Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO


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RELATOR: 

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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5077635-54.2022.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: RENE RODRIGUES

Advogado do(a) APELADO: MARCIO LISBOA MARTINS - SP224010-N

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R E L A T Ó R I O

 

 

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da sentença de fls. 33/42 que julgou procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade de trabalhador rural, condenando-o a pagar o benefício, verbis:

“ANTE O EXPOSTO, julgo PROCEDENTE o pedido inicial, com resolução do mérito, nos termos do artigo487, inciso I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL a conceder aposentadoria rural por idade em favor de RENE RODRIGUES, a ser instituída no valor de um salário-mínimo, devido desde a data do pedido administrativo (23/08/2018 fl. 14). O valor das parcelas vencidas deve sofrer correção monetária desde a data em que deveriam ter sido pagas. Os juros de mora correm desde a citação (STJ, REsp nº 1.112.114, sob o rito do artigo1.036doCPC, tema 23) e, para as parcelas supervenientes à citação, desde o respectivo vencimento. A correção monetária será realizada segundo o INPC, nos termos do art. 41-A, da Lei nº 8.213/91. Quanto aos juros moratórios devem incidir o índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (TR), nos termos do art.1º-Fda Lei nº9.494/97, com redação dada pela Lei nº11.960/09. A partir da implantação do benefício, sobre as parcelas subsequentes, pagas tempestivamente, não incidirão juros e correção monetária. Por todas as razões expostas, entendo mais do que verossímil o direito alegado pelo autor, bem como, por se tratar de verba de natureza alimentar, tenho como caracterizado o risco de dano irreversível, caso não venham a ser antecipados os efeitos da tutela final. Assim, com amparo no art. 300 do CPC, CONCEDO a tutela de urgência de natureza antecipada, para determinar ao demandado que implante imediatamente o benefício concedido na presente sentença, no prazo de 30 dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), limitado a R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Oficie-se ao INSS para que implante o benefício, nos termos retro determinados. Condeno o INSS, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios da parte adversa, os últimos arbitrados equitativamente em 10% do valor da condenação, abrangidas para este fim as prestações vencidas até a data desta sentença, nos termos da Súmula 111, do STJ, atualizáveis a partir da publicação desta. Deixo de condenar ao pagamento de custas processuais, por força de lei. Por derradeiro, entendo que a presente sentença não está sujeita ao reexame necessário, uma vez que o valor da condenação, mesmo depois da sua liquidação, que será feito por meros cálculos aritméticos, certamente não superará a quantia de 1.000 (mil) salários mínimos (CPC, art. 496, §3°, inc. I). P.R.I.”

O recorrente argui,  preliminarmente, seja o presente recurso recebido liminarmente com efeito suspensivo, sobrestando-se eventual ordem de implantação do benefício (CPC, art. 1012 § 4.º) e  requer seja a parte autora intimada a firmar a declaração instituída pela EC  103/2019.

Argumenta, ainda, a  ocorrência de coisa julgada porquanto a pretensão  deduzida pela parte autora já foi julgada pelo Poder Judiciário, em ação anteriormente ajuizada e com decisão transitada em julgado, processo nº  0001806- 31.2012.403.6305, sendo de rigor a extinção do presente feito sem  sem resolução do mérito, com fundamento no artigo 485, inciso V, e § 3º do CPC.

No mérito, pede  a reforma da sentença, em síntese, sob os seguintes fundamentos: não comprovação dos requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado; o autor possui diversos vínculos urbanos como empresário/empregador, afastando o caráter de regime de economia familiar,   a extensão das provas rurais em nome de um integrante familiar  não é válida  após este passar a exercer atividade laborativa urbana   e inexistência de  qualquer documento contemporâneo.  Ad cautelam, requer a  fixação da DIB na data da citação e  exclusão da multa diária  ou  a sua redução, com a fixação de prazo razoável para o cumprimento da ordem; exclusão das custas e prescrição quinquenal.

Por fim, prequestiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais.

Regularmente processado o feito,  os autos subiram a este Eg. Tribunal.

É O RELATÓRIO.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5077635-54.2022.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: RENE RODRIGUES

Advogado do(a) APELADO: MARCIO LISBOA MARTINS - SP224010-N

 

 

 

V O T O

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.

Inicialmente,  a preliminar de necessidade de autodeclaração para os pedidos de aposentadorias, merece ser rejeitada, porquanto  se trata  de procedimento da entidade autárquica no âmbito administrativo, em que se  dispensa a determinação judicial.

A antecipação da tutela  foi concedida na sentença,  o que permite  o recebimento da apelação apenas no efeito devolutivo, nos termos do art. 1012, § 1º, inciso V, do CPC/2015.

Ademais, afigura-se possível a antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública nas causas de natureza previdenciária e assistencial. Precedentes (STF, Rcl 1067 / RS, Tribunal Pleno, Relatora Min. Ellen Gracie, j. 05/9/2002, v.u., DJ 14/02/2003, p. 60; STJ, AgRg no Ag 1322033, Rel: Ministro Herman Benjamin, julgado em 28/09/2010). De qualquer forma, não apresentou o apelante fundamentação  relevante a ensejar atribuição de efeito suspensivo à apelação, nos termos do artigo 558, caput e parágrafo único, do CPC/1973 (art. 1012, § 4º do código atual).

Quanto à alegação de coisa julgada, sem razão o INSS.

Com efeito, nas ações objetivando a concessão do  benefício de aposentadoria por idade rural, esta  Eg. Corte tem entendido que, caso a parte autora apresente novos documentos na segunda ação (que não foram utilizados na primeira ação), considera-se que houve inovação na causa de pedir, a afastar o reconhecimento da coisa julgada.

Confira-se, nesse sentido, o seguinte julgado:


PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COISA JULGADA. NÃO CONFIGURAÇÃO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. TRABALHO RURAL NÃO EXERCIDO NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO CUMPRIMENTO DO REQUISITO ETÁRIO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

1. Nas ações em que se pleiteia o benefício de aposentadoria por idade rural, esta Corte tem entendido que, caso a parte autora apresente novos documentos na segunda ação (que não foram utilizados na primeira ação), considera-se que houve inovação na causa de pedir, a afastar o reconhecimento da coisa julgada. Por outro lado, verifica-se que o feito se encontra em condições de imediato julgamento, nos termos do artigo 1.013, §3º, do CPC.

2. (...).

8. Apelação provida em parte para afastar a coisa julgada. Pedido julgado improcedente." (AC 0009984-32.2018.4.03.9999 , Rel: Des. Fed. Toru  Yamamoto, julgamento em 08/04/2019)

Exatamente essa a hipótese dos autos.

A  parte autora ajuizou a ação anterior  no ano de 2.012 buscando comprovar o labor rural naquela época, por ocasião do implemento do requisito etário (Processo nº0001806-31.2012.4.03.6305 , cujo acórdão transitou em julgado em 23/02/2018 (fl. 72).

Decorridos alguns anos, a parte autora formulou novo pedido administrativo, apresentou novos documentos e pretende o reconhecimento de período de labor rural diverso, sustentando  que  houve um novo período de carência de tempo.

A propósito, este foi o fundamento em que se lastreou o  magistrado a quo para rejeitar a preliminar de coisa julgada, verbis:

"Quanto à alegação de coisa julgada, razão não assiste ao demandado. Deveras, de acordo com o art. 337, §§ 2º e 4º, do Código de Processo Civil, verifica-se a coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado, sendo que uma demanda é considerada idêntica à outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.

 Ora, no presente caso, o autor pretende obter a aposentadoria rural por idade, a partir do reconhecimento de sua condição de segurado especial entre 20/05/1979 até 23/08/2018, ou seja, em período diverso daquele discutido no processo nº 0001806-31.2012.4.03.6305 (fls. 60/67).

Assim, distinta a causa de pedir entre as demandas, incabível se falar em coisa julgada."

Assim, distinta a causa de pedir entre as demandas, incabível se falar em coisa julgada. Inviável, outrossim, o reconhecimento da prescrição, uma vez que a presente ação foi proposta em setembro de 2019, com pedido de pagamento retroativo desde 2018, data do requerimento administrativo, não tendo transcorrido, portanto, o lustro prescricional.

Não há que se falar em  reconhecimento da prescrição, uma vez que a presente ação foi proposta em setembro de 2019, com pedido de pagamento retroativo  a  2018, data do  novo requerimento administrativo, não tendo transcorrido, portanto, o lustro prescricional.

Superadas as questões prévias, ingresso na análise do mérito.

A parte autora ajuizou a presente ação pretendendo a concessão da aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, in verbis:

"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.

§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.

§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)"

Para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão, sendo imperioso observar o disposto nos artigos 142 e 143, ambos da Lei nº 8.213/91.

Em síntese, para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão.

Em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à carência do referido benefício. Aos que  ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais.

Anoto, ainda, que a  necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou firmada pelo  C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva.

Sobre a questão,  o CJF erigiu a Súmula 54, que porta o seguinte enunciado “para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural, o tempo de exercício de atividade equivalente à carência deve ser aferido no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou à data do implemento da idade mínima”.

Portanto,  ao  trabalhador rural exige-se  a qualidade de segurado no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou implemento de idade, ressalvada a hipótese do direito adquirido,  devendo essa exigência ser comprovada por meio de prova material e testemunhal, ou de recolhimentos vertidos ao INSS.

Em relação aos segurados especiais, o artigo 39 da Lei n.º 8.213/91 estabelece que para a obtenção da aposentadoria por idade, o segurado especial deverá comprovar o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência, conforme preceitua o artigo 39, inciso I, da lei mencionada. Em outras palavras, não se exige o cumprimento de carência do segurado especial, mas o efetivo exercício de atividade rural, na forma especificada no dispositivo em comento.

COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL

A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ.

Ademais, diante das precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

Considerando a  dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).

Importante dizer que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou sedimentada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva.

CASO CONCRETO

A  idade mínima exigida para a obtenção do benefício restou comprovada pela documentação trazida aos autos, onde consta que a parte autora nasceu em  18/02/1952, implementando o requisito etário em  2012.

Logo, a parte autora deve comprovar o exercício do labor rural no período imediatamente anterior a 2012 ou a entrada do requerimento administrativo (2018 ), o que lhe for mais favorável, mesmo que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício requerido (180), não tendo o Instituto-réu conseguido infirmar a validade dos depoimentos prestados e dos documentos trazidos.

Segundo a inicial, o autor  e vive na zona rural do município, mais precisamente no bairro Jairê, lugar em que exerce também a atividade de lavrador   para a própria subsistência e da família, em regime de economia familiar, plantando, cultivando e colhendo, o que faz até os dias de hoje.

Para a comprovação do exercício da atividade rural, a parte autora apresentou os seguintes documentos: sua certidão de casamento, em 20/06/1979 sem informação de relevo (fl. 201); Certidão de nascimento da filha do autor,  em 05/01/2000 onde ele  está qualificado como lavrador  (fl. 196); Certidão de nascimento da filha do autor,  em 29/06/1993, onde ambos os genitores estão qualificados   como lavradores   (fl. 195); Certidão de nascimento da filha do autor,  em 14/07/1989  onde ele  está qualificado como lavrador  (fl. 194); ITR  de 2016,  2017 e 2018   em nome de sua esposa (fl. 129/ 133 e 188/192); Darf’s relativos  ao pagamento dos ITR’s  de     2005, 2008, 2007 e  Aviso de cobrança do ITR, em nome de Albertina Damasio Rodrigues, esposa do autor  (fl. 186/188); Declaração de direitos possessórios do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Iguape no sentido de que o autor  Rene e sua esposa  Albertina são detentores de uma área de 0,1 há (Sítio Beira Rio Bocuí) desde 12/10/1999 tornando a terra produtiva através de seu trabalho e de sua família;  (fl. 185); Certidão emitida pela Justiça Eleitoral em 28/04/2011 onde o autor está qualificado como agricultor (fl. 184); declaração de aptidão ao Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento de Agricultura Familiar) em seu nome e em nome de sua esposa (fl. 183);  Declaração de Exercício de Atividade Rural em seu nome, de exercício de atividade rural  em regime de economia familiar, perante o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Iguape, pelo período de 20/06/1979 até 23/08/2018 (fl. 180/182); declaração do trabalhador rural junto ao INSS (fl. 174/178) e sua CTPS em branco  (fl.103/ 105).

Posteriormente, apresentou cópia da sentença e do acórdão prolatados nos autos do processo nº  0026242-54.2017.403.9999  ajuizado por sua esposa em que se reconheceu a condição de segurada especial por ela ostentada, com a consequente concessão de aposentadoria por idade rural em seu favor em nome de sua esposa (fl. 51/69). O acórdão transitou em julgado em 23/02/2018 (fl. 72).

Os documentos colacionados pela parte autora constituem início razoável de prova material de que ela trabalhava nas lides campesinas.

Aduz o INSS que o autor  ostenta contribuições na qualidade de contribuinte empresário/empregador o que o descaracteriza como segurado especial.

Sobre a questão, colho dos autos que, por ocasião de sua entrevista, o autor, pessoa simples, disse desconhecer esses vínculos como empresário/empregador, circunstância que nunca se verificou e foi corroborada pela prova oral.

Ainda que assim não fosse, segundo consta do seu CNIS (fl. 143)  os recolhimentos como Empresário / Empregador datam  de 01/06/1985 a 31/05/1986; de 01/07/1986  a 31/08/1987; de  01/11/1987 a 31/05/1988 e de   01/08/1988  a  31/01/1989, ou seja, época  expressivamente distante do período de  carência que o autor busca comprovar.

Colho dos autos que o autor traz documentos em nome próprio e em nome de sua esposa, os quais, segundo  a legislação previdenciária,  permitem a extensão da qualificação  nos casos em que o grupo familiar labora junto, presumindo-se que um acompanha o outro na lida rural, prestando-lhe auxílio.

Por sua vez, a prova testemunhal produzida nos autos e não impugnada pelas partes,  evidenciou de forma segura e induvidosa o labor rural da parte autora, sendo que os depoentes, que a conhecem há muitos anos, foram unânimes em suas declarações, confirmando que ela sempre trabalhou na lavoura.

A testemunha ORIVALDO BARBOSA DE SOUZA disse conhecer Rene desde que este mudou para perto de sua casa. São vizinhos, mora a uma distância de 500 metros da casa dele, no bairro do Bucuí, na estrada do Jairê, zona rural, estrada Pedro Coutinho. Afirmou que Rene planta verduras, pé de mandioca, só para lavoura de mantimento dele. Negou que, de sua casa, visualize Rene trabalhando, pois este mora depois do morrinho que tem em frente de onde mora. De vez em quando, ele passa lá e o vê trabalhando. Aduziu que Rene é casado e que, com certeza, sua esposa o ajuda na lavoura. O nome dela é Dona Albertina. Negou saber se Rene já teve empregados no sítio. Desde que o conhece, sempre morou no mesmo lugar, sempre fazendo a mesma coisa.

O informante MÁXIMO TAKAHIRA, amigo do requerente, disse que são vizinhos e confirmou que sempre vai visitá-lo. Afirmou que conhece Rene como amigo, são vizinhos. Em relação a distância entre suas propriedades, indicou ser de aproximadamente 50 metros. Há um vizinho no meio, também é de 50 metros a distância da casa dele. Indicou que é no bairro do Bucuí, estrada do Jairê, quilômetro 18, zona rural. Informou que Rene planta feijão, mandioca, faz farinha, planta cana, cria galinhas, planta verduras para o custeio de casa, para manter a família. Confirmou que enxerga ele trabalhando, que são vizinhos e sempre está perto dele. Todo dia está na casa dele porque é pertinho e passa lá. Afirmou que o requerente é casado, sua esposa é Dona Albertina. Ela o ajuda, é o “braço direito” dele. Disse que ele trabalhava bem, mas, depois que foi operado, ele trabalha, mas é obrigado ir para casa porque não aguenta. O serviço que ele fazia, não pode fazer mais. Negou que ele tenha ou teve empregados. Só tem uma filha, que depende deles também, e uma netinha. Afirmou que ele sempre morou no mesmo lugar. Conhece ele há uns 30 anos com ele morando e trabalhando ali.

Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.

É dizer,  não é necessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência, desde que a sua eficácia probatória seja ampliada por robusta  prova testemunhal.

Assim sendo, o início de prova material, corroborado por robusta e coesa prova testemunhal, comprova a atividade campesina exercida pela parte autora.

CONCLUSÃO

Desse modo, presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício, vez que implementado o requisito da idade e demonstrado o exercício da atividade rural, por período equivalente ao da carência exigida pelo artigo 142 da Lei nº 8213/91, a procedência do pedido era de rigor.

Prequestionamento

Relativamente ao prequestionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que ser discutido ou acrescentado aos autos.

Não houve condenação em custas.

Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, (i) à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS, observada, quanto ao termo final, a tese firmada em Repercussão Geral no RE 579.431, e, (ii) a partir da promulgação da Emenda Constitucional nº 113, de 08/12/2021, será aplicada a Taxa SELIC, “para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, uma única vez, até o efetivo pagamento, acumulado mensalmente.”

Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.

O termo inicial do benefício foi corretamente fixado a partir do pedido administrativo, em  23/08/2018   e deve ser mantido.

Por fim, considerando que a  decisão que deferiu o pedido de tutela antecipada foi devidamente cumprida no prazo fixado, encontra-se prejudicado qualquer  questionamento  acerca da incidência de multa cominatória (fl. 27).

Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei.

Não obstante a matéria que trata dos honorários recursais tenha sido afetada pelo Tema nº 1.059 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que determinou a suspensão do processamento dos feitos pendentes que versem sobre essa temática, é possível, na atual fase processual, tendo em conta o princípio da  duração razoável do processo, que a matéria não constitui objeto principal do processo e que a questão pode ser reexaminada na fase de liquidação, a fixação do montante devido a título de honorários recursais, porém, deixando a sua exigibilidade condicionada à futura deliberação sobre o referido tema, o que será examinado oportunamente pelo Juízo da execução. 

Assim, - desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do CPC/2015.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso e, de ofício, altero os critérios de juros de mora e correção monetária. 

É COMO VOTO.

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E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO: COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ARTIGO 48, §§1º E 2º DA LEI Nº 8.213/91. REQUISITOS SATISFEITOS. COMPROVAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. 

1. Nas ações objetivando a concessão do  benefício de aposentadoria por idade rural, esta  Eg. Corte tem entendido que, caso a parte autora apresente novos documentos na segunda ação (que não foram utilizados na primeira ação), considera-se que houve inovação na causa de pedir, a afastar o reconhecimento da coisa julgada.

2. A  preliminar de necessidade de autodeclaração para os pedidos de aposentadorias, merece ser rejeitada, porquanto  se trata  de procedimento da entidade autárquica no âmbito administrativo, em que se  dispensa a determinação judicial.

3. A antecipação da tutela  foi concedida na sentença,  o que permite  o recebimento da apelação apenas no efeito devolutivo, nos termos do art. 1012, § 1º, inciso V, do CPC/2015.

4. Não há que se falar em  reconhecimento da prescrição, uma vez que a presente ação foi proposta em setembro de 2019, com pedido de pagamento retroativo  a  2018, data do  novo requerimento administrativo, não tendo transcorrido, portanto, o lustro prescricional.

5. Para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão.

6 - Em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, considera-se a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à carência do referido benefício e, aos  que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais., devendo se observar o caso concreto.

7 - A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ.

8 - Considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

9 - Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.

10- A parte autora deve comprovar o exercício do labor rural no período imediatamente anterior a 2012 ou a entrada do requerimento administrativo (2018 ), o que lhe for mais favorável, mesmo que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício requerido (180), não tendo o Instituto-réu conseguido infirmar a validade dos depoimentos prestados e dos documentos trazidos.

11 -  Para a comprovação do exercício da atividade rural, a parte autora apresentou os seguintes documentos: sua certidão de casamento, em 20/06/1979 sem informação de relevo (fl. 201); Certidão de nascimento da filha do autor,  em 05/01/2000 onde ele  está qualificado como lavrador  (fl. 196); Certidão de nascimento da filha do autor,  em 29/06/1993, onde ambos os genitores estão qualificados   como lavradores   (fl. 195); Certidão de nascimento da filha do autor,  em 14/07/1989  onde ele  está qualificado como lavrador  (fl. 194); ITR  de 2016,  2017 e 2018   em nome de sua esposa (fl. 129/ 133 e 188/192); Darf’s relativos  ao pagamento dos ITR’s  de     2005, 2008, 2007 e  Aviso de cobrança do ITR, em nome de Albertina Damasio Rodrigues, esposa do autor  (fl. 186/188); Declaração de direitos possessórios do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Iguape no sentido de que o autor  Rene e sua esposa  Albertina são detentores de uma área de 0,1 há (Sítio Beira Rio Bocuí) desde 12/10/1999 tornando a terra produtiva através de seu trabalho e de sua família;  (fl. 185); Certidão emitida pela Justiça Eleitoral em 28/04/2011 onde o autor está qualificado como agricultor (fl. 184); declaração de aptidão ao Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento de Agricultura Familiar) em seu nome e em nome de sua esposa (fl. 183);  Declaração de Exercício de Atividade Rural em seu nome, de exercício de atividade rural  em regime de economia familiar, perante o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Iguape, pelo período de 20/06/1979 até 23/08/2018 (fl. 180/182); declaração do trabalhador rural junto ao INSS (fl. 174/178) e sua CTPS em branco  (fl.103/ 105). Sobreveio aos autos  cópia da sentença e do acórdão prolatados nos autos do processo nº  0026242-54.2017.403.9999  ajuizado por sua esposa em que se reconheceu a condição de segurada especial por ela ostentada, com a consequente concessão de aposentadoria por idade rural em seu favor em nome de sua esposa (fl. 51/69). O acórdão transitou em julgado em 23/02/2018 (fl. 72).

12. Os documentos trazidos pela parte autora constituem início razoável de prova material que, corroborado por robusta e coesa prova testemunhal, não impugnada pelas partes, comprova a atividade campesina exercida pela parte autora.

13 - Presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício, vez que implementado o requisito da idade e demonstrado o exercício da atividade rural, por período equivalente ao da carência exigida pelo artigo 142 da Lei nº 8213/91, a procedência do pedido era de rigor.

14. Não houve condenação em custas.

15. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, (i) à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS, observada, quanto ao termo final, a tese firmada em Repercussão Geral no RE 579.431, e, (ii) a partir da promulgação da Emenda Constitucional nº 113, de 08/12/2021, será aplicada a Taxa SELIC, “para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, uma única vez, até o efetivo pagamento, acumulado mensalmente.”

16. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.

17. O termo inicial do benefício foi corretamente fixado a partir do pedido administrativo, em  23/08/2018   e deve ser mantido.

18. Considerando que a  decisão que deferiu o pedido de tutela antecipada foi devidamente cumprida no prazo fixado, encontra-se prejudicado qualquer  questionamento  acerca da incidência de multa cominatória (fl. 27).

19. Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei, ficando sua exigibilidade condicionada à futura deliberação sobre o Tema nº 1.059/STJ, o que será examinado oportunamente pelo Juízo a quo.

20. Recurso desprovido. De  ofício, alterados  os critérios de juros de mora e correção monetária. 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso e, de ofício, alterar os critérios de juros de mora e correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.