas. Frise-se que o agravante não se insurge contra a apreensão de aparelho celular, reputando-a legal. Insurge-se contra o uso das informações nele encontradas, alegando não terem conexão com os fatos apurados no PAD. Tendo sido a apreensão do aparelho licitamente determinada judicialmente, em autos de processo criminal, não há se falar em ilegal violação de sua intimidade ou de ser indevida a apuração das informações encontradas não diretamente relacionadas ao fato inicial investigado. Com efeito, no exercício de sua função pública e diante de indícios do cometimento de irregularidades, é dever do agente público noticiá-las para devida apuração, tal qual determina o art. 52 da Lei nº 4.878/1965. Quanto ao aditamento do PAD já em andamento, não há qualquer óbice nos textos normativos que regem a matéria, sendo tal medida inclusive prevista no art. 114 da IN nº 076/2013-DG/DPF. A alegação do agravante da necessidade de laudo toxicológico para confirmar a natureza das substâncias cujo consumo a ele são atribuídas não pode ser acolhida. Ressalte-se que, no caso dos autos, se está diante de processo administrativo disciplinar que busca justamente averiguar o eventual cometimento de conduta incompatível com a função pública, descrita como transgressão disciplinar no art. 43 da Lei nº 4.878/1965, e não processo criminal no qual são imputadas condutas criminosas ao agravante. Nos termos dos textos normativos e da jurisprudência dominante, é plenamente possível a utilização de elementos encontrados fortuitamente em processo administrativo disciplinar, desde que respaldados em ato regular e judicialmente autorizado. Também não é vedado o aditamento de portaria inicial de PAD para incluir novos fatos a serem apurados, daí porque não se mostra presente qualquer ilegalidade apta a ensejar a suspensão do processo administrativo em tela. Por fim, anoto que eventuais outros argumentos trazidos nos autos ficam superados e não são suficientes para modificar a conclusão baseada nos fundamentos ora expostos. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento. É como voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. POLÍCIA FEDERAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. ADITAMENTO. ENCONTRO FORTUITO DE PROVAS. POSSIBILIDADE.
- Em vista dos artigos 52 a 57 da Lei nº 4.878/1965 e dos artigos 114, II e 118 da Instrução Normativa nº 76/2013 – DG/DPF, que regem o processo disciplinar no âmbito da Polícia Federal, é possível o uso, na apuração disciplinar, de todas as provas admitidas em direito, mesmo que haja eventual necessidade de autorização judicial nos casos legalmente exigidos. Também se depreende que, em sendo encontrados indícios de novos fatos conexos àquele inicialmente investigado, pode haver aditamento da portaria instauradora, ficando a critério da autoridade competente decidir (com a devida motivação) se prosseguirá com a apuração nos mesmos autos ou se haverá instauração de novo processo.
- A legitimidade do encontro fortuito de elementos que demonstrem o cometimento de outras irregularidades não vislumbradas inicialmente, desde que com lastro em regular ordem judicial autorizadora, é plenamente aceita pela jurisprudência pátria, independentemente de nexo de causalidade com a conduta que ensejou a diligência investigatória.
- No caso dos autos, o agravante responde a processo administrativo disciplinar e, judicialmente, em autos de processo criminal, foi determinada a apreensão de seu celular. No aparelho foram encontrados, fortuitamente, indícios de cometimento de infrações disciplinares não inicialmente vislumbradas pelas autoridades, razão pela qual o PAD foi aditado para apurar também esses fatos.
- Tendo sido a apreensão do aparelho licitamente determinada judicialmente, em autos de processo criminal, não há se falar em ilegal violação de sua intimidade ou de ser indevido a apuração das informações encontradas não diretamente relacionadas ao fato inicial investigado. Com efeito, no exercício de sua função pública e diante de indícios do cometimento de irregularidades, é dever do agente público noticiá-las para devida apuração, tal qual determina o art. 52 da Lei nº 4.878/1965.
- Agravo de instrumento desprovido.