Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006191-65.2021.4.03.6128

RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: MUNICIPIO DE JUNDIAI

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006191-65.2021.4.03.6128

RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

APELADO: MUNICIPIO DE JUNDIAI

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de ação interposta pelo Município de Jundiaí, que objetiva a declaração de inexistência da relação jurídica quanto à incidência do Imposto de Renda sobre verbas pagas aos seus servidores por força da Lei Complementar n.º 499/2010, a saber, auxílio-transporte e férias-prêmio.

Argumenta possuir interesse processual pelo fato de ser demandado em inúmeras causas em que é obrigado a ressarcir aos servidores, contribuintes, os valores recolhidos com os acréscimos legais, o que estaria lhe trazendo vultoso prejuízo.

A sentença julgou o pedido inicial procedente, para declarar a inexistência de relação jurídico-tributária que obrigue o Município de Jundiaí e entidades a ele atreladas, que componham a sua Administração Indireta, de incluir na base de cálculo do Imposto de Renda os valores pagos a seus servidores a título de férias prêmio e auxílio-transporte. Condenou a União ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em R$ 5.000,00, fixando as custas nos termos da lei.

A União Federal apelou. Sustenta, preliminarmente, a impossibilidade de o Município substituir os seus servidores em juízo, bem como os demais entes da administração pública, pugnando pelo reconhecimento da ilegitimidade ativa. No mérito, sustenta que as verbas se enquadram no conceito de rendimentos, sendo dotadas de natureza salarial e, portanto, tributáveis.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006191-65.2021.4.03.6128

RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

APELADO: MUNICIPIO DE JUNDIAI

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

O Código de Processo Civil estabelece que “ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico” (art. 18).

À luz do artigo 45, do Código Tributário Nacional, o contribuinte do Imposto de Renda é o titular da disponibilidade sobre a renda ou proventos tributados na forma do artigo 43, cabendo-lhe a obrigação principal de pagamento.

Por outro lado, atribuiu-se à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de responsável pela retenção na fonte e repasse, se o caso. Trata-se de obrigação acessória à principal.

No caso específico do Imposto de Renda retido na fonte sobre as verbas pagas aos servidores municipais, o Município acumula três funções: 1) responsável pela retenção tributária na qualidade de fonte pagadora (art. 7º, §1º, da Lei Federal n.º 7.713/88); 2) ente arrecadador do tributo (artigos 83 e 84, do CTN) e 3) destinatário do produto da arrecadação (art. 185, da Constituição Federal).

Na qualidade de ente arrecadador, inclusive com participação no montante arrecadado, a jurisprudência tem reconhecido a legitimidade passiva da municipalidade nas ações de repetição de indébitos (STJ, 2ª Turma, AgRg no REsp 1480438 / SP, RELATOR Ministro HUMBERTO MARTINS, julgado em 23/10/2014, DJe 30/10/2014).

Na qualidade de mera fonte pagadora, não deteria legitimidade passiva para figurar naquelas ações e, tampouco, legitimidade ativa para pleitear a repetição. Confira-se:

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ART. 535, II, DO CPC/1973. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO. ART. 45 DO CTN. SUJEITO PASSIVO DE OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA ACESSÓRIA CUJO OBJETO CONSISTE NA RETENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM PARA PLEITEAR A RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO. CONVENÇÃO ENTRE AS PARTES. IRRELEVÂNCIA. INCIDÊNCIA DO ART. 123 DO CTN. PRECEDENTES. 

1. Inexiste contrariedade ao art. 535, II, do CPC/1973 quando o Tribunal de origem decide fundamentadamente todas as questões postas ao seu exame. Ademais, não se deve confundir decisão contrária aos interesses da parte com ausência de prestação jurisdicional. 

2. Controvérsia que diz respeito à legitimidade da fonte pagadora para pleitear a restituição de indébito decorrente de imposto de renda recolhido a maior por ocasião do ato de remuneração de pessoas que integram relação de emprego. 

3. Na espécie, não há dúvida de que se está diante de uma situação em que a ora recorrida estava inserida numa obrigação tributária acessória cujo objeto consistia na retenção e recolhimento do tributo devido por quem realmente praticou o fato gerador da obrigação tributária, intitulado contribuinte, a saber, as pessoas que prestavam serviços como empregadas e que obtiveram o acréscimo patrimonial decorrente da aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de renda, nos termos dos arts. 43 e 45 do CTN. 

4. A jurisprudência deste Tribunal Superior firmou compreensão de que "responsável tributário" (entenda aqui responsável tributário como o sujeito passivo da obrigação tributária acessória cujo objeto corresponde ao dever de fazer a retenção do imposto de renda devido pelos contribuintes) não tem legitimidade passiva [sic] ad causam para postular repetição de indébito de imposto de renda que foi retido quando do pagamento realizado a contribuintes da exação. Precedente: REsp 1.318.163/PR, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 27/5/2014.

5. Salvo disposições em contrários, as convenções entre particulares não tem o condão de alterar a relação jurídica tributária entre o Fisco e sujeito passivo prevista na legislação de regência, por força do que dispõe o art. 123 do CTN. Precedente: AgRg no REsp 895.824/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 30/9/2008. 

6. Recurso especial provido em parte para declarar a ilegitimidade ativa ad causam da recorrida a fim de pleitear a restituição de indébito na hipótese concreta dos autos.”

(REsp 1415441 / RS, 2ª Turma, RELATOR Ministro OG FERNANDES, julgado em 07/12/2017, DJe 15/12/2017).

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. VERBAS INDENIZATÓRIAS. ABONO PECUNIÁRIO DE FÉRIAS E AUSÊNCIA PERMITIDAS AO TRABALHO. NÃO INCIDÊNCIA. ILEGITIMIDADE DA FONTE PAGADORA PARA INTEGRAR O POLO PASSIVO. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. 

1. A fonte pagadora é responsável pela retenção e recolhimento do imposto de renda na fonte incidente sobre verbas passíveis de tributação, conforme determinação prevista no art. 45, parágrafo único, do CTN. Todavia, após efetuado o desconto do imposto de renda na fonte, o montante é repassado incontinenti ao órgão arrecadador, no caso a Secretaria da Receita Federal, o que torna a Fazenda Nacional a única legitimada para responder por eventual indébito tributário. 

2. O abono pecuniário de férias e a conversão em pecúnia da ausência permitida ao trabalho - APIP não configuram acréscimo patrimonial de qualquer natureza ou renda, não estando sujeitos à incidência do Imposto de Renda. 

3. Os juros moratórios são devidos a partir do trânsito em julgado, consoante determina a Súmula 188/STJ. 

4. Recurso especial interposto pela Caixa Econômica Federal provido. Recurso especial interposto pela Fazenda Nacional parcialmente provido; e Recurso especial interposto por Mônica Isabel Alves Rodrigues Cavalcanti e outros provido.”

(STJ, 1 Turma, REsp 488270 / AL, RELATOR Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, julgado em 28/10/2003, DJ 17/11/2003 p. 209)

Há, na mesma linha, precedentes desta Corte em casos análogos (TRF3, 6ª Turma, ApelRemNec 5014725-24.2017.4.03.6100, Relator Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 20/12/2021, publicado em 12/01/2022; TRF3, 3ª Turma, ApCiv - 0014139-77.2014.4.03.6100, Juiz Federal JOSE FRANCISCO DA SILVA NETO, julgado em 07/02/2022, publicado em 14/02/2022 ).

Ainda nas ações declaratórias, sem pleito repetitório, não se vislumbra a legitimidade ativa da fonte pagadora. A cessação da obrigação acessória é mera consequência da cessação da principal. Confira-se:

“TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA. RETENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE JUROS DISTRIBUÍDOS AOS ASSOCIADOS. ILEGITIMIDADE ATIVA DA COOPERATIVA. ART. 6º DO CPC. ARTS. 45, PARÁGRAFO ÚNICO, E 121, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DO CTN. EXTINÇÃO DO FEITO, SEM APRECIAÇÃO DO MÉRITO. PRECEDENTES DESTA CORTE. 1. Apelação contra sentença que extinguiu o feito, sem resolução do mérito, em face da ilegitimidade ativa da Cooperativa autora. 2. Esta Corte possui jurisprudência na esteira de que "havendo incidência do imposto sobre a renda sobre as quantias pagas aos cooperados, a título de percepção de juros sobre o capital integralizado, tanto com relação à retenção do imposto quanto a eventual prejuízo advindo de tributação indevida, a perda será suportada pelo patrimônio dos referidos cooperados, falecendo legitimidade ativa à Cooperativa, que não é contribuinte nem arca com o ônus da exação, mas apenas é obrigada a recolher o referido imposto na condição de responsável tributário" (APELREEX 15716/CE, 4ª T., Relª Desª Fed. Margarida Cantarelli, DJe 12/05/2011). 3. Na mesma linha: AC 491159/CE, 4ª T., Rel. Des. Federal Leonardo Resende Martins (Convocado), DJe 25/03/2010. 4. Apelação não-provida.”

(TRF5, 3ª Turma, AC 0000592-02.2011.4.05.8401, Relator Desembargador Federal Marcelo Navarro, julgado em 24/05/2012, publicado em 31/05/2012)

No caso em apreço, o Município de Jundiaí objetiva a declaração de não incidência do Imposto de Renda sobre “auxílio-transporte” e “férias-prêmio” indenizadas, ambos pagos aos servidores municipais nos termos da Lei Complementar n.º 499/2010, afastando-se, por consequência, a sua obrigação de incluir tais verbas na base de cálculo do tributo retido na fonte.

Em que pese seja compreensível o intuito da Municipalidade em evitar responder a muitos processos sobre o tema, fato é que isso não lhe oferece a possibilidade de litigar defendendo interesse do contribuinte do Imposto de Renda.

Nesse quadro, está ausente a legitimidade ativa, o que enseja a extinção da ação, sem a resolução do mérito.

Os honorários advocatícios devem remunerar o trabalho realizado pelo advogado, evitando-se a fixação irrisória ou exorbitante.

Assim, considerando-se o disposto no art. 85, §8º, do CPC, e o valor atribuído à causa (R$ 1.000,00), os honorários a cargo da Municipalidade devem ser fixados em R$ 2.000,00 (dois mil reais).

Por esses fundamentos, dou provimento à apelação da União, para reconhecer a ilegitimidade ativa do Município de Jundiaí e julgar o processo extinto, nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

AÇÃO ORDINÁRIA. TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA. IMPOSTO DE RENDA SOBRE VERBAS PAGAS A SERVIDORES MUNICIPAIS. ILEGITIMIDADE ATIVA DA FONTE PAGADORA.

1. O Código de Processo Civil estabelece que “ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico” (art. 18). À luz do artigo 45, do Código Tributário Nacional, o contribuinte do Imposto de Renda é o titular da disponibilidade sobre a renda ou proventos tributados na forma do artigo 43, cabendo-lhe a obrigação principal de pagamento. Por outro lado, atribuiu-se à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de responsável pela retenção na fonte e repasse, se o caso. Trata-se de obrigação acessória à principal.

2. O Município de Jundiaí objetiva a declaração de não incidência do Imposto de Renda sobre “auxílio-transporte” e “férias-prêmio” indenizadas, ambos pagos aos servidores municipais nos termos da Lei Complementar n.º 499/2010, afastando-se, por consequência, a sua obrigação de incluir tais verbas na base de cálculo do tributo retido na fonte. Em que pese seja compreensível o intuito da Municipalidade em evitar responder a muitos processos sobre o tema, fato é que isso não lhe oferece a possibilidade de litigar defendendo interesse do contribuinte do Imposto de Renda.

3. Ilegitimidade ativa reconhecida. Extinção sem resolução de mérito. Inversão do ônus de sucumbência.

4. Apelação provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, deu provimento à apelação da União, para reconhecer a ilegitimidade ativa do Município de Jundiaí e julgar o processo extinto, nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.