Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5022975-37.2022.4.03.0000

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

AGRAVADO: HIGHLIGHT COMERCIO DE TECIDOS, IMPORTACAO E EXPORTACAO EIRELI

Advogado do(a) AGRAVADO: DANIEL BETTAMIO TESSER - SP208351-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5022975-37.2022.4.03.0000

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

AGRAVADO: HIGHLIGHT COMERCIO DE TECIDOS, IMPORTACAO E EXPORTACAO EIRELI

Advogado do(a) AGRAVADO: DANIEL BETTAMIO TESSER - SP208351-A

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R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de agravo de instrumento à antecipação de tutela concedida para que a fiscalização aduaneira “finalize, no prazo de 5 dias, o despacho aduaneiro das mercadorias relacionadas na DI nº 21/1892677-3, liberando os bens em favor da demandante, independentemente de caução”.

Requereu a União antecipação de tutela recursal para que a liberação seja condicionada à prestação de caução idônea.

Alegou, em suma, que: (1) a decisão anterior de liberação das mercadorias mediante caução foi objeto do AI 5022891-36.2022.4.03.0000, posteriormente substituída pela decisão ora agravada que, em reconsideração, possibilitou liberação independentemente de caução, tendo sido interposto o presente recurso ante a perda de objeto daquele outro; (2) a DI 21/1892677-3 foi objeto do PAF 13032.930450/2021-36 e incluída no “Procedimento de Fiscalização de Combate às Fraudes Aduaneiras”, interrompendo o despacho aduaneiro; (3) a liberação possui natureza evidentemente satisfativa, não sendo cabível sem garantia idônea; (4) a DECEX/SP realizou fiscalização de infração por dano ao erário por “interposição fraudulenta de terceiros” na importação; (5) apurou-se que três empresas (GUARACI, ACENZA e LOTUSBLUME) integram o grupo econômico HONEYTEX, especializado na importação e revenda de tecidos, sendo detentora da marca HONEYTEX HIGH QUALITY TEXTILE AND PRINTING, realizando importações: (i) indiretamente, por importadoras interpostas, e (ii) diretamente, através de uma das empresas do grupo, a agravada HIGHLIGHT COMÉRCIO DE TECIDOS, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO EIRELI; (6) na importação direta, suspeitou-se de subfaturamento, direcionando oito declarações de importação (DI) da HIGHLIGHT ao canal vermelho, com laudo mercadológico para estimar o real valor dos bens, constatando-se declaração de valor inferior ao preço de custo; (7) embora intimada a retificar a DI, a empresa não concordou com tal determinação, gerando o auto de infração PAF 10314.720677/2021-11, com multa por subfaturamento; (8) depois, a fiscalização constatou “interposição fraudulenta de terceiros” e “subfaturamento em importações” pelas outras empresas do grupo econômico (GUARACI, ACENZA e LOTUSBLUME), lavrando-se os autos de infração 10314.720002/2022-52, 10314.720064/2022-64 e 10314.720067/2022-06, sendo realizadas diligências fiscais no escritório e armazém do grupo, coletando diversas provas das fraudes praticadas; (9) foram solicitadas informações sobre o real valor das mercadorias importadas pela HIGHLIGHT ao governo chinês, assim como documentos de exportação e faturas de compras de tecidos da China, mas ainda pendentes de resposta; (10) embora no pedido de reconsideração a autora tenha alegado que não foram solicitados documentos nem esclarecimentos quanto à DI 21/1892677-3, às f. 560 do dossiê 13032.930450/2021-36 consta que o “Termo de Constatação e Reintimação” abrangeu expressamente a DI 21/1892677-3 com notificação do contribuinte de que permanece intimado a responder às questões e apresentar documentação já solicitada para todas as DI's fiscalizadas (conforme “Termo de Exigência Fiscal” de 15/10/2021, solicitando documentos básicos sobre operações de importação, f. 094, dossiê 13032.930450/2021-36); (11) não houve qualquer informação ou documentação, em relação ao “Termo de Exigência Fiscal” ou ao “Termo de Constatação e Reintimação”, e ciente a fiscalização de que o contribuinte detém a documentação requerida, por força das provas colhidas no escritório do contribuinte, constata-se que foi suprimida deliberadamente a documentação para evitar a produção de provas contrárias à empresa; (12) a IN RFB 1.169/2011 prevê desembaraço ou entrega de bens submetidos a procedimento especial de fiscalização, antes da conclusão dos trabalhos de fiscalização, se oferecida caução que assegure interesses fazendários (artigo 5°-A da IN RFB 1.169/2011); (13) conforme entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal, a exigência prévia de recolhimento de tributo como condição para desembaraço aduaneiro não se compreende como sanção política, sendo descabida a aplicação da Súmula 323; e (13) “esta Agravante não se opõe ao direito à liberação das mercadorias, desde que a Agravada seja compelida a depositar em Juízo a integralidade do valor apurado pela Alfândega, em atenção ao regramento legal aplicável à espécie”.

Houve nova manifestação, reiterando as razões do recurso, e ressaltando o risco de dano irreparável, a justificar a tutela requerida, tendo em vista que “através da fiscalização e do controle aduaneiro que o Estado busca garantir a livre concorrência e preservar um ambiente saudável para a economia” e “dessa forma, a liberação da mercadoria representa uma clara agressão ao ambiente de negócios brasileiro”.

A antecipação da tutela recursal foi deferida (Id 263527705) e houve pedido de reconsideração (Id 264024223), alegando que: (1) não existe o grupo econômico “Honeytex High”, pois sequer instaurado incidente de desconsideração de personalidade jurídica; (2) a autoridade alfandegária, até o momento, não apurou suposta diferença tributária entre valor declarado e custo efetivo da importação das mercadorias; e (3) o procedimento alfandegário é ilegal, pois não houve ato motivado para início do procedimento de fiscalização, em que se retém mercadoria com flagrante excesso de prazo, e em que, solicitados esclarecimentos à autoridade, esta quedou-se inerte, e que, por fim, contraria a jurisprudência da Corte Superior quanto à impossibilidade de aplicação de pena de perdimento apenas em razão de suposto subfaturamento.

É o relatório.

 

 


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V O T O

 

 

Senhores Desembargadores, a decisão agravada acolheu pedido de reconsideração, deferindo tutela de urgência, nos seguintes termos (Id 259939808):

 

“A parte autora opôs embargos de declaração em face da decisão exarada em 08.07.2022, que deferiu em parte a tutela provisória, autorizando o desembaraço aduaneiro de mercadorias retidas pela Alfândega da RFB, mediante oferecimento de caução (ID 257325276).

Aduz a embargante contradição da decisão, no tópico acerca da ilegalidade da retenção de bens sob suspeita de subfaturamento, alegando que não incide tal hipótese dentre aquelas que autorizariam a pena de perdimento das mercadorias.

Também aponta omissão da decisão embargada acerca dos laudos merceológicos trazidos com a inicial, que, no entender da autora, demonstrariam a regularidade dos preços das mercadorias retidas pela RFB.

Por derradeiro, alega obscuridade no tópico da decisão, em que foi autorizado o oferecimento de garantia, uma vez que, no seu entender, todos os tributos incidentes sobre a operação de importação já foram recolhidos, de modo que a prestação de caução configuraria bis in idem.

Paralelamente aos embargos de declaração, pela petição datada de 20.07.2022, a autora formula “pedido de reconsideração”, aditando sua causa de pedir, afirmando que houve irregularidade no processo administrativo fiscal, no sentido de que não foi oportunamente intimada para apresentar documentos pela autoridade alfandegária, antes que esta interrompesse o despacho aduaneiro das mercadorias.

Ainda aponta excesso de prazo pela RFB para a análise do despacho aduaneiro, além de reiterar a tese de que não cabe a pena de perdimento ao caso, requerendo novamente a concessão da tutela de urgência para fins de liberação das mercadorias retidas.

Instada a se pronunciar sobre os embargos opostos, a Fazenda Nacional comparece em 11.08.2022, pugnando pela rejeição do recurso, bem como informando que, até o momento, não houve a prestação da garantia.

É o relatório. Decido.

Em primeiro lugar, vale consignar que a decisão exarada em 08.07.2022 expressamente reconheceu que as mercadorias retidas pela RFB não estariam sujeitas à pena de perdimento, razão pela qual foi autorizado o oferecimento de caução em garantia, nos termos da Instrução Normativa nº 1.986/2020.

A interrupção do despacho aduaneiro, por suspeita de subfaturamento, poderia justificar a retenção provisória dos bens, para que as autoridades alfandegárias pudessem avaliar as mercadorias e arbitrar seu valor, possibilitando o lançamento suplementar de tributos sobre a operação de importação.

Entretanto, no presente caso, a interrupção do despacho aduaneiro das mercadorias (DI nº 21/1892677-3) ocorreu em 28.12.2021 (ID 254896242), logo, há mais de sete meses, tempo mais do que razoável para que a RFB pudesse proceder à valoração dos bens retidos.

Cumpre frisar, ainda, que, em 22.02.2022 a impetrante apresentou perante a RFB uma petição acompanhada de laudo merceológico, elaborado pela Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção – ABIT (ID 254896248), oferecendo uma estimativa para os bens importados, com base na Declaração de Importação nº 21/1751278-9, que teve por objeto bens aparentemente idênticos aos declarados na DI nº 21/1892677-3.

Neste laudo merceológico, foi apontado como preço estimado para o quilograma de tecido de poliéster liso (PES) o valor de US$ 3.31, inferior ao valor declarado pela autora na DI nº 21/1892677-3, que foi de US$ 4,45 (vide ID 254896240 – fl. 05).

Por oportuno, destaco que os laudos da ABIT são aceitos por nossos Tribunais Regionais Federais, conforme demonstram os seguintes julgados:

[...]

Mesmo que a Ré entenda que o laudo mercadológico, por si só, não é suficiente para aferir o valor dos bens importados, ela deveria ter analisado a petição da parte autora, a fim de apontar eventuais inconsistências ou divergências de qualidade e quantidade na própria carga.

Não é razoável que as mercadorias permaneçam retidas na Alfândega por tanto tempo, correndo risco de perecimento e acarretando, evidentemente, diversos prejuízos à parte autora.

Ante o exposto, DEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA, para o fim de determinar que Ré finalize, no prazo de 5 dias, o despacho aduaneiro das mercadorias relacionadas na DI nº 21/1892677-3, liberando os bens em favor da demandante, independentemente de caução”.

 

Na ação principal, alegou-se que (i) as mercadorias objeto da DI 21/1892677-3 foram retidas há mais de nove meses, sem motivação ou solicitação de documentos ou esclarecimentos, gerando elevados custos de armazenagem; (ii) foram ofertados todos os documentos necessários ao despacho aduaneiro, inclusive demonstrando inexistir fraude na declaração do valor das mercadorias, não cabendo retenção por suposto subfaturamento, por não se tratar de infração, em tese, sujeita a perdimento; (iii) as mercadorias da “adição 002” da DI 21/1892677-3 são idênticas às incluídas na “adição 004” da DI 21/1751278-9, já submetidos a laudos técnicos pela ABIT (solicitados pela fiscalização) e peritos da RFB; (iv) embora se afirme que foram solicitados documentos e esclarecimentos através do “Termo de Início de Fiscalização e Intimação 08 (Proc. 13032.719055/2021-02)”, somente foi informada em 26/04/2021 (conforme “Termo de Ciência”), com registro da DI 21/1751278-9 no SISCOMEX apenas em 04/10/2021, ou seja, após quase três meses da lavratura do termo, não sendo razoável concluir que poderia a autora apresentar documentos relativos a bens que viria a importar somente daqui a três meses; (v) em verdade, a DI somente foi incluída em procedimento por suposto subfaturamento de outras DI's (TDPF-F 0819500-2021-01086-8) em 16/11/2021, não tendo sido jamais requerida apresentação de documentos ou esclarecimentos; (vi) embora a fiscalização alegue existir laudo mercadológico dos bens da DI 21/1751278-9, não teve ciência de tal documento; (vi) mesmo tendo peticionado, em 22/02/2022, sobre as ilegalidades da retenção, foi apontado no sistema informatizado que não houve manifestação naquele procedimento desde setembro/2021; e (vii) assim, descabida a alegação de que não houve retenção, mas mera interrupção do despacho aduaneiro para juntada de documentos, pois, havida tal intimação, houve esquecimento das mercadorias por mais de nove meses.

Verifica-se dos autos que a DI 21/1892677-3 foi registrada no SISCOMEX em 04/10/2021, quando já havia, na época, procedimentos instaurados pela Receita Federal do Brasil contra empresas do grupo econômico HONEYTEX HIGH QUALITY TEXTILE AND PRINTING (Pacífico Sul Comercial e Exportadora Ltda; Highlight Comércio de Tecidos, Imp e Exp Ltda, Acenza Comércio de Plásticos e Tecidos Ltda; Lotusblume Comercial Têxtil Ltda e Guaraci Têxtil Eireli), para “auditoria dos tecidos importados pelas empresas do grupo Honeytex”, com intimação para juntada de documentação e esclarecimentos, conforme constou do “Termo n° 08 – Início de Fiscalização e Intimação” (Id 254896657, f. 01):

 

“...E considerando que há provas de subfaturamento na importação dos tecidos;

INTIMA-SE as empresas em epígrafe a, num prazo de 20 dias:

1. Indicar pessoa de contato, fornecendo as seguintes informações: nome, CPF, cargo, telefone e e-mail. Essa pessoa, caso não seja sócio, deve possuir procuração, assinada por quem de direito, com firma reconhecida, e deve apresentar cópia de seu documento de identidade.

2. Apresentar os extratos bancários de todas as contas-correntes mantidas pelas empresas nos anos de 2017 a 2021. Os extratos devem ser entregues em mídia digital e no leiaute CC BACEN nº 3.454/10. As instituições financeiras são obrigadas a apresentar os extratos nesse formato caso solicitado. Alternativamente, a empresa pode entregar declaração por escrito autorizando a RFB a solicitar os extratos bancários diretamente as instituições financeiras;

3. Apresentar os contratos de câmbio e respectivos comprovantes de pagamento;

4. Informar, para cada Declaração de Importação registrada pelas empresas do grupo ou por terceiros (Empire, Ozon e WZG, por exemplo), quais mercadorias foram efetivamente importadas, em qual quantidade e qual o valor pago pelo grupo às empresas fabricantes chinesas.  OBS: utilizar a mesma notação usada para armazenagem do tecido nos armazéns do grupo, por exemplo:

[...]

5. Apresentar os contratos de compra das mercadorias e documentos de negociação das mercadorias no exterior, ainda que em idioma estrangeiro.

6. Em relação às empresas importadoras Empire, Ozon e WZG, informar com quem negociava a realização do serviço de importação, apresentando documentos de comunicação como e-mails, mensagens de Whatsapp, Telegram, entre outros”.

 

Relativamente à autora, “Highlight Comércio de Tecidos, Imp e Exp Ltda”, o procedimento administrativo TDPF-F 0819500-2021-00893-6 tratou especificamente da auditoria dos tecidos que importou e, no curso da tramitação, com o registro da DI 21/1892677-3 no SISCOMEX, em 04/10/2021, houve inclusão de tais bens na investigação (artigo 2°, § 1°, da IN RFB 1.986/2020), intimando a autora, em 15/10/2021, a prestar esclarecimentos e documentação das importações auditadas, conforme revelado no “Termo de Constatação e Intimação” enviado posteriormente, no âmbito do TDPF-F 0819500-2021-00893-6, para reiterar a notificação anterior, tendo em vista o silêncio da empresa investigada (Id 254896233, f. 01):

 

“No exercício das funções de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, nos termos do artigo 237 da Constituição Federal de 1988, dos artigos 194 a 197 da Lei 5.172/1966 (CTN), do artigo 6º da Lei 10.593/2002, dos artigos 18, 19, 21 e 24 do Decreto 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro), observando o disposto na Portaria RFB nº 6.478/20177 e nos artigos 7º e 23 do Decreto nº 70.235/1972, está sendo realizada fiscalização relativa às seguintes declarações de importação registradas pelo contribuinte: 21/1544439-5, 21/1544435-2, 21/1716617-1, 21/1727727-5, 21/1738368-7, 21/1738964-2, 21/1751278-9 e 21 1892677-3.  

A fiscalização, amparada pelo TDPF-F acima descrito, apura fraude no valor declarado das mercadorias importadas e foi instaurada com base na Instrução Normativa RFB nº 1.986/2020, que trata das fraudes aduaneiras.

Para as duas primeiras DIs registradas, foi feita exigência de recolhimento de multa e tributos, mas o contribuinte não concordou com a exigência e, conforme determina o art. 42, § 2º, da IN RFB nº 680/06, foi lavrado Auto de Infração para constituição do crédito tributário – processo 10314.720677/2021-11.

Para as demais DIs, registradas posteriormente, a fiscalização solicitou uma série de documentos e esclarecimentos, dando ao contribuinte a oportunidade de demonstrar documentalmente o valor efetivamente praticado.

Deve-se ressaltar que a empresa já vinha sendo fiscalizada no âmbito de outros procedimentos, também relativos a fraudes no comércio exterior, e já havia sido intimada e reintimada a apresentar documentos e esclarecimentos através do dossiê 13032.719055/2021-02, TDPF-D 0819500-2021-00893-6.

A primeira intimação se deu em 26/07/2021 e, em sua resposta, o contribuinte questiona os procedimentos adotados pela fiscalização e não apresenta qualquer documento. Foi, então, reintimado em 13/09/2021 e novamente não apresentou os documentos e esclarecimentos solicitados.

O sócio-administador da empresa, sr. Bum Chul Park, CPF 231.121.948-02, foi, então, intimado a comparecer na Receita Federal no dia 4 de novembro de 2021, às 10 horas, para prestar esclarecimentos sobre seus processos de importação.

O contribuinte, no entanto, não compareceu na data marcada.

Foi, então, agendada reunião com seus advogados, sr. Daniel Bettamio Tesser, OAB/SP nº 208.351 e sra. Juliana Perpétuo, OAB/SP nº 252.784, que compareceram na data marcada, dia 09/11/2021, 14 horas. A reunião foi acompanhada também pelo Auditor-Fiscal Bruno da Rocha Osório, mat. 1318997. Os advogados, contudo, não souberam responder as questões formuladas pela fiscalização sobre as mercadorias importadas.

Em 08/11/2021, o contribuinte solicitou a liberação das mercadorias e o prazo adicional de 15 dias para apresentação de documento e informações.

Considerando que a empresa ainda não apresentou nenhum dos documentos e esclarecimentos solicitados pela fiscalização através de diversos termos lavrados, não é possível liberar as mercadorias sob fiscalização. Concede-se o prazo adicional solicitado para que todas as intimações sejam atendidas, inclusive as realizadas desde julho através do dossiê 13032.719055/2021-02. O prazo, improrrogável, se esgota em 23/11/2021.  

Considerando que há uma série de questões a serem esclarecidas pelo sócio administrador da empresa, fica o contribuinte REINTIMADO a comparecer à Receita Federal para prestar esclarecimentos no dia 24/11/2021, às 14 horas”.

 

Como visto, foi intimada a autora da inclusão da DI 21/1892677-3 no “procedimento de fiscalização utilizado no combate às fraudes aduaneiras”, previamente instaurado para auditar tecidos, que importou, com suspeita de subfaturamento, em ato devidamente motivado, tendo sido interrompido o despacho aduaneiro para esclarecimentos e documentos solicitados junto à importadora, que não foram prestados, o que motivou o excesso de prazo, ora impugnado.

Embora alegado que houve retenção indevida de mercadorias, evidencia-se que, em verdade, foi interrompido o despacho aduaneiro, em conformidade com o tratamento previsto no Regulamento Aduaneiro:

 

"Art. 570. Constatada, durante a conferência aduaneira, ocorrência que impeça o prosseguimento do despacho, este terá seu curso interrompido após o registro da exigência correspondente, pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil responsável.

§ 1° Caracterizam a interrupção do curso do despacho, entre outras ocorrências:

I - a não-apresentação de documentos exigidos pela autoridade aduaneira, desde que indispensáveis ao prosseguimento do despacho; e

II - o não-comparecimento do importador para assistir à verificação da mercadoria, quando sua presença for obrigatória.

[...]

§ 2º Na hipótese de a exigência referir-se a crédito tributário ou a direito antidumping ou compensatório, o importador poderá efetuar o pagamento correspondente, independente de processo.

§ 3° Havendo manifestação de inconformidade, por parte do importador, em relação à exigência de que trata o § 2o, o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil deverá efetuar o respectivo lançamento, na forma prevista no Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972.

[...]

Art. 571. Desembaraço aduaneiro na importação é o ato pelo qual é registrada a conclusão da conferência aduaneira.

§ 1º Não será desembaraçada a mercadoria:

I - cuja exigência de crédito tributário no curso da conferência aduaneira esteja pendente de atendimento, salvo nas hipóteses autorizadas pelo Ministro de Estado da Fazenda, mediante a prestação de garantia

 

No contexto, apurados indícios de declaração a menor de valores de importação, gerando subfaturamento, sem que, intimada, a importadora tenha esclarecido ou juntado documentação pertinente, a interrupção do despacho aduaneiro tem expresso respaldo no artigo 570, § 2º, do Decreto 6.759/2009, conforme acima transcrito.

A existência de previsão legal para paralisação impede, desde logo, o manejo da Súmula 323 do Supremo Tribunal Federal, por múltiplos fundamentos.

Primeiro, porque em 12/02/2021, a  Suprema Corte julgou, em repercussão geral, recurso extraordinário vinculado ao Tema 1.042, consolidando a tese de que “É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal”.

Em segundo lugar, porque não se trata de "apreensão" de mercadorias, mas paralisação de despacho aduaneiro, na medida em que obstado desembaraço aduaneiro, a afastar a incidência do verbete. Neste sentido decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

 

REsp 1.668.909, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 30/06/2017: "TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. DESPACHO ADUANEIRO. DIREITO ANTIDUMPING. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, ART. 1.022, II, DO CPC. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. 1. A parte recorrente sustenta que o art. 1.022, II, do CPC foi violado, mas deixa de apontar, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Assim, é inviável o conhecimento do Recurso Especial nesse ponto, ante o óbice da Súmula 284/STF. 2. Cuida-se na origem de Mandado de Segurança com o escopo de se proceder ao desembaraço aduaneiro de produtos químicos oriundos da República Popular da China, porquanto a autoridade alfandegária exige pagamento de direitos antidumping e multa de ofício sobre direitos antidumping. 3. O Tribunal regional decidiu que a retenção das mercadorias para cobrança dos tributos somente pode ser exigida mediante lavratura de auto de infração; portanto, a autoridade coatora deveria dar prosseguimento ao despacho de importação das mercadorias, independentemente do recolhimento de multa e prestação de garantia. Ademais, "a liberação da mercadoria não impediria a atuação da administração tributária em futuro procedimento fiscal, que tem meios próprios para satisfação da dívida (Súmula 323/STF)". 4. A indicada afronta aos arts. 107, 108 e 109 do Decreto 6.759/2009; ao art. 78 do CTN; ao art. 39 do Decreto 1.455/1976 e ao art. 50 do Decreto-Lei 37/1966 não pode ser analisada, pois o Tribunal de origem não emitiu juízo de valor sobre esses dispositivos legais. O Superior Tribunal de Justiça entende ser inviável o conhecimento do Recurso Especial quando os artigos tidos por violados não foram apreciados pelo Tribunal a quo, a despeito da oposição de Embargos de Declaração, haja vista a ausência do requisito do prequestionamento. Incide, na espécie, a Súmula 211/STJ. 5. O direito antidumping têm como escopo proteger a produção nacional contra a importação desmedida de produtos similares aos que se produzem aqui ou que com eles concorrem diretamente. 6. A vetusta Súmula 323 do Supremo Tribunal Federal (É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos) não pode ser aplicada ao caso sub judice. Ela não se amolda à hipótese sob exame, pois não houve apreensão de mercadorias por parte da autoridade alfandegária, mas negativa de proceder ao desembaraço aduaneiro dos produtos advindos da República Popular da China. 7. O art. 571, § 1º do Decreto 6.759/2009, infra transcrito, é claro à respeito, portanto não existe direito líquido e certo da recorrida ao prosseguimento do despacho de importação. 8. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido."

 

Mesmo que a medida fosse entendida como sendo equivalente à apreensão, não se autorizaria conclusão diversa. Com efeito, o datado verbete (editado há mais de cinquenta anos, anteriormente, portanto, ao Código Tributário Nacional, ao Decreto-Lei 37/1966 e ao Decreto-Lei 1.455/1976, que presentemente regem a matéria) tem por escopo obstar efetiva retenção ou apreensão de mercadorias, sem lastro hierárquico-normativo suficiente (como era o caso discutido no RE 39.933, vértice de tal súmula, que não tratava de direito aduaneiro, mas, sim, de taxa municipal indenizatória por despesas com rodovias), para exigir-se pagamento de tributo.

No caso, porém, a interrupção do despacho aduaneiro para pagamento, discussão ou caucionamento de crédito administrativo ou tributário tem lastro normativo expresso, recepcionado pela Constituição, com estatura de legislação ordinária federal (artigo 51, §§1º e 2º, do Decreto-lei 37/1966, e artigo 39 do Decreto-Lei 1.455/1976), a afastar o enquadramento da conduta como ilegalmente coercitiva.

A este respeito o seguinte precedente da Turma:

 

ApCiv 5002051-96.2017.4.03.6105, Rel. Des. Fed. NELTON DOS SANTOS, Intimação via sistema 08/02/2020: "TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTROLE ADUANEIRO. SÚMULA 323 STF. INAPLICAÇÃO. PARALISAÇÃO DE DESPACHO ADUANEIRO. ATO ADMINISTRATIVO. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE E VERACIDADE. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. A interrupção do despacho aduaneiro está expressamente respaldada no mencionado art. 571, § 1º, I, do Decreto 6.759/2009, uma vez que a impetrante descumpriu a exigência de apresentação de documentos no curso da conferência aduaneira. 2. Impertinente, pois, a invocação da Súmula nº 323 do Supremo Tribunal Federal, uma vez que não se trata de "apreensão" de mercadoria, e sim de paralisação de despacho aduaneiro. Precedentes do STJ. 3. Tampouco merece prosperar o pedido subsidiário formulado, porquanto a liberação da mercadoria somente poderia ser realizada mediante a prestação de garantia se tivesse sido instaurado procedimento especial de controle aduaneiro em razão das irregularidades constantes dos incisos IV e V do art. 2º da IN RFB 1.169/2011, inaplicáveis ao caso. Precedentes desta Turma. 4. Em relação à própria autuação, não se vislumbram, por ora, elementos suficientes a afastar a presunção de veracidade e legitimidade do ato administrativo. Precedentes. 5. Apelação não provida."

 

Cabe observar, ainda, que o prosseguimento do despacho aduaneiro não exige pagamento do tributo exigido, nos casos em que o único óbice ao desembaraço aduaneiro for a existência de crédito em aberto a favor da Administração. O procedimento pode ser concluído mediante a mera caução, nos termos da Portaria 389/1976 do Ministério da Fazenda (sendo admitida para tal fim, inclusive, fiança-bancária). Logo, não procede supor que a conclusão do despacho aduaneiro exija pagamento da diferença de tributos, devidos em razão do subfaturamento ilegal da importação.

Neste sentido, o seguinte julgado deste colegiado:

 

AI 5003545-70.2020.4.03.0000, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, DJe de 27/07/2020: “DIREITO ADUANEIRO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCEDIMENTO ESPECIAL DE CONTROLE. IMPORTAÇÃO DE MERCADORIAS. DECLARAÇÃO A MENOR DE VALOR ADUANEIRO. DESEMBARAÇO MEDIANTE CAUÇÃO. POSSIBILIDADE. SÚMULA 323/STF. INAPLICABILIDADE.  1.Versando a espécie sobre paralisação de despacho aduaneiro, nos termos do Decreto 6.759/2009, afasta-se a aplicação da Súmula 323 do Supremo Tribunal Federal, vez que não se trata de apreensão de mercadoria. Precedente do Superior Tribunal de Justiça. 2. Mesmo que, sob enfoque eficacial, a medida fosse entendida como equivalente à apreensão, não se chegaria à conclusão diversa. Com efeito, o datado verbete (editado há mais de cinquenta anos, anteriormente, portanto, ao Código Tributário Nacional, ao Decreto-Lei 37/1966 e ao Decreto-Lei 1.455/1976, que presentemente regem a matéria) tem por escopo obstar efetiva retenção ou apreensão de mercadoria, sem embasamento hierárquico-normativo suficiente (como era o caso discutido no RE 39.933, vértice da súmula referida, que não tratava de direito aduaneiro, mas, sim, de taxa municipal indenizatória por despesas com rodovias), para exigir-se o pagamento de tributo. No caso dos autos, contudo, a paralisação do despacho aduaneiro para pagamento, discussão ou caucionamento de crédito administrativo ou tributário tem lastro normativo expresso, recepcionado pela Constituição, com estatura de legislação ordinária federal (artigo 51, §§1º e 2º, do Decreto-lei 37/1966, e artigo 39 do Decreto-Lei 1.455/1976), a afastar o enquadramento da conduta como ilegalmente coercitiva. 3. O prosseguimento do despacho aduaneiro prescinde, a rigor, de pagamento do tributo exigido, já que, nos casos em que o único óbice ao desembaraço aduaneiro for a existência de crédito em aberto a favor da Administração, o procedimento pode ser concluído mediante a apresentação de simples garantia, nos termos da Portaria 389/1976 do Ministério da Fazenda (sendo admitida para tal fim, inclusive, fiança-bancária). Desta feita, não há que se dizer ser imposta a quitação das diferenças que a autoridade aduaneira entende devidas, para fim de conclusão do despacho aduaneiro. 4. Agravo de instrumento provido”.

 

Nem se alegue que a juntada, em fevereiro/2022, de laudo da ABIT afastaria a conclusão de que a autora deixou de fornecer elementos solicitados à fiscalização, pois há pedido específico, identificando dados e documentos exigidos pela RFB, que não se refere a laudo mercadológico, como visto acima.

Por sua vez, inviável cogitar de inexistência de controvérsia quanto ao preço das mercadorias na “adição 002” da DI 21/1892677-3, por supostamente serem idênticos, em qualidade, às mercadorias da adição declarada em outra DI, em que elaborado laudo mercadológico, pois, além deste não conter especificação quanto a tratar-se do tecido denominado “COLONNA PD”, não há como atestar a identidade entre as mercadorias pela mera visualização de descrição contida nas DI's, inclusive porque, conforme constou do “Termo n° 08 – Início de Fiscalização e Intimação”, “as descrições dos produtos na importação são genéricas, não permitindo sua perfeita identificação” (Id 254896657, f. 01).

O cenário fático-probatório externa, pois, percepção de que é razoável, adequada e aplicável, segundo o parâmetro normativo próprio, a exigência de caução para prosseguimento do despacho aduaneiro para liberação da importação sobre a qual recaem indícios de subfaturamento, não esclarecidos devidamente apesar de intimações fiscais que se destinaram a permitir a elucidação do fato controvertido.

A retomada do despacho aduaneiro com liberação de importação mediante caução, em casos que tais, é reconhecido pela jurisprudência:

 

REsp 1.728.921, Rel. Min. REGINA COSTA, DJe 24/10/2018: "PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. TRIBUTÁRIO. DESPACHO ADUANEIRO. DIREITO ANTIDUMPING. SÚMULA 323/STF. NÃO INCIDÊNCIA. HONORÁRIOS. NÃO CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II - Não se pode conhecer a apontada violação ao art. 1.022, do Código de Processo Civil, porquanto o recurso cinge-se a alegações genéricas e, por isso, não demonstra, com transparência e precisão, qual seria o ponto omisso, contraditório ou obscuro do acórdão recorrido, bem como a sua importância para o deslinde da controvérsia, o que atrai o óbice da Súmula 284 do Supremo Tribunal Federal, aplicável, por analogia, no âmbito desta Corte. III - A quitação dos direitos antidumping é requisito para perfectibilização do processo de importação. A retenção de mercadorias e a exigência do recolhimento de tributos e multa ou prestação de garantia integram a operação aduaneira. Inaplicabilidade da Súmula 323 do Supremo Tribunal Federal. IV - Honorários. Não cabimento. V - Recurso Especial provido."

 

Logo, ainda que se alegue não ser cabível pena de perdimento, disto não resulta a ilegalidade da exigência de caução para retomada do despacho aduaneiro em garantia ao interesse fiscal e aduaneiro na pendência da resolução da controvérsia sobre subfaturamento da importação, nos termos da jurisprudência apontada.

Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento e julgo prejudicado o pedido de reconsideração da antecipação de tutela recursal. 

É como voto.



E M E N T A

 

DIREITO ADUANEIRO. FISCALIZAÇÃO. FRAUDE E SUSPEITA DE SUBFATURAMENTO. IMPORTAÇÃO DE TECIDOS. NOTIFICAÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE ESCLARECIMENTOS. DETERMINAÇÃO PENDENTE DE CUMPRIMENTO. INTERRUPÇÃO DO DESPACHO ADUANEIRO. ARTIGO 570, § 2°, DECRETO 6.759/2009. SÚMULA 323/STF IMPERTINENTE. CABIMENTO DA EXIGÊNCIA DE CAUÇÃO. PORTARIA MF 389/1976.

1. Ao tempo do registro da DI, já havia procedimentos, junto à Aduana, contra empresas do grupo econômico HONEYTEX HIGH QUALITY TEXTILE AND PRINTING (Pacífico Sul Comercial e Exportadora Ltda; Highlight Comércio de Tecidos, Imp e Exp Ltda, Acenza Comércio de Plásticos e Tecidos Ltda; Lotusblume Comercial Têxtil Ltda e Guaraci Têxtil Eireli), para “auditoria dos tecidos importados pelas empresas do grupo Honeytex”, com intimação para juntada de documentação e esclarecimentos, conforme constou do “Termo n° 08 – Início de Fiscalização e Intimação”.

2. Relativamente à “Highlight Comércio de Tecidos, Imp e Exp Ltda”, o procedimento administrativo TDPF-F 0819500-2021-00893-6 tratou especificamente da auditoria dos tecidos que importou, incluindo na investigação a importação referente à DI 21/1892677-3 (artigo 2°, § 1°, da IN RFB 1.986/2020) com intimação, em 15/10/2021, para esclarecimentos e juntada de documentos, conforme “Termo de Constatação e Intimação” enviado posteriormente, no âmbito do TDPF-F 0819500-2021-00893-6, para reiterar a notificação anterior, dado o silêncio da  investigada. Assim, foi intimada a autora da inclusão da DI 21/1892677-3 no “procedimento de fiscalização utilizado no combate às fraudes aduaneiras”, previamente instaurado para auditar tecidos, que importou, com suspeita de subfaturamento, em ato devidamente motivado, interrompendo-se o despacho aduaneiro para esclarecimentos e instrução documental, não prestados, motivando o decurso de prazo, ora impugnado. 

3. Embora alegada retenção indevida, houve, na verdade, interrupção do despacho aduaneiro, em conformidade com o tratamento previsto no Regulamento Aduaneiro. Apurados indícios de declaração a menor de valores de importação, com prática de subfaturamento e sem esclarecimentos por parte da autora, a interrupção do despacho aduaneiro é procedimento regular com expresso respaldo no artigo 570, § 2º, do Decreto 6.759/2009.

4. A existência de previsão legal para paralisação impede, pois, o manejo da Súmula 323/STF, por múltiplos fundamentos. Primeiro, porque em 12/02/2021 a Suprema Corte julgou, com repercussão geral, o Tema 1.042, consolidando tese de que “É constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal”. Em segundo lugar, porque não se trata de "apreensão" de mercadorias, mas paralisação de despacho aduaneiro, na medida em que obstado desembaraço aduaneiro, a afastar a incidência do verbete.

5. Mesmo que a medida fosse entendida como equivalente à apreensão, não se autorizaria conclusão diversa. O datado verbete (editado há mais de cinquenta anos, anteriormente, pois, ao Código Tributário Nacional, ao Decreto-Lei 37/1966 e ao Decreto-Lei 1.455/1976, que atualmente regem a matéria) tem por escopo obstar efetiva retenção ou apreensão de bens sem lastro hierárquico-normativo suficiente (como era o caso discutido no RE 39.933, vértice de tal súmula, que não tratava de direito aduaneiro, mas, sim, de taxa municipal indenizatória por despesas com rodovias) para exigir-se pagamento de tributo.

6. No caso dos autos, porém, a paralisação do despacho aduaneiro para pagamento, discussão ou caucionamento de crédito administrativo ou tributário tem lastro normativo expresso, recepcionado pela Constituição, com estatura de legislação ordinária federal (artigo 51, §§1º e 2º, do Decreto-lei 37/1966, e artigo 39 do Decreto-Lei 1.455/1976), a afastar o enquadramento da conduta como ilegalmente coercitiva.

7. O prosseguimento do despacho aduaneiro não exige pagamento do tributo exigido, nos casos em que o único óbice ao desembaraço aduaneiro for a existência de crédito em aberto a favor da Administração. O procedimento pode ser concluído com mera oferta de garantia, nos termos da Portaria 389/1976 do Ministério da Fazenda (admitida para tal fim, inclusive, fiança-bancária). Logo, não procede supor que a conclusão do despacho aduaneiro exija pagamento da diferença de tributos, devidos em razão do subfaturamento ilegal da importação.

8. Nem se alegue que a juntada pela autora, em fevereiro/2022, de laudo da ABIT, afastaria a conclusão de que esta deixou de fornecer elementos solicitados à fiscalização, pois há pedido específico, identificando dados e documentos exigidos pela fiscalização, que não se refere a laudo mercadológico, como visto acima.

9. Inviável cogitar de inexistência de controvérsia em relação ao preço das mercadorias na “adição 002” da DI 21/1892677-3, por supostamente serem qualitativamente iguais às da adição declarada em outra DI, em que redigido laudo mercadológico, pois, além deste não conter especificação quanto a tratar-se do tecido denominado “COLONNA PD”, não há como atestar a identidade entre produtos por mera visualização de descrição contida nas DI's, inclusive porque, conforme constou do “Termo n° 08 – Início de Fiscalização e Intimação”, “as descrições dos produtos na importação são genéricas, não permitindo sua perfeita identificação” (Id 254896657, f. 01).

10. O cenário fático-probatório externa, pois, a percepção de que é razoável, adequada e aplicável, segundo parâmetro normativo próprio, a exigência de caução para prosseguimento do despacho aduaneiro para liberação da importação sobre a qual recaem indícios de subfaturamento, não esclarecidos devidamente apesar de intimações fiscais que se destinaram a permitir a elucidação do fato controvertido.

11. Logo, ainda que se alegue não ser cabível perdimento, disto não resulta a ilegalidade da exigência de caução para retomada do despacho aduaneiro em garantia ao interesse fiscal e aduaneiro na pendência da resolução da controvérsia sobre o subfaturamento da importação, nos termos da jurisprudência apontada.

12. Agravo de instrumento provido e pedido de reconsideração à antecipação de tutela prejudicado.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento ao agravo de instrumento e julgou prejudicado o pedido de reconsideração da antecipação de tutela recursal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.