APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011325-31.2019.4.03.6100
RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE
APELANTE: UNILEVER BRASIL INDUSTRIAL LTDA
Advogado do(a) APELANTE: JULIO CESAR GOULART LANES - SP285224-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011325-31.2019.4.03.6100 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: UNILEVER BRASIL INDUSTRIAL LTDA Advogado do(a) APELANTE: JULIO CESAR GOULART LANES - SP285224-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: [ialima] R E L A T Ó R I O Apelação interposta por Unilever Brasil Industrial Ltda. contra sentença que, em sede de mandado de segurança, denegou a ordem e julgou improcedente o pedido de afastamento da compensação de ofício dos créditos reconhecidos pela Receita Federal do Brasil com eventuais débitos com exigibilidade suspensa ou garantidos por carta-fiança ou seguro-garantia em processos judiciais (Id 257302950). Aduz (Id 257302954) que: a) a sentença é nula, nos termos dos artigos 93, inciso IX, da Constituição e 489, §1º, inciso IV, e 1.022, inciso II, e parágrafo único, inciso II, do CPC, porquanto ausente o exame da possibilidade de os débitos garantidos por apólice de seguro e fiança bancária serem considerados para fins de compensação de ofício e de obstar a restituição de créditos já reconhecidos; b) o juízo se omitiu na análise do artigo 20 da LINDB, da preservação do direito à ampla defesa e de o contribuinte efetivamente restituir-se dos créditos que forem reconhecidos em seu favor; bem como do fato de que a própria RFB, por meio do artigo 89, §2º, da IN RFB nº 1.717/2017, exarou entendimento no sentido de que débitos garantidos não podem ser obstáculos à restituição de créditos tributários; c) o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp nº 1.213.082 (Tema 484) decidiu que débitos com exigibilidade suspensa nos termos do artigo 151 do CTN impedem a realização de compensação de ofício, mas não se pronunciou sobre débitos garantidos por seguro e carta fiança, de modo que é descabida a sua aplicação ao caso; d) a pretensão da fazenda de proceder com a compensação de ofício dos créditos reconhecidos com os débitos cuja exigibilidade esteja suspensa, bem como com os débitos garantidos por seguro garantia e carta de fiança bancária, viola a determinação dos artigos 20 da LINDB e 2º do Decreto nº 9.830/2019. Em contrarrazões (Id 257302958), a União requer o desprovimento do recurso. O parecer ministerial é no sentido de que seja dado prosseguimento ao feito (Id 257546681). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5011325-31.2019.4.03.6100 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: UNILEVER BRASIL INDUSTRIAL LTDA Advogado do(a) APELANTE: JULIO CESAR GOULART LANES - SP285224-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O I – Dos fatos Mandado de segurança impetrado por Unilever Brasil Industrial Ltda. contra ato coator praticado pelo Delegado da Receita Federal em São Paulo/SP, com vista ao afastamento da compensação de ofício dos créditos reconhecidos pela Receita Federal do Brasil com eventuais débitos com exigibilidade suspensa ou garantidos por carta-fiança ou seguro-garantia em processos judiciais. II – Da preliminar Alega o recorrente que a sentença é nula, nos termos dos artigos 93, inciso IX, da Constituição e 489, §1º, inciso IV, e 1.022, inciso II, e parágrafo único, inciso II, do CPC, porquanto não examinada a possibilidade de débitos garantidos por apólice de seguro e fiança bancária serem considerados para fins de compensação de ofício. Contudo, não lhe assiste razão, pois o magistrado analisou a questão de maneira clara e com a exposição dos motivos de seu convencimento. A propósito, confira-se: STF, ARE 1193761, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, j. 17.05.2019 e RE 609513 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 25.10.2011. Por sua vez, o exame da aplicação dos artigos 20 do Decreto-Lei nº 4.657/72 (LINDB) e 89 da IN RFB n.º 1.717/2017 é matéria que se confunde com o mérito e com ele será analisado. III – Da compensação de ofício Cinge-se a questão à legalidade da compensação de ofício de créditos reconhecidos administrativamente com eventuais débitos com exigibilidade suspensa ou garantidos por carta-fiança ou seguro-garantia em processos judiciais. O tema referente à compensação de ofício foi analisado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n.º 1.213.082/PR (Tema 484), representativo da controvérsia, que assentou o entendimento de que o procedimento somente é ilegal se a dívida do contribuinte estiver com sua exigibilidade suspensa, na forma do artigo 151 do Código Tributário Nacional, verbis: PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA (ART. 543-C, DO CPC). ART. 535, DO CPC, AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO. COMPENSAÇÃO DE OFÍCIO PREVISTA NO ART. 73, DA LEI N. 9.430/96 E NO ART. 7º, DO DECRETO-LEI N. 2.287/86. CONCORDÂNCIA TÁCITA E RETENÇÃO DE VALOR A SER RESTITUÍDO OU RESSARCIDO PELA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. LEGALIDADE DO ART. 6º E PARÁGRAFOS DO DECRETO N. 2.138/97. ILEGALIDADE DO PROCEDIMENTO APENAS QUANDO O CRÉDITO TRIBUTÁRIO A SER LIQUIDADO SE ENCONTRAR COM EXIGIBILIDADE SUSPENSA (ART. 151, DO CTN). 1. Não macula o art. 535, do CPC, o acórdão da Corte de Origem suficientemente fundamentado. 2. O art. 6º e parágrafos, do Decreto n. 2.138/97, bem como as instruções normativas da Secretaria da Receita Federal que regulamentam a compensação de ofício no âmbito da Administração Tributária Federal (arts. 6º, 8º e 12, da IN SRF 21/1997; art. 24, da IN SRF 210/2002; art. 34, da IN SRF 460/2004; art. 34, da IN SRF 600/2005; e art. 49, da IN SRF 900/2008), extrapolaram o art. 7º, do Decreto-Lei n. 2.287/86, tanto em sua redação original quanto na redação atual dada pelo art. 114, da Lei n. 11.196, de 2005, somente no que diz respeito à imposição da compensação de ofício aos débitos do sujeito passivo que se encontram com exigibilidade suspensa, na forma do art. 151, do CTN (v.g. débitos inclusos no REFIS, PAES, PAEX, etc.). Fora dos casos previstos no art. 151, do CTN, a compensação de ofício é ato vinculado da Fazenda Pública Federal a que deve se submeter o sujeito passivo, inclusive sendo lícitos os procedimentos de concordância tácita e retenção previstos nos §§ 1º e 3º, do art. 6º, do Decreto n. 2.138/97. Precedentes: REsp. nº 542.938 - RS, Primeira Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 18.08.2005; REsp. nº 665.953 - RS, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 5.12.2006; REsp. nº 1.167.820 - SC, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 05.08.2010; REsp. nº 997.397 - RS, Primeira Turma, Rel. Min. José Delgado, julgado em 04.03.2008; REsp. nº 873.799 - RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12.8.2008; REsp. n. 491342/PR, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 18.05.2006; REsp. nº 1.130.680 - RS Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 19.10.2010. [...] 4. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, e da Resolução STJ n. 8/2008. (REsp 1213082/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, j. 10.08.2011, DJe 18.08.2011, destaquei). Ressalte-se que, não obstante a Lei nº 12.844/2013, publicada após o julgamento do recurso paradigma pelo STJ, tenha alterado o artigo 73 da Lei n.º 9.430/96 para permitir a realização da compensação de ofício, a regra do artigo 151 do CTN sobre a suspensão da exigibilidade permanece hígida, de modo que o comando que somente poderia ser alterado por lei complementar (artigo 146, inciso III, alínea “b”, da CF). Nesse sentido é o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema 874: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO. ARTIGO 146, III, B, DA CF. ARTIGO 170 DO CTN. NORMA GERAL EM MATÉRIA DE COMPENSAÇÃO. COMPENSAÇÃO DE OFÍCIO. ARTIGO 73, PARÁGRAFO ÚNICO (INCLUÍDO PELA LEI Nº 12.844/13), DA LEI Nº 9.430/96. DÉBITOS PARCELADOS SEM GARANTIA. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO (ART. 151, VI, DO CTN). IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO UNILATERAL. INCONSTITUCIONALIDADE DA EXPRESSÃO “OU PARCELADOS SEM GARANTIA”. 1. O art. 146, III, b, da Constituição Federal dispõe caber a lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários. Nesse sentido, a extinção e a suspensão do crédito tributário constituem matéria de norma geral de Direito Tributário, sob reserva de lei complementar. A compensação vem prevista no inciso II do art. 156 do CTN como forma de extinção do crédito tributário e deve observar as peculiaridades estabelecidas no art. 170 do Código Tributário Nacional. 2. O art. 170 do CTN, por si só, não gera direito subjetivo a compensação. A lei complementar remete a lei ordinária a disciplina das condições e das garantias, cabendo a lei autorizar a compensação de créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo, observados os institutos básicos da tributação previstos no Código Tributário Nacional. 3. A jurisprudência da Corte já assentou que a compensação de ofício não viola a liberdade do credor e que o suporte fático da compensação prescinde de anuência ou acordo, perfazendo-se ex lege, diante das seguintes circunstâncias objetivas: (i) reciprocidade de dívidas, (ii) liquidez das prestações, (iii) exigibilidade dos débitos e (iv) fungibilidade dos objetos. Precedentes. 4. O art. 151, VI, do CTN, ao prever que o parcelamento suspende a exigibilidade do crédito tributário, não condiciona a existência ou não de garantia. O parágrafo único do art. 73 da Lei nº 9.430/96 (incluído pela Lei nº 12.844/13), ao permitir que o Fisco realize compensação de ofício de débito parcelado sem garantia, condiciona a eficácia plena da hipótese de suspensão do crédito tributário - no caso, o 'parcelamento' (CTN - art. 151, VI) - a condição não prevista em lei complementar. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento, mantendo-se o acórdão em que se declarou a inconstitucionalidade da expressão “ou parcelados sem garantia”, constante do parágrafo único do art. 73 da Lei nº 9.430/96, incluído pela Lei nº 12.844/13, por afronta ao art. 146, III, b, da Constituição Federal. 6. Tese do Tema nº 874 de repercussão geral: “É inconstitucional, por afronta ao art. 146, III, b, da CF, a expressão ’ou parcelados sem garantia’ constante do parágrafo único do art. 73, da Lei nº 9.430/96, incluído pela Lei nº 12.844/13, na medida em que retira os efeitos da suspensão da exigibilidade do crédito tributário prevista no CTN.” (RE 917285, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, j. 18.08.2020, DJe 06.10.2020, destaquei). No caso, cuida-se de débitos garantidos por seguro-garantia e carta fiança. Entretanto, cabe destacar que esses instrumentos, diferentemente do depósito integral, não têm o condão de suspender a exigibilidade do crédito tributário, à vista da taxatividade das causas suspensivas previstas no artigo 151 do CTN. O oferecimento de seguro e ou fiança, ainda que no montante integral do valor devido, tem apenas o efeito garantidor do débito exequendo e viabiliza o ajuizamento dos embargos à execução, bem como a expedição de certidão de regularidade fiscal. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1156668/DF (Tema 378), representativo da controvérsia, fixou a seguinte tese: A fiança bancária não é equiparável ao depósito integral do débito exequendo para fins de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, ante a taxatividade do art. 151 do CTN e o teor do Enunciado Sumular n. 112 desta Corte. Destaca-se, ainda: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. GARANTIA DO JUÍZO PARA FINS DE OPOSIÇÃO DE EMBARGOS PELO DEVEDOR. SEGURO-GARANTIA. IDONEIDADE. REQUISITOS AUTORIZADORES. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. 1. O seguro-garantia e a carta-fiança são instrumentos idôneos à garantia do adimplemento da obrigação e, por isso, aptos a produzir o efeito de suspensão do processo executivo fiscal, mas não o de suspender a exigibilidade do crédito tributário cobrado. Precedentes. 2. Declarada a possibilidade de oferecimento do seguro-garantia para o fim de oposição dos embargos à execução fiscal, o preenchimento dos requisitos que autorizam a apresentação da garantia deve ser verificado pelo juízo da execução fiscal, sem prejuízo do direito da parte exequente de recorrer a tempo e modo próprios, caso entenda pela ilegalidade da decisão. 3. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt no AREsp n. 1.710.699/ES, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 27.09.2021, destaquei). Desse modo, não há que se falar em violação aos artigos 20 do Decreto-Lei nº 4.657/72 (LINDB) e 2º do Decreto nº 9.830/2019, pois a aplicação do Direito Tributário submete-se ao princípio da estrita legalidade (artigo 150 da Constituição) e é disciplinada por lei complementar (artigo 146, inciso III, da CF), o que não permite interpretações ou extensões para além do texto legal (artigos 107 a 112 do Código Tributário Nacional). Assim, a análise das questões referentes à compensação de ofício e à suspensão da exigibilidade do crédito tributário são realizadas de acordo com o regramento jurídico tributário estabelecido. Por sua vez, o artigo 89, §2º, da IN RFB n.º 1.717/2017 cuida da hipótese de parcelamentos concedidos com garantia, conforme previsão do artigo 11, §1º, da Lei n.º 10.522/02. No caso, observa-se que as garantias ofertadas pelo apelante foram feitas em sede de ação executiva (Id 257302940, p. 12/16 e ) e, nessa condição, embora não tenham o condão de suspender a exigibilidade do crédito tributário, na forma do artigo 151 do CTN, elas produzem o mesmo efeito da penhora, nos termos do artigo 9º, §3º, da Lei n.º 6.830/80, com a garantia do débito e com possibilidade do oferecimento dos embargos à execução fiscal, de modo que é descabida a compensação de ofício com créditos em favor do contribuinte. Nesse sentido, confira-se: TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. COMPENSAÇÃO DE OFÍCIO. ILEGITIMIDADE. 1. É ilegítima a compensação de ofício ou a retenção de valores em processo de ressarcimento de créditos, com o escopo de compensar débitos que já estejam incluídos em programas de parcelamento ou garantidos por penhora em execução fiscal. 2. Não se está afirmando a impossibilidade da compensação de ofício e sim que, nos casos de suspensão de exigibilidade do crédito tributário ou de execução garantida por penhora suficiente, tal ato não é autorizado. (TRF 4ª Região, Primeira Turma, REOAC 0002897-65.2009.4.04.7201, Rel. Eduardo Vandré Oliveira Lema Garcia, j. 20.10.2010, destaquei). TRIBUTÁRIO. RESTITUIÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. COMPENSAÇÃO DE OFÍCIO COM DÉBITOS OBJETO DE EXECUÇÃO FISCAL E RESPECTIVOS EMBARGOS DO DEVEDOR. - É indevida a compensação de ofício pelo Fisco entre o IRPF a restituir e débito de ITR já objeto de execução fiscal e respectivos embargos do devedor, com a garantida do juízo. - Não pode a União pretender receber seu crédito duas vezes, através da compensação de ofício e com o ajuizamento da correspondente execução fiscal. (TRF 4ª Região, Segunda Turma, AC 2006.72.00.001006-3, Rel. Marciane Bonzanini, j. 28.01.2009, destaquei. Por fim, as questões relativas aos artigos 5º, inciso LV, da Constituição, 7º do Decreto-Lei n.º 2.287/86, 206 do CTN, e 9º, inciso II, da LEF não têm o condão de alterar esse entendimento pelos motivos já apontados. Ante o exposto, dou provimento à apelação para reformar a sentença e julgar procedente o pedido de não inclusão dos débitos com a exigibilidade suspensa, nos termos do artigo 151 do CTN, e aqueles garantidos por carta fiança e seguro-garantia, em sede de ação executiva, no regime de compensação de ofício. Sem honorários, na forma do artigo 25 da Lei n.º 12.016/09. Custas ex vi legis. É como voto.
E M E N T A
TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. COMPENSAÇÃO DE OFÍCIO. DÉBITOS COM A EXIGIBILIDADE SUSPENSA. ARTIGO 151 DO CTN. SEGURO GARANTIA E CARTA FIANÇA EM AÇÃO EXECUTIVA. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO.
- Afastada a preliminar de nulidade da sentença, nos termos dos artigos 93, inciso IX, da Constituição e 489, §1º, inciso IV, e 1.022, inciso II, e parágrafo único, inciso II, do CPC, pois o magistrado analisou a questão de maneira clara e com a exposição dos motivos de seu convencimento.
- A questão referente à compensação de ofício foi analisada pelo o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n.º 1213082/PR, representativo da controvérsia, que assentou o entendimento de que o procedimento somente é ilegal se a dívida do contribuinte estiver com sua exigibilidade suspensa, na forma do artigo 151 do Código Tributário Nacional.
- A despeito de a Lei nº 12.844/2013, publicada após o julgamento do recurso paradigma pelo STJ, tenha alterado o artigo 73 da Lei n.º 9.430/96 para permitir a realização da compensação de ofício, a regra do artigo 151 do CTN sobre a suspensão da exigibilidade dos permanece hígida, dado que somente poderia ser alterado por lei complementar (artigo 146, inciso III, alínea “b”, da CF).
- O Supremo Tribunal Federal reafirmou esse entendimento, com o julgamento do Tema 874: é inconstitucional, por afronta ao art. 146, III, b, da CF, a expressão ‘ou parcelados sem garantia’, constante do parágrafo único do art. 73 da Lei nº 9.430/96, incluído pela Lei nº 12.844/13, na medida em que retira os efeitos da suspensão da exigibilidade do crédito tributário prevista no CTN.
- O seguro-garantia e carta fiança, diferentemente do depósito integral, não têm o condão de suspender a exigibilidade do crédito tributário, à vista da taxatividade das causas suspensivas previstas no artigo 151 do CTN. O seu oferecimento, ainda que no montante integral do valor devido, tem apenas o efeito garantidor do débito exequendo e viabiliza o ajuizamento dos embargos à execução, bem como a expedição de certidão de regularidade fiscal (Tema 378 do STJ).
- Não há que se falar em violação aos artigos 20 do Decreto-Lei nº 4.657/72 (LINDB) e 2º do Decreto nº 9.830/2019, pois a aplicação do Direito Tributário submete-se ao princípio da estrita legalidade (artigo 150 da Constituição) e é disciplinada por lei complementar (artigo 146, inciso III, da CF), o que não permite interpretações ou extensões para além do texto legal (artigos 107 a 112 do Código Tributário Nacional).
- As garantias ofertadas pelo apelante foram feitas em sede de ação executiva e, nessa condição, embora não tenham o condão de suspender a exigibilidade do crédito tributário, na forma do artigo 151 do CTN, elas produzem o mesmo efeito da penhora, nos termos do artigo 9º, §3º, da Lei n.º 6.830/80, com a garantia do débito e com possibilidade do oferecimento dos embargos à execução fiscal, de modo que é descabida a compensação de ofício.
- Apelação provida.