APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000410-93.2020.4.03.6129
RELATOR: Gab. Vice Presidência
APELANTE: LOGIKA DISTRIBUIDORA DE COSMETICOS LTDA
Advogado do(a) APELANTE: MURILO VARASQUIM - PR41918
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000410-93.2020.4.03.6129 RELATOR: Gab. Vice Presidência APELANTE: LOGIKA DISTRIBUIDORA DE COSMETICOS LTDA Advogado do(a) APELANTE: MURILO VARASQUIM - PR41918 PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo interno interposto por LOGIKA DISTRIBUIDORA DE COSMÉTICOS LTDA. em face de decisão desta Vice-Presidência que negou seguimento ao recurso excepcional. A decisão agravada tem os seguintes termos: O recurso não comporta trânsito. No tocante à controvérsia recursal atinente à possibilidade de rejeição dos embargos à execução, ante a ausência de garantia integral do débito exequendo, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.272.827/PE - tema 526 confirmou a inaplicabilidade do art. 736 do CPC/73 (atual 914) que dispensa a garantia nas execuções fiscais em razão do princípio da especialidade das leis. Logo, os feitos executivos fiscais exigem garantia para o manejo dos competentes embargos do devedor. Ainda, no julgamento do REsp 1.127.815/SP - tema 260, alçado como representativo de controvérsia, pacificou-se a tese que é impossível a rejeição liminar dos embargos do devedor, devendo a embargante a pedido da exequente ser intimada para reforçar a penhora ou justificar a impossibilidade de assim proceder. No particular: TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. DETERMINAÇÃO DE REFORÇO DE PENHORA PELO JUIZ EX OFFICIO. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE REQUERIMENTO PELA FAZENDA EXEQUENTE, IN CASU. INSUFICIÊNCIA DA PENHORA. ADMISSIBILIDADE DOS EMBARGOS. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. (...) 9. A insuficiência de penhora não é causa bastante para determinar a extinção dos embargos do devedor, cumprindo ao magistrado, antes da decisão terminativa, conceder ao executado prazo para proceder ao reforço, à luz da sua capacidade econômica e da garantia pétrea do acesso à justiça. (Precedentes: REsp 973.810/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/10/2008, DJe 17/11/2008; REsp 739.137/CE, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/10/2007, DJ 22/11/2007; AgRg no Ag 635829/PR, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, DJ 18/04/2005; REsp 758266/MG, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ 22/08/2005) 10. In casu, contrariamente ao alegado pelos recorrentes, o Juízo singular não procedeu à extinção da ação de embargos à execução; ao revés, fundamentando o decisum nos princípios da economia processual e da instrumentalidade das formas, determinou, a requerimento da exequente, o reforço da penhora e a regularização de atos processuais, tão logo verificada a ausência de nomeação do depositário, bem assim a divergência entre o montante do débito e o valor do bem penhorado (fls e-STJ 349/350). 11. O pleito de imediato prosseguimento dos embargos, à revelia da referida decisão judicial, não merece acolhimento, haja vista que, conquanto a insuficiência patrimonial do devedor seja justificativa plausível à apreciação dos embargos à execução sem que o executado proceda ao reforço da penhora, deve ser a mesma comprovada inequivocamente. Nesse sentido, in verbis: "Caso o devedor não disponha de patrimônio suficiente para a garantia integral do crédito exequendo, cabe-lhe comprovar inequivocamente tal situação. Neste caso, dever-se-á admitir os embargos, excepcionalmente, sob pena de se violar o princípio da isonomia sem um critério de discrímen sustentável, eis que dar seguimento à execução, realizando os atos de alienação do patrimônio penhorado e que era insuficiente para garantir toda a dívida, negando ao devedor a via dos embargos, implicaria restrição dos seus direitos apenas em razão da sua situação de insuficiência patrimonial. Em palavras simples, poder-se-ia dizer que tal implicaria em garantir o direito de defesa ao "rico", que dispõe de patrimônio suficiente para segurar o Juízo, e negar o direito de defesa ao "pobre", cujo patrimônio insuficiente passaria a ser de pronto alienado para a satisfação parcial do crédito. Não trato da hipótese de inexistência de patrimônio penhorável pois, em tal situação, sequer haveria como prosseguir com a execução, que restaria completamente frustrada." (Leandro Paulsen, in Direito Processual Tributário, Processo Administrativo Fiscal e Execução Fiscal à luz da Doutrina e da Jurisprudência, Ed. Livraria do Advogado, 5ª ed.; p. 333/334) (...) (REsp 1127815/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/11/2010, DJe 14/12/2010) No caso dos autos, o acórdão recorrido mostra-se em consonância com as orientações firmadas nos precedentes paradigmáticos em destaque, in verbis: No caso, o valor penhorado/bloqueado de R$ 77.050,73 (setenta e sete mil, cinquenta reais e setenta e três centavos) é nitidamente inferior ao valor da dívida (R$ 10.200.000,00 – dez milhões e duzentos mil reais), o que equivale à falta de garantia e atrai a incidência da norma expressa no art. 16, §1º, da Lei nº 6.830/1980. Registre-se, ainda, que à vista da oposição dos embargos à execução fiscal, a apelante foi devidamente intimada para reforçar a garantia ou justificar a sua impossibilidade (ID 40446123); o que não restou atendido, conforme fundamentação da r. sentença. Assim, não tendo comprovado a garantia do juízo nos autos principais e sendo tal condição de admissibilidade dos embargos à execução, a r. sentença que extinguiu o feito sem resolução do mérito deve ser mantida. (trecho extraído do voto de ID 220164878) (Grifei) A seu turno, a modificação do julgado, como pretende o Recorrente, visando a um maior debate sobre as circunstâncias peculiares do caso concreto, implica invariavelmente revolvimento de matéria fática, cujo propósito encontra óbice na orientação da Súmula 7 do STJ, que veda o reexame de provas no recurso especial. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DO DEVEDOR. GARANTIA DO JUÍZO. NÃO COMPROVAÇÃO. REEXAME DE PROVAS. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. 1. A Primeira Seção do STJ, ao julgar o REsp 1127815/SP sob o rito do art. 543-C do CPC, reafirmou que "a jurisprudência desta Corte Superior é remansosa no sentido de que não se deve obstar a admissibilidade ou apreciação dos embargos à execução pelo simples fato de que o valor do bem constrito é inferior ao valor exequendo, devendo o juiz proceder à intimação do devedor para reforçar a penhora". Ressaltou-se, ainda, que "a insuficiência patrimonial do devedor é a justificativa plausível à apreciação dos embargos à execução sem que o executado proceda ao reforço da penhora, [...], desde que comprovada inequivocamente". 2. In casu, o Tribunal de origem consignou: "Ora, o recebimento dos embargos à execução quando ausente garantia integral da dívida pressupõe prova cabal no sentido de que a parte embargante não possui bens ou rendas suficientes a tanto. Prova essa que não foi produzida, sequer minimamente, nos autos. A alegada insuficiência não passou de mero argumento expendido pelo executado, uma vez que não foi juntado aos autos qualquer documento capaz de amparar a alegação, seja declaração de imposto de renda da pessoa jurídica, seja certidão negativa expedida pelo registro de imóveis ou pelo DETRAN/RS" (fl. 112, e-STJ). 3. Desse modo, rever o consignado pelo Tribunal de origem requer revolvimento do conjunto fático-probatório. 4. Recurso Especial não conhecido. (REsp 1680672/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/09/2017, DJe 09/10/2017) Ante o exposto, nego seguimento ao recurso especial no tocante ao debate pacificado em recursos repetitivos (Temas 260 e 526), nos termos do art. 1.030, I, "b" do CPC e, nas demais questões, não o admito. Int. Nas razões do presente agravo, a parte reproduz, em síntese, os argumentos que já houvera formulado quando da interposição do recurso excepcional ao qual fora negado seguimento nos termos da decisão acima transcrita. Afirma que o caso concreto não se amolda aos temas citados. A parte agravada apresentou contrarrazões. É o relatório.
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000410-93.2020.4.03.6129 RELATOR: Gab. Vice Presidência APELANTE: LOGIKA DISTRIBUIDORA DE COSMETICOS LTDA Advogado do(a) APELANTE: MURILO VARASQUIM - PR41918 PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A atuação dos tribunais de segundo grau de jurisdição, no tocante ao exame de admissibilidade dos recursos especiais e extraordinários, ganhou novos contornos, ainda ao tempo do CPC/73, com a introdução da sistemática dos recursos representativos de controvérsia ou, na terminologia do CPC/15, da sistemática dos recursos repetitivos ou de repercussão geral, decorrente da transformação das decisões das Cortes Superiores de precedentes meramente persuasivos para julgados de observância obrigatória pelas instâncias ordinárias do Poder Judiciário. Assim, a partir da edição dos arts. 543-A a 543-C do CPC/73, foi atribuída, aos tribunais locais, a competência de julgar, pelo mérito, os recursos dirigidos às instâncias superiores, desde que a questão de direito constitucional ou legal neles veiculada tenha sido, anteriormente, objeto de acórdão de Corte Superior erigido à condição de precedente qualificado pelo procedimento estabelecido para sua formação. Esse sistema, aperfeiçoado pelo CPC/15, permite à instância a quo negar seguimento, desde logo, a recurso especial ou extraordinário em contrariedade à tese jurídica já estabelecida pelas Cortes Superiores, bem como a autoriza a proceder ao encaminhamento do caso para retratação pelo órgão julgador, sempre que verificado que o acórdão recorrido não aplicou, ou aplicou equivocadamente, tese jurídica firmada nos leading cases. Além da valorização dos precedentes, a atual sistemática acarreta sensível diminuição dos casos individuais que chegam aos Tribunais Superiores, ocasionando maior racionalidade em seu funcionamento e aperfeiçoamento de seu papel de Cortes de “teses” ou de interpretação do direito constitucional ou legal. Cabe destacar que a manutenção do tradicional sistema de recorribilidade externa, qual seja, da possibilidade de revisão das decisões da instância a quo mediante interposição do agravo de inadmissão para julgamento pela instância ad quem, tinha enorme potencial para esvaziar a eficácia da novel sistemática de valorização dos precedentes qualificados, pois mantinha as Cortes Superiores facilmente acessíveis a todos os litigantes em todo e qualquer caso. As leis de reforma do sistema processual que trouxeram à luz os arts. 543-A a 543-C do CPC/73 silenciaram quanto ao ponto em destaque, o que instigou os Tribunais Superiores a avançarem em direção a uma solução jurisprudencial para o impasse: no AI 760.358/RS-QO (j. 19.11.2009), o Pleno do Supremo Tribunal Federal decidiu por não mais conhecer dos agravos interpostos de decisões proferidas com fundamento no art. 543-B do CPC/73, estabelecendo que a impugnação de tais decisões ocorreria, dali em diante, por meio de agravos regimentais, a serem decididos pelos próprios tribunais de apelação. Como não poderia deixar de ser, a iniciativa da Suprema Corte foi secundada pelo Superior Tribunal de Justiça, que, por sua Corte Especial, em 12.05.2011, chegou a solução similar ao julgar a QO-AI 1.154.599/SP. Dessa forma, restou adequadamente solucionada pela jurisprudência a questão, ao se estabelecer, como regra, a recorribilidade “interna” na instância a quo em caso de negativa de seguimento do recurso excepcional pelo tribunal, por considerá-lo em confronto à tese jurídica assentada pelo STF ou pelo STJ em precedente qualificado. Essa solução foi totalmente encampada pelo CPC/15, prevendo-se expressamente, desde então, o cabimento de agravo interno das decisões que negam seguimento a recurso excepcional, sempre que o acórdão recorrido tenha aplicado precedente qualificado e o recurso interposto tenha, em seu mérito, a pretensão única de rediscutir a aplicação da tese jurídica firmada no precedente. Trata-se de recurso de fundamentação vinculada, pois não é dado à parte rediscutir o acerto ou a justiça do acórdão recorrido, sendo cognoscível por essa via recursal, tão somente, a questão relativa à invocação correta, ou não, do precedente no caso concreto. É lícito ao agravante, portanto, alinhavar razões que evidenciem que o precedente invocado não se aplica ao caso concreto, por nele existir circunstância fática ou jurídica que o diferencia (distinguishing), bem como que demonstrem que a tese assentada no precedente, ainda que aplicável ao caso concreto, encontra-se superada por circunstâncias fáticas ou jurídicas (overruling). A simples reprodução mecânica, no agravo interno, das razões do recurso excepcional a que negado seguimento, ou ainda, o subterfúgio da inovação recursal, extrapolam o exercício regular do direito de recorrer, fazendo do agravo uma medida manifestamente inadmissível e improcedente, a autorizar a aplicação aos agravos internos interpostos com fundamento no art. 1.030, I, do CPC, da penalidade prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC, por interpretação extensiva. Assentadas essas premissas, passa-se ao julgamento do agravo interno. Diferentemente do quanto sustentado pela parte agravante, o exame meticuloso dos autos revela que não há distinção relevante entre o caso concreto e a ratio decidendi do precedente vinculante invocado para fins de negativa de seguimento ao recurso excepcional interposto. Não há fundamento idôneo, portanto, para que seja conferido trânsito ao recurso excepcional interposto, já que o caso bem se amolda ao quanto decidido pela instância superior no recurso excepcional invocado na decisão agravada, e o acórdão proferido pelo órgão fracionário deste Tribunal está em total conformidade com o entendimento que emana do mencionado precedente. Em face do exposto, nego provimento ao agravo interno. É como voto.
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. RECURSO DE FUNDAMENTAÇÃO VINCULADA. AUSÊNCIA DE DISTINÇÃO RELEVANTE. ACÓRDÃO DO ÓRGÃO FRACIONÁRIO EM CONFORMIDADE COM O ENTENDIMENTO EMANADO PELO PRECEDENTE. AGRAVO DESPROVIDO.
I. Agravo interno contra decisão que negou seguimento a recurso excepcional.
II. Trata-se o agravo interno de recurso com fundamentação vinculada, sendo cognoscível por essa via recursal, tão somente, a questão relativa à invocação correta, ou não, do precedente no caso concreto.
III. Inexistente distinção relevante entre o caso concreto e a ratio decidendi do precedente vinculante invocado para fins de negativa de seguimento ao recurso excepcional interposto.
IV. O caso amolda-se ao quanto decidido pela instância superior no recurso excepcional invocado na decisão agravada, e o acórdão proferido pelo órgão fracionário deste Tribunal está em total conformidade com o entendimento que emana do mencionado precedente.
V. Agravo interno desprovido.