APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5030576-64.2021.4.03.6100
RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA
APELANTE: MARCEL EDITILIOES DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: THIAGO CRUZ DOS SANTOS - SP340820-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5030576-64.2021.4.03.6100 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: MARCEL EDITILIOES DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: THIAGO CRUZ DOS SANTOS - SP340820-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Exma. Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): Apelação interposta por MARCEL EDITILIÕES DA SILVA contra sentença que denegou a segurança pleiteada a fim de obter autorização para porte de arma, indeferido pela autoridade administrativa. Sustenta, em síntese, que é Agente da Autoridade de Trânsito, em São Vicente/SP e recebe Adicional de Risco, concedido pela Lei Complementar 798/15, conforme demonstra o comprovante de pagamento anexado a estes autos, o que significa o reconhecimento do Estado, do poder público, por meio de lei, dos riscos inerentes à função. Afirma, também, que se há uma lei dizendo que o exercício da função de Agente de Trânsito expõe o funcionário público que a desempenha a riscos, o Delegado ou Superintendente de Polícia é obrigado a acatá-la, pois é princípio constitucional que os atos administrativos devem se basear sempre na legalidade, e da moralidade, como prega o artigo 37 da Constituição Federal de 1988. Contrarrazões da União Federal, nas quais afirma que não restou demonstrada nenhuma ilegalidade no processo administrativo e que o apelante não comprovou o preenchimento dos requisitos necessários ao deferimento da autorização para porte de arma, razão pela qual requer a manutenção da sentença recorrida. Manifestação do Ministério Público Federal pelo desprovimento da apelação. É o relatório.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5030576-64.2021.4.03.6100 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: MARCEL EDITILIOES DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: THIAGO CRUZ DOS SANTOS - SP340820-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Exma. Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): Cinge-se a controvérsia em verificar se o impetrante, ora apelado, tem direito à emissão, em seu favor, de porte de arma de fogo, sob o fundamento de que exerce atividade de risco como Agente da Autoridade de Trânsito, em São Vicente/SP. O impetrante, agente de trânsito, apresentou o requerimento de autorização de porte de arma de fogo com fundamento legal no Decreto 9.785/19, indeferido em 02/09/2021, ao fundamento de que não conseguiu demonstrar a sua efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou eventual ameaça à sua integridade física, conforme estabelece o artigo 10 da Lei nº 10.826/03. Foi apresentado recurso administrativo, que também restou indeferido. Com razão o Ministério Público em seu parecer, abaixo transcrito: “(. . .) Assim, embora o impetrante tenha sofrida uma ameaça após ter autuado um cidadão, não foi demonstrado um risco real, capaz de justificar a autorização para o porte de arma. E se for, isso é matéria para ser resolvida no âmbito de um inquérito policial e subsequentemente judicial, e não por meio da concessão de porte de arma. Além disso, como bem mencionado pela apelada, embora o impetrante aduza que não requereu porte de arma funcional, a sua argumentação exposta nos autos é no sentido de que necessita de porte de arma em razão de sua profissão. Seria até temerário armar um agente de trânsito, inclusive porque esta profissão não está elencada entre as exceções à proibição do porte de arma de fogo no país, dispostas no art. 6º, caput, da Lei nº 10.826/2003. Se a lei não lhes concedeu ou permitiu o porte de arma em razão da função, trata-se de um silêncio eloquente, de uma opção do legislador. Confira-se: “Art. 6º É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para: I – os integrantes das Forças Armadas; II – os integrantes de órgãos referidos nos incisos I, II, III, IV e V do caput do art. 144 da Constituição Federal e os da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP); III – os integrantes das guardas municipais das capitais dos Estados e dos Municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, nas condições estabelecidas no regulamento desta Lei; IV - os integrantes das guardas municipais dos Municípios com mais de 50.000 (cinqüenta mil) e menos de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, quando em serviço; V – os agentes operacionais da Agência Brasileira de Inteligência e os agentes do Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; VI – os integrantes dos órgãos policiais referidos no art. 51, IV, e no art. 52, XIII, da Constituição Federal; VII – os integrantes do quadro efetivo dos agentes e guardas prisionais, os integrantes das escoltas de presos e as guardas portuárias; VIII – as empresas de segurança privada e de transporte de valores constituídas, nos termos desta Lei; IX – para os integrantes das entidades de desporto legalmente constituídas, cujas atividades esportivas demandem o uso de armas de fogo, na forma do regulamento desta Lei, observando-se, no que couber, a legislação ambiental. X - integrantes das Carreiras de Auditoria da Receita Federal do Brasil e de Auditoria-Fiscal do Trabalho, cargos de Auditor-Fiscal e Analista Tributário. XI - os tribunais do Poder Judiciário descritos no art. 92 da Constituição Federal e os Ministérios Públicos da União e dos Estados, para uso exclusivo de servidores de seus quadros pessoais que efetivamente estejam no exercício de funções de segurança, na forma de regulamento a ser emitido pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ e pelo Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP. Observe-se que mesmo os guardas municipais podem não dispor do porte de arma, não fazendo sentido que agentes de trânsito o tenham, até porque, diversamente do que alega o recorrente, agente de trânsito não é agente de segurança pública do Estado, de maneira alguma, mas sim agente de controle e ordenação do trânsito. (. . .) Não há nos autos qualquer evidência da necessidade do porte, seja pelo exercício profissional ou por outra situação que comprove o risco à integridade física do impetrante. Ainda, o ato de autorização radica-se na discricionariedade da Administração, não cumprindo ao Judiciário - via de regra - a análise do mérito da concessão ou da negativa desse porte. Colaciono julgados desta Corte corroborando o entendimento aqui exposto: ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. AUTORIZAÇAO PARA PORTE DE ARMA DE FOGO. ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO DA POLÍCIA FEDERAL. REQUISITOS AUSENTES. RECURSO PROVIDO.- Conforme o artigo 10 da Lei n.º 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento) e artigo 22, caput, do Decreto n.º 5.123/2004, para a concessão do porte de arma de fogo ao cidadão, em situação excepcional, a critério da Polícia Federal, é imprescindível a demonstração de sua necessidade efetiva em virtude do desempenho de atividade de risco ou da existência de ameaça à sua integridade física.- Na hipótese, a autoridade policial competente, em decisão devidamente motivada, entendeu que o agravante não logrou êxito em comprovar tal requisito, razão pela qual indeferiu seu pedido, sendo de se ressaltar, no tocante à alegada Instrução Normativa n.º 023/2005-DG/DGF, as assertivas do Parecer n.º 27/2015-DELEAQ/SR/DPF/SP, adotado como razão de decidir pela Superintendência Regional da Polícia Federal no Estado de São Paulo.- Com efeito, as atividades descritas no citado artigo 18, § 2º, inciso II, da Instrução Normativa em tela são meramente exemplificativas, as quais, ainda que exercidas, não desincumbem a autoridade administrativa da verificação da necessidade concreta da autorização pretendida, nos termos da legislação de regência.- Ademais, tal autorização, como salientou o próprio agravante, constitui ato administrativo discricionário, não cabendo ao Poder Judiciário, portanto, a análise de sua conveniência ou oportunidade, encargo este exclusivo da Administração Pública, mas tão somente se foi praticado dentro dos parâmetros da legalidade.- No caso em apreço, não restou evidenciada qualquer irregularidade do ato administrativo em questão.- Recurso provido. (AI 00212678120154030000 / TRF3 - QUARTA TURMA / DES. FED. MÔNICA NOBRE / e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/03/2016) AGRAVO LEGAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCESSÃO DE PORTE DE ARMA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO DEMONSTRADO. SENTENÇA MANTIDA. AGRAVO LEGAL IMPROVIDO. 1. A autoridade impetrada indeferiu o pedido administrativo de autorização para porte de arma de fogo, sob a alegação de que não restaram demonstrados os requisitos necessários à sua concessão, nos termos do art. 10, § 1º, inciso I, da Lei n.º 10.826/2003. 2. Muito embora afirme a impetrante em evidenciar que pratica atividade desportiva que demanda o uso de armas de fogo, tal fato não é argumento suficiente e idôneo a demonstrar a efetiva necessidade de porte de arma, conforme prevista legalmente, mesmo porque a mens legis do Estatuto do Desarmamento é exatamente restringir a venda e a utilização indiscriminada de armas de fogo no país. 3. Não há elementos novos capazes de alterar o entendimento externado na decisão monocrática. 4. Agravo legal improvido. (AMS 00214421620124036100 / TRF3 - SEXTA TURMA / JUIZ CONV. MIGUEL DI PIERRO / e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/12/2015) PROCESSO CIVIL. AGRAVO. ART. 557 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PORTE DE ARMA DE FOGO. AUTORIZAÇÃO ADMINISTRATIVA. SERVIDOR PÚBLICO. ATIVIDADE DE RISCO PREVISTA NA IN 023/2005 DA POLÍCIA FEDERAL. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A Instrução Normativa n.º 23/2005 da DG/DPF reconheceu como atividade de risco, para os fins do inciso I, do §1º, do art. 10 da Lei n.º 10.826/2003, o exercício, por servidor público, de cargo efetivo ou comissionado nas áreas de segurança, dentre outras. 2. A jurisprudência é assente no sentido de que, para a concessão deporte de arma de fogo, é necessária a efetiva comprovação do exercício de atividade de profissional risco ou de ameaça à integridade física, já que o porte, de acordo com o Estatuto do Desarmamento, é exceção. 3. No caso em tela, a realidade apresentada pelo agravado não é habitual à vivenciada pela sociedade em geral, uma vez que exerce o cargo de Secretário Municipal de Trânsito e Segurança, corroborado, como se extrai dos autos, pela atuação na organização da Guarda Municipal e no desempenho conjunto com as Polícias Militar e Civil, no combate a ilícitos criminais, especialmente no combate ao tráfico de drogas, atividades que, evidentemente, oferecem risco à sua integridade física e, por isso, são suficientes a enquadrar o impetrado na exceção imposta pelo Estatuto do Desarmamento e conceder-lhe a pretendida renovação ao porte de arma, desde que inexistentes outros requisitos que a impeçam. 4. Agravo desprovido. (AMS 00027376720124036100 / TRF3 - TERCEIRA TURMA / DES. FED. NELTON DOS SANTOS / e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/10/2015) ADMINISTRATIVO. AUTORIZAÇÃO PARA PORTE DE ARMA DE FOGO. LEI Nº10.826/03. ATO DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 1. A autoridade impetrada indeferiu o pedido administrativo de autorização para porte de arma de fogo formulado pela impetrante, sob a assertiva de não ter sido demonstrada a efetiva necessidade da autorização de porte de arma de fogo, nos termos previstos no artigo 10, §1º, inciso I, da Lei nº 10.826/2003. 2. A concessão do porte de arma insere-se no poder discricionário da Administração, cujo controle pelo Poder Judiciário, se limita ao aspecto da legalidade, sem qualquer incursão sobre a conveniência e oportunidade. 3. A impetrante não demonstrou, nos autos, o alegado direito líquido e certo à autorização postulada, não sendo suficiente sua qualidade de atiradora para permitir o porte de arma de fogo para defesa pessoal, porquanto não observados os demais requisitos legais para obtê-la. 4. Na presente ação mandamental, a impetrante nada juntou a comprovar a efetiva necessidade do porte de arma ou de ameaça à sua integridade física, limitando-se a colacionar aos autos peças do requerimento administrativo para a concessão do porte de arma, os recursos administrativos e as decisões da autoridade tida como coatora. 5. Não comprovado nos autos o cumprimento de todos os requisitos previstos na legislação que disciplina a matéria e, não comportando a ação mandamental dilação probatória, deve ser mantida a denegação da segurança. (AMS 00086035620124036100 / TRF3 - SEXTA TURMA / DES. FED. MAIRAN MAIA / e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/11/2014) Ante o exposto, nego provimento à apelação. É como voto.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
E M E N T A
APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PRETENDIDO PORTE DE ARMA DE FOGO POR AGENTE DE TRÂNSITO, ALEGANDO NECESSIDADE EM VIRTUDE DO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO. AUSÊNCIA DA NECESSIDADE DO PORTE PELA FUNÇÃO EXERCIDA, NA ESPÉCIE. RECURSO DESPROVIDO.
1. O Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03) veda o porte de arma em todo o território nacional, ressalvados os casos previstos na própria lei e em legislação esparsa.
2. O ato administrativo de autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido possui, além dos seus aspectos vinculados, conteúdo discricionário, que consiste na análise pela Administração Pública da justificativa apresentada para o pedido, a fim de aferir se esta traduz a efetiva necessidade.
3. Ao Poder Judiciário cabe apenas e tão somente a análise dos aspectos relacionados à legalidade do ato administrativo, não lhe competindo o controle sobre o seu mérito, sob pena de se imiscuir na atividade típica do administrador. Precedentes.
4. Caso em que, além de tudo, não há nos autos qualquer evidência da necessidade do porte, seja pelo exercício profissional ou por outra situação que comprove o risco à integridade física do impetrante.
5. Apelação improvida.