AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5008924-21.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY
AGRAVANTE: MAXIMO OLIVEIRA E SOARES TRANSPORTES LTDA - EPP
Advogado do(a) AGRAVANTE: OLEGARIO ANTUNES NETO - SP152019
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
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AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5008924-21.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY AGRAVANTE: MAXIMO OLIVEIRA E SOARES TRANSPORTES LTDA - EPP Advogado do(a) AGRAVANTE: OLEGARIO ANTUNES NETO - SP152019 AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo de instrumento interposto por MAXIMO OLIVEIRA E SOARES TRANSPORTES LTDA – EPP em face de decisão que, nos autos da execução fiscal movida pela UNIÃO FEDERAL, rejeitou a impugnação à penhora de veículos e ativos financeiros (ID 246745710 dos autos n. 5004976-86.2018.4.03.6119). Alega, para tanto, que teve todos os valores em suas contas bloqueados e todo os seus veículos penhorados, com a inclusão de restrições no RENAJUD. Aduz, porém, que aderiu a parcelamento da dívida fiscal, razão pela qual faz jus ao levantamento das constrições, pois necessita dos bens para praticar sua atividade empresarial, inclusive para que consiga quitar o parcelamento fiscal. Afirma que a manutenção das penhoras pelo período do parcelamento (60 meses) lhe impõe imensuráveis prejuízos. Portanto, postula a reforma da decisão (ID 255587358). Foi deferida a antecipação da tutela recursal (ID 255660951). Contraminuta da agravada (ID 257224514). É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5008924-21.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY AGRAVANTE: MAXIMO OLIVEIRA E SOARES TRANSPORTES LTDA - EPP Advogado do(a) AGRAVANTE: OLEGARIO ANTUNES NETO - SP152019 AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL V O T O Pretende a agravante o desfazimento da penhora sobre veículos e ativos financeiros em razão da adesão a parcelamento fiscal. A matéria devolvida ao conhecimento desta Corte foi objeto de análise quando da concessão da antecipação da tutela recursal por decisão monocrática por mim proferida, a qual ora transcrevo (ID 255660951): No caso em comento, em um exame sumário dos fatos adequado a esta fase processual, verifico presentes os requisitos necessários à antecipação da tutela recursal. O dissenso instalado nos autos diz respeito à liberação dos valores bloqueados aos argumentos de que não houve prévia citação da agravante e em razão de parcelamento do crédito tributário. Registro, de início, que ao enfrentar o tema relativo à possibilidade de manutenção da penhora de valores via sistema Bacenjud no caso de parcelamento do crédito fiscal, o C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Resp's nº 1.756.406/PA, nº 1.703.535/PA e nº 1.696.270/MG afetou aqueles processos ao rito dos recursos repetitivos e determinou a suspensão de todos os feitos que versem sobre esta questão, conforme decisão proferida em 14.05.2019 e que abaixo transcrevo: EMENTA PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PROPOSTA DE AFETAÇÃO COMO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 2/STJ. EXECUÇÃO FISCAL. PARCELAMENTO DO DÉBITO. MANUTENÇÃO DA PENHORA VIA BACENJUD. 1. Questão jurídica central: "Possibilidade de manutenção de penhora de valores via sistema BACENJUD no caso de parcelamento do crédito fiscal executado (art. 151, VI, do CTN)". 2. Recurso especial submetido ao regime dos recursos repetitivos, conjuntamente com o REsp 1.703.535/PA e o REsp 1.696.270/MG. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento: A PRIMEIRA SEÇÃO, por maioria, afetou o processo ao rito dos recursos repetitivos (RISTJ, art. 257-C) e, por maioria, suspendeu a tramitação de processos em todo território nacional, inclusive que tramitem nos juizados especiais , conforme proposta do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Sr. Ministro Relator os Ministros Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa e Og Fernandes e, nos termos do art. 257-B do RISTJ, os Srs. Ministros Francisco Falcão, Herman Benjamin e Napoleão Nunes Maia Filho. Quanto à afetação do processo, divergiu o Sr. Ministro Gurgel de Faria. Quanto à abrangência da suspensão de processos, divergiu o Sr. Ministro Gurgel de Faria. Quanto à abrangência da suspensão do processo, o Ministro Gurgel de Faria proferiu voto específico. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Benedito Gonçalves. (Resp nº 1.756.406/PA) Como se percebe, há ordem expressa do C. Superior Tribunal de Justiça determinando a suspensão de todos os processos que versem sobre o tema em debate. No caso dos autos, verifico que a execução fiscal foi ajuizada em 10.08.2018 (Num. 9973185 – Pág. 1/2 do processo de origem), tendo a agravada formulado requerimento preliminar de “indisponibilidade de ativos ou de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira em nome do(s) executado(s) responsáveis pelo estabelecimento matriz e suas filiais” sem dar conhecimento prévio à agravante. Em 23.03.2020 foi proferida decisão indeferindo o pedido de indisponibilidade de ativos “sem prejuízo da realização do bloqueio via Bacenjud após a citação do executado”, bem como determinando a citação da agravante (Num. 30003024 – Pág. 1/2 do processo de origem). Em 04.11.2020, antes mesmo de sua citação, a agravante compareceu espontaneamente aos autos apresentando exceção de pré-executividade (Num. 41250107 – Pág. 1/16 do processo de origem), tendo sido proferido despacho determinando o prosseguimento da execução com cumprimento do mandado de penhora (Num. 41312094 – Pág. 1 do processo de origem). Em 26.10.2020 foi lavrada certidão pelo Oficial de Justiça citando a agravante, com registro de intimação do representante da empresa em 01.04.2021 acerca do bloqueio de contas e penhora no sistema Renajud (Num. 48461978 – Pág. 1/2 do processo de origem). Por fim, em 14.10.2021 a agravante noticiou a adesão a parcelamento fiscal e requereu a suspensão da execução de origem, além da liberação os valores bloqueados e o levantamento das penhoras e das restrições que recaíram sobre os veículos (Num. 130844959 – Pág. 1/2 do processo de origem). Amoldando-se o caso concreto ao precedente debatido pelo C. STJ, até que se resolva o dissenso, futura decisão a ser proferida por aquela Corte quanto ao tema controverso há ser cumprida diretamente pelo juízo da execução. Tenho, contudo, que o pedido de liberação dos valores bloqueados deve ser acolhido por fundamentos diversos. Vimos que o executivo fiscal de origem foi ajuizado em 10.08.2018 sendo proferida decisão em 23.03.2020 indeferindo o pedido inicial de indisponibilidade de ativos. Muito embora tenha o sr. oficial de justiça registrado a penhora de ativos financeiros no Bacenjud e de veículos no Renajud, constato que não houve qualquer requerimento posterior da agravada reiterando o pedido de indisponibilidade de bens. Nestas condições, a constrição de bens da agravante, nos termos em que realizada, viola o artigo 854, caput do CPC que exige prévio requerimento do exequente para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira, in verbis: Art. 854. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, sem dar ciência prévia do ato ao executado, determinará às instituições financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional, que torne indisponíveis ativos financeiros existentes em nome do executado, limitando-se a indisponibilidade ao valor indicado na execução. (…) (negritei) Ainda quanto ao tema, tenho entendido que a constrição de numerário depositado em conta bancária pelo sistema BacenJud consiste medida extrema a ser adotada apenas quando não localizados outros bens suficientes à garantia da dívida ou, ainda, quando os bens indicados ou penhorados forem de difícil alienação de modo a inviabilizar o recebimento do crédito. Tal entendimento se harmoniza com o princípio da preservação da empresa que busca prestigiar a continuidade da atividade empresarial em razão dos diversos interesses, sociais inclusive, que giram em torno dela. Nestas condições, antes que se esgotem as tentativas de localização de outros bens à garantia da dívida, não se afigura razoável o bloqueio de valores de conta bancária da empresa que podem lhe servir de capital de giro e impedir o regular exercício de suas atividades. No caso dos autos, verifico que sequer houve reiteração do requerimento de indisponibilidade pela agravada, titular do crédito perseguido, relativo à constrição de ativos financeiros pelo Bacenjud, não se mostrando razoável a constrição de numerário depositado em conta bancária e necessário à manutenção das atividades ordinárias da empresa sem que lhe fosse oportunizada a indicação de outros bens à garantia da dívida. Não fosse o suficiente, há, ainda, outro fundamento a determinar o desbloqueio de ativos e de veículos da agravante. Ao tratar dos bens impenhoráveis o artigo 833 do CPC estabeleceu o seguinte: Art. 833. São impenhoráveis: I – os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução; II – os móveis, os pertences e as utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou os que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida; III – os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor; IV – os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º; V – os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do executado; VI – o seguro de vida; VII – os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas; VIII – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família; IX – os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social; X – a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos; XI – os recursos públicos do fundo partidário recebidos por partido político, nos termos da lei; XII – os créditos oriundos de alienação de unidades imobiliárias, sob regime de incorporação imobiliária, vinculados à execução da obra. (...) No caso concreto, tenho que o pedido de liberação dos valores bloqueados encontra fundamento no artigo 833, X do CPC por se tratar de montante inferior a 40 salários mínimos, atraindo a aplicação da regra de impenhorabilidade prevista no mencionado dispositivo legal. Anoto, neste ponto, que a jurisprudência pátria tem entendido que a impenhorabilidade do montante até 40 salários mínimos depositados recai não apenas em caderneta de poupança, mas também em conta corrente, fundo de investimento ou guardado em papel moeda por se tratar de valor necessário ao sustento familiar, entendo que o pedido de antecipação da tutela recursal deve ser acolhido. Em caso assemelhado ao posto nos autos, assim decidiu esta E. Corte Regional: “PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ARTIGO 535 DO CPC. NÃO CARACTERIZAÇÃO. EXECUÇÃO FISCAL. REGRA DE IMPENHORABILIDADE. ARTIGO 833 DO CPC. LIMITE DE QUARENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. CABIMENTO. 1. Não havendo no acórdão recorrido omissão, obscuridade ou contradição, não fica caracterizada ofensa ao art. 535 do CPC. 2. Segundo a jurisprudência pacificada deste STJ "é possível ao devedor, para viabilizar seu sustento digno e de sua família, poupar valores sob a regra da impenhorabilidade no patamar de até quarenta salários mínimos, não apenas aqueles depositados em cadernetas de poupança, mas também em conta-corrente ou em fundos de investimento, ou guardados em papel-moeda." (REsp 1.340.120/SP, Quarta Turma, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 18/11/2014, DJe 19/12/2014). 3. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.” (STJ, Segunda Turma, REsp 1666893/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 30/06/2017) Entendo que o caso em exame se amolda ao entendimento consubstanciados nos julgados transcritos diante da informação de que foi bloqueada quantia de R$ 25.440,96 em conta bancária da agravante junto ao Itaú Unibanco S.A., além de R$ 5.162,96 junto à instituição “CCLA Vanguarda da Reg das Cata” conforme Detalhamento da Ordem Judicial de Bloqueio de Valores (Num. 48462102 – Pág. 2/3 do processo de origem). Considerando, portanto, que o montante bloqueado é inferior ao valor equivalente a 40 salários mínimos, a constrição se mostra descabida. Especialmente em relação à impenhorabilidade do montante de até 40 salários mínimos relativa a pessoa jurídica, trago o seguinte precedente: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. BACENJUD. ARTIGO 805 DO NOVO CPC. CAPITAL DE GIRO DA EMPRESA. REGULAR EXERCÍCIO DE SUAS ATIVIDADES. IMPOSSIBILIDADE DO BLOQUEIO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (...) 6. Por outro lado, os itens essenciais à exploração da empresa, inclusive os recursos mantidos em conta corrente e poupança, constituem exemplos da limitação da responsabilidade patrimonial (artigo 649, V e X, do CPC de 1973 e artigo 833, V e X, do novo CPC). No caso de conta destinada ao pagamento de salários, a isenção não decorre da natureza da verba – sem transferência aos credores, o dinheiro não assume papel alimentar –, mas sim da vinculação à subsistência da sociedade empresária. Na ausência de pagamento de mão de obra, a entidade deixará de funcionar, comprometendo a garantia de sobrevivência mínima extraída proporcionalmente do artigo 649, V e X, do CPC de 1973 e do artigo 833, V e X, do novo CPC. 7. Na presente hipótese, verifica-se que os valores bloqueados correspondem ao único montante disponível de capital de giro da empresa. Em 02/03 a empresa efetuou pedido de compra de parte do material necessário para a execução do projeto, efetuando o pagamento da primeira parcela. Em 06/03 foi emitida a nota fiscal pela empresa Dicomp Distribuidora de Eletrônicos Ltda, no valor total de R$ 99.106,69, sendo que o pagamento da segunda parcela ocorreria em 09/03. Na mesma data do bloqueio (07/03) foi efetuado o pedido de compra de mais uma parte do material necessário, nos valores de R$ 48.976,50 e R$ 5.883,85 e, no dia seguinte, do restante do material, no valor de R$ 314.356,00. Em razão do bloqueio, nenhum pagamento foi efetuado e alguns títulos já foram protestados, conforme documentos juntados pela agravada. O saldo da conta corrente em 25/07/2018 está negativo. 8. Não há dúvida de que o valor bloqueado se refere à sobra do montante do empréstimo bancário que, embora não seja impenhorável em si mesmo – já que se trata de dinheiro disponível da empresa – configura seu único capital de giro, que foi bloqueado na sua totalidade. 9. Desta forma, não se afigura razoável o bloqueio de valores de conta bancária da empresa que podem impedir o regular exercício de suas atividades. Assim, diante da excepcionalidade do caso, deve ser mantida a decisão agravada. 10. Agravo de instrumento desprovido. Agravo interno julgado prejudicado.” (negritei) (TRF 3ª Região, Terceira Turma, AI/SP 5016606-66.2018.4.03.0000, Relator Desembargador Antonio Cedenho, e–DJF3 12/12/2018) Da mesma forma, tenho que devem ser liberados os veículos de propriedade da agravante bloqueados no Renajud. Com efeito, especificamente em relação à hipótese de que trata o inciso V do dispositivo legal, observo que se trata de disposição aplicável aos bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão e não da atividade da pessoa jurídica executada. Entretanto, a jurisprudência pátria tem admitido a aplicação da mencionada regra protetiva aos bens imprescindíveis à atividade de microempresa ou empresa de pequeno porte. Neste sentido: “PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. CONTRATOS BANCÁRIOS. – Impenhorabilidade prevista no art. 833, V do CPC que é extensível às pessoas jurídicas constituídas na forma de microempresa ou empresa de pequeno porte quando os bens penhorados forem imprescindíveis à atividade da empresa. Precedentes. – Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor que não tem o alcance de autorizar a decretação de nulidade de cláusulas contratuais ou inversão dos ônus da prova com base em meros questionamentos do devedor com alegações vagas e genéricas de abusividade. – Recurso parcialmente provido.” (negritei) (TRF 3ª Região, Segunda Turma, ApCiv/SP 0012369-49.2014.4.03.6100, Relator Desembargador Federal Peixoto Júnior, e – DJF3 21/09/2020) “PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IMPENHORABILIDADE DOS INSTRUMENTOS ESSENCIAIS AO DESEMPENHO DE ATIVIDADE PROFISSIONAL. EMPRESA DE PEQUENO PORTE. MAQUINÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO EM PARTE. 1. A questão posta nos autos diz respeito ao benefício da justiça gratuita e à higidez de penhora efetivada. 2. Não tendo havido alterações fáticas ou jurídicas relevantes desde a decisão monocrática proferida, reiteram-se seus fundamentos no tocante ao descabimento da gratuidade de justiça. 3. O C. Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento de que a impenhorabilidade prevista no dispositivo supracitado aplica-se, em caráter excepcional e analógico, às pessoas jurídicas na condição de microempresas ou empresas de pequeno porte. 4. No caso dos autos, trata-se de empresa de pequeno porte contra a qual, no bojo de execução fiscal, foi efetuada a penhora de maquinário diverso (guilhotinas, tornos de repuxo, tesoura rotativa e prensas), conforme ID 23236918 e 34905463 dos autos de origem. 5. Conforme se depreende da própria denominação da executada (Repuxação São Lucas – EPP) é evidente que os instrumentos em tela são essenciais ao desenvolvimento do objeto social da sociedade empresária, e que sua constrição tem potencial para paralisar a atividade empresarial. 6. Agravo de instrumento provido em parte.” (negritei) (TRF 3ª Região, Terceira Turma, AI/SP 5028390-69.2020.4.03.0000, Relator Desembargador Federal Antonio Cedenho, DJEN 25/03/2021) No caso concreto, tenho que tais precedentes se mostram aplicáveis ao caso dos autos, tendo em vista que a agravante se reveste da qualidade de empresa de pequeno porte, como indica consulta ao número de inscrição no CNPJ no sítio eletrônico da Receita Federal que revela se tratar de “Empresa Individual de Responsabilidade Limitada” que se dedica ao “Transporte rodoviário de cargas, exceto produtos perigosos e mudanças, intermunicipal, interestadual e internacional”. Neste sentido, julgado desta Corte Regional: “EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IMPENHORABILIDADE. VEÍCULOS. PESSOA JURÍDICA. MICROEMPRESA. BENS UTEIS E NECESSÁRIOS AO DESEMPENHO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL. VERBA HONORÁRIA. CONDENAÇÃO DA UNIÃO. DESCABIMENTO. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA. As medidas forçadas não podem ser adotadas a qualquer custo, devendo respeitar o modo menos gravoso para o devedor-executado. A compreensão jurídica da menor onerosidade deve ser construída na área de convergência entre os interesses legítimos do credor e a excessiva privação do patrimônio e das atividades do devedor, daí significando que, havendo diversos meios executivos igualmente eficientes, deve-se trilhar aquele que implique em menor sacrifício para o devedor. No âmbito da menor onerosidade é também imprescindível considerar as determinações legais, sobre o que emerge a ordem de preferência de bens penhoráveis e os instrumentos para as correspondentes efetivações. A impenhorabilidade não exige que o bem seja indispensável, bastando que esteja bem caracterizada situação de utilidade para o exercício profissional no caso concreto. No caso dos autos, foram bloqueados veículos de propriedade da empresa executada, daí porque emergem as disposições do art. 833 do CPC. A embargante comprova, por seu contrato social e Ficha Cadastral registrados na Junta Comercial do Estado de São Paulo, o exercício da atividade de transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, serviços de táxi e de transporte de passageiros mediante locação de automóveis com motorista. Verifica-se, ademais, que a devedora possui somente mais dois veículos registrados em seu nome, conforme pesquisa realizada no sistema Renajud, além de se enquadrar na categoria de microempresa. Os elementos acima apontados evidenciam a utilidade dos bens para o exercício das atividades empresariais da embargante, restando caracterizado, no caso em apreço, o caráter impenhorável dos veículos. Despropositada a condenação da embargada em verba honorária, dada sua sucumbência mínima na presente demanda e em parte que não extinguiu a dívida exigida. Apelações da embargante e da União às quais se nega provimento.” (negritei) (TRF 3ª Região, Segunda Turma, ApCiv/SP 5015469-33.2019.4.03.6105, Relator Desembargador Federal José Carlos Francisco, DJEN 14/04/2021) Ante o exposto, defiro o pedido de antecipação da tutela recursal para determinar o desbloqueio de ativos financeiros e a liberação dos veículos bloqueados de titularidade da agravante, nos termos da fundamentação supra. Sem delongas, não vislumbro motivo para a alteração das razões então adotadas. De fato, uma vez que os valores bloqueados são inferiores a 40 salários mínimos e os veículos penhorados são indispensáveis ao exercício da atividade econômica da agravante (transporte de cargas), pelos fundamentos supra transcritos, recaem sobre tais bens as impenhorabilidades previstas no art. 833, V e X, do Código de Processo Civil. Vale registrar que não se ignora a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n. 1.756.406/PA sob o rito dos recursos repetitivos, em 08 de junho de 2022, com a qual se harmoniza a decisão agravada. Veja-se: O bloqueio de ativos financeiros do executado via sistema BACENJUD, em caso de concessão de parcelamento fiscal, seguirá a seguinte orientação: (i) será levantado o bloqueio se a concessão é anterior à constrição; e (ii) fica mantido o bloqueio se a concessão ocorre em momento posterior à constrição, ressalvada, nessa hipótese, a possibilidade excepcional de substituição da penhora online por fiança bancária ou seguro garantia, diante das peculiaridades do caso concreto, mediante comprovação irrefutável, a cargo do executado, da necessidade de aplicação do princípio da menor onerosidade. Considerando, contudo, que o levantamento das constrições na espécie encontra fundamento diverso da concessão de parcelamento fiscal, hipótese pacificada pela Corte Superior, não há que se falar em aplicação do referido precedente no presente julgamento. Ante o exposto, CONHEÇO E DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento a fim de determinar o desbloqueio dos ativos financeiros e a liberação dos veículos bloqueados de titularidade da agravante, nos termos da fundamentação supra. É como voto.
VOTO
O Juiz Federal Convocado ALEXANDRE SALIBA: peço vênia ao e. Relator para divergir.
Cuida-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que rejeitou impugnação à penhora de valores e de veículos efetivadas no feito executivo de origem.
O e. Relator apresentou seu voto no sentido de acolher a pretensão recursal.
Com a devida vênia, divirjo do entendimento.
Inicialmente, há que se registrar que o Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento, em julgamento submetido ao rito do artigo 543-C do CPC - Código de Processo Civil de 1973, no sentido de que é possível o deferimento da penhora online mesmo antes do esgotamento de outras diligências:
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. PROCESSO JUDICIAL TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA ELETRÔNICA. SISTEMA BACEN-JUD. ESGOTAMENTO DAS VIAS ORDINÁRIAS PARA A LOCALIZAÇÃO DE BENS PASSÍVEIS DE PENHORA. ARTIGO 11, DA LEI 6.830/80. ARTIGO 185-A, DO CTN. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INOVAÇÃO INTRODUZIDA PELA LEI 11.382/2006. ARTIGOS 655, I, E 655-A, DO CPC. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DAS LEIS. TEORIA DO DIÁLOGO DAS FONTES. APLICAÇÃO IMEDIATA DA LEI DE ÍNDOLE PROCESSUAL. 1. A utilização do Sistema BACEN-JUD, no período posterior à vacatio legis da Lei 11.382/2006 (21.01.2007), prescinde do exaurimento de diligências extrajudiciais, por parte do exeqüente, a fim de se autorizar o bloqueio eletrônico de depósitos ou aplicações financeiras (Precedente da Primeira Seção: EREsp 1.052.081/RS, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Primeira Seção, julgado em 12.05.2010, DJe 26.05.2010. Precedentes das Turmas de Direito Público: REsp 1.194.067/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 22.06.2010, DJe 01.07.2010; AgRg no REsp 1.143.806/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 08.06.2010, DJe 21.06.2010; REsp 1.101.288/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 02.04.2009, DJe 20.04.2009; e REsp 1.074.228/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 07.10.2008, DJe 05.11.2008. Precedente da Corte Especial que adotou a mesma exegese para a execução civil: REsp 1.112.943/MA, Rel. Ministra Nancy Andrighi, julgado em 15.09.2010)... 12. Assim, a interpretação sistemática dos artigos 185-A, do CTN, com os artigos 11, da Lei 6.830/80 e 655 e 655-A, do CPC, autoriza a penhora eletrônica de depósitos ou aplicações financeiras independentemente do exaurimento de diligências extrajudiciais por parte do exeqüente. 13. À luz da regra de direito intertemporal que preconiza a aplicação imediata da lei nova de índole processual, infere-se a existência de dois regimes normativos no que concerne à penhora eletrônica de dinheiro em depósito ou aplicação financeira: (i) período anterior à égide da Lei 11.382, de 6 de dezembro de 2006 (que obedeceu a vacatio legis de 45 dias após a publicação), no qual a utilização do Sistema BACEN-JUD pressupunha a demonstração de que o exeqüente não lograra êxito em suas tentativas de obter as informações sobre o executado e seus bens; e (ii) período posterior à vacatio legis da Lei 11.382/2006 (21.01.2007), a partir do qual se revela prescindível o exaurimento de diligências extrajudiciais a fim de se autorizar a penhora eletrônica de depósitos ou aplicações financeiras... 19. Recurso especial fazendário provido, declarando-se a legalidade da ordem judicial que importou no bloqueio liminar dos depósitos e aplicações financeiras constantes das contas bancárias dos executados. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008. (STJ, REsp 1184765/PA, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/11/2010, DJe 03/12/2010).
Portanto, não há que se aguardar o exaurimento da busca de bens penhoráveis para somente após buscar a constrição on line de ativos financeiros.
Anoto, ademais, pela relevância da solução da questão aqui discutida, que a exequente, ora agravada, ao distribuir o feito executivo, pleiteou pela a indisponibilidade de ativos financeiros.
E o Juízo a quo ao proferir o despacho citatório, observou adequadamente a impossibilidade da imediata indisponibilidade, reservando a providência para momento posterior, na hipótese de não pagamento voluntário, in verbis:
2. Prematuro o pedido da União de indisponibilidade de ativos financeiros via BacenJud antes da citação dos executados, com fulcro no art. 854 do CPC.
Com efeito, na execução fiscal, o devedor é citado para, no prazo de cinco dias, pagar a dívida ou garantir a execução (art. 8º da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980).
Desse modo, caso a tentativa de bloqueio se mostre exitosa antes da citação, a opção de garantir a execução acaba sendo eliminada, até porque o dinheiro e os ativos financeiros têm prioridade legal.
Por conseguinte, referido dispositivo não permite indistintamente a realização de BacenJud antes da citação do executado, pois não é aplicável às execuções fiscais.
Ademais, não vislumbro a possibilidade de risco de lesão grave e de difícil reparação não tutelada por instrumentos legais específicos, já que a Exequente não demonstrou a urgência da adoção de medidas constritivas sobre o patrimônio do(a) devedor(a) antes mesmo da citação. Ressalte-se que não há nos autos comprovação de que a parte executada esteja promovendo o esvaziamento de seu patrimônio, o qual culminaria em frustração da satisfação do crédito ora exigido.
Portanto, ausentes os requisitos legais, INDEFIRO a medida prévia requerida, sem prejuízo da realização do bloqueio via Bacenjud após a citação do executado.
Portanto, há pedido expresso da exequente pelo deferimento da constrição on line de valores e a medida somente foi deferida no momento oportuno.
Por outro lado, o quanto disposto no art. 833, inc. X do CPC, não beneficia a agravante.
É que a impenhorabilidade de montante em conta até o limite de 40 salários constitui benefício legal voltado à proteção da pessoa física, de modo a lhe garantir subsídios mínimos de subsistência.
Nesse sentido é a jurisprudência do C. STJ:
5. A impenhorabilidade inserida no art. 833, X, do CPC/2015, reprodução da norma contida no art. 649, X, do CPC/1973, não alcança, em regra, as pessoas jurídicas, visto que direcionada a garantir um mínimo existencial ao devedor (pessoa física). Nesse sentido: "[...] a intenção do legislador foi proteger a poupança familiar e não a pessoa jurídica, mesmo que mantenha poupança como única conta bancária" (AREsp 873.585/SC, Rel. Ministro Raul Araújo, DJe 8/3/2017).
(STJ, AgIntREsp 1.914.793-RS, rel. Min. Herman Benjamin, j. 14.06.2021)
Nesses termos, não há que se falar em limitação da penhora em 40 salários mínimos, tendo em vista que o bloqueio de ativos financeiros recaiu sobre conta de titularidade da pessoa jurídica executada.
Por fim, a penhora dos veículos, por si só, não inviabiliza o desenvolvimento das atividades da executada, não constituindo razão plausível para liberação da constrição. Cumpria à recorrente demonstrar que a constrição inviabiliza suas operações, o que não restou demonstrado na hipótese.
Desse modo, nego provimento ao agravo de instrumento.
É o voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. IMPUGNAÇÃO À PENHORA. ATIVOS FINANCEIROS E VEÍCULOS. CONCESSÃO DE PARCELAMENTO FISCAL. IMPOSSIBILIDADE DE LEVANTAMENTO. TESE REPETITIVA 1012 DO STJ. IMPENHORABILIDADE DOS BENS. VALORES INFERIORES A QUARENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. VEÍCULOS INDISPENSÁVEIS AO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA DA EXECUTADA. EMPRESA DE PEQUENO PORTE. INCIDÊNCIA DO ART. 833, INCISOS V E X, DO CPC. RECURSO PROVIDO.
1. Recurso em que se pretende o desfazimento da penhora sobre veículos e ativos financeiros em razão da adesão a parcelamento fiscal.
2. A decisão agravada está em harmonia com a tese firmada no julgamento do Tema Repetitivo 1012 pelo Superior Tribunal de Justiça, pela qual o bloqueio de ativos financeiros do executado via sistema BACENJUD fica mantido se a concessão do parcelamento fiscal ocorre em momento posterior à constrição, ressalvada, nessa hipótese, a possibilidade excepcional de substituição da penhora online por fiança bancária ou seguro garantia, diante das peculiaridades do caso concreto, mediante comprovação irrefutável, a cargo do executado, da necessidade de aplicação do princípio da menor onerosidade.
3. Tenho, contudo, que o recurso merece provimento por fundamentos diversos.
4. O pedido de liberação dos valores bloqueados encontra fundamento no artigo 833, X, do CPC por se tratar de montante inferior a 40 salários mínimos, atraindo a aplicação da regra de impenhorabilidade prevista no mencionado dispositivo legal.
5. A jurisprudência pátria tem entendido que a impenhorabilidade do montante até 40 salários mínimos depositados recai não apenas em caderneta de poupança, mas também em conta corrente, fundo de investimento ou guardado em papel moeda por se tratar de valor necessário ao sustento familiar. Tal entendimento se aplica à pessoa jurídica quando os valores bloqueados são necessários à subsistência da sociedade empresária, correspondendo ao único montante disponível de capital de giro da empresa. Precedente desta Corte.
6. Com relação à liberação dos veículos, embora o art. 833, V, do CPC, se trate de disposição aplicável aos bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão e não da atividade da pessoa jurídica, a jurisprudência pátria tem admitido a aplicação da referida regra protetiva aos bens imprescindíveis à atividade de microempresa ou empresa de pequeno porte.
7. Na espécie, a executada se reveste da qualidade de empresa de pequeno porte e, como indica consulta ao número de inscrição no CNPJ no site da Receita Federal, se dedica ao transporte rodoviário de cargas. Portanto, incide sobre os veículos bloqueados a proteção do dispositivo legal retro citado, devendo ser determinada a sua liberação.
8. Agravo de instrumento provido.