AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5004046-53.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
AGRAVANTE: JONATHAN APARECIDO DOS SANTOS
REPRESENTANTE: JAQUELINE APARECIDA BOTTARO
Advogados do(a) AGRAVANTE: RENATA VILHENA SILVA - SP147954-A,
AGRAVADO: BRADESCO SAUDE S/A, UNIÃO FEDERAL
Advogado do(a) AGRAVADO: ALESSANDRA MARQUES MARTINI - SP270825-A
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5004046-53.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA AGRAVANTE: JONATHAN APARECIDO DOS SANTOS Advogado do(a) AGRAVANTE: RENATA VILHENA SILVA - SP147954-A, AGRAVADO: BRADESCO SAUDE S/A, UNIÃO FEDERAL Advogado do(a) AGRAVADO: ALESSANDRA MARQUES MARTINI - SP270825-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo de instrumento interposto por Jonathan Aparecido dos Santos, contra decisão que indeferiu o pedido de tutela provisória antecipada de urgência, pleiteada no bojo de ação ordinária (autos nº 5026156-84.2019.4.03.6100), ajuizada em face da União Federal e do Bradesco Saúde S/A. O demandante tem diagnóstico de Síndrome do Intestino Curto, resultante de um quadro evolutivo de má formação congênita da parede abdominal (gastrosquise), com indicação de transplante multivisceral como única opção de terapêutica curativa. Informa que em razão da propositura de ação judicial (autos nº 1008460-47.2017.8.26.0071), a operadora de seguros/planos de saúde Bradesco Saúde S/A foi condenada a custear a realização do tratamento médico junto ao Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Realizado o procedimento cirúrgico em 12/04/2018, houve posterior rejeição com necessidade de retirada de parte dos órgãos em 18/07/2018. Argumenta que o Brasil não possui profissionais de saúde capacitados à realização de procedimento de tamanha complexidade, considerando-se a baixa incidência de doação de órgãos no País. Requer seja determinada a realização de novo transplante multivisceral, às custas do Poder Público, no Jackson Memorial Hospital, em Miami, com a equipe do Dr. Rodrigo Vianna, atual chefe do Departamento de Transplantes Gastrointestinais e Fígado da referida instituição hospitalar. Nesse sentido, requer (i) obrigar a União Federal a providenciar e custear todos os gastos relacionados à remoção do paciente do Hospital Israelita Albert Einstein, para o Jackson Memorial Hospital em Miami, disponibilizando transporte de UTI automotiva até o aeroporto e, posteriormente, UTI aérea, equipados com o necessário à manutenção da vida do autor durante a viagem, devendo a remoção ser realizada em relação ao autor e um de seus representantes legais; ii) obrigar a Bradesco Saúde e a União Federal, a providenciarem o pagamento dos valores exigidos pelo Jackson Memorial Hospital, garantindo o custeio das despesas do tratamento de transplante multivisceral, bem como procedimentos e tratamentos decorrentes destes, inclusive eventual internação em Home Care, devendo providenciar a adequada instalação do representante, acompanhante do paciente dentro das dependências do nosocômio, ou em residência próxima ao hospital, sempre de acordo com as orientações e prescrições médicas, iii) Providenciar todas as medidas burocráticas para o cumprimento das medidas aqui pleiteadas, inclusive firmando todos os documentos e contratos necessários para fins de remoção e internação do Jovem Jonathan para sua transferência para o Jackson Memorial Hospital. iv) Com relação aos itens ii) e iii), requer seja consignado que a Bradesco Saúde possui a obrigação de proceder o pagamento das despesas médicas e hospitalares de todo tratamento a ser realizado pelo Menor Jonathan, pela equipe médica do Jackson Memorial Hospital, diretamente ao referido nosocômio, até alta definitiva, nos valores que seriam pagos pela Seguradora, caso o paciente continuasse internado e realizasse todo o referido tratamento no Hospital Israelita Albert Einstein, devendo a diferença dos valores ser custeada pela União Federal. Sobreveio decisão monocrática indeferindo a tutela recursal, em liminar. Com contraminuta, os autos vieram conclusos. O Ministério Público Federal manifesta-se pelo desprovimento do recurso. É o relatório.
REPRESENTANTE: JAQUELINE APARECIDA BOTTARO
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5004046-53.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA AGRAVANTE: JONATHAN APARECIDO DOS SANTOS Advogado do(a) AGRAVANTE: RENATA VILHENA SILVA - SP147954-A, AGRAVADO: BRADESCO SAUDE S/A, UNIÃO FEDERAL Advogado do(a) AGRAVADO: ALESSANDRA MARQUES MARTINI - SP270825-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A questão posta nos autos diz respeito à realização de transplante múltiplo de órgãos no exterior. O direito à saúde é direito fundamental de dupla face, protegido no ordenamento jurídico brasileiro na condição de direito individual, enquanto corolário do direito à vida, e sob uma perspectiva coletiva, enquanto direito social, segundo os art. 5º, caput, e 6º, caput, e art. 196 da Constituição Federal. Assim, ainda que no campo da definição de políticas públicas seja possível priorizar a tutela das necessidades coletivas, não se pode, com esse raciocínio, deixar de promover a guarda dos direitos fundamentais, especialmente no que concerne ao chamado mínimo existencial, quando não houver, por parte do Poder Público, o devido suprimento às necessidades básicas dos indivíduos. Na situação, em que pese a exigência de que o tratamento de saúde ofertado pelo Poder Público seja adequado e eficiente, sob pena de esvaziar-se o direito fundamental de acesso à saúde, importa salientar que o demandante já teve acesso à terapêutica pretendida no Brasil (transplante múltiplo de órgãos), buscando-se, por ora, a realização de mesma terapêutica no exterior. Pretende-se, em verdade, repetir o procedimento cirúrgico, o qual, frisa-se, é igual ao oferecido pelo Sistema Único de Saúde – SUS, com um dos melhores e mais caros profissionais do mundo. A realização de tratamento médico no exterior, às custas do Poder Público, deve-se limitar às hipóteses em que não há oferecimento de tratamento equivalente em território nacional. Isto porque, conforme já mencionado, o direito constitucional de acesso à saúde compreende o fornecimento de tratamento adequado e eficiente, o que não se confunde com o acesso a um profissional ou a um hospital específico. Por consequência, igualmente incabível a pretensão de custeio pelo Poder Público limitado às despesas burocráticas e de transporte do paciente até o estrangeiro, pois se situam foram do âmbito de proteção da norma constitucional. Ademais, inexiste qualquer comprovação de que o insucesso da cirurgia realizada junto ao Hospital Israelita Albert Einstein seja atribuído à falta de expertise dos profissionais brasileiros, já que em qualquer procedimento de transplante há intrínseca possibilidade de rejeição por órgãos por peculiaridades de cada paciente. Observa-se, nesse sentido, o precedente desta E. Corte: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA. TRANSPLANTE MULTIVISCERAL A SER REALIZADO NO EXTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. MESMO PROCEDIMENTO REALIZADO PELO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. 1. A questão posta nos autos diz respeito à realização de transplante múltiplo de órgãos no exterior, às custas do Poder Público. 2. É sabido que o direito fundamental à saúde constrói-se, além do aspecto coletivo, como direito subjetivo de cada indivíduo, cabendo ao Estado, obedecidas as balizas legais e constitucionais, oportunizar o acesso a tratamentos médicos mesmo em âmbito individual. 3. Ainda que no campo da definição de políticas públicas seja possível priorizar a tutela das necessidades coletivas, não se pode, com esse raciocínio, deixar de promover a guarda dos direitos fundamentais, especialmente no que concerne ao chamado mínimo existencial, quando não houver, por parte do Poder Público, o devido suprimento às necessidades básicas do indivíduo. 4. No caso dos autos, é importante salientar que, conforme demonstrado pela União Federal (Nota Informativa nº 1-SEI/2017- CGSNT/DAET/SAS/MS – ID 149178628), existem, no Brasil, ao menos três instituições autorizadas pelo Ministério da Saúde e consideradas aptas a realizar transplante multivisceral, quais sejam: Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (HC/USP), Hospital Israelita Albert Einstein e Hospital Sírio Libanês, em parceria com o Sistema Único de Saúde – SUS. 5, A demandante, contudo, não se submeteu a qualquer tentativa de realização de transplante multivisceral junto às instituições supramencionadas. Busca-se, em verdade, realizar, de imediato, o procedimento cirúrgico, o qual, frisa-se, é o mesmo oferecido pelo Sistema Único de Saúde – SUS, com um dos melhores e mais caros profissionais do mundo. 6. Verifica-se também que inexiste lastro probatório acerca da falta de perícia dos profissionais brasileiros por ocasião dos transplantes multiviscerais realizados em território nacional, assim como não há demonstração da imprescindibilidade, ou garantia da eficácia, da realização do mesmo procedimento no exterior. 7. Acrescenta-se que, conforme informado pela União Federal (ID 170740687), desde 02.11.2020, a recorrida vem sendo assistida pelo Sistema Único de Saúde – SUS, por meio de equipe de reabilitação intestinal e Transplante de Intestino Delgado (TID) e Transplante Multivisceral (TMV) do Hospital Sírio Libanês, o qual já está formalmente autorizado e habilitado a realizar o procedimento em questão. 8. Entende-se, portanto, que a realização de tratamento médico no exterior, às custas do Poder Público, deve-se limitar às hipóteses em que não há oferecimento de tratamento equivalente em território brasileiro. Isto porque o direito fundamental de acesso à saúde, como já dito, compreende o fornecimento de tratamento adequado e eficiente, o que não se confunde com o acesso a um profissional ou a um hospital específico. 9. Agravo de instrumento provido. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5026894-05.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 08/10/2021, Intimação via sistema DATA: 13/10/2021) Em face do exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. É o voto.
REPRESENTANTE: JAQUELINE APARECIDA BOTTARO
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA. TRANSPLANTE MULTIVISCERAL A SER REALIZADO NO EXTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. MESMO PROCEDIMENTO REALIZADO PELO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE.
1. A questão posta nos autos diz respeito à realização de transplante múltiplo de órgãos no exterior.
2. O direito à saúde é direito fundamental de dupla face, protegido no ordenamento jurídico brasileiro na condição de direito individual, enquanto corolário do direito à vida, e sob uma perspectiva coletiva, enquanto direito social, segundo os art. 5º, caput, e 6º, caput, e art. 196 da Constituição Federal.
3. Ainda que no campo da definição de políticas públicas seja possível priorizar a tutela das necessidades coletivas, não se pode, com esse raciocínio, deixar de promover a guarda dos direitos fundamentais, especialmente no que concerne ao chamado mínimo existencial, quando não houver, por parte do Poder Público, o devido suprimento às necessidades básicas dos indivíduos.
4. Na situação, em que pese a exigência de que o tratamento de saúde ofertado pelo Poder Público seja adequado e eficiente, sob pena de esvaziar-se o direito fundamental de acesso à saúde, importa salientar que o demandante já teve acesso à terapêutica pretendida no Brasil (transplante múltiplo de órgãos), buscando-se, por ora, a realização de mesma terapêutica no exterior. Pretende-se, em verdade, repetir o procedimento cirúrgico, o qual, frisa-se, é igual ao oferecido pelo Sistema Único de Saúde – SUS, com um dos melhores e mais caros profissionais do mundo.
5. A realização de tratamento médico no exterior, às custas do Poder Público, deve-se limitar às hipóteses em que não há oferecimento de tratamento equivalente em território nacional. Isto porque, conforme já mencionado, o direito constitucional de acesso à saúde compreende o fornecimento de tratamento adequado e eficiente, o que não se confunde com o acesso a um profissional ou a um hospital específico. Igualmente incabível, por consequência, a pretensão de custeio pelo Poder Público limitado às despesas burocráticas e de transporte do paciente até o estrangeiro, pois se situam foram do âmbito de proteção da norma constitucional.
6. Inexiste qualquer comprovação de que o insucesso da cirurgia realizada junto ao Hospital Israelita Albert Einstein seja atribuído à falta de expertise dos profissionais brasileiros, já que em qualquer procedimento de transplante há intrínseca possibilidade de rejeição por órgãos por peculiaridades de cada paciente.
7. Agravo de instrumento improvido.