AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5013178-37.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
AGRAVANTE: SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS
AGRAVADO: NOVAFACA FUNDO DE AUXILIO AO CAMINHONEIRO, WAGNER LEMES DE OLIVEIRA
Advogado do(a) AGRAVADO: CAROLINE LACERDA DE SA - SP364043
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5013178-37.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA AGRAVANTE: SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS AGRAVADO: NOVAFACA FUNDO DE AUXILIO AO CAMINHONEIRO, WAGNER LEMES DE OLIVEIRA Advogado do(a) AGRAVADO: CAROLINE LACERDA DE SA - SP364043 OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo de instrumento interposto pela SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP, contra a decisão proferida pelo r. Juízo da 26ª Vara Cível Federal de São Paulo, que, na Ação Civil Pública nº 5034807-37.2021.4.03.6100, indeferiu o pedido de tutela de urgência. Cuida-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pela SUSEP em face de NOVAFACA FUNDO DE AUXÍLIO AO CAMINHONEIRO, em que se pleiteou a declaração de ilicitude da atuação da ré no mercado de seguros e ao pagamento de danos materiais em valor correspondente ao montante total da importância segurada em desacordo com as normas legais. Alega a autora que, nos autos dos procedimentos administrativos nº. 15414.618456/2020-98 e nº 15414.601517/2021-69, constatou-se que a NOVAFACA estaria atuando como sociedade seguradora sem a devida autorização legal, infringindo o disposto nos arts. 24, 78, 113 do Decreto-Lei nº 73/66 c/c arts. 2º, III e § 6º e 17 da Resolução CNSP nº 243/11. Assevera que a NOVAFACA fornece serviço de proteção veicular aos seus associados, revestindo-se da natureza de verdadeiro contrato de seguro. Defende que o seguro é um contrato típico, cujo aperfeiçoamento depende da observância de critérios e regramentos específicos, predefinidos em lei, segundo os quais a sociedade seguradora deve ser constituída sobre a forma de sociedade anônima ou cooperativa, deve ser autorizada pela SUSEP para atuação e deve seguir todas as normas estabelecidas pelo DL nº 73/66. Conclui que a atividade da NOVAFACA como operadora de seguros restou evidenciada a partir da análise de seu Estatuto Social, assim como dos contratos firmados pela entidade com seus associados. Requereu, em sede de tutela provisória, os seguintes pedidos (ID Num. 170547956 - Pág. 30, dos autos originais): a. Que a entidade ré se abstenha, imediatamente, de comercializar, realizar a oferta, veicular ou anunciar – por qualquer meio de comunicação – qualquer modalidade contratual de seguro, sendo expressamente proibida de angariar novos consumidores ao referido serviço, bem como de renovar os contratos atualmente em vigor, sob pena de imposição de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada evento que importe inobservância do referido provimento jurisdicional, a ser recolhida ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD), previsto no artigo 13 da Lei nº 7347/85 e regulamentado pelo Decreto n. 1.306/94, sem prejuízo de outras medidas previstas no Código de Processo Civil; b. Que a ré suspenda, de imediato, a cobrança de valores de seus clientes ou consumidores, a título de mensalidades vencidas e/ou vincendas, rateio e outras despesas relativas à atuação irregular no mercado de seguros, sob pena de imposição de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada evento que importe inobservância do referido provimento jurisdicional, a ser recolhida ao FDD; c. Que seja determinado à entidade ré que divulgue na sua página na internet e no seu perfil nas redes sociais (acaso existentes), no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, o teor da decisão liminar, a fim de dar máxima publicidade aos consumidores em geral, sob pena de multa diária no importe de R$10.000,00 (dez mil reais), em caso de inobservância do provimento jurisdicional, a ser recolhida ao FDD; d. Que seja determinado à ré que encaminhe a todos os clientes, no prazo de 10 (dez) dias, correspondência comunicando o teor da decisão antecipatória, bem como publique, com destaque, em jornal de circulação nacional e/ou veículo publicitário de âmbito nacional, o teor da decisão liminar, sob pena de multa diária, no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), em caso de inobservância do provimento jurisdicional, a ser recolhida ao FDD; e. Que seja estipulada multa pessoal aos dirigentes da entidade ré no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), por dia de atraso no cumprimento das obrigações acima elencadas, a ser recolhida ao FDD, aplicando-se, in casu, a teoria da desconsideração da pessoa jurídica. Na decisão agravada, o r. Juízo a quo indeferiu a antecipação dos efeitos da tutela de urgência (ID Num. 170924938, dos autos originais). Inconformada, a agravante interpõe o presente recurso, com pedido de antecipação dos efeitos tutela recursal, aduzindo, em síntese, que: a) a NOVAFACA está comercializando contratos de seguro sem a autorização da SUSEP e sem observância dos requisitos legais; b) a atividade da recorrida se traduz em típica operação de seguros, conforme evidenciado a partir da análise de seu Estatuto Social e dos contratos firmados pela entidade com seus associados; c) ao contrário do entendimento adotado pelo r. Magistrado Singular, os processos administrativos em curso visam à aplicação de multa administrativa e não se confundem com o objeto da ação civil pública, até porque naqueles autos existe a conclusão administrativa de que a atividade exercida pela associação embute um seguro dissimulado. Em sede de antecipação de tutela recursal, reitera os exatos pedidos formulados na demanda originária. Em decisão ID Num. 258403518, foi deferida parcialmente a concessão de efeito suspensivo. Intimada, a parte recorrida apresentou contraminuta (ID Num. 260504161), aduzindo, em síntese, que: a) como os processos administrativos não foram concluídos perante a SUSEP, não seria adequado suspender de imediato a proteção aos associados; b) não é companhia seguradora e não opera seguros privados, constituindo-se uma associação sem finalidade lucrativa que serve de mero instrumento dos interesses de seus associados, conferindo entre estes os mais diversos benefícios. Na mesma oportunidade, interpôs agravo interno (ID Num. 260509689) nos termos da contraminuta. Intimada, a agravante ofertou resposta (ID Num. 263346474). Em parecer, o Ministério Público Federal, por meio da Procuradoria da República, manifestou-se pelo parcial provimento do recurso para também incluir o pedido contido no item “d” seja concedido (ID Num. 263683320). É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5013178-37.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA AGRAVANTE: SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS AGRAVADO: NOVAFACA FUNDO DE AUXILIO AO CAMINHONEIRO, WAGNER LEMES DE OLIVEIRA Advogado do(a) AGRAVADO: CAROLINE LACERDA DE SA - SP364043 OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Cuida-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pela SUSEP em face de NOVAFACA FUNDO DE AUXÍLIO AO CAMINHONEIRO, em que se pleiteou a declaração de ilicitude da atuação da ré no mercado de seguros e ao pagamento de danos materiais em valor correspondente ao montante total da importância segurada em desacordo com as normas legais. Segundo a agravante, a NOVAFACA, associação civil, estaria atuando como sociedade seguradora sem a devida autorização legal. O conceito legal de seguro está previsto no art. 757 do CC: Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Já o respectivo parágrafo único consigna que “somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada” (grifei). No mesmo sentido, em termos infralegais, o Decreto-Lei nº 73/66, que regulamenta o contrato de seguro privado, prevê, em seu art. 24: Art 24. Poderão operar em seguros privados apenas Sociedades Anônimas ou Cooperativas, devidamente autorizadas. Ainda segundo o Decreto-Lei nº 73/66, compete à SUSEP, como executora da política traçada pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), atuar como órgão fiscalizador da constituição, organização, funcionamento e operações das Sociedades Seguradoras, com as seguintes atribuições (art. 36): a) processar os pedidos de autorização, para constituição, organização, funcionamento, fusão, encampação, grupamento, transferência de contrôle acionário e reforma dos Estatutos das Sociedades Seguradoras, opinar sôbre os mesmos e encaminhá-los ao CNSP; (...) h) fiscalizar as operações das Sociedades Seguradoras, inclusive o exato cumprimento dêste Decreto-lei, de outras leis pertinentes, disposições regulamentares em geral, resoluções do CNSP e aplicar as penalidades cabíveis; Analisando o estatuto social, verifica-se que a NOVAFACA possui a seguinte finalidade (ID Num. 170557217 - Pág. 10, dos autos principais, grifei): Artigo 2º - Das finalidades da Associação A NOVAFACA é uma Associação constituída por número ilimitado de associados, que terá por objetivo principal a proteção do patrimônio relacionado com transportes, quer sejam veículos, carreta ou equipamentos que guarnecem os veículos dos filiados, através do Fundo de Auxilio em caso de sinistros devidamente discriminados nos Estatutos, bem como a difusão de modernos métodos e técnicas de transporte (...) A questão que ora se coloca é saber se a agravada atua como operadora de seguro ou como entidade de autogestão. A distinção se mostra relevante, uma vez que caso a NOVAFACA se organize como entidade de autogestão, não se mostra necessária a autorização da SUSEP para o desempenho de suas atividades, conforme proclamado no Enunciado nº 185 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal: Enunciado nº 185: A disciplina dos seguros do Código Civil e as normas da previdência privada que impõem a contratação exclusivamente por meio de entidades legalmente autorizadas não impedem a formação de grupos restritos de ajuda mútua, caracterizados pela autogestão. Analisando os dois institutos, a Exma. Desembargadora Federal Marli Ferreira já decidiu que os serviços de proteção por autogestão possuem “natureza jurídica de contratos de comunhão de objetivos destinados a partilhar riscos entre os contratantes. Os contratos de serviços de proteção por autogestão revelam mutualismo em si próprios, seja porque estabelecem o simples rateio entre os participantes, ou porque estipulam fundo de reserva a partir de contribuições periódicas” (AI 0005918-72.2014.4.03.0000, 4ª TURMA, julgado em 21/10/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2015). No caso em tela, quanto aos produtos disponibilizados aos associados, segundo a cópia da página de seu endereço eletrônico, a agravada oferece os seguintes (ID Num. 257704568 - Pág. 22, grifei): Proteção Caminhão Proteção Carreta Proteção Carro Proteção Motorhome – Trailer – Tunados e outros Rastreador com Proteção Carro e Caminhão Rastreador FACA Antijammer FACA Proteção Terceiros: Plus – Compacta – CNH A entidade também oferta diversos serviços, tais como: Oficinas credenciadas Assistência Jurídica Serviço de Pronta Resposta e Recuperação Departamento de Gerenciamento de Risco Despachante Financiamento e Refinanciamento Seguros veículos e cargas Seguro saúde Consórcios Pesquisa Cadastral FACA Rastreador principal e contingência Além disso, restando verificado o sinistro, a agravada descreve um “passo a passo” de como deve ser o procedimento adotado pelo associado ser indenizado (ID Num. 257704568 - Pág. 23): 1º Passo: Faça o B.O imediatamente O primeiro passo após um sinistro é fazer o boletim de ocorrência na própria cidade ou pela internet (conforme tipo de sinistro), tirar fotos e colher o máximo de dados possíveis. É recomendado que procure a polícia imediatamente após o ocorrido. Somente então após o boletim, o associado poderá entrar em contato com a Central de Atendimento FACA (leia 2º Passo). 2º Passo: Ligue para a central FACA Uma vez lavrado o boletim de ocorrência, o associado deve entrar em contato com a Central de Atendimento do Fundo de Assistência ao Carreteiro Autônomo no número (11) 2912-2288 ou através do chat online no site www.portalfaca.com.br. Os profissionais do FACA, especializados em agilizar os processos de sinistro, deverão receber todos os documentos necessários para a abertura do processo (veja a lista ao lado). 3º Passo: Documentos em mãos A partir do registro da ocorrência, que dará tranquilidade ao associado, chega a hora de separar os documentos necessários para a continuidade do processo. Veja abaixo a relação de documentos exigidos para abertura e andamento do sinistro para o pagamento de indenização: (...) 4º Passo: Casos de terceiros No caso de sinistro envolvendo terceiros, é obrigatória a apresentação do boletim de ocorrência, bem como o envio de uma foto do veículo protegido para andamento do processo. É também importante pensar no lado humano, uma das prioridades do Fundo de Assistência ao Carreteiro Autônomo. Ajudar ao próximo é sempre sinal de boa atitude por parte dos motoristas. Dentre os documentos trazidos pela recorrente, chama a atenção o “CONTRATO PARA FILIAÇÃO DE VEÍCULOS” que a agravada oferece aos seus associados (ID Num. 170587008, dos autos principais), em que consta as seguintes cláusulas: "VEÍCULOS COBERTOS A. Caminhões leves, Caminhões Pesados, Cavalo Mecânico, Rebocadores e Semirreboques, com vistoria prévia. B. Veículos e Equipamentos Especiais com vistoria prévia para aceitação. COBERTURAS BÁSICAS A. Colisão, Incêndio, Roubo, Furto, responsabilidade civil (danos materiais, danos pessoais e danos morais devidamente contratados). B. Garantia de reposição por um bem similar, respeitando os seguintes prazos: até 90 dias para incêndio, roubo, furto; desde que a documentação do veículo sinistrado esteja perfeitamente em ordem. (...) K. Só será pago sinistro ou socorro para a carreta ou outros equipamentos caso sejam devidamente cadastrados, vistoriados e com suas mensalidades em dia. (...) RATEIO EXTRA A. Haverá rateio extra (gatilho automático) entre todos participantes do contrato caso a sinistralidade atinja 75% (setenta e cinco por cento) do valor destinado à cobertura ora contratada. Destarte, vislumbra-se que a agravada desempenha atividade típica de operação de seguros, uma vez que oferta serviços ou produtos que buscam resguardar o seu associado/consumidor de prejuízos materiais decorrentes das coberturas por ela abarcadas. Corrobora tal conclusão o fato de seus serviços e produtos estarem à disposição de um “número ilimitado de associados” (art. 2º de seu Estatuto). Isso porque, segundo entendimento adotado pelo E. Superior Tribunal de Justiça, os serviços e produtos prestados pelas entidades de autogestão não estão disponibilizados ao mercado consumidor em geral, sendo esta a primordial razão pela qual não incide as previsões do Código de Defesa do Consumidor: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. ENTIDADE DE AUTOGESTÃO. CDC. INAPLICABILIDADE. TRATAMENTO ODONTOLÓGICO. CIRURGIA. COPARTICIPAÇÃO DO USUÁRIO EM VALORES PERCENTUAIS. PREVISÃO CONTRATUAL CLARA E EXPRESSA. LEGALIDADE. FATOR DE RESTRIÇÃO SEVERA AOS SERVIÇOS. INEXISTÊNCIA. ABUSIVIDADE. AFASTAMENTO. DANOS MORAIS. NÃO CONFIGURAÇÃO. 1. As entidades de autogestão não visam o lucro e constituem sistemas fechados, já que os planos que administram não estão disponíveis no mercado consumidor em geral, mas, ao contrário, a apenas um grupo restrito de beneficiários. 2. A Segunda Seção desta Corte Superior consagrou o entendimento de não se aplicar o Código de Defesa do Consumidor ao contrato de plano de saúde administrado por entidade de autogestão, haja vista a inexistência de relação de consumo. (...) (AgInt no REsp n. 1.563.986/MS, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe de 6/9/2017.) Assim, a agravada não pode ser qualificada como uma entidade de autogestão, seja porque os seus produtos e serviços são disponibilizados para qualquer pessoa, seja porque a forma pela qual tais atividades são oferecidas apresentam nítidos elementos de um contrato securitário de veículos e cargas. Como a SUSEP categoricamente afirma que a agravada não está autorizada a comercializar seguros, restam violados o art. 757, parágrafo único, do CC, anteriormente descrito, e os arts. 24, 78 e 113 do Decreto-Lei nº 73/1966: Art. 24. Poderão operar em seguros privados apenas Sociedades Anônimas ou Cooperativas, devidamente autorizadas. Parágrafo único. As Sociedades Cooperativas operarão unicamente em seguros agrícolas, de saúde e de acidentes do trabalho. Art. 78. As Sociedades Seguradoras só poderão operar em seguros para os quais tenham a necessária autorização, segundo os planos, tarifas e normas aprovadas pelo CNSP. Art. 113. As pessoas naturais ou jurídicas que realizarem operações de capitalização, seguro, cosseguro ou resseguro sem a devida autorização estão sujeitas às penalidades administrativas previstas no art. 108, aplicadas pelo órgão fiscalizador de seguros, aumentadas até o triplo. Em caso análogo, o E. Superior Tribunal de Justiça assim já decidiu: CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. PODER FISCALIZATÓRIO DA SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP. PEDIDO DE INTERVENÇÃO DA CONFEDERAÇÃO NACIONAL DAS EMPRESAS DE SEGUROS GERAIS, PREVIDÊNCIA PRIVADA E VIDA, SAÚDE SUPLEMENTAR E CAPITALIZAÇÃO - CNSEG, COMO TERCEIRO PREJUDICADO. INDEFERIMENTO. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO PELA SUSEP. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO E DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO SOBRE A PARTE DO RECURSO QUE SUSCITA A VIOLAÇÃO DO DISPOSITIVO DO ART. 535, II, DO CPC/1973. REJEIÇÃO. ALEGAÇÃO DA RECORRENTE - SUSEP DE OFENSA AO DISPOSITIVO DO ART. 535, II, DO CPC/1973. NÃO OCORRÊNCIA. ATIVIDADES DA ASSOCIAÇÃO MINEIRA DE PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA AUTOMOTIVA. CARACTERIZAÇÃO COMO PRÁTICA SECURITÁRIA. ARESTO RECORRIDO QUE CONCLUIU PELA OCORRÊNCIA DE UM "GRUPO RESTRITO DE AJUDA MÚTUA". ENUNCIADO N. 185 DA III JORNADA DE DIREITO CIVIL DO CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL. INAPLICABILIDADE. VIOLAÇÃO DOS DISPOSITIVOS DOS ARTS. 757 DO CÓDIGO CIVIL/2002 E DOS ARTS. 24, 78 e 113 DO DECRETO-LEI N. 73/1966. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELA CONFEDERAÇÃO NACIONAL DAS EMPRESAS DE SEGUROS GERAIS, PREVIDÊNCIA PRIVADA E VIDA, SAÚDE SUPLEMENTAR E CAPITALIZAÇÃO - CNSEG PREJUDICADO. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELA SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP CONHECIDO E PROVIDO. (...) 9. O Enunciado n. 185 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, no que concerne à interpretação atribuída ao art. 757 do Código Civil/2002, assenta que "a disciplina dos seguros do Código Civil e as normas da previdência privada que impõem a contratação exclusivamente por meio de entidades legalmente autorizadas não impedem a formação de grupos restritos de ajuda mútua, caracterizados pela autogestão". 10. A questão desta demanda é que, pela própria descrição contida no aresto impugnado, verifica-se que a recorrida não pode se qualificar como "grupo restrito de ajuda mútua", dadas as características de típico contrato de seguro, além de que o serviço intitulado de "proteção automotiva" é aberto a um grupo indiscriminado e indistinto de interessados, o que resulta em violação do dispositivo do art. 757 do Código Civil/2002, bem como dos arts. 24, 78 e 113 do Decreto-Lei n. 73/1966. 11. Aliás, tanto se trata de atividade que não encontra amparo na legislação atualmente vigente que a própria parte recorrida fez acostar aos autos diversos informes a título de projetos de lei que estariam tramitando no Poder Legislativo, a fim de alterar o art. 53 do Código Civil/2002, para permitir a atividade questionada neste feito. Ora, tratasse de ponto consolidado na legislação pátria, não haveria necessidade de qualquer alteração legislativa, a demonstrar que o produto veiculado e oferecido pela recorrida, por se constituir em atividade securitária, não possui amparo na liberdade associativa em geral e depende da intervenção reguladora a ser exercida pela recorrente. 12. Não se está afirmando que a requerida não possa se constituir em "grupo restrito de ajuda mútua", mas tal somente pode ocorrer se a parte se constituir em conformidade com o disposto no Decreto-Lei n. 2.063/1940 e legislação correlata, obedecidas às restrições que constam de tal diploma legal e nos termos estritos do Enunciado n. 185 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal. 13. Recurso especial interposto pela Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização - CNSEG prejudicado. Recurso especial interposto pela Superintendência de Seguros Privados - SUSEP conhecido e provido. (REsp n. 1.616.359/RJ, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 27/6/2018.) No mesmo sentido, esta E. Corte já reconheceu a impossibilidade de uma associação civil ofertar serviços de cobertura de riscos inerentes ao ramo securitário sem a devida autorização da SUSEP: DIREITO CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO MATERIAL DE VEÍCULOS AUTOMOTORES. SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP. PRÁTICA SECURITÁRIA CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO. ART. 24 DO DECRETO-LEI Nº 73/66. ART. 757 DO CÓDIGO CIVIL. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL PROVIDAS. 1. O objetivo da associação em questão entre outros é amparar os seus associados quanto a danos em seus veículos, causados por colisão, incêndio, roubo ou furto. 2. Uma das características do contrato de seguro é no que pertine à universalidade de suas propostas. Ou seja, é importante para distinguir o grupo de auxílio mútuo por autogestão do denominado contrato de seguro, deve-se analisar quem são os sujeitos de direito aos quais se dirige a proposta. 3. Verifica-se no site da AIPESP (www.imperialpaulista.com.br) constar a oferta a grupo indeterminado de pessoas, de proteção patrimonial, que seria uma alternativa para proprietários de carros ou frotas que procuram uma proteção para seu bem, com valor acessível. E, mais adiante elenca quais as proteções oferecidas: roubo, furto qualificado, acidentes, incêndios e assistência 24h. 4. Portanto, o que ressalta dos autos é que a apelada, sem forma ou figura legal, exerce ilegalmente a atividade de seguradora, sem atentar para as exigências legais que envolvem essa prestação de serviço. 5. Configurada violação ao disposto no artigo 757 do Código Civil/2002, bem como nos artigos 24, 78 e 113 do Decreto-Lei n. 73/1996. Precedentes. 6. Remessa Oficial e apelação providas. (ApelRemNec 0015716-61.2012.4.03.6100, Rel. Desembargadora Federal Marli Ferreira, julgado em 26/09/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/10/2019) CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REMESSA OFICIAL. ASSOCIAÇÃO CIVIL. SEGURO PRIVADO DE AUTOMÓVEL. ILEGALIDADE. SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP. AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO. ART. 24 DO DECRETO-LEI Nº 73/66. ART. 757 DO CÓDIGO CIVIL. RISCO AO MERCADO CONSUMERISTA. DANOS MORAIS COLETIVOS. NÃO VERIFICAÇÃO. DESPROVIMENTO. 1. Ação civil pública proposta por ente legitimado (SUSEP - Autarquia Federal) com o intuito de defesa do mercado consumerista (Lei 7.347/85, artigos 1º, II e 5º, IV). 2. Cinge-se a questão em averiguar se os serviços oferecidos pela associação-ré no denominado "Programa de Proteção do Patrimônio dos Associados", configuram atividades privativas de sociedades securitárias, sendo permitidas somente àquelas legalmente constituídas e autorizadas. 3. Nos termos do art. 757, caput e parágrafo único do Código Civil, no contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados, sendo que somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada. 4. O Decreto-lei 73 de 21.11.1966 prevê no seu art. 24 que poderão operar em seguros privados apenas sociedades anônimas ou cooperativas devidamente autorizadas; por sinal, essa prévia autorização é de atribuição da SUSEP, que também exerce as atividades fiscalizadoras do ramo (DL 73/66, artigos 35 e 36). 5. No caso dos autos, conforme largamente demonstrado pelos procedimentos administrativos e demais documentos colacionados, o serviço de proteção veicular oferecido pela ré no âmbito do "Programa de Proteção do Patrimônio" proporciona aos associados o pagamento de indenizações em caso de sinistro de automóveis, exigindo, como contraprestação, pagamento de "taxa de adesão". 6. Conquanto haja utilização de terminologias impróprias ou diferenciadas, a implementação do referido programa prevê, dentre outras, cláusulas de pagamento de franquia, realização de vistoria, inspeção de riscos e sinistros, descrição de riscos cobertos e não cobertos pela avença, bem como obrigações e direitos dos contratantes. 7. É certo, portanto, estar-se diante de programa cujo escopo é o oferecimento de cobertura de riscos automotivos ao mercado consumidor, atividade que, nos termos dos dispositivos legais supracitados, é típica e privativa de entidade seguradora. 8. Não sendo a ré uma entidade legalmente constituída e autorizada para a realização de atividades securitárias (bastando lembrar que se trata de uma associação civil), a manutenção de tal atuação consubstancia, além de concorrência desleal, cenário de potencial dano ao mercado consumidor, uma vez que as sociedades de seguro legalmente instituídas se submetem a rígido padrão de controle e fiscalização pelo Poder Público. Precedente. 9. A pretendida condenação por danos morais coletivos se mostra descabida no caso, pois não se demonstrou que a atividade da ré, embora desautorizada, causou sofrimentos, intranquilidade social e alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva, conforme exige a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça (REsp 1221756/RJ, Rel. Min. Massami Uyeda, 3ªT, DJe 10/02/2012; REsp 1291213/SC, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ªT, DJe 25/09/2012). 10. Nega-se provimento à remessa oficial. (ReeNec 0016965-47.2012.4.03.6100, 6ª Turma, Rel. Desembargadora Federal Diva Malerbi, julgado em 07/06/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/06/2018) Neste recurso, a agravante formula os pedidos de antecipação dos efeitos da tutela recursal e de provimento final nos idênticos termos (ID Num. 257704568 - Pág. 25): a. Que a entidade ré se abstenha, imediatamente, de comercializar, realizar a oferta, veicular ou anunciar – por qualquer meio de comunicação – qualquer modalidade contratual de seguro, sendo expressamente proibida de angariar novos consumidores ao referido serviço, bem como de renovar os contratos atualmente em vigor, sob pena de imposição de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada evento que importe inobservância do referido provimento jurisdicional, a ser recolhida ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD), previsto no artigo 13 da Lei nº 7347/85 e regulamentado pelo Decreto n. 1.306/94, sem prejuízo de outras medidas previstas no Código de Processo Civil; b. Que a ré suspenda, de imediato, a cobrança de valores de seus clientes ou consumidores, a título de mensalidades vencidas e/ou vincendas, rateio e outras despesas relativas à atuação irregular no mercado de seguros, sob pena de imposição de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada evento que importe inobservância do referido provimento jurisdicional, a ser recolhida ao FDD; c. Que seja determinado à entidade ré que divulgue na sua página na internet e no seu perfil nas redes sociais (acaso existentes), no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, o teor da decisão liminar, a fim de dar máxima publicidade aos consumidores em geral, sob pena de multa diária no importe de R$10.000,00 (dez mil reais), em caso de inobservância do provimento jurisdicional, a ser recolhida ao FDD; d. Que seja determinado à ré que encaminhe a todos os clientes, no prazo de 10 (dez) dias, correspondência comunicando o teor da decisão antecipatória, bem como publique, com destaque, em jornal de circulação nacional e/ou veículo publicitário de âmbito nacional, o teor da decisão liminar, sob pena de multa diária, no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), em caso de inobservância do provimento jurisdicional, a ser recolhida ao FDD; e. Que seja estipulada multa pessoal aos dirigentes da entidade ré no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), por dia de atraso no cumprimento das obrigações acima elencadas, a ser recolhida ao FDD, aplicando-se, in casu, a teoria da desconsideração da pessoa jurídica. Na decisão ID Num. 258403518, deferi parcialmente o pedido de tutela provisória, nos seguintes termos: O pedido de item “a” deve ser concedido em sua integralidade, uma vez que existem provas de atuação no mercado securitário sem a devida autorização da SUSEP. Assim, a agravada não pode oferecer os seus produtos e serviços para novos consumidores, nem renovar com aqueles que já estão associados. Com relação à multa cominatória, ao regulamentar o procedimento da obrigação de fazer ou de não fazer (“tutela específica”), o Diploma Processual em vigor prevê diversas medidas de natureza executiva no art. 537: Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito. § 1º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que: I - se tornou insuficiente ou excessiva; II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento. Na tutela específica, o propósito do legislador é compelir o sujeito passivo a praticar o provimento jurisdicional concedido. Neste sentido, a multa cominatória ostenta especial importância, tanto que o Código de Processual Civil autoriza o magistrado a fixá-la de ofício em qualquer fase do processo de conhecimento ou de execução. Impende considerar, por outro lado, que a previsão da multa coercitiva possui os condicionantes de ser “suficiente e compatível com a obrigação”. Deste modo, o valor sugerido de R$ 10.000,00 para cada evento que importe inobservância deste provimento jurisdicional se mostra razoável e proporcional com a obrigação de não fazer ora imposta. Quanto ao pedido do item “b” (suspender a cobrança de valores de seus clientes ou consumidores), entendo que imediata paralisação do pagamento da contraprestação acarretaria, posteriormente, a interrupção do próprio serviço por ela prestado de salvaguardar os consumidores que já aderiram à avença. Impende frisar que não se está aqui defendendo uma espécie de ato jurídico perfeito ou de aplicação da teoria do fato consumado. Ocorre que não se pode negar que, sem o pagamento dos valores dos consumidores, a reserva financeira que a agravada atualmente possui se esgotará com a manutenção dos serviços securitários, o que prejudicaria os próprios consumidores. O fundamento para a manutenção deste regime jurídico está descrito no parágrafo único, do art. 21, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro: Art. 21. A decisão que, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, decretar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas. Parágrafo único. A decisão a que se refere o caput deste artigo deverá, quando for o caso, indicar as condições para que a regularização ocorra de modo proporcional e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais, não se podendo impor aos sujeitos atingidos ônus ou perdas que, em função das peculiaridades do caso, sejam anormais ou excessivos. Assim, por ora, mostra-se essencial que as atividades prestadas pela NOVAFACA permaneçam válidas e eficazes exclusivamente para os associados, minorando os prejuízos que a parte hipossuficiente sofreria em caso de abrupta interrupção do regime securitário. Já o pedido de item “c” (divulgar na sua página na internet e no seu perfil nas redes sociais o teor da decisão liminar) também entendo que não deve ser deferido. Ao apreciar o pedido de tutela de urgência, o magistrado realiza uma análise preliminar dos fatos narrados e das provas acostadas pelo autor, resultando em um juízo provisório acerca da veracidade dos termos lançados no requerimento. Dado os novos paradigmas do Diploma Processual Civil de 2015, todas as partes devem se comportar “de acordo com a boa-fé” (art. 5º), cumprindo ao magistrado, dentre outros princípios, resguardar a proporcionalidade, a razoabilidade e a eficiência (art. 8º). Daí porque a publicidade do teor desta decisão no endereço eletrônico e em redes sociais da agravada, dada a sua natureza precária, não traria qualquer outro benefício e/ou providência útil aos limites do pedido inaugural. Isto porque com o deferimento do pedido de item “a”, não serão admitidos novos consumidores, nem renovados com os que já estão associados. E, aos que já aderiram, estão devidamente resguardados pelo indeferimento do pedido de item “b”. Também pela precariedade da decisão liminar, o pedido de item “d” (seja determinado à ré que encaminhe a todos os clientes, no prazo de 10 dias, correspondência comunicando o teor da decisão antecipatória) deve ser rejeitado. Por fim, o pedido de item “e” (multa pessoal aos dirigentes da entidade ré) não se mostra cabível no presente momento, uma vez que não há provas de que os dirigentes estariam utilizando a personalidade jurídica da agravada para burlar eventual ressarcimento aos consumidores. Apreciando os argumentos trazidos pela agravada em sua contraminuta, bem como do Parquet, em seu parecer, não constato elementos que justifiquem a modificação do entendimento acima firmado. Ao contrário do que sustenta a agravada, não há que se falar em prejuízo para os atuais associados, uma vez que, ao indeferir o pedido do item “b” (suspender a cobrança de valores de seus clientes ou consumidores), consignei que se mostra “essencial que as atividades prestadas pela NOVAFACA permaneçam válidas e eficazes exclusivamente para os associados, minorando os prejuízos que a parte hipossuficiente sofreria em caso de abrupta interrupção do regime securitário”. Além disso, o fato de não ter sido encerrado o processo administrativo perante a SUSEP não obsta o ajuizamento da Ação Civil Pública originária, seja por força do princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), seja pelo princípio da independência das instâncias civil, administrativa e penal. Quanto ao requerimento do Parquet para que também seja concedido o pedido contido no item “d” (seja determinado à ré que encaminhe a todos os clientes, no prazo de 10 dias, correspondência comunicando o teor da decisão antecipatória), mantenho os argumentos já adotados. Com efeito, o agravo de instrumento, na forma positivada pelo ordenamento jurídico, é dotado de estreito limite cognitivo, não lhe sendo permitido transcender as matérias efetivamente analisadas pelo juízo singular, sob pena de supressão de instância. No caso em tela, o presente recurso foi interposto em face de decisão interlocutória que indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência. Ou seja, a ação subjacente ainda se encontra em sua fase procedimental inicial. Assim, dada a provisoriedade desta decisão, mostra-se prudente aguardar a tramitação ordinária dos autos principais. Além disso, como ressaltei na decisão ID Num. 258403518, com o deferimento do pedido de item “a” (abster-se de comercializar, realizar a oferta, veicular ou anunciar – por qualquer meio de comunicação – qualquer modalidade contratual de seguro), não estão admitidas a contratação de novos associados, sendo que, para os atuais, não há prejuízo diante do indeferimento do pedido de item “b” (suspender a cobrança de valores de seus clientes ou consumidores). Por fim, esgotada a análise do vertente recurso, fica prejudicado o agravo interno. Ante o exposto, dou parcial provimento ao agravo de instrumento para que a agravada se abstenha, imediatamente, de comercializar, realizar a oferta, veicular ou anunciar – por qualquer meio de comunicação – qualquer modalidade contratual de seguro, sendo expressamente proibida de angariar novos consumidores ao referido serviço, bem como de renovar os contratos atualmente em vigor, sob pena de imposição de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada evento que importe inobservância do referido provimento jurisdicional, a ser recolhida ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD), previsto no artigo 13 da Lei nº 7347/85 e regulamentado pelo Decreto n. 1.306/94, e julgo prejudicado o agravo interno. É como voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
Agravo de instrumento interposto pela SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP contra a decisão proferida pelo Juízo da 26ª Vara Cível Federal de São Paulo, que na Ação Civil Pública nº 5034807-37.2021.4.03.6100 indeferiu o pedido de tutela de urgência. Sustenta, em síntese, que: a) a NOVAFACA está comercializando contratos de seguro sem a autorização da SUSEP e sem observância dos requisitos legais; b) a atividade da recorrida se traduz em típica operação de seguros, conforme evidenciado a partir da análise de seu estatuto social e dos contratos firmados pela entidade com seus associados; c) ao contrário do entendimento adotado pelo magistrado, os processos administrativos em curso buscam a aplicação de multa administrativa e não se confundem com o objeto da ação civil pública, até porque naqueles autos existe a conclusão administrativa de que a atividade exercida pela associação embute um seguro dissimulado.
O eminente Relator votou no sentido de dar parcial provimento ao recurso para que, verbis, “a agravada se abstenha, imediatamente, de comercializar, realizar a oferta, veicular ou anunciar – por qualquer meio de comunicação – qualquer modalidade contratual de seguro, sendo expressamente proibida de angariar novos consumidores ao referido serviço, bem como de renovar os contratos atualmente em vigor, sob pena de imposição de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada evento que importe inobservância do referido provimento jurisdicional, a ser recolhida ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD), previsto no artigo 13 da Lei nº 7347/85 e regulamentado pelo Decreto n. 1.306/94, e julgo prejudicado o agravo interno.” Concordo com as providências deferidas, que correspondem à alínea “a” da petição inicial, porém entendo que devam ser também acolhidos os pedidos das alíneas “b” a “d”.
Concordo inteiramente com os bem lançados fundamentos do voto do Relator, no sentido de que emerge da documentação acostada e das características dos serviços que a agravada oferece a seus associados que desempenha atividade típica de operação de seguros, uma vez que busca-se resguardá-los de prejuízos materiais decorrentes das coberturas contratadas. Precisamente por essa razão é que considero cabíveis as demais providências reclamadas pela recorrente, para também sustar os pagamentos dos clientes atuais, bem como que a empresa providencie ampla divulgação da presente decisão, seja na internet, seja nos meios de comunicação tradicionais. Descabida apenas a fixação de multa para os sócios, dado que sequer foram deduzidos fundamentos para a desconsideração da personalidade jurídica.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento em maior extensão, a fim de que sejam também deferidos os pedidos dos itens “b”, “c” e “d” da inicial do recurso.
É como voto
ANDRÉ NABARRETE
DESEMBARGADOR FEDERAL
mcc
E M E N T A
CIVIL E CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASSOCIAÇÃO CIVIL. SEGURO PRIVADO DE AUTOMÓVEL E OUTROS SERVIÇOS. ATIVIDADES TÍPICAS DE SEGURADORA. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DA SUSEP. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Segundo o Decreto-Lei nº 73/66, compete à SUSEP, como executora da política traçada pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), atuar como órgão fiscalizador da constituição, organização, funcionamento e operações das Sociedades Seguradoras.
2. Segundo entendimento adotado pelo E. Superior Tribunal de Justiça, os serviços e produtos prestados pelas entidades de autogestão não estão disponibilizados ao mercado consumidor em geral, sendo esta a primordial razão pela qual não incide as previsões do Código de Defesa do Consumidor.
3. A agravada não pode ser qualificada como uma entidade de autogestão, seja porque os seus produtos e serviços são disponibilizados para qualquer pessoa, seja porque a forma pela qual tais atividades são oferecidas apresentam nítidos elementos de um contrato securitário de veículos e cargas.
4. Como a SUSEP categoricamente afirma que a agravada não está autorizada a comercializar seguros, restam violados o art. 757, parágrafo único, do CC, anteriormente descrito, e os arts. 24, 78 e 113 do Decreto-Lei nº 73/1966.
5. O simples fato de não ter sido encerrado o processo administrativo perante a SUSEP não obsta o ajuizamento da Ação Civil Pública originária, seja por força do princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), seja pelo princípio da independência das instâncias civil, administrativa e penal.
6. Agravo de instrumento parcialmente provido. Agravo interno prejudicado.