Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Seção

EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE (421) Nº 0007785-60.2009.4.03.6181

RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI

EMBARGANTE: RICARDO HALLAK

Advogado do(a) EMBARGANTE: RAFAEL TUCHERMAN - SP206184-A

EMBARGADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
PROCURADOR: PROCURADORIA DA REPÚBLICA-EM SÃO PAULO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Seção
 

EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE (421) Nº 0007785-60.2009.4.03.6181

RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI

EMBARGANTE: RICARDO HALLAK

Advogado do(a) EMBARGANTE: RAFAEL TUCHERMAN - SP206184-A

EMBARGADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
PROCURADOR: PROCURADORIA DA REPÚBLICA-EM SÃO PAULO

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: 

Cuida-se de embargos infringentes opostos pela defesa de RICARDO HALLAK (id. 260542057) contra o v. acórdão proferido pela Colenda Quinta Turma desse E. Tribunal (id. 259786793) que, “por unanimidade, decidiu, REJEITAR as preliminares e, no mérito, por maioria, decidiu NEGAR PROVIMENTO ao recurso de Ricardo Hallak, nos termos do voto do Relator, acompanhado pelo DES. FED. MAURICIO KATO, vencido o DES. FED. PAULO FONTES que, com base no art. 386, VII, do CPP, DAVA PROVIMENTO ao recurso defensivo para absolver o réu". 

O embargante pretende a prevalência do voto vencido, a fim de que seja o réu RICARDO HALLAK absolvido da imputação contida na denúncia. 

O recurso foi admitido (ID. 261144251). 

A Procuradoria Regional da República apresentou contrarrazões ao recurso, pugnando pelo desprovimento dos embargos infringentes (id. 262825924). 

É o relatório. 

Sujeito à revisão, nos termos do art. 266, §4º, do Regimento Interno desta Corte. 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Seção
 

EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE (421) Nº 0007785-60.2009.4.03.6181

RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI

EMBARGANTE: RICARDO HALLAK

Advogado do(a) EMBARGANTE: RAFAEL TUCHERMAN - SP206184-A

EMBARGADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
PROCURADOR: PROCURADORIA DA REPÚBLICA-EM SÃO PAULO

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI: 

A disciplina processual acerca dos embargos infringentes e de nulidade está encerrada no parágrafo único do art. 609 do Código de Processo Penal, que dispõe, in verbis

"Art. 609. Os recursos, apelações e embargos serão julgados pelos Tribunais de Justiça, câmaras ou turmas criminais, de acordo com a competência estabelecida nas leis de organização judiciária. 

Parágrafo único. Quando não for unânime a decisão de segunda instância, desfavorável ao réu, admitem-se embargos infringentes e de nulidade, que poderão ser opostos dentro de 10 (dez) dias, a contar da publicação de acórdão, na forma do art. 613. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto de divergência." 

 

Tem-se, na lição de Aury Lopes Jr. (Direito Processual Penal - 13. ed. - São Paulo: Saraiva, 2016, pp. 1057 e 1058), os seguintes requisitos para manejo do referido recurso: 

- cabimento e adequação: somente tem lugar para impugnar uma decisão não unânime desfavorável ao réu, proferida por tribunal, no julgamento de uma apelação, recurso em sentido estrito ou gravo em execução, quando haja um voto divergente mais benéfico à defesa (no todo ou em parte); 

- tempestividade: o prazo é único para interposição do recurso e apresentação das suas razões (dez dias, contados da publicação do acórdão); 

- preparo: apenas nos casos em que a ação penal é de iniciativa privada; 

- legitimidade: trata-se de recurso exclusivo da defesa; 

- existência de um gravame: "existe interesse recursal ainda que o voto vencido acolha uma pequena parcela do pedido da defesa, ou seja, ainda que mínima a vantagem jurídica que aquele provimento lhe possa ocasionar". 

 

Delineados os contornos da espécie recursal ora em exame, tem-se que os embargos infringentes opostos pela defesa de RICARDO HALLAK devem ser conhecidos. 

Em primeiro grau, o ora embargante foi condenado pela prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, c.c. o art. 71 do Código Penal, à pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e 11 (onze) dias-multa, no valor unitário de 1/3 (um terço) do salário mínimo vigente à época dos fatos. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas e direitos (ID. 220074673). 

A sentença foi mantida pela E. Quinta Turma, por maioria, nos termos do voto do e. Relator, o Des. Fed. André Nekatschalow. Trago à colação a parcela do voto vencedor que interessa ao julgamento do presente recurso: 

“A defesa alega a ausência de prova da materialidade, pois não está demonstrado que o acusado auferiu renda; que cabe à acusação comprovar que as despesas realizadas no cartão de crédito foram custeadas com receitas que o réu efetivamente integrou a seu patrimônio pessoal, não sendo suficiente a mera presunção; que está demonstrado que as despesas realizadas no cartão de crédito do acusado (pessoa física) eram da empresa Ricktel Telefones Ltda., da qual era sócio majoritário, e foram pagas com recursos da pessoa jurídica; e que não está comprovado o acréscimo patrimonial a descoberto. 

Sem razão. 

De fato, o acusado é sócio da empresa Ricktel Telefones Ltda., mas realizou despesas no exterior com seus cartões de crédito pessoa física em valores correspondentes a R$ 436.643,39 (quatrocentos e trinta e seis mil, seiscentos e quarenta e três reais e trinta e nove centavos) no ano-calendário 1997, e R$ 469.405,10 (quatrocentos e sessenta e nove mil, quatrocentos e cinco reais e dez centavos) no ano-calendário 1998. 

Do Termo de Verificação Fiscal (Id. n. 220074482, pp. 142/145) extrai-se que apenas no mês de setembro de 1997 o acusado demonstrou que tais despesas foram custeadas pela empresa Ricktel Telefones Ltda., o mesmo não ocorrendo em relação ao restante do período, por ausência de correspondência de valores: 

(...) o contribuinte no sentido de demonstrar que as despesas realizadas com seus cartões de crédito internacionais, na realidade eram despesas da empresa Ricktel Telefones Ltda., nos apresentou extratos de conta/corrente da referida empresa, anexados às fls. 156 a 228, alegando que a empresa em questão era quem efetuava os pagamentos de seus cartões de crédito. 

No entanto, somente no mês de setembro de 1997 ficou comprovado que a empresa pagou efetivamente seu cartão de crédito, pois o valor do documento de fls. 34 corresponde exatamente ao valor pago pela empresa, conforme documentos de fls. 58 e 59. Os valores constantes dos documentos anexados às fls. 156 a 228, deixaram de ser considerados como origem dos pagamentos dos cartões de crédito, uma vez que não são coincidentes os valores. 

Consta dos autos um cheque da empresa Ricktel Telefones Ltda. nominal a Credicard no valor de R$ 11.0005,50 (onze mil, cinco reais e cinquenta centavos) de 25.09.97 (Id. n. 220074431, p. 63), correspondente exatamente ao valor das despesas no exterior no mês de setembro, conforme extrato Id. n. 220074431, p. 38. 

Porém, relativamente ao restante do período, não está comprovada a correlação de datas e valores. Os cheques emitidos pela empresa englobariam, em tese, outras despesas mensais e contas a pagar da pessoa jurídica. 

Também não foram juntados aos autos documentos que comprovem que as mercadorias adquiridas no exterior e pagas com os cartões de crédito da pessoa física do sócio foram incorporadas ao patrimônio da empresa (conforme balanço patrimonial), e não ao seu patrimônio pessoal, e que os pagamentos foram contabilizados nos livros fiscais da pessoa jurídica, não bastando, para tal fim, o depoimento das testemunhas de defesa e a juntada de planilhas de “contas a pagar” elaboradas unilateralmente e sem valor probatório perante o Fisco, conforme estabelece o Código Tributário Nacional. 

Aliás, a testemunha de defesa Patrícia Bernardique Gagliardi, que trabalhou na empresa Ricktel, de 1991 até o início de 1998, na área administrativa, informou que as planilhas, como a constante do Id. n. 33797835, p. 84, eram folhas soltas e não faziam parte de um livro contábil da empresa (Id. n. 220074650). 

E a alegação de impossibilidade de juntada da prova documental em razão de furto ocorrido em 15.08.00 em propriedade privada do réu, um sítio em Mairiporã (SP), na qual estaria armazenada a documentação da pessoa jurídica, também deve ser afastada. 

Isso porque, nos termos do art. 1.194 do Código Civil, a sociedade empresária é obrigada a conservar em boa guarda toda a escrituração, correspondência e mais papéis concernentes à sua atividade, enquanto não ocorrer prescrição ou decadência no tocante aos atos neles consignados, não sendo um sítio em Mairiporã (SP) de propriedade privada de seu sócio, local apropriado para tal fim. 

Ademais, o boletim de ocorrência juntado pela defesa (Id. n. 220074482, pp. 166/169) não especifica quais documentos da pessoa jurídica foram furtados. 

De qualquer forma, tratando-se de sociedade limitada, a figura do sócio não pode se confundir com a da pessoa jurídica, e a alegada compra de mercadorias para integrar o patrimônio da empresa com cartões de crédito particular do sócio, dificulta a fiscalização tributária da pessoa jurídica, evidenciando o intuito fraudulento do réu. 

Conforme prevê o art. 3º, § 1º, da Lei n. 7.713/88, os acréscimos patrimoniais não correspondentes aos rendimentos declarados constituem rendimento bruto da pessoa física sujeito à tributação. 

Trata-se de presunção legal relativa, invertendo-se o ônus da prova. Ao Fisco cabe demonstrar o acréscimo patrimonial a descoberto decorrente da declaração de renda insuficiente na Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física para custear as despesas realizadas, cabendo ao contribuinte comprovar a origem dos recursos. 

Nesse sentido é o acórdão da Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento em São Paulo (SP), no julgamento da impugnação administrativa do contribuinte, ora réu Ricardo Hallak, que julgou procedente o lançamento fiscal, conforme segue: 

(...) Pretende o impugnante, por meio da documentação juntada na impugnação às fls. 262/345, compreendendo as cópias do extrato da conta corrente de titularidade da empresa Ricktel Telefones Ltda, demonstrar que as despesas realizadas no exterior com os cartões de crédito internacionais, de titularidade do contribuinte, eram despesas da referida empresa e, segundo alega, era também quem efetuava os pagamentos de seus cartões de crédito. 

Dita documentação já foi objeto de análise pela Fiscalização no curso da ação fiscal. Consoante Termo de Verificação (fls. 233/236), os valores constantes dos documentos anexados às fls. 156/228, deixaram de ser considerados como origem dos pagamentos dos cartões de crédito, uma vez que os seus valores não são coincidentes. A exceção foi o pagamento de despesas no exterior com o cartão de crédito Tam Diners, no valor de R$ 11.005,50, pago pela Ricktel em 26/09/1997 (fls. 58/59), consoante citado Termo de Verificação. Referido valor não foi lançado como Despesas Omitidas do mês de setembro/1997, conforme se constata da relação de Despesas com Cartão de Crédito no Exterior Ano-Calendário 1997 de fls. 141/142. 

O contribuinte não trouxe na impugnação nenhum elemento novo de prova, comprovando que as despesas realizadas no exterior com seus cartões de crédito internacionais, consolidadas na relação de Despesas com Cartão de Crédito no Exterior (fls. 141/142 e 143/144) são despesas decorrentes da atividade econômica da empresa Ricktel Telefones Ltda. Também, não restou comprovada que tais despesas no exterior foram efetivamente pagas pela empresa Ricktel, da qual é sócio. 

A cópia autenticada do Boletim de Ocorrência de Autoria Desconhecida, lavrado em 16/08/2000, concernente ao Furto Qualificado Consumado ocorrido, em 15/08/2000, na Fazenda/Sítio à Rua dos Girassóis, 560 - Salsalito II, em Mairiporã/SP, dá conta, dentre outros relatos, da subtração da documentação da empresa Ricktel de 1990 a 1999. Citado Boletim não especifica que documentos da empresa foram subtraídos do sítio em Mairiporã. 

Contudo, esta situação não desobriga o impugnante de comprovar que os gastos realizados no exterior com cartões de crédito internacionais, de titularidade do contribuinte, são despesas decorrentes da atividade da empresa Ricktel, mediante outros documentos subsidiários. Por exemplo, por meio da apresentação de notas fiscais de venda emitidas por fornecedores da pessoa jurídica, da qual o impugnante é sócio. 

Não tendo feito esta comprovação, mediante apresentação de documentação hábil e idônea, as despesas em comento, realizadas no exterior com cartões de crédito internacionais, de titularidade do contribuinte, constituem aplicações na análise da evolução patrimonial mensal. 

Ainda que as despesas com os cartões de crédito tenham sido pagas pela empresa Ricktel como alega, ainda assim, tais pagamentos não poderiam ser considerados como Origens/Recursos na análise da Evolução Patrimonial (fls. 229/330 e 231/232), pois que seus valores não foram oferecidos à tributação na declaração de ajuste anual correspondente (fls. 09/12 e 13/16). 

Somente os rendimentos tributáveis declarados e os lançados de ofício, os isentos e não tributáveis, os tributados exclusivamente na fonte e os que foram objeto de tributação definitiva, bem como os empréstimos, cuja transferência de recursos restou, documentalmente, comprovada, poderiam ser considerados como Origens/Recursos na análise da evolução patrimonial. 

Saliente-se, ademais, que pelo princípio contábil da entidade, de adoção obrigatória, tanto para fins comerciais (art. 177 da Lei das SAA), como para fins fiscais (Regulamento do Imposto de Renda), o patrimônio de uma entidade não se confunde com o de seus sócios ou proprietários. Ou seja, a empresa não poderia fazer uso dos cartões de crédito internacionais de titularidade da pessoa física de seu sócio para a realização de seus negócios. 

O acréscimo patrimonial é uma das fontes colocadas à disposição do Fisco para detectar omissão de rendimentos, cabendo à Fazenda Pública tornar evidente o fato constitutivo do seu direito e ao contribuinte provar os fatos modificativos ou extintivos desse direito. 

Trata-se de uma presunção legal, tipo relativa (juris tantum) que, embora estabelecida em lei (Lei nº 7.713/1988, art. 3º, § 1º), não tem caráter absoluto de verdade e que impõe ao contribuinte o ônus de elidir a imputação, mediante a comprovação da origem dos recursos. Assim, o principal efeito da presunção legal é a inversão do ônus da prova. Ao Fisco compete demonstrar a ocorrência de acréscimos patrimoniais, que se presume rendimentos omitidos. Ao contribuinte, cabe comprovar que a transação tem respaldo em rendimentos tributáveis, isentos e não tributáveis e/ou tributados exclusivamente na fonte, e/ou que as aplicações imputadas não dizem respeito ao contribuinte; comprovação que o impugnante não logrou comprovar (Id. n. 220074483, pp. 57/66). 

No mesmo sentido, é o depoimento judicial da testemunha comum Jeanne de Carvalho, Auditora Fiscal da Receita Federal (Id. n. 220074646 a Id. n. 220074648). 

Assim como na seara tributária, não cabe à acusação, no âmbito da presente ação penal, comprovar que as despesas realizadas no cartão de crédito foram custeadas com receitas que o réu efetivamente integrou a seu patrimônio pessoal, cabendo ao acusado demonstrar a origem dos recursos utilizados para o pagamento de tais despesas. 

Contudo, a defesa não afastou a presunção relativa de acréscimo patrimonial a descoberto, seja no âmbito do processo administrativo-fiscal seja na presente ação penal, não se desincumbindo do ônus de provar o quanto alegado, nos termos do artigo 156, primeira parte, do Código de Processo Penal. 

O crédito tributário objeto da denúncia foi definitivamente constituído na esfera administrativa no processo administrativo instaurado em face do contribuinte, não havendo decisão judicial que o anulasse na esfera cível. 

Em memoriais entregues antes do julgamento, a defesa salienta que a acusação incidiu em perda de uma chance probatória, pois, conforme precedente do Superior Tribunal de Justiça, é inadmissível que uma prova capaz de inocentar o acusado seja dispensada pelo Ministério Público como mera estratégia processual, contentando-se com os elementos mínimos já apresentados, quando a prova adicional poderia concorrer para o esclarecimento dos fatos (AREsp n. 1.940.381). 

Com efeito, o Ministério Público tem por função promover a justiça, de maneira tal que não se concebe venha a de qualquer forma descurar de prova que, ao revelar a verdade dos fatos, inocente o acusado. Não é raro o órgão de acusação pedir a absolvição do réu em função de provas por si produzidas. 

No caso concreto, porém, não é disso que se trata. 

A hipótese versa sobre crime de sonegação fiscal inerente à fraude associada à redução do encargo tributário incidente sobre os fatos econômicos não que foram declarados com respeito à verdade. A legislação tributária exige que os fatos sejam informados segundo as regras jurídicas que disciplinam as operações econômicas; a falta dessa declaração verdadeira habilita, segundo a legislação, o Fisco a proceder ao lançamento segundo os elementos dos quais dispõe. Assim foi feito e, sem embargo, a defesa entende que o Ministério Público Federal deveria melhor perquirir a respeito da veracidade dos fatos, sonegados pelo acusado. 

Nesse sentido, o acusado recrudesce a discrepância entre fato e sua declaração para efeitos fiscais, pois sustenta que, em verdade, os pagamentos de suas despesas com cartão de crédito teriam sido arcadas pela empresa, no interesse desta, na aquisição do que seria, aparentemente, mercadoria para a consecução de seu objeto social. Acrescenta uma irregularidade à outra, pois desse modo a empresa, pelo que tudo indica pertencente ao acusado, igualmente não teria oferecido à tributação os rendimentos mais ou menos implicados nessa prática fraudulenta. Essa inferência é razoável, considerado que este processo-crime remonta a outro concernente a evasão de divisas justamente pelo uso de cartão de crédito como meio de pagamento irregular para a importação de mercadorias. 

Sucede que a legislação tributária estabelece a presunção de que essas despesas implicam correspondente receita. Assim se constitui o crédito tributário respectivo, à vista da discrepância entre a verdade dos fatos e suas declarações fiscais. Nesse contexto, nada impede que entre o acusado e a empresa haja, de fato, relações de ordem financeira de maneira tal que o primeiro tenha créditos perante a segunda (pelo uso do cartão) ou a segunda contra o primeiro (pelo pagamento dessas ou outras despesas: DDL?). Seja como for, essa relação entre o empresário e a empresa não oblitera o lançamento tributário, o qual se realiza segundo os elementos indiciários verdadeiramente disponíveis e postos ao exame do Fisco. Acrescente-se que a matéria já foi objeto de apreciação na esfera administrativa, havendo pouco a acrescentar nesta. 

Como se percebe, ao contrário do sustentado pela defesa em memoriais, a acusação não perdeu chance probatória. 

Dessa forma, está suficientemente demonstrada a materialidade do crime de sonegação fiscal.” 

 

O voto vencido, da lavra do e. Des. Fed. Paulo Fontes, dava provimento ao apelo defensivo para absolver RICARDO HALLAK, com fundamento no art. 386, VII, do Código e Processo Penal. Eis o teor do mencionado decisum (id. 257318007): 

“[...] 

Quanto ao mérito, contudo, peço vênia ao E. Relator para chegar a conclusão distinta, que me leva a sustentar que a materialidade do delito não restou suficientemente comprovada. 

Com efeito, em síntese, a autuação fiscal ocorreu porque a Receita considerou como “acréscimo patrimonial a descoberto” despesas elevadas efetuadas no cartão de crédito do réu nos anos de 1997 e 1998. Presumiu-se, portanto, que tais despesas implicam em correspondente renda que não tinha sido declarada nas declarações correspondentes de ajuste anual. 

Tenho considerado válida a presunção de renda quando o acusado não consegue contrapor provas no sentido de que os valores em questão não possuíam tal natureza. Contudo, com efeito, é possível que a defesa demonstre que os valores tinham natureza diversa. 

No presente caso, desde a impugnação administrativa, o acusado sustentou que tais despesas em seu cartão de crédito não representavam renda ou disponibilidade patrimonial dele próprio, mas se tratava de compras feitas para a atividade de sua empresa Ricktel, consistente em aparelhos de telefonia. Afirmou, ainda, que a empresa restituía ao réu tais valores. 

O Fisco não acatou tal argumento, pois os cheques apresentados emitidos pela empresa não correspondiam exatamente aos valores despendidos pelo réu em seus cartões de crédito, à exceção de um único mês em que se verificou a coincidência. O E. Relator argumentou nesse mesmo sentido. A defesa, contudo, asseverou que os cheques não coincidiam pois englobavam outros valores, referentes a gastos diversos. 

Penso, com a devida vênia, que a linha defensiva mostra-se coerente e que faltou tanto ao Fisco quanto à acusação demonstrarem efetivamente que os valores em questão constituíam renda do acusado. O caminho mais objetivo nesse sentido, parece-me, teria sido pesquisar as faturas dos cartões de crédito para verificar a que tipo de mercadorias ou serviços correspondiam os gastos. “Manuseando” os autos virtuais, não encontrei tais elementos, e sua eventual ausência deve ser tomada em detrimento da acusação. 

Como já dito acima, algumas presunções fiscais podem até ser trazidas e consideradas válidas no processo penal, mas com certo cuidado e parcimônia, exigindo atenção às alegações e contraprovas suscitadas pela defesa, que por sua vez podem demandar novos elementos por parte da acusação, numa distribuição do ônus probatório que é dinâmica por sua própria natureza. 

Não basta que valores transitem na conta bancária de um acusado para asseverar a sua natureza de renda. Lembro-me de outros casos em que, por exemplo, um réu movimentava em sua conta todos os valores de suas vendas de laranjas, compras de insumos, pagamentos a fornecedores, enfim, toda a movimentação financeira de um empreendimento econômico circulava na referida conta bancária. Se tal movimentação podia conter irregularidades do ponto de vista das obrigações formais e acessórias, a assertiva de que os valores correspondiam ao conceito de renda exigiria novas pesquisas, cálculos e aprofundamentos por parte do fisco. 

No caso, até pela atividade desenvolvida pela empresa e pelo valor do dólar quase paritário à época em relação ao real, incentivando as compras no exterior, além dos outros elementos trazidos, a tese defensiva mostra-se razoável e não foi adequadamente refutada. 

Por fim, não considero possível cogitar de eventual sonegação da própria empresa, pois trata-se de autuação fiscal e processo-crime movido contra a pessoa física do acusado, e da mesma forma a defesa trouxe elementos de que tais despesas eram efetivamente assumidas pela empresa, que não foram refutados de forma suficiente.” 

 

A controvérsia posta a deslinde envolve, portanto, a análise da prova produzida nos autos, a fim de que se estabeleça se há elementos suficientes à condenação (como apontado no voto vencedor) ou se há dúvida razoável da materialidade delitiva (como diz o voto vencido). 

Penso que a razão está com o voto vencedor. 

Na hipótese, a Receita Federal instaurou procedimento fiscalizatório em face de RICARDO HALLAK e intimou o contribuinte a demonstrar, dentre outras operações, os gatos efetuados no exterior com cartões de crédito internacionais (Credicard, Bank Boston, Unibanco e TAM/Diners). 

Na conclusão do procedimento fiscal, a autoridade fazendária considerou que o contribuinte não comprovou a origem dos valores expendidos na utilização de tais cartões de crédito nos meses de julho a dezembro de 1997 (R$421.271,00) e de março a novembro de 1998 (R$469.405,10) e reputou que tal montante constituiu acréscimo patrimonial a descoberto, o que motivou o lançamento, de ofício, do imposto de renda pessoa física correspondente aos mencionados anos-calendário (ID. 220074483 – pp.34/45).

Naquela ocasião, foi excluído da base de cálculo do lançamento apenas o montante de R$11.055,50, referente a despesas no exterior no mês de setembro de 1997 efetuadas no cartão Tam Diners, de titularidade do réu (pessoa física), diante da demonstração de que a mencionada fatura foi quitada diretamente pela empresa “RICKTEL”, em 26/09/1997.

Anoto, de saída, que é plenamente válida na seara penal a presunção administrativa de omissão de rendimento no art. 3º, §1º, da Lei nº 7.713/88, que dispõe, expressamente:

“Art. 3º O imposto incidirá sobre o rendimento bruto, sem qualquer dedução, ressalvado o disposto nos arts. 9º a 14 desta Lei.

§ 1º Constituem rendimento bruto todo o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos, os alimentos e pensões percebidos em dinheiro, e ainda os proventos de qualquer natureza, assim também entendidos os acréscimos patrimoniais não correspondentes aos rendimentos declarados.”

 

Há, portanto, presunção legal juris tantum de omissão de rendimentos, pois o réu efetuou gastos nos anos-calendário de 1997 e 1998 em valores superiores à disponibilidade financeira que possuía no período, calculada a partir dos seus rendimentos declarados e comprovados perante a RFB. É dizer, demonstradas despesas em valores absolutamente incompatíveis com os rendimentos declarados para o período, é legítima a presunção relativa de que se trata de renda omitida pela pessoa física.

Justamente por se tratar de presunção relativa, a omissão de rendimentos apurada pelo agente fazendário é plenamente passível de ser infirmada. Assim, mesmo nas hipóteses de lançamento definitivo do crédito tributário, pode o juízo penal desconstituir a presunção de omissão de receita (com efeito endoprocessual, apenas), desde que haja elementos para tanto.

Na seara administrativa e em juízo, a defesa do ora embargante sustentou que a integralidade das despesas indicadas pela Receita Federal na autuação fazendária foi feita em prol da pessoa jurídica “RICKTEL TELEFONES LTDA.”, da qual o acusado era sócio, e que foram utilizados recursos da própria empresa para pagamento das faturas de cartão de crédito do réu (pessoa física).

Contudo, os elementos trazidos aos autos pela defesa não se prestam a comprovar suas alegações. Senão vejamos.

A fim de demonstrar que os pagamentos das faturas do cartão de crédito do réu (pessoa física) teriam sido quitadas pela “RICKTEL”, já na fase administrativa, a defesa apresentou os seguintes itens: extratos de contas bancárias da RICKTEL nos anos de 1997 e 1998, cópias de cheques emitidos pela mencionada pessoa jurídica e planilhas relacionando os cheques aos valores das faturas e outras despesas (ID. 220074482 e ID. 220074482).

Não obstante, como observado já pela autoridade fazendária que julgou a impugnação administrativa da contribuinte, tais elementos não se prestam a demonstrar os supostos pagamentos das faturas do réu (pessoa física) com recursos da “RICKTEL”, pois não há coincidência entre os valores ou as datas de pagamento.

Apenas para exemplificar, no ID. 220074482 – p. 80, a defesa juntou cópia de uma ficha identificada como “ctas à pagar”, na qual são detalhados diversos valores, todos para o dia 10/03/1997, com referências a suposta origem do débito e a pessoa a quem o lançamento se referia. O total da mencionada ficha somava R$18.817,10 e relacionava o pagamento com o cheque 019940, cuja microfilmagem foi juntada aos autos na página seguinte.

Na ficha em questão havia uma indicação de pagamento “Visa Boston” no valor de R$7.998,78 que estaria incluído no valor total do cheque.

Ocorre que os cheques eram emitidos nominalmente à própria pessoa jurídica e sacados “na boca do caixa”, conforme se verifica dos extratos da conta bancária da “RICKTEL” juntados aos autos, o que torna impossível determinar o destino dos recursos levantados mediante tal expediente. É dizer, uma vez que os valores de face dos cheques foram sacados em espécie, não é possível afirmar que os montantes tenham sido utilizados para pagamento das despesas do réu no exterior.

Tanto por isso, apenas o pagamento da fatura da Credicard do mês de setembro de 1997 foi considerado comprovado pela Receita Federal, pois o cheque utilizado na operação foi emitido nominalmente à empresa de cartão de crédito (ID. 220074482 – p. 225).

Além disso, as fichas apresentadas nos autos não possuem o valor probatório pretendido pelo embargante, pois foram produzidas unilateralmente e não há registro de que tenham sido formalmente escrituradas na contabilidade da pessoa jurídica. Ao contrário, a testemunha de defesa Patrícia Bernardique Gagliardi, que trabalhou na empresa Ricktel de 1991 até o início de 1998, na área administrativa, informou que tais planilhas eram folhas soltas e não faziam parte de um livro contábil da empresa (Id. n. 220074650 – aproximadamente aos oito minutos de gravação). 

De se ver que a mera afirmação pelo réu é impertinente para desconstituir, por si só, o robusto lastro documental que instruiu a ação penal, merecendo destaque o fato de que a defesa não juntou qualquer documento que minimamente indicasse a verossimilhança das suas alegações, embora não se cogite dificuldade na adoção da referida providência.

Não se trata de indevida inversão do ônus da prova, mas da correta exegese da regra insculpida no art. 156 do CPP, a qual dispõe que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer".

A acusação se desincumbiu do ônus de demonstrar mediante prova documental incontroversa que o contribuinte efetuou gastos no exterior, pagos com seus cartões de crédito pessoais, que somavam quase um milhão de reais nos anos de 1997 e 1998.

Assim, competia ao réu juntar aos autos ao menos indícios suficientes para gerar dúvida quanto à alegação de que os valores em questão não configurariam rendimentos para fins de tributação.

E nem se alegue que a prova em questão seria impossível, em razão do suposto furto de todos os documentos e elementos contábeis da “RICKTEL” relacionados aos anos de 1990 a 1999 que estavam em um sítio de propriedade de RICARDO, em Mairiporã.

A defesa trouxe aos autos cópia de um Boletim de Ocorrência (ID. 220074482 – pp. 166/169) lavrado na presença de JORGE HALLAK (vítima), a partir de declarações das testemunhas Darcy Aparecida da Luz e Luis Carlos Amandio (caseiros do sítio), do qual consta que, em 15/08/2000, por volta de 22:30, cinco indivíduos teriam ingressado na propriedade e subtraído bens da vítima, que incluíam, além de roupas, joias e armamentos:

“documentações dos familiares da vítima, sendo: VALERIA HOSSNE HALLAK, VANIA HALLAK, JORGE HALLAK, RICARDO HALLAK, HEBRAHIN HALLAK dos últimos 20 anos, bem como documentação das empresas: RICKTEL de 1990 a 1999 / empresa SOL de 1998 a 2000, HALLAK UROLOGIA GERAL E INFANTIL de 1995 a 2000/ e cartões de crédito antigos, impostos de renda antigos, documentação tributária das empresas e pessoa física”

 

Mencionado boletim de ocorrência, por si só, não é prova cabal do extravio de toda a documentação contábil da “RICKTEL”, inclusive porque o art. 264 do Decreto 3.000/99 prescreve o dever de mantença, em ordem, dos livros e documentos relativos à atividade empresarial, enquanto não prescritas as obrigações tributárias correspondentes. Ainda, e justamente por ser da maior importância a conservação da referida escrituração, a mesma norma estabelece procedimentos rígidos a serem adotados em casos de extravio de livros, documentos ou papeis:

“Art. 264.  A pessoa jurídica é obrigada a conservar em ordem, enquanto não prescritas eventuais ações que lhes sejam pertinentes, os livros, documentos e papéis relativos a sua atividade, ou que se refiram a atos ou operações que modifiquem ou possam vir a modificar sua situação patrimonial.

§ 1º  Ocorrendo extravio, deterioração ou destruição de livros, fichas, documentos ou papéis de interesse da escrituração, a pessoa jurídica fará publicar, em jornal de grande circulação do local de seu estabelecimento, aviso concernente ao fato e deste dará minuciosa informação, dentro de quarenta e oito horas, ao órgão competente do Registro do Comércio, remetendo cópia da comunicação ao órgão da Secretaria da Receita Federal de sua jurisdição.

§ 2º  A legalização de novos livros ou fichas só será providenciada depois de observado o disposto no parágrafo anterior.

§ 3º  Os comprovantes da escrituração da pessoa jurídica, relativos a fatos que repercutam em lançamentos contábeis de exercícios futuros, serão conservados até que se opere a decadência do direito de a Fazenda Pública constituir os créditos tributários relativos a esses exercícios.” - grifei

 

De se ver, portanto, que a alegação de extravio não pode ser admitida sem a mínima demonstração, pelo contribuinte, da adoção das medidas estipuladas no art. 264 do RIR/99. Ainda, decorre do próprio sistema tributário nacional que, mesmo a adoção das medias previstas no art. 264, §1º, do Decreto nº 3.000/99, não exclui a responsabilidade do contribuinte pela guarda e conservação dos documentos contábeis e fiscais, a ele competindo providenciar sua reconstituição – ao menos quanto aos livros obrigatórios – antes do início de qualquer procedimento fiscal.

E, ao contrário do quanto alegado pela defesa, a providência não seria “impossível”, pois a escrituração poderia ser feita a partir de elementos obtidos junto a terceiros.

Por derradeiro, é curial consignar que a defesa precisaria demonstrar, além da origem dos valores utilizados no pagamento das faturas, que as despesas feitas pelo réu no exterior efetivamente se deram em benefício da pessoa jurídica, o que não ocorreu. Tal fato, aliás, foi um dos fundamentos eleitos pela autoridade fazendária e pelo e. Des. Fed. ANDRÉ NEKATSCHALOW para rejeitar a pretensão defensiva. Confira-se a propósito:

- voto vencedor (ID. 253719421):

Também não foram juntados aos autos documentos que comprovem que as mercadorias adquiridas no exterior e pagas com os cartões de crédito da pessoa física do sócio foram incorporadas ao patrimônio da empresa (conforme balanço patrimonial), e não ao seu patrimônio pessoal, e que os pagamentos foram contabilizados nos livros fiscais da pessoa jurídica, não bastando, para tal fim, o depoimento das testemunhas de defesa e a juntada de planilhas de “contas a pagar” elaboradas unilateralmente e sem valor probatório perante o Fisco, conforme estabelece o Código Tributário Nacional.”

 

 - julgamento pela RFB da impugnação administrativa ao lançamento (ID. 220074483 – pp. 62/63):

“Contudo, esta situação não desobriga o impugnante de comprovar que os gastos realizados no exterior com cartões de crédito internacionais, de titularidade do contribuinte, são despesas decorrentes da atividade da empresa Ricktel, mediante outros documentos subsidiários. Por exemplo, por meio da apresentação de notas fiscais de venda emitidas por fornecedores da pessoa jurídica, da qual o impugnante é sócio.

Não tendo feito esta comprovação, mediante apresentação de documentação hábil e idônea, as despesas em comento, realizadas no exterior com cartões de crédito internacionais, de titularidade do contribuinte, constituem aplicações na análise da evolução patrimonial mensal.

Ainda que as despesas com os cartões de crédito tenham sido pagas pela empresa Ricktel como alega, ainda assim, tais pagamentos não poderiam ser considerados como Origens/Recursos na análise da Evolução Patrimonial (fls. 229/330 e 231/232), pois que seus valores não foram oferecidos à tributação na declaração de ajuste anual correspondente (fls. 09/12 e 13/16).

Somente os rendimentos tributáveis declarados e os lançados de ofício, os isentos e não tributáveis, os tributados exclusivamente na fonte e os que foram objeto de tributação definitiva, bem como os empréstimos, cuja transferência de recursos restou, documentalmente, comprovada, poderiam ser considerados como Origens/Recursos na análise da evolução patrimonial.

Saliente-se, ademais, que pelo princípio contábil da entidade, de adoção obrigatória, tanto para fins comerciais (art. 177 da Lei das SAA), como para fins fiscais (Regulamento do Imposto de Renda), o patrimônio de uma entidade não se confunde com o de seus sócios ou proprietários. Ou seja, a empresa não poderia fazer uso dos cartões de crédito internacionais de titularidade da pessoa física de seu sócio para a realização de seus negócios.”

 

Consigne-se, em conclusão, que a mera apresentação de uma versão hipotética desacompanhada de qualquer indício probatório (cuja produção não se vislumbra minimamente dificultosa) não é suficiente para desonerar a defesa de seu fardo processual.

Ao contrário, quedou-se a defesa inerte, restando a este Juízo a prova produzida pela acusação, em especial o procedimento fiscal, que apurou, com observância da estrita legalidade, ressalte-se, movimentação financeira absolutamente incompatível com a declaração de renda do contribuinte no período.

Mantenho, por tais fundamentos, a condenação.

 

DISPOSITIVO 

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO aos embargos infringentes. 

É o voto. 

 

 



E M E N T A

 

PENAL E PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. ART. 609 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 1º, I, DA LEI Nº 8.137/90. PROVA SUFICIENTE À CONDENAÇÃO. EMBARGOS INFRINGENTES DESPROVIDOS. 

1- Embargos infringentes opostos com o objetivo de obter a prevalência de voto vencido que absolvia o ora embargante da imputação do crime do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90, com base no art. 386, VII, do CPP.

2- É válida, na seara penal, a presunção administrativa de omissão de rendimento fundada em acréscimo patrimonial não correspondente aos rendimentos declarados, nos termos do art. 3º, §1º, da Lei nº 7.713/88.

3- A prova produzida no caso concreto é insuficiente para demonstrar a versão defensiva de que os valores gastos no cartão de crédito do réu não integraram seu patrimônio.

4- Não se trata de indevida inversão do ônus da prova, mas da correta exegese da regra insculpida no art. 156 do CPP, a qual dispõe que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer". A acusação se desincumbiu do ônus de demonstrar mediante prova documental incontroversa que o contribuinte efetuou gastos no exterior, pagos com seus cartões de crédito pessoais, que somavam quase um milhão de reais nos anos de 1997 e 1998. Assim, competia ao réu juntar aos autos ao menos indícios suficientes para gerar dúvida quanto à alegação de que os valores em questão não configurariam rendimentos para fins de tributação.

5 - A mera apresentação de uma versão hipotética desacompanhada de qualquer indício probatório (cuja produção não se vislumbra minimamente dificultosa) não é suficiente para desonerar a defesa de seu fardo processual.

6 – Embargos infringentes desprovidos.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Seção, por maioria, decidiu negar provimento aos embargos infringentes, nos termos do voto do Relator, no que foi acompanhado pelos Desembargadores Federais FAUSTO DE SANCTIS, NINO TOLDO, MAURÍCIO KATO e ANDRÉ NEKATSCHALOW, vencido o Desembargador Federal PAULO FONTES, que votou por dar provimento aos embargos infringentes, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.