Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5015623-28.2022.4.03.0000

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

AGRAVANTE: JESUS MARTINS

Advogado do(a) AGRAVANTE: BRAZ EID SHAHATEET - SP357831-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5015623-28.2022.4.03.0000

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

AGRAVANTE: JESUS MARTINS

Advogado do(a) AGRAVANTE: BRAZ EID SHAHATEET - SP357831-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de agravo de agravo de instrumento, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, interposto por JESUS MARTINS, em face r. decisão proferida pelo MM. Juízo “a quo”, que em sede de execução fiscal nº 0001817-14.2013.403.6115, indeferiu o pedido de conversão em renda do valor bloqueado para liquidar o saldo devedor transacionado, bem como o pedido de alienação particular dos bens imóveis constritos.

Alega o agravante, em síntese, que possui o direito subjetivo de quitar o parcelamento/transação efetuada com o produto derivado de alienação dos bens penhorados. 

Deferido parcialmente o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, para possibilitar a integral liquidação da transação tributária com a utilização dos valores penhorados, atualmente custodiados junto à Caixa Econômica Federal, com a sua conversão em renda da União para fins de liquidação do saldo devedor transacionado, devendo ser respeitadas eventuais penhoras de ações trabalhistas e/ou pensão alimentícia, mantendo-se tais valores à disposição do r. Juízo (ID 260188145).

Devidamente intimada, a agravada apresentou contraminuta (ID 259979861).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5015623-28.2022.4.03.0000

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

AGRAVANTE: JESUS MARTINS

Advogado do(a) AGRAVANTE: BRAZ EID SHAHATEET - SP357831-A

AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

Trata-se de agravo de instrumento interposto para o fim de reformar a r. decisão proferida pelo juízo de piso, que indeferiu o pedido de conversão em renda do valor bloqueado para liquidar o saldo devedor transacionado, bem como o pedido de alienação particular dos bens imóveis constritos.

In casu, relata o agravante que durante o curso da execução fiscal, em 17/08/2020 procedeu à adesão à denominada Transação Excepcional, disciplinada pela Portaria PGFN sob nº 14.402, de 16 de junho de 2020, publicada em 17/06/2020, Edição 114, Seção 1, Página 46, a qual foi “DEFERIDA E CONSOLIDADA”, na modalidade de TRANSAÇÃO EXCEPCIONAL – DEMAIS DÉBITOS, com valor transacionado de R$ 1.667.310,71, a serem adimplidos em 145 parcelas mensais e sucessivas, sendo que já realizou o pagamento de 20 (vinte) prestações, nas quais se incluem as 12 (doze) parcelas de “ENTRADA”, cujos valores representam cifras consideravelmente superiores às demais 133, e que compõem parte substancial do débito. Por conta disso, o saldo devedor transacionado está, atualmente, em R$ 1.375.093,82. 

Conforme se extrai da petição inicial do presente recurso, o Executado/Agravante requereu o deferimento de alienação por iniciativa particular dos imóveis sob matrícula nº 62.140, 62.141, 48.432, 62.181 e 62.182, todos do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de São Carlos/SP, para fins de amortização ou liquidação de saldo devedor transacionado. Em subsequente manifestação da Fazenda Pública Federal (ID 51989783, protocolada em 21/04/2021) exarou-se alternativa distinta da alienação dos bens penhorados por iniciativa particular, assentindo a Exequente (ora Agravada) com a utilização dos valores penhorados, atualmente custodiados junto à Caixa Econômica Federal, asseverando que “a sua conversão em renda se impõe para fins de amortização do saldo devedor do parcelamento celebrado pelo Executado”.

O Executado/Agravante  concordou com a utilização dos valores anteriormente constritos e objeto de depósito judicial para fins de amortização ou liquidação do saldo devedor transacionado, no entanto, a Fazenda Pública Nacional defendeu a manutenção do depósito judicial até a quitação integral da transação ou, alternativamente, sua conversão em renda na inscrição em DAU exequenda, sem a incidência dos descontos da transação, com posterior reconsolidação do saldo devedor, bem como o indeferimento da proposta do devedor de alienação direta dos imóveis penhorados nos autos, posto que as certidões de matrículas demonstram que todos tem penhoras efetivadas pela Justiça do Trabalho.

Aduz que, em um primeiro momento, a Fazenda Nacional teria anuído expressamente com “a utilização dos depósitos de valores existentes para amortização das dívidas parceladas/transacionadas, no entanto, em nova manifestação, discordou, sob o fundamento de inexistência de previsão legal expressa para amortização das parcelas.

Após nova conclusão, o MM. Juízo “a quo” proferiu o r. despacho encartado sob ID 251998397, indeferindo o pedido de conversão dos valores depositados naqueles autos em renda para a União, bem como o pleito de alienação particular dos imóveis objeto de penhora naqueles autos, sob dois fundamentos: i) discordância da União e ii) tratar-se de garantia da referida execução e de outras em relação às quais aquele feito é piloto.

É bem de ver que não se desconhece a tese firmada pelo c. STJ - Tema 1012 no sentido de que o bloqueio de ativos financeiros do executado via sistema BACENJUD, em caso de concessão de parcelamento fiscal, fica mantido se a concessão ocorre em momento posterior à constrição, ressalvada, nessa hipótese, a possibilidade excepcional de substituição da penhora online por fiança bancária ou seguro garantia, diante das peculiaridades do caso concreto, mediante comprovação irrefutável, a cargo do executado, da necessidade de aplicação do princípio da menor onerosidade (REsp 1756406, julgado em 08/06/2022, publicado em 14/06/2022).

Ocorre que, no caso dos autos, o agravante não pretende o levantamento da constrição para si, mas sim o aproveitamento dos valores depositados judicialmente para o fim de liquidação do saldo devedor transacionado. Ora, o agravante informa que está com muita dificuldade de pagar as parcelas vincendas do parcelamento, enquanto que existe um valor bloqueado em favor da União Federal. 

Ainda que não haja previsão legal expressa, tal como afirmou o r. Juízo  a quo, é certo que que deve ser levado em conta os princípios motivadores da transação tributária, elencados na Portaria PGFN nº 14.402, de 16 de julho de 2020 e na Portaria PGFN nº 9.917, de 14 abril de 2020, vale dizer: (i) o estímulo à autorregularização e conformidade fiscal; (ii) a cooperação mútua para a solução não litigiosa dos conflitos; (iii) menor onerosidade dos instrumentos de cobrança; (iv) adequação dos meios de cobrança à capacidade de pagamento dos devedores inscritos em dívida ativa da União; (v) atendimento ao interesse público e, também, (vi) assegurar que a cobrança de créditos inscritos em dívida ativa seja realizada de forma menos gravosa para os devedores pessoa física.

Além disso, a própria Portaria PGFN nº 14.402/2020, em seu artigo 23, autoriza a utilização de bens penhorados em execução fiscal para amortização ou liquidação do saldo devedor transacionado, senão vejamos:

Art. 23. A adesão à transação excepcional proposta pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional implica manutenção automática dos gravames decorrentes de arrolamento de bens, de medida cautelar fiscal e das garantias prestadas administrativamente ou nas ações de execução fiscal ou em qualquer outra ação judicial.

Parágrafo único. Em caso de bens penhorados ou oferecidos em garantia de execução fiscal, é facultado ao sujeito passivo requerer a alienação por iniciativa particular, nos termos do art. 880 da Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), para fins de amortização ou liquidação de saldo devedor transacionado. (grifei)

Referido ato normativo não faz distinções entre bens móveis, imóveis e dinheiro, autorizando, de forma abrangente, a utilização de bens penhorados para a amortização ou liquidação do saldo devedor transacionado.

 Ainda que assim não fosse, se existe a possibilidade de alienação de bens para a amortização ou liquidação do saldo devedor do parcelamento, com mais razão de ser a possibilidade de utilização de valor já restrito para o mesmo fim, com a simples conversão em renda da União, procedimento mais simples, beneficiando o próprio credor.

Nesta senda, não faz sentido a manutenção da penhora para garantia da execução e para satisfação do crédito do credor (Fazenda Nacional) quando os valores penhorados serão vertidos ao pagamento do próprio credor (Fazenda Nacional).

Desse modo, a conversão em renda da União de valores já bloqueados traz uma solução rápida e eficaz à controvérsia, já que permite a quitação, parcial ou total, do crédito tributário em aberto, entretanto devem ser respeitadas eventuais penhoras de ações trabalhistas e/ou pensão alimentícia, mantendo-se tais valores à disposição do r. Juízo.

Nesse sentido, colaciono julgados desta e. Corte, verbis:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXPROPRIAÇÃO DE BENS. ALIENAÇÃO POR INICIATIVA PARTICULAR.

- A jurisprudência vem se posicionando no sentido de que é possível a alienação ser realizada por iniciativa particular.

- Agravo de instrumento a que se dá provimento.

(TRF 3ª/R, AI 5009632-08.2021.4.03.0000, Rel. Desembargadora Federal MARLI FERREIRA, Quarta Turma, Julg.: 06/09/2022, DJEN DATA: 19/09/2022).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EXPROPRIAÇÃO DE BENS. ALIENAÇÃO POR INICIATIVA PARTICULAR. FACULDADE DO EXEQUENTE.

- Embora o art. 881 do CPC indique que o leilão judicial será feito se não efetivada a adjudicação ou a alienação por iniciativa particular, não existe ordem de preferência entre essas vias de expropriação de bens porque o art. 880 do mesmo código positivou a alienação por iniciativa particular como uma faculdade conferida ao exequente.

- O credor poderá fazer a alienação ele mesmo ou com auxílio de corretor ou leiloeiro público credenciado perante o Poder Judiciário, cabendo ao magistrado competente fixar os termos e condições para que a medida seja efetivada, garantindo os primados do processo e os legítimos interesses do credor e do devedor, conforme previsto no art. 880 do CPC. Em face do art. 685-C do CPC/1973, foi editada a Resolução CJF nº 160/2011, descrevendo providências para o processamento a alienação por iniciativa particular que devem ser aproveitadas no que forem compatíveis como o art. 880 do CPC/2015.

- Apesar de buscar celeridade e diminuição de custos em comparação às hastas públicas, a alienação por iniciativa particular é também uma forma de expropriação judicial dos bens penhorados, pois é operada sob a intervenção da autoridade judiciária competente, nos termos e condições por ela fixados. O E.STJ já decidiu que a alienação por iniciativa particular é hipótese de aquisição originária da propriedade, com os mesmos efeitos da alienação em hasta pública porque o domínio da coisa penhorada é transferido sob supervisão judicial, de tal modo que o adquirente fica desvinculado da responsabilidade tributária do executado (ocorrendo a sub-rogação dos créditos tributários no respectivo preço, conforme o art. 130, parágrafo único, do CTN).

- No caso dos autos, a decisão agravada indeferiu o pedido formulado pelo exequente para alienação por iniciativa particular do bem penhorado, contrariando o contido no CPC e na orientação jurisprudencial, merecendo reforma a decisão agravada, notadamente diante da existência de regulamentação da matéria pela Resolução CJF nº 160/2011.

- Recurso provido para autorizar, nos autos de origem, a alienação por iniciativa particular nos termos e condições a serem fixados pelo juízo de primeiro grau.

(TRF 3ª/R, AI 5009013-44.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, Segunda Turma, Julg.: 14/07/2022, Intimação via sistema DATA: 17/07/2022).

Por outro lado, informa o agravante que se encontra em dificuldades financeiras e teme não ser possível manter a regularidade dos pagamentos, já que as parcelas no montante de R$ 12.000,00 (doze mil reais) por mês, acarretam insuportável ônus financeiro, possuindo todos os seus recursos penhorados, salvo aqueles já comprometidos com a manutenção básica da vida humana, especialmente levando-se em consideração que já conta com 64 anos de idade. 

Ante do exposto, dou provimento ao agravo de instrumento para possibilitar a integral liquidação da transação tributária com a utilização dos valores penhorados, atualmente custodiados junto à Caixa Econômica Federal, com a sua conversão em renda da União para fins de liquidação do saldo devedor transacionado, devendo ser respeitadas eventuais penhoras de ações trabalhistas e/ou pensão alimentícia, mantendo-se tais valores à disposição do r. Juízo, nos termos da fundamentação.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. ALIENAÇÃO POR INICIATIVA PARTICULAR. AMORTIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR. POSSIBILIDADE. AGRAVO PROVIDO.

1. Trata-se de agravo de instrumento interposto para o fim de reformar a r. decisão proferida pelo juízo de piso, que indeferiu o pedido de conversão em renda do valor bloqueado para liquidar o saldo devedor transacionado, bem como o pedido de alienação particular dos bens imóveis constritos.

2. In casu, o agravante não pretende o levantamento da constrição para si, mas sim o aproveitamento dos valores depositados judicialmente para o fim de liquidação do saldo devedor transacionado, considerando que está com muita dificuldade de pagar as parcelas vincendas do parcelamento, enquanto que existe um valor bloqueado em favor da União Federal. 

3. A Portaria PGFN nº 14.402/2020 autoriza a utilização de bens penhorados em execução fiscal para amortização ou liquidação do saldo devedor transacionado.

4. Ainda que assim não fosse, se existe a possibilidade de alienação de bens para a amortização ou liquidação do saldo devedor do parcelamento, com mais razão de ser a possibilidade de utilização de valor já restrito para o mesmo fim, com a simples conversão em renda da União, procedimento mais simples, beneficiando o próprio credor.

5. Nesta senda, não faz sentido a manutenção da penhora para garantia da execução e para satisfação do crédito do credor (Fazenda Nacional) quando os valores penhorados serão vertidos ao pagamento do próprio credor (Fazenda Nacional).

6. Agravo de instrumento provido. 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu dar provimento ao agravo de instrumento para possibilitar a integral liquidação da transação tributária com a utilização dos valores penhorados, atualmente custodiados junto à Caixa Econômica Federal, com a sua conversão em renda da União para fins de liquidação do saldo devedor transacionado, devendo ser respeitadas eventuais penhoras de ações trabalhistas e/ou pensão alimentícia, mantendo-se tais valores à disposição do r. Juízo, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA (Relator), com quem votaram o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE e a Des. Fed. MARLI FERREIRA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.