Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000651-22.2018.4.03.6005

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: BANCO CENTRAL DO BRASIL, BANCO DO BRASIL SA

Advogado do(a) APELANTE: LOUISE RAINER PEREIRA GIONEDIS - PR8123-A

APELADO: LUIZ JORGE LAGEANO

Advogados do(a) APELADO: LUIS ALBERTO DE SOUZA - MS5571-A, ROSELI ALVES TORRES - MS5734-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000651-22.2018.4.03.6005

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: BANCO CENTRAL DO BRASIL, BANCO DO BRASIL SA

Advogado do(a) APELANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A

APELADO: LUIZ JORGE LAGEANO

Advogados do(a) APELADO: LUIS ALBERTO DE SOUZA - MS5571-A, ROSELI ALVES TORRES - MS5734-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de apelações interpostas pelo BANCO CENTRAL DO BRASIL e pelo BANCO DO BRASIL S/A em face de sentença que assim decidiu:

3) DISPOSITIVO

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a pretensão inicial e extingo o processo com exame do mérito (art. 487, I, CPC) para:

3.1) condenar o BACEN e o BANCO DO BRASIL ao pagamento de indenização relativa à cobertura securitária (PROAGRO) do financiamento CRP40/07451-X, em valor a ser oportunamente liquidado, acrescidos de juros de mora e correção monetária desde a data do evento danoso (negativa do cobertura 24/11/2016. Fls. 77), nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal cujo valor deverá se liquidado;

3.2) condenar o BANCO DO BRASIL ao pagamento de indenização a título de danos materiais, no valor de $16.230,77, acrescidos de juros de mora e correção monetária desde a data da realização da referida despesa, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, tudo a ser apurado em liquidação.

Os requeridos deverão ainda arcar com honorários devidos em favor do patrono da parte adversa, ora fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, o que faço considerando-se a natureza da causa e o trabalho desenvolvido em uma demanda sem dilação probatória.

Dada a sucumbência mínima do autor, condeno o Banco do Brasil S.A. ao pagamento de metade das custas, pois o Banco Central é isento (art. 4º, I, lei n.º 9.289/96).

Sentença sujeita não sujeita ao reexame necessário (art. 496 do CPC).

Intimem-se.

Sentença publicada e registrada eletronicamente.

Acolhidos embargos de declaração para acrescentar o seguinte parágrafo à sentença:

“(...)Condeno os requeridos ao reembolso das despesas antecipadas pelo autor, nos termos do art. 82, do CPC, observado o art. 4º, parágrafo único, da Lei n. 9.289/1996.  (...)”.

Em suas razões recursais, sustenta o BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), preliminarmente, sua ilegitimidade passiva para a causa. No mérito, defende que não tem responsabilidade pela indenização postulada, haja vista o não atendimento, pelo agricultor da integralidade das normas relativas ao PROAGRO, especialmente no que toca à análise física e química do solo. Argumenta, ainda, com a inaplicabilidade ao caso das normas do Código de Defesa do Consumidor.

Já o BANCO DO BRASIL S/A, em sua apelação, também sustenta matéria preliminar de ilegitimidade passiva. No mérito, pugna pela improcedência do pedido, aduzindo ser impossível a restituição pleiteada, tendo em vista a inocorrência de falha na prestação dos serviços, cuidando-se, na verdade, de hipótese de culpa exclusiva do tomador do seguro.

Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

Memoriais apresentados pelo BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN).

É o breve relatório. Passo a decidir.

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000651-22.2018.4.03.6005

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: BANCO CENTRAL DO BRASIL, BANCO DO BRASIL SA

Advogado do(a) APELANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A

APELADO: LUIZ JORGE LAGEANO

Advogados do(a) APELADO: LUIS ALBERTO DE SOUZA - MS5571-A, ROSELI ALVES TORRES - MS5734-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal CARLOS FRANCISCO (Relator): Inicio pelo exame da questão preliminar de ilegitimidade passiva para a causa, deduzida por ambos os apelantes em suas respectivas razões recursais.

As condições da ação podem ser entendidas como os requisitos de existência do direito à obtenção de uma sentença de mérito que solucione a lide posta à apreciação do Poder Judiciário. De acordo com o art. 17 do CPC/2015, duas são as condições da ação: a) a legitimidade para a causa, considerada como a titularidade ativa e passiva, em abstrato, da relação jurídica de direito material controvertida; e b) o interesse de agir (ou interesse processual), visto através do trinômio necessidade-utilidade-adequação, isto é, a a necessária intervenção judicial deve proporcionar tutela útil pleiteada pelo autor pela via processual adequada para solucionar o litígio. O não preenchimento de qualquer das duas condições da ação caracteriza o fenômeno processual da carência de ação, conduzindo à extinção do processo sem resolução de mérito (art. 485, VI, do CPC).

De outro lado, o Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro), criado pela Lei nº 5.969/1973 e regido, atualmente, pela Lei nº 8.171/1991, ambas regulamentadas pelo Decreto nº 175/1991 e pela Lei Federal nº 12.058/2009, tem suas normas aprovadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e codificadas no Manual de Crédito Rural (MCR-16), que é divulgado pelo Banco Central do Brasil. O Programa em referência tem por objetivo garantir a exoneração de obrigações financeiras relativas a operação de crédito rural para o custeio da produção agropecuária, cuja liquidação seja dificultada pela ocorrência de fenômenos naturais, pragas e doenças sem controle que atinjam as plantações ou os rebanhos, na forma estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional – CMN (artigo 59, I e II da Lei nº 8.171/1991). A despeito de ter como foco principal os pequenos e os médios produtores, o Proagro está aberto a todos os produtores rurais, dentro do limite de cobertura estabelecido na regulamentação. Outrossim, o Proagro possui duas modalidades: a) o Proagro Mais, que atende aos agricultores familiares do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf); e b) o Proagro, que atende aos demais agricultores.

Acerca da cobertura proporcionada pelo Programa, encontra-se ela delimitada pelo art. 65 da Lei nº 8.171/91, assim redigido:

Art. 65. O Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro) cobrirá integral ou parcialmente:

I - os financiamentos de custeio rural;

II - os recursos próprios aplicados pelo produtor em custeio rural, vinculados ou não a financiamentos rurais.

Parágrafo único. Não serão cobertas as perdas relativas à exploração rural conduzida sem a observância da legislação e das normas do proagro. (Redação dada pela Lei nº 12.058, de 2009)

A comprovação das perdas, ademais, será efetuada pela instituição financeira, mediante laudo de avaliação expedido por profissional habilitado (art. 65-B da Lei nº 8.171/1991, Incluído pela Lei nº 12.058, de 2009). Entretanto, para que o mutuário do crédito rural tenha direito à cobertura do Proagro, terá que cumprir as normas a ele relativas, a teor do disposto no art. 65, parágrafo único, da Lei nº 8.171/1991.

O Banco Central do Brasil (BACEN) é o administrador, tanto do Proagro quanto do Proagro Mais, nos termos do art. 66-A da Lei nº 8.171/1991, que dispõe sobre a política agrícola. Assim, é o BACEN que faz o pagamento das indenizações, repassando os recursos para os agentes do programa, o que implica em sua legitimidade passiva para ações judiciais como a presente.

Já ao Conselho Monetário Nacional (CMN) cabe regulamentar os termos pelos quais devem de se processar a apuração e o pagamento das indenizações relativas ao Proagro. O Manual do Crédito Rural é a compilação dessas normas do CMN, dispondo, ainda, sobre os cuidados que o produtor rural precisa ter e demonstrar perante o agente financeiro durante todas as fases do empreendimento, que envolvem questões como: planejamento; orçamento; tecnologia correta; recomendações de insumos; execução do orçamento proposto; respeito ao zoneamento agrícola; observação do momento certo do plantio e da colheita etc.

As instituições financeiras (bancos e cooperativas de crédito), por sua vez, funcionam como os agentes do Proagro, fazendo-o funcionar, na medida em que são elas as responsáveis por contratar e enquadrar os empreendimentos (lavouras) no programa, receber a comunicação de perdas feita pelo produtor, acionar os peritos para fazer a comprovação de perdas e calcular a indenização.

No caso dos autos, o autor, LUIZ JORGE LAGEANO, busca provimento jurisdicional para que a parte ré seja condenada a restituir os valores de sua responsabilidade e indenizar por danos materiais, sendo R$ 243.743,22 de restituição do agente financiador corrigidos monetariamente e acrescidos de juros até a efetiva restituição e R$ 16.230,77 corrigidos monetariamente e acrescidos de juros até a efetiva restituição. Narrou, em síntese, que:

a) por meio da Cédula Rural Pignoratícia nº 40/07451-X, emitida em 21/12/2015, contratou com o Banco do Brasil S.A., o financiamento de R$ 270.025,84 (duzentos e setenta mil, vinte e cinco reais e oitenta e quatro centavos), a serem pagos em 04 parcelas vencíveis em 28/10/2016, 28/11/2016, 28/12/2016 e 28/01/2017, para implantação da lavoura de milho em 234,00 hectares de terras, na Fazenda São João da Boa Vista, com expressa adesão ao PROAGRO;

b) antecedendo à emissão da Cédula, encaminhou ao Banco do Brasil S.A., o Plano de Custeio Agrícola, com toda a documentação solicitada, que foi acolhida, analisada e julgada apta, com a aprovação do seu projeto de financiamento, enquadramento no PROAGRO e liberação do valor contratado, com o qual, providenciou a aquisição do quanto necessário para implantação da lavoura de milho (sementes, adubos, defensivos), além do correto preparo do solo e plantio, com observância das recomendações técnicas inerentes ao empreendimento, conforme comprova o Laudo de Supervisão de Crédito Orientado;

c) não obstante, apesar do natural zelo e responsabilidade na condução da lavoura do milho safrinha/2016, como atestado pelos laudos da Assistência Técnica – BRASPLAN, credenciada pelo Banco do Brasil, para acompanhamento e prescrição dos procedimentos na aplicação dos recursos financiados, o plantio foi realizado dentro das recomendações técnicas determinadas, havendo, porém, drástica quebra na produtividade inicialmente esperada, ocasionada unicamente pelo evento climático geada, causador de frustração de safra, com perda total em 100 hectares e significativas no restante das 134 hectares plantadas;

d) em face do ocorrido e seguindo orientação da Assistência Técnica, acionou o PROAGRO, que periciou a lavoura no dia 30/07/2016, através da empresa Integral Assistência Agronômica Ltda., resultando no Relatório de Comprovação de Perdas, que comprova insofismavelmente que a condição climática (geada) foi a única determinante a afetar negativamente a lavoura;

e) realizou a colheita, resultando na produção de 160.800kg de milho, que foram depositados no silo de sua propriedade e, diante da péssima qualidade do milho colhido, o produto foi integralmente destinado à ração animal, utilizada na suplementação da alimentação de seu gado;

f) para sua surpresa, em 24/11/2016, recebeu a comunicação de indeferimento do pagamento securitário, sob a seguinte alegação: “ANÁLISE FÍSICA DO SOLO INADEQUADA/INCOMPLETA”;

g) inconformado, o pediu reanálise na Comissão Especial de Recursos, em Brasília – DF;

h) não dispondo do numerário necessário à quitação dos valores vencidos, foi compelido, por força das circunstâncias, a prorrogar o vencimento da Cédula Rural Pignoratícia, com sua fixação para 28/01/2018 e por exigência do Banco, substituir a garantia de penhor agrícola para hipoteca cedular de imóvel, acarretando-lhe, além das despesas com averbação, registro do Aditivo e da Hipoteca;

i) com a efetivação da prorrogação da dívida, que deveria ser quitada pelo PROAGRO, passou a aguardar a decisão da CER, que, entretanto, novamente foi de indeferimento;

j) em outubro/2017, lançou mão de seus planos de previdência privada, resgatando integral e antecipadamente o BRASILPREV – Matrícula nº 8268413-8, no valor de R$ 285.329,92 (doc. 28), e parcialmente o Matrícula nº 8710856-9, no valor de R$ 35.077,21, transferindo-os para pagamento da operação financiada e prorrogada, complementando, ainda, R$ 5.316,09, para obter a quitação da dívida junto ao Banco do Brasil S.A., no valor total de R$ 325.723,22 (trezentos e vinte cinco mil, setecentos e vinte e três reais e vinte e dois centavos), efetivada em 20/10/2017, além dos valores anteriormente carreados para amortização na conta do financiamento.

Tecidas essas considerações, tem-se que o BACEN é parte passiva legítima para responder aos termos da presente ação (quanto ao pleito de cobertura securitária), na qualidade de administrador do Proagro, nada importando, para fins de definição da legitimidade “ad causam”, que o procedimento interno de apuração do sinistro seja responsabilidade da instituição financeira. Relevante, na verdade, é que o BACEN responde externamente perante os produtores rurais, na medida em que, nos termos da legislação de regência, o seguro é contratado com o próprio Banco Central, figurando a instituição financeira como mera intermediária do negócio. Nesse sentido, pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste TRF da 3ª Região:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SEGURO. PROAGRO. PERDA PARCIAL DE SAFRA AGRÍCOLA. INDENIZAÇÃO. AÇÃO MOVIDA CONTRA O BANCO DO BRASIL S.A. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. EXTINÇÃO DO PROCESSO. CPC, ART. 267, VI.

I. O Banco do Brasil, mero intermediário na contratação do seguro pelo Programa de Garantia da Atividade Agropecuária - PROAGRO, administrado pelo Banco Central do Brasil e que utiliza verbas orçamentárias da União, não é parte legitimada para responder no pólo passivo de ação pela qual segurado objetiva o recebimento de indenização pela perda parcial de safra agrícola.

II. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

III. Recurso conhecido e provido. Processo extinto, nos termos do art. 267, VI, da lei adjetiva civil.

(STJ, REsp n. 52.195/RS, relator Ministro Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, julgado em 14/9/1999, DJ de 25/10/1999, p. 83.)

APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO. PROGRAMA DE GARANTIA DA ATIVIDADE AGROPECUÁRIA (PROAGRO). BANCO CENTRAL DO BRASIL. LEGITIMIDADE PASSIVA. AGRICULTOR. PLANTAÇÃO DE TOMATE AFETADA PELA DOENÇA "NEMATÓIDES". PROVA PERICIAL CONTUNDENTE. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO EM DECORRÊNCIA DOS CONTRATOS FIRMADOS PELAS PARTES. CÉDULAS RURAIS PIGNOTATICIAS. APELAÇÃO ADESIVA. SUCUMBÊNCIA DO RÉU BANCO DO BRASIL. APELAÇÕES IMPROVIDAS.

1. Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva "ad causam" arguida pelo Banco Central do Brasil - BACEN. A sentença prolatada está em consonância com a lei e a Jurisprudência, no sentido de que o Banco Central do Brasil é legitimado para responder pelo Seguro Agrícola - PROAGRO.

2. Em se tratando o PROAGRO de um seguro de crédito rural, bem como que a hipótese é de cobertura do sinistro, não havendo qualquer excludente verificável ao caso, que a sentença de primeiro grau é irretocável, devendo, assim, ser mantida em sua integralidade, com o desprovimento da apelação ora em tela. Até porque a responsabilidade pelos recursos financeiros do programa é do ora apelante, o BACEN.

3. Além disso, o Apelante não trouxe nenhuma outra evidência para afastar a prova pericial trazida aos autos, categórica no sentido de que o autor, ora Apelado, foi zeloso e suficientemente diligente no preparo e no desenvolvimento vegetativo da plantação de tomate. E que a ocorrência de "nematoides" - praga de difícil controle, justifica o pagamento de indenização em decorrência dos contratos firmados pelas partes (Cédulas Rurais Pignoratícias nºs 90/01042-6 e 90/01041-8).

4. Por derradeiro, verifica-se, da simples leitura do dispositivo do r. decisum a quo, que houve revés considerável do Banco do Brasil no caso, uma vez que este fora condenado a exonerar o autor quanto aos financiamentos de crédito agrícola, "efetuando a devida compensação, considerando-se a indenização securitária e os valores originários do financiamento, excluindo-se, portanto, os encargos, multas e juros moratórios" (fl. 1409-v). Não havendo, pois, que se falar em ausência de sucumbência, in casu, de modo a se negar provimento à apelação adesiva do segundo corréu.

5. Apelações improvidas.

(AC 08021060219944036107, DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, TRF3 - QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/10/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

Seguindo nessa mesma linha de raciocínio, seria de se concluir que o BANCO DO BRASIL S/A, na qualidade de mero agente operador do Programa, não deteria a indispensável legitimidade passiva para responder ao pleito de cobertura securitária pelo Proagro, vez que a ele não cabe, nem mesmo em abstrato, arcar com a reparação pleiteada pelo autor. Ocorre que a parte autora também cumula, em sua peça inicial, pleito de indenização por danos alegadamente sofridos e de restituição dos valores pagos ao próprio Banco do Brasil para amortização/quitação do financiamento. Nesse sentido, diante de uma hipótese de cumulação própria de pedidos (art. 327 do CPC), resta atraída a legitimidade passiva do apelante BANCO DO BRASIL S/A para a causa, na medida em que se trata de fatos a ele pessoalmente imputados, sendo certo, ainda, que eventual decreto de procedência do pedido de indenização dos danos materiais refletirá na sua esfera jurídica de interesses. Esse é o entendimento desta Corte Regional:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROAGRO. PRODUÇÃO DE PROVAS. LEGITIMIDADE PASSIVA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

I. A decisão que trata do indeferimento de produção de prova, situação que não se insere nas hipóteses previstas na referida norma processual, não pode ser impugnada pelo recurso de agravo de instrumento.

II. No que concerne à legitimidade do Banco do Brasil S/A, relevante mencionar que a parte alega que a instituição financeira foi a responsável pelo demora na liberação da área, requerendo a condenação em lucros cessantes. Deste modo, em casos em que a parte objetiva, além da indenização pelo seguro, a indenização por eventuais fatos imputados ao Banco do Brasil (retardamento do pagamento e liberação da área), deve esta permanecer no polo passivo da ação.

III. Agravo de instrumento a que se dá parcial provimento.

(TRF 3ª Região, 1ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5021788-33.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, julgado em 23/10/2019, Intimação via sistema DATA: 29/10/2019)

                               

APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO. PROAGRO. PERDA DE SAFRA AGRÍCOLA. OCORRÊNCIA DE FENÔMENOS NATURAIS. INDENIZAÇÃO. BANCO CENTRAL DO BRASIL. LEGITIMINADE AD CAUSAM. PEDIDO DE RESTITUIÇÃO EM FACE DO BANCO DO BRASIL S.A. PARTE LEGÍTIMA NO CASO CONCRETO.

1. Banco Central do Brasil, na qualidade de gestor exclusivo dos recursos relativos ao Programa de Garantia de Atividade Agropecuária - PROAGRO é parte legítima a figurar no polo passivo da presente demanda. Precedentes.

2. Nesta toada, seria natural que o Banco do Brasil, mero intermediário na contratação do seguro, fosse excluído da lide, eis que o responsável pelo seguro de crédito rural é o Banco Central. Ocorre que, no presente feito, a parte autora busca também a restituição dos valores pagos por ela diretamente ao Banco do Brasil, daí por que tal instituição bancária deve permanecer no polo passivo, uma vez que afetada em caso de procedência do pedido.

3. A Lei 5.969/73, no seu art. 1º, definia o PROAGRO como programa destinado a exonerar o produtor rural de obrigações financeiras relativas a operações de crédito cuja liquidação seja dificultada pela ocorrência de "fenômenos naturais". Tal ideal foi reprisado na Lei nº 8.171/91. Assim, não assiste razão ao Banco Central quando procura afastar a incidência da proteção legal aos casos de chuvas excessivas em período anterior à 2007. Assim, adequada a r. sentença que condenou o Banco Central do Brasil a garantir a cobertura do PROAGRO, nos termos da Lei 8.171/91, arcando com as obrigações financeiras relativas à operação de crédito rural de custeio perante o Banco do Brasil S/A, bem como a indenizar a parte autora pelos recursos por ela despendidos.

4. O PROAGRO assegura a exoneração de obrigações financeiras relativas a operação de crédito rural em casos como o aqui narrado. A respectiva Lei não limita tal exoneração a prestações supervenientes, abrangendo tanto prestações vencidas (pagas ou não) como prestações a vencer. Em suma, fica o agricultor livre do ônus financeiro decorrente da operação de crédito rural, o que implica a devolução por parte do Banco do Brasil da quantia que recebera do agricultor a título de quitação parcial do financiamento.

5. No tocante ao pedido pela incidência da norma ventilada no inciso III, do art. 65-A da Lei 8.171/91, observa-se que tal pedido não foi submetido ao juízo a quo, constituindo indevida inovação recursal.

6. Apelação do Banco Central não provida.

7. Apelação da parte autora provida parcialmente.

(TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1611591 - 0007989-30.2008.4.03.6120, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, julgado em 12/09/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/09/2017 )

Importante registrar, todavia, que no tocante ao pleito de indenização dos danos materiais apenas o BANCO DO BRASIL S/A detém legitimidade passiva para a causa, eis que não há conduta que possa ser imputada ao BACEN. Já quanto ao pedido de pagamento da cobertura securitária, ambos os réus encontram-se legitimados em litisconsórcio passivo, na medida em que os dois concorreram para a negativa de ressarcimento.

Assim, vencida a matéria preliminar, com o reconhecimento da legitimidade passiva dos réus, passo ao exame do mérito.

Deixo assentado, desde logo, que o Código de Defesa do Consumidor não se aplica a casos como o ora sob exame, nos quais o produto ou serviço é contratado para a implementação de política pública pertinente à atividade econômico-produtiva, já que não se encontra configurada a figura do consumidor, assim considerado o destinatário final da relação de consumo (art. 2º, caput, do CDC). No caso, como o financiamento e o seguro foram obtidos para o fomento da atividade produtiva agropecuária, não se enquadrando como atividade de consumo, não há que se falar de aplicação do CDC. Nessa linha:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO. CONCLUSÃO ACERCA DA LIQUIDEZ, CERTEZA E EXIGIBILIDADE. SÚMULAS 5 E 7/STJ. FUNDAMENTO INATACADO. SÚMULA 283/STF. INAPLICABILIDADE DO CDC. SÚMULA 83/STJ. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM. SÚMULA 5/STJ. INVIABILIDADE DO PLEITO POR APLICAÇÃO DA MULTA CONTRATUAL EM 2%. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO CONSUMERISTA. SÚMULA 83/STJ. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TEORIA DA IMPREVISÃO. NÃO OCORRÊNCIA DE SEUS REQUISITOS. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

(...)

3. A utilização de serviços ou aquisição de produtos com o fim de incremento da atividade produtiva, como ora se apresenta, não se caracteriza como relação de consumo, mas de insumo, a afastar as normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor. Precedente.

(...)

(AgInt no AREsp n. 1.602.292/RJ, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 24/8/2020, DJe de 1/9/2020.)

Cumpre assentar, contudo, que a inaplicabilidade do Código do Consumidor à espécie não tem o condão de alterar o resultado do julgamento em Primeiro Grau de Jurisdição.

Realmente, no caso sob exame, restou incontroverso nos autos que, em 2015/2016, para a safra cuja colheita era prevista para ocorrer em julho/agosto de 2016, o autor figurou como tomador de crédito agrícola para financiamento de sua lavoura de milho. Ficou evidenciado, ainda, que o mutuário do financiamento sofreu perda considerável em sua produção devido à geada. De fato, foram plantados 234 hectares, segundo o laudo do engenheiro representante do Proagro, “em 100 há de área cultivada ocorreu a perda total em função da geada. No restante da área obteve-se uma produção de 160.800 kg de milho, depositados no silo da propriedade.” A produção prevista era de até 1.404.000 kg (ID 151035765).

A prova documental produzida nos autos também evidencia a existência de cláusula contratual expressa prevendo a cobertura pelo Proagro, além do que, a instituição financeira debitou da conta do autor importância correspondente a 4% do valor total contratado (ID 151035761).

O indeferimento da cobertura, por sua vez, se deu por força da “ANÁLISE FÍSICA DO SOLO INCOMPLETA/INADEQUADA.” (ID 151035768). Feito pedido de reconsideração do indeferimento da cobertura securitária, o mesmo foi indeferido pela CER – Comissão Especial de Recursos (IDs 151035769 e 151035772).

O indeferimento do pedido de reconsideração, por outro lado, fundamentou-se no argumento de que a negativa de cobertura teria decorrido do fato de que o laudo de análise do solo apresentado pelo mutuário ao agente financeiro tinha mais de dois anos (o contrato foi assinado em 21/12/2015 e a análise do solo é datada de 12/09/2013), o que estaria em desconformidade com as normas de regência do Proagro, mais especificamente com o Manual de Crédito Rural (MCR). Todavia, do exame dos elementos de prova existentes nos autos constata-se que tal laudo foi aceito pelo BANCO DO BRASIL, o qual, repita-se uma vez mais, atua na qualidade de agente operados do Proagro. Portanto, na época da assinatura do contrato, momento no qual se aperfeiçoam as obrigações recíprocas, nenhum óbice foi colocado pela instituição financeira, concluindo-se pela perfeita validade do pacto.

O BANCO DO BRASIL, contudo, afirma que o autor “NÃO CUMPRIU os requisitos estabelecidos para fazer jus ao pagamento da indenização pretendida, no tocante ao laudo técnico, de modo que, mesmo se EM TESE tivesse direito à cobertura, ainda assim não caberia por sua culpa exclusiva” (ID 151035772). À vista disso, afirma que não houve falha na prestação do serviço pelo banco, sendo responsabilidade exclusiva da parte autora a negativa de cobertura pelo Proagro.

O argumento dos réus, entretanto, não merece acolhida. Com efeito, e tal como já referido acima, o laudo de análise do solo foi aceito pelo BANCO DO BRASIL, que não pode, só depois da ocorrência do sinistro, negar a cobertura securitária contratada com base na sua extemporaneidade. Vale lembrar, neste ponto, que a partir de 01/07/2015 a conferência da regularidade da documentação a ser apresentada pelo mutuário também passou a ser de responsabilidade do agente do Proagro, o que é previsto no MCR 16-2-19-b. É o que consta, aliás, da própria contestação oferecida pelo BACEN nestes autos (ID 151035997).

Assim, tem-se que encontra incidência na espécie a proteção da confiança legítima, reflexo subjetivado da segurança jurídica, e que serve, justamente, como forma de proteção do cidadão em face das mudanças determinadas pelo Estado. Cumpre destacar que a segurança jurídica implica no estabelecimento de parâmetros: (a) estáveis para o passado; (b) confiáveis para o presente; e (c) previsíveis para o futuro. Esses parâmetros de segurança do cidadão em face dos órgãos estatais, com certeza, estariam sendo desrespeitados caso se admitisse que os réus, na qualidade de administrador e agente operador do Proagro, aceitassem documento em desacordo com as exigências regulamentares (embora tivessem o dever de conferir a regularidade dessa documentação), para, só depois, invocar essa mesma irregularidade que deveria ter sido tempestivamente verificada, para negar a cobertura securitária contratada. Caso admitida essa conduta, não haveria para o mutuário/contratante nem estabilidade, nem confiança, nem, muito menos, previsibilidade quanto a estar efetivamente resguardado frente às contingências capazes de prejudicar sua produção agropecuária.

Como é cediço, a ninguém é dado valer-se da própria torpeza, ou seja, a ninguém é dado fazer algo incorreto ou em desacordo com as normas legais e regulamentares, para depois alegar tal conduta em proveito próprio, in casu, para eximir-se da obrigação assumida, prejudicando aquele que tinha legítima expectativa de contar com o pagamento do seguro.

Dessarte, está correta a sentença ao concluir que “Os documentos apresentados foram aceitos, foi ofertada a cobertura securitária pelo agente operador do PROAGRO; o respectivo adicional de cobertura foi igualmente cobrado, além do que, a obrigação de pagar em caso de sinistro foi assumida contratualmente por agente operador do PROAGRO”.

Portanto, há que se dar cumprimento integral ao pacto celebrado entre as partes, até mesmo em razão do princípio da força obrigatória dos contratos (“pacta sunt servanda”), segundo o qual, estando as partes de comum acordo e submetendo-se livremente às regras estabelecidas, o contrato obriga seu cumprimento como se fosse lei, sendo certo, outrossim, que os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé (art. 422 do CC/2002).

Entretanto, é importante reconhecer que, havendo controvérsia acerca do valor devido a título da cobertura securitária do Proagro, correta a determinação da sentença apelada no sentido de que o valor correto deverá ser apurado em posterior liquidação de sentença.

Por fim, tem-se que deve ser mantida, igualmente, a condenação do BANCO DO BRASIL a responder pelos danos materiais devidamente evidenciados nos autos.

De fato, os elementos de convicção existentes neste feito dão conta de que, em razão da negativa da cobertura securitária do Proagro, o autor necessitou proceder ao aditamento do contrato CRP 40/07451-X realizando para tal as seguintes despesas demonstradas nos autos (ID’s 151035985, 151035986, 151035987, 151035988 e 151035989), que totalizaram R$16.230,77:

a) Certidão de autenticidade da CRP 40/07451-X, no valor de R$ 39,20, em 20/06/2018;

b) Reconhecimentos de firmas no Aditivo de Re-Ratificação à CRP 40/07451-X (R$ 7,80 + R$ 15,60), em 18/05/2017, totalizando R$23,40);

c) Averbação no Livro 3, Registro Auxiliar sob o nº AV-02-66.376, no valor de R$57,20, em 22.05.2017 e R$ 37,70 da respectiva certidão, totalizando R$94,90;

d) Registro no Livro 3, Registro Auxiliar nº 69.484, no valor de R$149,50, em 22/05/2017, e R$37,70 da respectiva certidão, totalizando R$187,20;

e) Registro no Livro 2, Registro Geral nº R-34/2681, no valor de R$3.909,10, em 22/05/2017;

f) Certidão da matrícula nº 2681, no valor de R$37,70, em 23/05/2017;

g) Pagamento de tributos pelo resgate do plano de previdência BRASILPREV nº 8268413-8, no valor de R$10.064,38, em 17/10/2017;

h) Pagamento de tributos pelo resgate do plano de previdência BRASILPREV nº 8710856-9, no valor de R$1.722,79, em 17/10/2017;

i) Reconhecimento de firma, na autorização de baixa do instrumento de crédito 40/07451-X, no valor de R$7,80, em 23/10/2017;

j) Baixas da averbação e registro, no valor de R$114,40, em 26/10/2017;

l) Certidão da Matrícula nº 2681, no valor de R$37,70, em 26/10/2017.

Assim, em razão de tudo quanto acima exposto, encontra incidência no presente caso o disposto no art. 389 do CC/2002, segundo o qual “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”.

É de se ter em mente, outrossim, que a situação aqui tratada diz respeito a hipótese de responsabilidade civil contratual, e não extracontratual (arts. 186 e 927 do CC/2002), como chega a mencionar o BANCO DO BRASIL em seu apelo. De outro lado, o conjunto probatório revela o preenchimento de todos os pressupostos da responsabilidade contratual, quais sejam: (a) existência de um contrato; (b) validade do contrato; (c) descumprimento da obrigação decorrente do contrato, no caso, o não pagamento de indenização relativa à cobertura securitária pelo Proagro, relativamente ao financiamento CRP40/07451-X; (d) os prejuízos sofridos por um dos contratantes, no caso, o autor.

Não procede, outrossim, a alegação de excludente da responsabilidade contratual dos réus, na medida em que, consoante já demonstrado acima, não restaram evidenciadas a culpa exclusiva da vítima nem o exercício regular de direito pelas instituições financeiras. Nessa esteira, cite-se o entendimento doutrinário materializado no Enunciado nº 548 da VI Jornada de Direito Civil promovida pelo Conselho da Justiça Federal, segundo o qual “Caracterizada a violação de dever contratual, incumbe ao devedor o ônus de demonstrar que o fato causador do dano não lhe pode ser imputado”, sendo certo, no entanto, que os réus, ora apelantes, não se desincumbiram desse ônus.

Transcreve-se, neste ponto, a observação feita pela sentença recorrida no sentido de que “A condenação exclusiva neste item do Banco do Brasil se justifica, uma vez que foi o agente operador, que recebeu toda a documentação por parte do mutuário, inclusive a relativa à análise do solo que depois se alegou inválida, dando azo ao não pagamento, na via administrativa, da cobertura securitária”.

Correta, por fim, a remissão da sentença à Resolução nº 134/2010, do Conselho da Justiça Federal, que aprova o Manual de Cálculos no âmbito da Justiça Federal, regramento aplicável aos consectários da condenação judicial. Vale lembrar, por oportuno, que a mencionada Resolução já determina a aplicação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação atribuída pela Lei nº 11.960/2009.

Considerando o insucesso do recurso interposto, com a manutenção da decisão recorrida, aplica-se a regra da sucumbência recursal estabelecida no art. 85, § 11, do CPC, pelo que majoro em 20% os honorários advocatícios fixados na sentença.

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO aos recursos, mantendo, na íntegra, a sentença proferida.

É como voto.

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA/INDENIZAÇÃO. PROAGRO. REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS. BANCO CENTRAL DO BRASIL. BANCO DO BRASIL S/A. LEGITIMIDADE PASSIVA “AD CAUSAM”. INAPLICABILIDADE DO CDC. RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL.

- O Banco Central do Brasil (BACEN) é o administrador do Proagro, nos termos do art. 66-A da Lei nº 8.171/1991, que dispõe sobre a política agrícola, cabendo-lhe o pagamento das indenizações e o repasse de recursos para os agentes do programa, do que decorre sua legitimidade processual passiva para feitos como o presente.

- Como mero executor desse programa, em princípio o Banco do Brasil S/A não seria parte legítima para responder ao pleito de cobertura securitária pelo Proagro, vez que a ele não cabe arcar com a reparação pleiteada pelo autor. Ocorre que a parte autora também cumula pleito de indenização por danos alegadamente sofridos e de restituição dos valores pagos ao próprio Banco do Brasil para amortização/quitação do financiamento. Diante de cumulação própria de pedidos (art. 327 do CPC), resta atraída a legitimidade passiva do apelante Banco do Brasil para a causa, na medida em que se trata de fatos a ele pessoalmente imputados, sendo certo, ainda, que eventual decreto de procedência do pedido de indenização dos danos materiais refletirá na sua esfera jurídica de interesses. Precedentes desta Corte Regional.

- No tocante ao pleito de indenização dos danos materiais apenas o Banco do Brasildetém legitimidade passiva para a causa, eis que não há conduta que possa ser imputada ao BACEN. Já quanto ao pedido de pagamento da cobertura securitária, ambos os réus encontram-se legitimados em litisconsórcio passivo, na medida em que os dois concorreram para a negativa de ressarcimento.

 - O Código de Defesa do Consumidor não se aplica a casos como o ora sob exame, nos quais o produto ou serviço é contratado para a implementação de política pública atividade econômico-produtiva, já que não se encontra configurada a figura do consumidor, assim considerado o destinatário final da relação de consumo (art. 2º, caput, do CDC). No caso, como o financiamento e o seguro foram obtidos para o fomento da atividade produtiva agropecuária, não se enquadrando como atividade de consumo, não há que se falar de aplicação do CDC.

- A prova documental produzida nos autos evidencia a existência de cláusula contratual expressa prevendo a cobertura pelo Proagro, além do que, a instituição financeira debitou da conta do autor importância correspondente a 4% do valor total contratado.

- Do exame dos elementos de prova existentes nos autos constata-se que o laudo de análise do solo foi aceito pelo Banco do Brasil, o qual atua na qualidade de agente operados do Proagro. Portanto, na época da assinatura do contrato, momento no qual se aperfeiçoam as obrigações recíprocas, nenhum óbice foi colocado pela instituição financeira, concluindo-se pela perfeita validade do pacto.

- A partir de 01/07/2015 a conferência da regularidade da documentação a ser apresentada pelo mutuário também passou a ser de responsabilidade do agente do Proagro, o que é previsto no MCR 16-2-19-b.

- Assim, tem-se que encontra incidência da proteção da confiança legítima, reflexo da segurança jurídica, e que serve, justamente, como forma de proteção do cidadão em face de mudanças determinadas pelo Estado. A ninguém é dado valer-se da própria torpeza, ou seja, a ninguém é dado fazer algo incorreto ou em desacordo com as normas legais e regulamentares, para depois alegar tal conduta em proveito próprio, in casu, para eximir-se da obrigação assumida, prejudicando aquele que tinha legítima expectativa de contar com o pagamento do seguro.

- Os elementos de convicção existentes neste feito dão conta de que, em razão da negativa da cobertura securitária do Proagro, o autor necessitou proceder ao aditamento do contrato CRP 40/07451-X realizando para tal as despesas demonstradas nos autos.

- A situação aqui tratada diz respeito a hipótese de responsabilidade civil contratual, e não extracontratual (arts. 186 e 927 do CC/2002). Não procede a alegação de excludente da responsabilidade contratual dos réus, na medida em que, não restaram evidenciadas a culpa exclusiva da vítima nem o exercício regular de direito pelas instituições financeiras.

- Recursos não providos.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento aos recursos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.