Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0006852-14.2015.4.03.6105

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: COMERCIO DE COSMETICOS BELLEZA CUERPO LTDA

Advogado do(a) APELADO: MARISTELA ANTONIA DA SILVA - SP260447-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0006852-14.2015.4.03.6105

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: COMERCIO DE COSMETICOS BELLEZA CUERPO LTDA

Advogado do(a) APELADO: MARISTELA ANTONIA DA SILVA - SP260447-A

OUTROS PARTICIPANTES:

[ialima] 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Remessa oficial e apelação interposta pela União contra sentença que, em sede de mandado de segurança, concedeu a ordem para declarar a inexigibilidade do recolhimento do IPI sobre a revenda de produtos cosméticos e de perfumaria por comerciante atacadista, como estabelecido pelo Decreto n° 8.393/2015 (Id 122739988, p. 82/85).

 

Aduz (Id 122739988, p. 92/104) que:

 

a) de acordo com os artigos 46 e 51 do Código Tributário Nacional, 4º, inciso I, da Lei n.º 4.502/64, 2º, 9º e 35, do Decreto n.º 7.212/10, bem como da Lei n.º 7.798/89, com as alterações do Decreto n.º 8.393/2015, o IPI é devido nas operações de saída (comercialização) dos bens do estabelecimento;

 

b) na condição de equiparada a estabelecimento industrial, o importador de produtos de procedência estrangeira que der saída a esses produtos (artigo 40, inciso I, da Lei n° 4.302/64) fica obrigado ao pagamento do IPI em dois momentos distintos, quais sejam, desembaraço aduaneiro e saída do estabelecimento;

 

c) não há bis in idem na exigência do tributo, pois cuida de hipóteses de incidência distintas, uma verificada no desembaraço da mercadoria e outra na saída do produto do estabelecimento comercial;

 

c) a incidência do IPI não recai sobre a industrialização, mas sobre produtos industrializados, nacionais ou importados, cuja definição legal dos fatos geradores abarcam o desembaraço aduaneiro de produto de procedência estrangeira, bem como a saída de produto do estabelecimento equiparado a industrial.

 

Em contrarrazões (Id 122739988, p. 108/118), a apelada requer a manutenção da sentença.

 

O parecer ministerial é no sentido de que seja desprovida a apelação (Id 122739988, p. 121/124)

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0006852-14.2015.4.03.6105

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: COMERCIO DE COSMETICOS BELLEZA CUERPO LTDA

Advogado do(a) APELADO: MARISTELA ANTONIA DA SILVA - SP260447-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

V O T O

 

I - Dos fatos

 

Mandado de segurança impetrado por Comércio de Cosméticos Belleza Cuerpo Ltda. contra ato praticado pelo Delegado da Receita Federal em Campinas/SP, com vista à declaração de inexigibilidade do recolhimento do IPI sobre a revenda de produtos cosméticos e de perfumaria por comerciante atacadista, como estabelecido pelo Decreto n° 8.393/2015.

 

II – Da aplicação da lei processual

 

Inicialmente, ressalta-se que sentença recorrida foi proferida em 08.09.2015 (Id 122739988, p. 85), razão pela qual, aplicada a regra do tempus regit actum, segundo a qual os atos jurídicos se regem pela lei vigente à época em que ocorreram, o recurso será analisado à luz do Diploma Processual Civil de 1973 (Enunciados Administrativos n.º 01 e 03/2016, do STJ).

 

III - Da incidência do IPI

 

Cinge-se a questão à análise da legalidade do Decreto n.º 8.393/2015, que ampliou a relação de itens do Anexo III da Lei n.º 7.798/89, com o acréscimo de artigos de perfumaria, toucador, higiene pessoal e beleza e, por consequência, equiparou à condição de industrial (contribuinte) os estabelecimentos atacadistas desses produtos.

 

Sobre o IPI o artigo 153, inciso IV, da Constituição dispõe:

 

Art. 153 – Compete a União instituir impostos sobre:

(...)

IV – produtos industrializados

(...)

§ 1º É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.

 

Por sua vez, coube ao Código Tributário Nacional, na forma do artigo e 146, inciso III, alíneas “a” e “b”, da CF, estabelecer a hipótese de incidência do tributo, bem como os elementos que a constituem, com destaque para o aspecto temporal e o contribuinte do imposto:

 

Art. 46. O imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados tem como fato gerador:

I - o seu desembaraço aduaneiro, quando de procedência estrangeira;

II - a sua saída dos estabelecimentos a que se refere o parágrafo único do artigo 51;

III - a sua arrematação, quando apreendido ou abandonado e levado a leilão.

Parágrafo único. Para os efeitos deste imposto, considera-se industrializado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo.

 

Art. 51. Contribuinte do imposto é:

I - o importador ou quem a lei a ele equiparar;

II - o industrial ou quem a lei a ele equiparar;

III - o comerciante de produtos sujeitos ao imposto, que os forneça aos contribuintes definidos no inciso anterior;

IV - o arrematante de produtos apreendidos ou abandonados, levados a leilão.

Parágrafo único. Para os efeitos deste imposto, considera-se contribuinte autônomo qualquer estabelecimento de importador, industrial, comerciante ou arrematante.

[destaquei]

 

Por sua vez, a Lei n.º 7.798/89, que trata da cobrança do tributo, determina em seus artigos 7º e 8º que:

 

Art. 7º. Equiparam-se a estabelecimento industrial os estabelecimentos atacadistas que adquirirem os produtos relacionados no Anexo III, de estabelecimentos industriais ou dos seguintes estabelecimentos equiparados a industrial:

I - estabelecimentos importadores de produtos de procedência estrangeira;

II - filiais e demais estabelecimentos que exerçam o comércio de produtos importados ou industrializados por outro estabelecimento da mesma firma;

III - estabelecimentos comerciais de produtos cuja industrialização haja sido realizada por outro estabelecimento da mesma firma ou de terceiros, mediante a remessa, por eles efetuadas, de matérias-primas, produtos intermediários, embalagens, recipientes, moldes, matrizes ou modelos; e

IV - estabelecimentos comerciais de produtos do capítulo 22 da TIPI, cuja industrialização tenha sido encomendada a estabelecimento industrial, sob marca ou nome de fantasia de propriedade do encomendante, de terceiro ou do próprio executor da encomenda.

(...)

Art. 8º. Para fins do disposto no artigo anterior, fica o Poder Executivo autorizado a excluir produto ou grupo de produtos cuja permanência se torne irrelevante para arrecadação do imposto, ou a incluir outros cuja alíquota seja igual ou superior a quinze por cento.

 

Por sua vez, o Decreto n.º 8.393/2015 estabeleceu a inclusão de novos produtos ao Anexo III da Lei n.º 7.798/89, verbis:

 

NCM

Descrição

3303.00.10

Perfumes (extrato)

3304.10.00

Produtos de maquiagem para os lábios

3304.20

Produtos de maquiagem para os olhos

3304.30.00

Preparações para manicuros e pedicuros

3304.9

Outros

3305.20.00

Preparações para ondulação ou alisamento, permanentes, dos cabelos

3305.30.00

 

3305.90.00

Outras:

 

ex 01 condicionadores

3307.10.00

Preparações para barbear (antes, durante ou após)

3307.30.00

Sais perfumados e outras preparações para banhos

3307.4

Preparações para perfumar ou para desodorizar ambientes, incluindo as preparações odoríferas para cerimônias religiosas:

3307.90.00

- Outros:

 

Ex 01 - Soluções para lentes de contato ou para olhos artificiais

 

 

Na sentença reconheceu-se a ilegalidade do aludido decreto, verbis

 Ora, na espécie, o decreto referenciado nos autos, para além de operacionalizar a cobrança do tributo, promoveu inovação na ordem jurídica, transbordando dos limites impostos chamada atividade regulamentar, em específico quando incluiu a impetrante no rol dos contribuintes do IPI, violando, portanto, o princípio da estrita legalidade tributária. Vale lembrar, no que se refere aos limites da atividade regulamentar, como aduz o preclaro mestre Celso Antônio Bandeira de Mello, "... tão só e especificamente aos em que o enunciado legal pressupõe uma averiguação ou operacionalização técnica - conforme adiante melhor aclararemos - a serem resolutas a nível administrativo, até porque, muitas vezes, seria impossível, impraticável ou desarrazoado efetuá-la no plano da lei" (Curso de Direito Administrativo, 8' edição, o, Malheiros, 1.996, p. 201). Enfim, igualmente profícuas palavras do D. Procurador da República, transcritas a seguir:

"O enquadramento da impetrante como contribuinte do IPI via Decreto expedido pelo Chefe do Poder Executivo se apresenta como majoração da carga tributária, uma vez que expande a incidência do tributo. Não se trata apenas de alteração de alíquota, mas de instauração de novo sujeito passivo de obrigação tributária. Assim sendo, assiste razão à tese sustentada pela Imperante, devendo ser declarada inexigível a incidência tributária do IPI sobre os produtos discriminados pelo Anexo ao Decreto a° 8.393/2015 e, consequentemente, descaracterizando-a como sujeito passivo deste tributo, considerando a observância da via adequada para a majoração em tela, que deveria ter sido realizada através de lei ordinária."

 

Concordo com o entendimento do juízo e do Parquet. É inequívoco que a alteração promovida pelo Decreto nº 8.393/2015 extrapolou a autorização do artigo 8º da Lei 7798/89 para que o Executivo modifique a alíquota, não para equiparar estabelecimento atacadista a industrial. Nesse sentido, destaco: 

 

DIREITO TRIBUTÁRIO. IPI. ARTIGO 8º DA LEI Nº 7.798/89. DECRETO Nº 8.393/2015.

1. A inclusão de produtos no Anexo III da Lei nº 7.798/89, com base no art. 8º da indigitada lei é inconstitucional, tendo em vista que os art. 146, III, alínea a, c/c art. 153, § 1º, ambos da Constituição Federal de 1988, somente autorizam o Poder Executivo a alterar as alíquotas do IPI, não estendendo tal prerrogativa à promoção da equiparação do estabelecimento atacadista a estabelecimento industrial, para fins de definição da qualidade de contribuinte do IPI, ainda que essa equiparação seja feita de forma indireta.

2. Via de consequência, a inclusão dos produtos efetivada pelo Decreto nº 8.393/2015 é indevida, pois baseada em autorização inconstitucional da lei. Concessão da segurança para declarar a inexigibilidade do IPI baseado no referido decreto em relação à impetrante.

 (TRF 4ª Região, Primeira Turma, AC 5043793-76.2015.4.04.7000, Rel. Leandro Paulsen, j. 18.11.2021, destaquei).

 

Por fim, as questões relativas ao demais artigos suscitados no recurso, quais sejam, 1º, 2º e 4º, da Lei n.º 4.502/64, 2º e 226 do Decreto n.º 7.212/2010, não têm o condão de alterar esse entendimento pelos motivos já apontados.

 

IV – Do dispositivo

 

Ante o exposto, nego provimento à remessa oficial e à apelação.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

TRIBUTÁRIO. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS. DECRETO N.º 8.393/2015. AMPLIAÇÃO DA RELAÇÃO DE ITENS DO ANEXO III DA LEI N.º 7.798/89. ILEGALIDADEREEXAME E RECURSO DESPROVIDOS.

- A sentença recorrida foi proferida em antes da vigência da Lei n.° 13.105/2015 (NCPC), razão pela qual, aplicada a regra do tempus regit actum, segundo a qual os atos jurídicos se regem pela lei vigente à época em que ocorreram, o recurso será analisado à luz do Diploma Processual Civil de 1973 (Enunciado Administrativo n.º 01/2016, do STJ).

- É inequívoco que a alteração promovida pelo Decreto nº 8.393/2015 extrapolou a autorização do artigo 8º da Lei 7798/89 para que o Executivo modifique a alíquota, não para equiparar estabelecimento atacadista a industrial. Precedente.

- Remessa oficial e apelação desprovidas.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à remessa oficial e à apelação, nos termos do voto do Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (Relator), com quem votaram a Des. Fed. MARLI FERREIRA e a Des. Fed. MÔNICA NOBRE., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.