APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000139-34.2017.4.03.6115
RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS
APELANTE: VICTOR MANUEL VALDES ALIE
Advogado do(a) APELANTE: RAFAEL LOPES DE CARVALHO - SP300838-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL, ORGANIZACAO PAN-AMERICANA DA SAUDE/ORGANIZACAO MUNDIAL DA SAUDE - OPAS/OMS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000139-34.2017.4.03.6115 RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS APELANTE: VICTOR MANUEL VALDES ALIE Advogado do(a) APELANTE: RAFAEL LOPES DE CARVALHO - SP300838-A APELADO: UNIÃO FEDERAL, ORGANIZACAO PAN-AMERICANA DA SAUDE/ORGANIZACAO MUNDIAL DA SAUDE - OPAS/OMS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação ajuizada por Victor Manuel Vlades Alie em face da União e da Organização Pan-Americana - OPAS, objetivando provimento jurisdicional que lhe garanta a renovação direta do contrato referente ao “Programa Mais Médicos”, bem como receba integralmente a bolsa paga aos profissionais, cuja maior parte do valor é retida pelo governo cubano. A tutela de urgência foi indeferida (ID 25205269). Dessa decisão o autor interpôs agravo de instrumento, o qual foi remetido ao Superior Tribunal de Justiça e julgado prejudicado ante a prolação da sentença. Decretou-se a revelia da OPAS (ID 25213592). O MM. Juiz a quo, ao final, julgou extinto o processo, sem resolução de mérito, em relação à Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), por falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo e, no mérito, julgou improcedentes os pedidos, condenando a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor atribuído à causa (ID 25213603). O autor apelou, sustentando, em síntese, que: a) é de conhecimento dos integrantes do “Programa Mais Médicos” que o Brasil tem depositado a parcela referente ao seguro-desemprego dos médicos cubanos que participavam do projeto, assim como a parcela relativa ao 13º salário, porém, a Embaixada de Cuba jamais repassou esses valores aos profissionais, ficando integralmente com o montante; b) a Constituição Federal, em seus artigos 6º e 7º, regulamentou princípios básicos para a relação de trabalho, sendo obrigação do governo brasileiro tomar atitude no sentido de proteger as regras e inibir qualquer violação a esses direitos em relação aos profissionais que laboram em território nacional; c) a r. sentença deve ser reformada para garantir a renovação do contrato diretamente com o apelante e o recebimento integral da bolsa paga pelo “Programa Mais Médicos”, assegurando, assim, tratamento isonômico em relação aos médicos cubanos e aqueles de outras nacionalidades; Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000139-34.2017.4.03.6115 RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS APELANTE: VICTOR MANUEL VALDES ALIE Advogado do(a) APELANTE: RAFAEL LOPES DE CARVALHO - SP300838-A APELADO: UNIÃO FEDERAL, ORGANIZACAO PAN-AMERICANA DA SAUDE/ORGANIZACAO MUNDIAL DA SAUDE - OPAS/OMS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): Trata-se de ação ajuizada por médico cubano com o fito de garantir a renovação direta do contrato referente ao “Programa Mais Médicos”, bem como o recebimento integral da bolsa paga aos profissionais, cuja maior parte do valor é retida pelo governo cubano. Aduz, em síntese, que é médico formado em Cuba e encontra-se no Brasil para cumprir missão junto ao Programa denominado “Mais Médicos”. Alega que sofre tratamento diferenciado dos demais estrangeiros por ser nacional de Cuba, eis que não teve oportunidade de solicitar a renovação de seu contrato, o que foi possibilitado aos médicos de outras nacionalidades. Sustenta que os valores pagos pelo trabalho do autor são enviados para o governo cubano, que fica com parte dos valores, repassando uma parte mínima ao autor. Afirma, ainda, que pretende obter a nacionalidade brasileira e permanecer no país, uma vez que se casou com brasileira. A respeito dessa questão, cumpre asseverar que o Programa Mais Médicos, instituído pela Lei nº 12.871/2013, tem por objetivo formar recursos humanos na área médica para o Sistema Único de Saúde (SUS) e, principalmente, diminuir a carência de médicos nas regiões prioritárias para o SUS. Para a sua implementação, criou-se o “Projeto Mais Médicos para o Brasil”, oferecido aos médicos formados em instituições de educação superior brasileiras ou com diploma revalidado no País, e aos médicos formados em instituições de educação superior estrangeiras, por meio de intercâmbio médico internacional. No caso dos médicos de nacionalidade cubana, que participaram do “Projeto Mais Médicos para o Brasil” - diferentemente dos participantes de outras nacionalidades, cujo vínculo de emprego se dava diretamente com a União (Ministério da Saúde) –, o intercâmbio ocorria por meio de uma cooperação técnica celebrada entre a República Federativa do Brasil e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), consubstanciada no Terceiro Termo de Ajuste ao 80º Termo de Cooperação Técnica, com respaldo no direito internacional, na Constituição Federal e no Decreto nº 3.594, de 8 de setembro de 2000. Verifica-se, deste modo, que a relação da parte autora se estabelecia diretamente com o Governo Cubano, com a intermediação da OPAS, que foi responsável pela indicação dos profissionais aptos ao projeto, não podendo o Brasil intervir nessa relação, em razão dos princípios constitucionais que regem o país em suas relações de cooperação internacional, especialmente o da não intervenção, decorrente dos princípios da independência nacional e da igualdade entre os Estados. Com efeito, a Lei nº 12.871/2013 não confere direito adquirido dos médicos intercambistas à prorrogação automática da sua participação no programa, nos termos do disposto nos artigos 17 e 18, in verbis: “Art. 17. As atividades desempenhadas no âmbito do Projeto Mais Médicos para o Brasil não criam vínculo empregatício de qualquer natureza. Art. 18. O médico intercambista estrangeiro inscrito no Projeto Mais Médicos para o Brasil fará jus ao visto temporário de aperfeiçoamento médico pelo prazo de 3 (três) anos, prorrogável por igual período em razão do disposto no § 1º do art. 14, mediante declaração da coordenação do Projeto. § 1º O Ministério das Relações Exteriores poderá conceder o visto temporário de que trata o caput aos dependentes legais do médico intercambista estrangeiro, incluindo companheiro ou companheira, pelo prazo de validade do visto do titular. § 2º Os dependentes legais do médico intercambista estrangeiro poderão exercer atividades remuneradas, com emissão de Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) pelo Ministério do Trabalho e Emprego. § 3º É vedada a transformação do visto temporário previsto neste artigo em permanente. § 4º Aplicam-se os arts. 30, 31 e 33 da Lei no 6.815, de 19 de agosto de 1980, ao disposto neste artigo”. Por sua vez, cabe à Coordenação do "Projeto Mais Médicos para o Brasil", vinculada aos Ministérios da Saúde e Educação, a deliberação acerca da seleção e ocupação das vagas no programa, as quais devem observar a ordem de prioridade prevista no artigo 13, abaixo transcrito: “Art. 13. É instituído, no âmbito do Programa Mais Médicos, o Projeto Mais Médicos para o Brasil, que será oferecido: I - aos médicos formados em instituições de educação superior brasileiras ou com diploma revalidado no País; e II - aos médicos formados em instituições de educação superior estrangeiras, por meio de intercâmbio médico internacional. § 1º A seleção e a ocupação das vagas ofertadas no âmbito do Projeto Mais Médicos para o Brasil observarão a seguinte ordem de prioridade: I - médicos formados em instituições de educação superior brasileiras ou com diploma revalidado no País, inclusive os aposentados; II - médicos brasileiros formados em instituições estrangeiras com habilitação para exercício da Medicina no exterior; e III - médicos estrangeiros com habilitação para exercício da Medicina no exterior. § 2º Para fins do Projeto Mais Médicos para o Brasil, considera-se: I - médico participante: médico intercambista ou médico formado em instituição de educação superior brasileira ou com diploma revalidado; e II - médico intercambista: médico formado em instituição de educação superior estrangeira com habilitação para exercício da Medicina no exterior. § 3º A coordenação do Projeto Mais Médicos para o Brasil ficará a cargo dos Ministérios da Educação e da Saúde, que disciplinarão, por meio de ato conjunto dos Ministros de Estado da Educação e da Saúde, a forma de participação das instituições públicas de educação superior e as regras de funcionamento do Projeto, incluindo a carga horária, as hipóteses de afastamento e os recessos”. À vista disso, as vagas destinadas ao programa são ocupadas, prioritariamente, por médicos formados no Brasil ou com diploma revalidado no país; depois, por médicos brasileiros formados em instituições estrangeiras com habilitação para exercício da medicina no exterior; e, por último, por médicos estrangeiros com habilitação para exercício da medicina no exterior, como é o caso do autor. Cabe destacar, ademais, que os bolsistas do “Projeto Mais Médicos para o Brasil”, segundo a supracitada lei, não possuem vínculo empregatício, mas atividade acadêmica remunerada por valor fixo a título de bolsa de estudos, conforme segue: “Art. 29. Para os efeitos do art. 26 da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, os valores percebidos a título de bolsa previstos nesta Lei e na Lei nº 11.129, de 30 de junho de 2005, não caracterizam contraprestação de serviços.” Assim, a ausência de vínculo entre a parte autora e o governo brasileiro afasta a comparação com a condição dos médicos de outras nacionalidades participantes do programa, visto que o princípio da isonomia pressupõe tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades e, devido ao Termo de Cooperação, os profissionais cubanos não são autorizados a atuar no “Programa Mais Médicos” como intercambistas individuais, cabendo ao autor a opção de revalidar seu diploma estrangeiro no Brasil, para enquadramento no inciso I, § 1º, art. 13 da Lei nº 12.871/2013. Registre-se, ainda, que não há qualquer ilegalidade no desligamento do autor do programa em questão, pois há que se atentar para o prazo previamente fixado no Termo de Cooperação, da mesma forma como foi estabelecido o pagamento da bolsa aos profissionais, que, por força do regramento específico dessa cooperação, recebem por intermédio da OPAS e do Governo Cubano, os quais, repita-se, são os únicos que podem autorizar a prorrogação da participação dos médicos cubanos no “Programa Mais Médicos”. A respeito do tema, colhem-se os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça: “ADMINISTRATIVO. CABIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO. PROGRAMA MAIS MÉDICOS. PARTICIPANTE. DETERMINAÇÃO DE VOLTA AO PAÍS DE ORIGEM. PRETENSÃO DE PRORROGAÇÃO. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE LEGISLAÇÃO DISCIPLINADORA. DIREITO SUBJETIVO DE PERMANÊNCIA. INEXISTÊNCIA. PRECEDENTE. I - Médico cubano, participante do Programa Mais Médicos, ajuizou ação contra a União, a República de Cuba e a Organização Pan-Americana de Saúde - OPAS pretendendo permanecer no país, a despeito da determinação de que deveria retornar à Cuba, em razão do final da missão no referido Programa. II - A ação foi julgada improcedente pelo Juízo Federal do Distrito Federal, sob o principal fundamento de inexistência de lei disciplinando a pretendida prorrogação no Programa. III - Cabimento do presente recurso, nos termos do art. 105, II, c, da Constituição Federal. IV - A Lei n. 12.871/2013 criou o "Programa Mais Médicos" com a finalidade de formar recursos humanos na área médica para o Sistema Único de Saúde, possibilitando a contratação de médicos estrangeiros, legislação que deve ser interpretada à luz dos princípios que o Brasil deve observar em suas relações internacionais. V - A inexistência de direito adquirido para a permanência dos médicos estrangeiros no referido Programa foi expressamente prevista - arts. 17 e 18, §3º, da Lei n. 12.871/2013, situação que não ampara a pretensão deduzida pelo recorrente, conforme já bem salientado na sentença recorrida, que merece ser ratificada. VI - Ademais, o art. 13 da referida Lei confirma a discricionariedade da coordenação do Projeto Mais Médicos para o Brasil, não cabendo ao Poder Judiciário interferir no juízo de discricionariedade, a não ser para afastar ilegalidades, não sendo essa a hipótese dos autos. VII - Precedente: RO n. 213/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBEL MARQUES, DJe 12/12/2019. VIII - Recurso ordinário improvido”. (RO n. 221/DF, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 6/4/2021, DJe de 14/4/2021.) (grifei) “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MÉDICOS INTERCAMBISTAS. LEIS 12.871/2013 E 13.333/2016. CONTRATOS INDIVIDUAIS. RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA. DESCABIMENTO. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA NÃO DEMONSTRADA. AGRAVO INTERNO DOS ESTRANGEIROS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Inicialmente, é importante ressaltar que o presente Recurso atrai a incidência do Enunciado Administrativo 3 do STJ, segundo o qual, aos recursos interpostos com fundamento no Código Fux (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo Código. 2. A contratação de médicos cubanos no âmbito do programa federal instituído pela Lei 12.871/2013 é efetivada com a intermediação da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS/ONU), conforme acordos internacionais celebrados e mantidos entre os Chefes de Estado do Brasil e de Cuba com o mencionado organismo internacional. 3. É sabido que o controle judicial no campo político e diplomático é restrito, não cabendo ao Poder Judiciário intervir em ato discricionário da administração pública, salvo na hipótese de flagrante violação dos princípios da legalidade e da isonomia, circunstâncias que não se vislumbram no caso. Sobre o tema, é importante notar que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI 5.035/DF, Rel. Min. MARCO AURÉLIO MELLO, Relator p/ acórdão Min. ALEXANDRE DE MORAES, reconheceu a constitucionalidade da Medida Provisória 621/2013, convertida na Lei 12.871/2013. 4. Relativamente aos critérios de renovação dos contratos, os dispositivos das Leis 12.871/2013 e 13.333/2016 são claros e objetivos no sentido de que, após o término do prazo estipulado na legislação de regência, o profissional que deseja continuar trabalhando como médico no Brasil deverá providenciar a revalidação de seu diploma de graduação no País. 5. A legislação de regência do Programa Mais Médicos expôs, de maneira clara, os critérios para adesão e participação na ação governamental, não sendo viável ao Poder Judiciário sindicá-los no juízo meritório de conveniência e oportunidade - substituindo, ao mesmo tempo, o papel dos Poderes Legislativo e Executivo na condução das relações diplomáticas brasileiras. 6. Tampouco é possível a análise detida dos fatores de descrímen para as especificidades do regime de contratação dos médicos cubanos - que parecem, em um juízo de cognição sumário, ser orientados justamente pela soberania do Estado Brasileiro na esfera diplomática. Desta forma, seria no mínimo temerário concluir, de antemão, pela existência de violação do princípio da isonomia. Assim já decidiu, a propósito, a Segunda Turma desta Corte Superior: Ag 1.433.756/DF, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 9.4.2018. (...) 8. Agravo Interno dos Estrangeiros a que se nega provimento”. (AgInt no Ag n. 1.433.738/ES, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 18/11/2019, DJe de 26/11/2019.) (grifei) “PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO PROFERIDA POR JUIZ FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU. RECURSO. ART. 1.027, II, "B", DO CPC/2015. COMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA PROCESSAR E JULGAR O AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO. MÉDICOS INTERCAMBISTAS. LEIS N. 12.871/2013 E N. 13.333/2016. CONTRATOS INDIVIDUAIS. RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA. DESCABIMENTO. DELIBERAÇÃO DA COORDENADORIA DO PROGRAMA "MAIS MÉDICOS" DO BRASIL. CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. AUSÊNCIA DE RAZÕES DO ALEGADO DISCRÍMEN. TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES. DESCABIMENTO. AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO PROVIDO. (...) 3. A Lei n. 12.871/2013 dispensou a revalidação do diploma e previu a concessão de visto temporário ao médico intercambista durante os três primeiros anos de participação no programa e a Lei n. 13.333/2016 prorrogou por 3 (três) anos o prazo de dispensa da revalidação do diploma e do visto temporário, mas nada dispôs sobre a renovação automática dos contratos individuais. 4. Os critérios estabelecidos na legislação de regência acima citada são claros e objetivos, sendo certo, ainda, competir à Coordenadoria do Programa "Mais Médicos" do Brasil a deliberação sobre a continuidade ou não dos profissionais no desempenho de suas atividades no território nacional, resolvendo-se a questão pela conveniência e oportunidade da Administração Pública. 5. Ainda que se houvesse de invocar a teoria dos motivos determinantes, como bem ressaltado pela decisão de primeiro grau, no caso em exame sequer "está claro nos autos a razão pela qual não fora oportunizada aos médicos cubanos a possibilidade de renovação do vínculo ao Programa Mais Médicos" e, dessa forma, ainda nem é possível antever as razões do suposto discrímen, motivo pelo qual "seria temerário presumir em juízo de cognição sumária a ofensa ao princípio da isonomia, não havendo, portanto, substrato para que o Judiciário controle a legitimidade do ato". 6. Agravo de instrumento não provido”. (Ag n. 1.433.756/DF, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 3/4/2018, DJe de 9/4/2018.) (grifei) A jurisprudência desta Corte Regional segue a linha do mesmo entendimento. Veja-se: “CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. PROGRAMA MAIS MÉDICOS. LEIS N.º 12.871/13 E N.º 13.333/2016. RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA DE CONTRATOS INDIVIDUAIS. DESCABIMENTO. SENTENÇA MANTIDA. - Pretende-se no presente feito a obtenção de provimento jurisdicional que assegure ao autor a renovação direta e independente de seu contrato relativo ao Programa "Mais Médicos", além do reconhecimento do direito ao recebimento do valor integral da respectiva remuneração. - No caso concreto, a participação do autor, ora apelante, no Programa "Mais Médicos" para o Brasil não decorre de contratação direta pelo governo brasileiro, mas da instituição de cooperação técnica pactuada entre o governo brasileiro e a OPAS – Organização Panamericana de Saúde, em articulação com o seu país de origem (Cuba) e rege-se por normas e ajustes específicos, nos termos da legislação destacada (Leis n.º 12.871/13 e n.º 13.333/2016), bem como dos princípios do Direito Internacional. Nesse contexto, eventual interferência judicial, nos termos requeridos pelo autor/apelante, somente teria cabimento em virtude da ocorrência de ilegalidade, o que não está demostrado nos autos. Ademais, a Lei n.º 13.333/2016, ao ampliar o prazo de validade do visto temporário, não trouxe qualquer determinação no que toca à prorrogação dos contratos individuais de trabalho. Desse modo, afigura-se correto o provimento de 1º grau de jurisdição, ao afirmar que (id 54898038): No caso dos autos, a contratação do autor, médico cubano, no âmbito do referida programa federal, não foi feita de forma direta pelo Governo Brasileiro, mas sim através da intermediação da Organização Pan-Americana da Saúda (OPAS/OMS/ONU), conforme disposto no art. 23 da Lei nº 12.871/2013, a qual possibilita que os Ministérios da Educação e da Saúde podem firmar acordos e outros instrumentos de cooperação com organismos internacionais, tanto que fora firmado com a OPAS o Termo de Cooperação Técnica para o desenvolvimento de ações vinculadas ao Projeto “Acesso da População Brasileira à Atenção Básica em Saúde”. (…) Na hipótese, o autor aderiu ao contrato com plena ciência do caráter temporário do ajuste outrora firmado, não sendo o caso de reconhecer a renovação contratual como pretendido, de forma individual e independente, fundado no princípio de isonomia, no ponto em que o autor clama por tratamento igualitário aos médicos de outra nacionalidade. - Desse modo, haja vista a ausência de norma que autorize a prorrogação pretendida, é de ser mantida a sentença. Precedentes. - Por fim, nos termos da legislação de regência da matéria e da jurisprudência destacada, não há que se falar em ofensa aos artigos 5º, 6º e 7ª da CF tampouco ao princípio da isonomia. - No caso em apreço, deve a verba honorária ser majorada, com base no art. 85, § 11, do CPC, para o patamar intermediário estabelecido § 3º, incisos I a V do mesmo dispositivo processual. - Apelo a que se nega provimento”. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5004345-24.2017.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal ANDRE NABARRETE NETO, julgado em 26/05/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 29/05/2020) (grifei) “PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. MÉDICOS INTERCAMBISTAS. LEI Nº 12.871/2013 E Nº 13.333/2016. CONTRATOS INDIVIDUAIS. RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA. DESCABIMENTO. DELIBERAÇÃO DA COORDENADORIA DO PROGRAMA “MAIS MÉDICOS DO BRASIL”. CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta por Gresen Guerra Garcia em face de sentença que julgou improcedente o pedido para assegurar a sua permanência no Programa Mais Médicos, com o recebimento do salário diretamente em sua conta, além da renovação de seu contrato de trabalho. 2. Na inicial, a parte autora informa que seu contrato de trabalho vence em marco de 2017, e que após essa data deverá retornar ao seu país de origem, Cuba, porém deseja estabelecer domicílio permanente no Brasil e obter a naturalização brasileira assim que preencha os requisitos. Também comunica gravidez de risco, com necessidade de permanência no Brasil até um momento adequado após o parto, sendo que, no caso de não renovação do contrato, não terá condições de sobrevivência. Alega que, em razão de sua nacionalidade cubana, não teve a oportunidade de solicitar a renovação do contrato de adesão ao programa. 3. Conforme consta nos autos, a participação da apelante, médica de nacionalidade cubana, no "Programa Mais Médicos para o Brasil" não ocorreu por meio de vínculo direto com a União, mas sim mediante cooperação técnica firmada entre a República Federativa do Brasil e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), incluindo todos os Termos de Ajuste específicos, em articulação com o seu país de origem, Cuba, em conformidade com os princípios do direito internacional, da legislação e o consenso dos participantes. 4. A jurisprudência pátria entende que "a despeito de ser vedado ao Poder Judiciário o exame do mérito dos atos discricionários da Administração, não se deve confundir tal proibição com a possibilidade do Poder Judiciário de aferir a legalidade dos atos da Administração" (v.g. MS 22.488/DF, 1ª S., Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 08.08.2016). 5. Na espécie, apesar de o art. 16 da Lei nº 12.871/2013 ter dispensado a revalidação do diploma de médico no período em que vinculado ao "Programa Mais Médicos para o Brasil", e a Lei nº 13.333/2016 ampliado o prazo do visto temporário, não houve qualquer menção á prorrogação dos contratos individuais de trabalho. Assim, não havendo norma autorizando a prorrogação do “Programa Mais Médicos”, não é possível, em princípio, sua prorrogação, pois inexiste direito subjetivo dos médicos estrangeiros nesse sentido. 6. Com efeito, a definição do tempo de permanência no referido programa deve ficar a critério da coordenadoria do “Programa Mais Médicos do Brasil”, resolvendo-se a questão pela conveniência e oportunidade da Administração Pública, deliberando sobre a continuidade, ou não, das atividades dos profissionais no Brasil. Precedentes do STJ. 7. Apelação desprovida”. (AC 50006489220174036105, Rel. Des. Federal NELTON DOS SANTOS, 3ª Turma, Julg.: 19/12/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 26/12/2019) (grifei) A definição do tempo de permanência no referido programa, portanto, deve ficar a critério da coordenadoria do “Programa Mais Médicos do Brasil”, resolvendo-se a questão pela conveniência e oportunidade da Administração Pública, deliberando sobre a continuidade, ou não, das atividades dos profissionais no país. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação. É como voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. MÉDICOS INTERCAMBISTAS. LEI Nº 12.871/2013. CONTRATOS INDIVIDUAIS. RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA. DESCABIMENTO. DELIBERAÇÃO DA COORDENADORIA DO PROGRAMA “MAIS MÉDICOS DO BRASIL”. CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Trata-se de ação ajuizada por médico cubano com o fito de garantir a renovação direta do contrato referente ao “Programa Mais Médicos”, bem como o recebimento integral da bolsa paga aos profissionais, cuja maior parte do valor é retida pelo governo cubano.
2. No caso dos médicos de nacionalidade cubana, que participaram do “Projeto Mais Médicos para o Brasil” - diferentemente dos participantes de outras nacionalidades, cujo vínculo de emprego se dava diretamente com a União (Ministério da Saúde) –, o intercâmbio ocorria por meio de uma cooperação técnica celebrada entre a República Federativa do Brasil e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), consubstanciada no Terceiro Termo de Ajuste ao 80º Termo de Cooperação Técnica, com respaldo no direito internacional, na Constituição Federal e no Decreto nº 3.594, de 8 de setembro de 2000.
3. A relação da parte autora se estabelecia diretamente com o Governo Cubano, com a intermediação da OPAS, que foi responsável pela indicação dos profissionais aptos ao projeto, não podendo o Brasil intervir nessa relação, em razão dos princípios constitucionais que regem o país em suas relações de cooperação internacional, especialmente o da não intervenção, decorrente dos princípios da independência nacional e da igualdade entre os Estados. Precedentes.
4. A Lei nº 12.871/2013, ademais, não confere direito adquirido dos médicos intercambistas à prorrogação automática da sua participação no programa, nos termos do disposto nos artigos 17 e 18, e os bolsistas do “Projeto Mais Médicos para o Brasil” não possuem vínculo empregatício, mas atividade acadêmica remunerada por valor fixo a título de bolsa de estudos, de acordo com o artigo 29.
5. A ausência de vínculo entre a parte autora e o governo brasileiro afasta a comparação com a condição dos médicos de outras nacionalidades participantes do programa, visto que o princípio da isonomia pressupõe tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades e, devido ao Termo de Cooperação, os profissionais cubanos não são autorizados a atuar no “Programa Mais Médicos” como intercambistas individuais, cabendo ao autor a opção de revalidar seu diploma estrangeiro no Brasil, para enquadramento no inciso I, § 1º, art. 13 da Lei nº 12.871/2013.
6. A definição do tempo de permanência no referido programa, portanto, deve ficar a critério da coordenadoria do “Programa Mais Médicos do Brasil”, resolvendo-se a questão pela conveniência e oportunidade da Administração Pública, deliberando sobre a continuidade, ou não, das atividades dos profissionais no país.
7. Apelação desprovida.