Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5019335-93.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: ENCALSO CONSTRUCOES LTDA

Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO CARLOS KEPPLER - SP68931-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5019335-93.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: ENCALSO CONSTRUCOES LTDA

Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO CARLOS KEPPLER - SP68931-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de de apelação à sentença denegatória de mandado de segurança impetrado para: i) possibilitar a tomada de créditos de PIS/COFINS sobre as despesas com adequação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e Compliance; e ii) garantir o direito à recuperação dos créditos sobre tais despesas nos últimos 5 (cinco) anos, com aplicação da SELIC. 

Alegou, em síntese, que: o conceito de insumo previsto no julgamento do REsp 1.221.170, para fins de creditamento de PIS/COFINS sob a sistemática de apuração não-cumulativa, está vinculado aos critérios de relevância e essencialidade da atividade desenvolvida pela empresa, devendo essa análise ser feita caso a caso e sem qualquer limitação a esse ou aquele segmento da atividade empresarial; logo, não sendo adstrito somente às indústrias ou empresas prestadoras de serviços, os custos envolvidos no tratamento de dados pessoais e compliance devem ser enquadrados como insumos, pois considerados necessários a consecução de sua atividade empresarial, sob pena de, ao não fazê-lo, sofrer eventuais sanções previstas na Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.909/2018); o termo compliance remete à ideia de "estar em conformidade, que aplicada ao direito sugere o cumprimento de leis, reservado para descrever o conjunto de práticas, implementadas no interior de uma empresa, para melhor monitorar o bom cumprimento de legislações e controlar a licitude dos relacionamentos jurídicos com terceiros", tratando-se, portanto, de tema cujos gastos são essenciais e relevantes à atividade empresarial, e sem os quais as empresas poderiam sofrer sanções administrativas e civis, de modo que tais despesas, além das despesas com tratamento de dados pessoais, estão dentro dos critérios de insumos para fins de creditamento do PIS/COFINS não-cumulativo; o Parecer Normativo COSIT 5/2018, ao interpretar o REsp 1.221.170, definiu que o "critério da relevância é identificável no item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à  prestação do serviço, integre o processo de produção, seja pelas singularidades de cada cadeia produtiva, seja por imposição legal"; e na Consulta Interna COSIT 1/2021 fixou-se o entendimento de que "as despesas com tratamento de efluentes para pessoas jurídicas dedicadas às atividades de curtimento e a outras preparações de couro seriam passíveis de créditos de PIS e COFINS não cumulativos, tendo em vista que esses gastos têm o intuito de mitigar danos ambientais e, com isso, afastar multas e sanções administrativas que seriam aplicáveis no caso de descumprimento das normas ambientais", de modo a concluir que a RFB vem reconhecendo que os gastos com itens que, uma vez suprimidos, poderiam causar danos à coletividade e gerar sanções às empresas devem ser entendidos como insumos para fins de créditos de PIS/COFINS não cumulativo; deve ser reformada a sentença, para reconhecer o direito a tomada de créditos de PIS/COFINS sobre as despesas incorridas com adequação à LGPD e Compliance, bem como o direito à recuperação dos créditos referentes a tais despesas nos últimos 5 (cinco) anos, com aplicação da Taxa SELIC.

Houve contrarrazões e parecer ministerial pela dispensa de intervenção quanto ao mérito.

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5019335-93.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: ENCALSO CONSTRUCOES LTDA

Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO CARLOS KEPPLER - SP68931-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO

 

 

  

 

V O T O

 

 

Senhores Desembargadores, a Corte Superior decidiu, em rito repetitivo (Temas 779 e 780), que o conceito de insumo, para efeito das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, é definido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, perquirindo-se imprescindibilidade ou importância do bem ou serviço no desenvolvimento da atividade econômica:

 

REsp 1.221.170, Rel. Min. NAPOLEÃO MAIA, DJe 24/04/2018: TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. NÃO-CUMULATIVIDADE. CREDITAMENTO. CONCEITO DE INSUMOS. DEFINIÇÃO ADMINISTRATIVA PELAS INSTRUÇÕES NORMATIVAS 247/2002 E 404/2004, DA SRF, QUE TRADUZ PROPÓSITO RESTRITIVO E DESVIRTUADOR DO SEU ALCANCE LEGAL. DESCABIMENTO. DEFINIÇÃO DO CONCEITO DE INSUMOS À LUZ DOS CRITÉRIOS DA ESSENCIALIDADE OU RELEVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL DA CONTRIBUINTE PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO, SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC/1973 (ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015). 1. Para efeito do creditamento relativo às contribuições denominadas PIS e COFINS, a definição restritiva da compreensão de insumo, proposta na IN 247/2002 e na IN 404/2004, ambas da SRF, efetivamente desrespeita o comando contido no art. 3o., II, da Lei 10.637/2002 e da Lei 10.833/2003, que contém rol exemplificativo. 2. O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte. 3. Recurso Especial representativo da controvérsia parcialmente conhecido e, nesta extensão, parcialmente provido, para determinar o retorno dos autos à instância de origem, a fim de que se aprecie, em cotejo com o objeto social da empresa, a possibilidade de dedução dos créditos relativos a custo e despesas com: água, combustíveis e lubrificantes, materiais e exames laboratoriais, materiais de limpeza e equipamentos de proteção individual-EPI. 4. Sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015), assentam-se as seguintes teses: (a) é ilegal a disciplina de creditamento prevista nas Instruções Normativas da SRF ns. 247/2002 e 404/2004, porquanto compromete a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal como definido nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003; e (b) o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de terminado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo Contribuinte.” (g.n.)

 

Logo, no regime de não-cumulatividade do artigo 195, § 12, CF, com reconhecimento do direito ao creditamento de tributos pagos na cadeia produtiva, deve ser cotejada a real e efetiva essencialidade do bem ou serviço com o objeto social do contribuinte, alcançando os imprescindíveis à finalidade empresarial, enquanto insumos essenciais afetos ao processo produtivo e ao produto final, excluindo, assim, meras despesas operacionais, relativas a atividades secundárias, de natureza administrativa ou não indispensáveis à produção do bem ou do serviço. 

No caso, o objeto social da empresa compreende: "a) execução de obras públicas ou particulares nos setores de Engenharia Civil, tais como: terraplanagem, drenagem, pavimentação e obras complementares de sistemas viários urbanos e rurais; rodovias, ferrovias, metrovias e aeroportos, incluindo terminais, estações, páteos, edificações de apoio, sistemas de sinalização, telefonia, monitorização de tráfego com controle eletrônico; obras de arte, pontes de viadutos; túneis hidrelétricas, termoelétricas e barragens; construção, ampliação ou recuperação de obras portuárias e viagens navegáveis, obras de dragagen, desassoreamento, inclusive serviços subaquáticos, para manutenção, retificação e canalização de rios e canais; captação, tratamentos, reservação e distribuição de água; interceptação, condução e tratamento de esgotos sanitários e industriais; pisodutos, gasodutos e demais dutos especiais, marítimos ou terrestres; b) Implantação de sistemas de telecomunicações e telefonia; linhas de transmissão de energia e subestações; c) Montagem de equipamentos, estruturas e sistemas eletromecânicos de controle de operação; d) Serviços de limpeza pública, incluindo coleta, remoção, transporte e beneficiamento de lixo; e) Prestação de serviços de transportes hidroviários, vinculados à execução de obras públicas ou particulares; f) Exploração de serviços públicos relacionados com os itens anteriores, ainda que desvinculados de sua construção mediante regime de concessão, permissão ou outro qualquer; g) Usinagem de concreto asfáltico para consumo próprio; h) Exploração de pedreiras, britagem, rebritagem e beneficiamento para consumo próprio; i) Execução de obras e serviços através de contratos na modalidade EPC (Engenharia, Compra e Construção; j) Comercialização de produtos asfálticos e congêneres; e k) A estruturação, o desenvolvimento, a implantação, a geração e a exploração de projetos e empreendimentos de energia elétrica por fonte eólica e solar". (Id. 259780722, fl. 8)

O contribuinte pretende creditamento de despesas com adequação à Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.909/2018) e Compliance, sob alegação de que tais atividades são essenciais e necessárias a consecução de suas atividades empresariais.

A pretensão de escrituração de créditos de PIS/COFINS exige demonstração específica de respaldo legal e jurisprudencial próprio, a ser avaliada em cotejo com o acervo probatório dos autos, caso a caso.

A propósito, cumpre ressaltar que despesas com adequação à Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.909/2018) e Compliance, em primeiro lugar, não se enquadram no objeto social descrito e, além do mais, referem-se à atividade comercial, não podendo ser dados como insumos para os fins dos artigos 3º, caput, II, das leis de referência, pois nelas se autoriza creditamento de PIS/COFINS como insumos apenas para “bens e serviços”, utilizados “na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda”.

Não se trata sequer de interpretação restritiva, com fulcro no artigo 111 do CTN. Pelo contrário, o vértice é sistemático e teleológico. Se é certo que no regime não-cumulativo de PIS/COFINS não se admite crédito por toda e qualquer despesa, e que tampouco há obrigação de que todos os setores econômicos sejam beneficiados por tal sistemática, ressoa claro que o legislador ordinário, ao referir “prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda”, não exemplificou atividades econômicas, mas delimitou o âmbito de incidência daquele comando legal.

Não cabe sequer cogitar de aplicação extensiva de regime legal próprio, a título de isonomia, solução esta que implicaria atribuir ao Judiciário função de legislador positivo, incompatível com o regime de controle de constitucionalidade, no qual a quebra da isonomia não se resolve, na técnica judicial, com extensão do benefício para além do previsto pelo legislador, mas, ao contrário, com a sua supressão como forma de excluir tratamento supostamente desigual, a revelar, assim, que a pretensão deduzida, ainda que fosse o caso de equiparar as situações - o que se registra com o efeito apenas de mera discussão -, não poderia ser acolhida. 

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

É como voto.

 

 



E M E N T A

 

DIREITO CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PIS/COFINS. ARTIGO 195, §12, CF/1988. REGIME DA NÃO-CUMULATIVIDADE. CREDITAMENTO. LEIS 10.637/2002 E 10.833/2003. TEMAS REPETITIVOS 779 E 780. INSUMOS. ESSENCIALIDADE E RELEVÂNCIA.

1. Consolidada a jurisprudência da Corte Superior, em rito repetitivo (Temas 779 e 780), no sentido de que o conceito de insumo, para efeito das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, é definido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, perquirindo-se imprescindibilidade ou importância do bem ou serviço no desenvolvimento da atividade econômica. 

2. No regime de não-cumulatividade do artigo 195, § 12, CF, com reconhecimento do direito ao creditamento de tributos pagos na cadeia produtiva, deve ser cotejada a real e efetiva essencialidade do bem ou serviço com o objeto social do contribuinte, alcançando os imprescindíveis à finalidade empresarial, enquanto insumos essenciais afetos ao processo produtivo e ao produto final, excluindo, assim, meras despesas operacionais, relativas a atividades secundárias, de natureza administrativa ou não indispensáveis à produção do bem ou do serviço. 

3. As despesas com adequação à Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.909/2018) e Compliance, em primeiro lugar, não se enquadram no objeto social descrito e, além do mais, referem-se à atividade comercial, não podendo ser dados como insumos para os fins dos artigos 3º, caput, II, das leis de referência, pois nelas se autoriza creditamento de PIS/COFINS como insumos apenas para “bens e serviços”, utilizados “na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda”.

4. Não se trata sequer de interpretação restritiva, com fulcro no artigo 111 do CTN. Pelo contrário, o vértice é sistemático e teleológico. Se é certo que no regime não-cumulativo de PIS/COFINS não se admite crédito por toda e qualquer despesa, e que tampouco há obrigação de que todos os setores econômicos sejam beneficiados por tal sistemática, ressoa claro que o legislador ordinário, ao referir “prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda”, não exemplificou atividades econômicas, mas delimitou o âmbito de incidência daquele comando legal. Assim, tem-se que a regência legal e constitucional do regime do PIS/COFINS não exige, sequer, que a atividade da impetrante seja submetida à sistemática não-cumulativa. De toda a forma, há previsões específicas aplicáveis ao ramo em que inserida, inexistindo, porém, possibilidade de creditamento de toda e qualquer despesa incorrida na persecução do objeto societário, tampouco de extensão de regras que, pela exegese da regência normativa, com respaldo em jurisprudência, não são destinadas a tal setor econômico.

5. Apelação desprovida. 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.