Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5022595-14.2022.4.03.0000

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

AGRAVANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

AGRAVADO: PROTEGE S/A PROTECAO E TRANSPORTE DE VALORES

Advogados do(a) AGRAVADO: BEATRIZ BUSATTO BEREA GRASSIA - SP424303, EDUARDO ISAIAS GUREVICH - SP110258-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5022595-14.2022.4.03.0000

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

AGRAVANTE: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

AGRAVADO: PROTEGE S/A PROTECAO E TRANSPORTE DE VALORES

Advogados do(a) AGRAVADO: BEATRIZ BUSATTO BEREA GRASSIA - SP424303, EDUARDO ISAIAS GUREVICH - SP110258-A

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R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de agravo de instrumento interposto pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL à concessão de liminar, no mandado de segurança 5002200-10.2022.4.03.6108, impetrado por PROTEGE S/A – PROTEÇÃO E TRANSPORTE DE VALORES, que “determinou que a autoridade ‘a quo’ coatora se abstenha de inabilitar a impetrante pelo fato de não apresentar a declaração de que trata a cláusula ‘8.5.2’ do edital do Pregão Eletrônico nº 0276/2022 — CECOT/BU ou, ainda, de não possuir base operacional em Divinópolis/MG ou em município situado em um raio de, no máximo, 50 km do marco zero deste município”.

Alegou a CEF que: (1) a Constituição Federal prevê, no artigo 37, possibilidade da Administração Pública exigir qualificações técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações contratadas; (2) o artigo 51, IV, do Regulamento de Licitações e Contratos da CAIXA, editado em observância ao artigo 40 da Lei 13.303/2016, prevê “qualificação técnica, restrita a parcelas do objeto técnica ou economicamente relevantes, de acordo com parâmetros estabelecidos de forma expressa no instrumento convocatório”, cabendo ao gestor operacional definir regras de acordo com necessidades do serviço a ser contratado, e, no caso, “foi estabelecida a qualificação técnica necessária nos termos publicados no Edital Pregão Eletrônico 0276/2022, de forma a garantir a eficiência dos serviços contratados, evitando atrasos e/ou não-comparecimento aos atendimentos devido as longas distâncias que deverão ser percorridas pelas contratadas”; e (3) “a existência de base nas condições conforme edital publicado deve-se à necessidade operacional de atendimento às unidades da CAIXA contempladas no edital, de modo a viabilizar o suprimento/recolhimento de numerário em horários compatíveis às necessidades da CAIXA, de acordo com a legislação relativa à circulação de carros-fortes”.

Manifestou-se PROTEGE S/A espontaneamente nos autos pelo indeferimento do pedido de antecipação da tutela recursal, alegando que: (1) o único fundamento utilizado pela CEF para pleitear tutela recursal foi que a Administração Pública possui prerrogativa de definir qualificação técnica a ser exigida em procedimento licitatório, nos termos do artigo 37, XXI, CF, sendo que a exigência do item 8.5.2 do edital, da licitante possuir base operacional em Divinópolis/MG, ou município localizado em raio de até 50 km, tem por objetivo garantir eficiência dos serviços contratados, evitando atrasos ou não-comparecimentos; (2) os editais de licitação da CEF são os únicos a impor tal exigência, embora possível prestar o serviço contratado, por possuir base operacional distante mais de 50km, como ocorre em contrato de prestação de serviço de objeto idêntico (“serviços de transporte de valores, processamento de numerário e custódia de valores e abastecimento e apoio logístico a terminais de autoatendimento, no regime de empreitada por preço unitário”) estabelecido entre unidade que possui com base operacional em Goiânia/GO e o Banco do Brasil localizado em Uberlândia/MG (contrato administrativo 2021/7421-6558; licitação 2021/03232), distando exatos 337,3km; (3) no pregão eletrônico 0276/2022 da CEF em Divinópolis/MG, pretende utilizar a base operacional de Belo Horizonte/MG, distante 136,7km, ou seja, muito inferior à do contrato com o Banco do Brasil em Uberlândia/MG, não havendo como concluir, pois, que haverá prejuízo na prestação do serviço; (4) o artigo 37, XXI, CF, prevê somente cláusulas com qualificações técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento do contrato administrativo; (5) a exigência de qualificação técnica não-essencial à execução do contrato restringe indevidamente a participação de interessados, impedindo a busca da melhor proposta, violando o princípio da soberania do interesse público; e (6) ofertou proposta vencedora de R$ 755.847,92 inferior à da segunda colocada, que com sua inabilitação, torna menos vantajosa a contratação do serviço, afetando o interesse público.

A antecipação de tutela foi deferida para suspender os efeitos da decisão recorrida, mantendo a inabilitação da PROTEGE S/A no certame (Id 263645369, f. 02).

Contra tal decisão, a PROTEGE S/A interpôs agravo interno, com pedido de reconsideração (Id 264186820, f. 01), reiterando alegações contidas na manifestação anterior à concessão da antecipação de tutela (Id 262789816), aduzindo que “a prestação dos serviços objeto do Pregão Eletrônico nº 0276/2022 não será exclusivamente no município de Divinópolis, mas também em municípios próximos, ocorrendo transporte de valores em território ‘interurbano’”. Ressaltou que, diferentemente do decidido, o contrato administrativo paradigma estabelecido entre a ora recorrente e o Banco do Brasil em Uberlândia (contrato 2021/7421-6558) possui objeto semelhante ao licitado no Pregão Eletrônico CEF 0276/2022, com previsão de transporte e custódia de valores; e prestação de serviços “interurbanos”, ou seja, fora dos limites dos municípios de execução do contrato.

O pedido de reconsideração foi indeferido (Id 264388445, f. 01) e houve novo pedido de reconsideração (Id 264437173, f. 01), objetivando, uma vez mais, assegurar, até o julgamento final do próprio writ na origem, a suspensão do trâmite do Pregão Eletrônico 276/2022, pois, em razão da liminar concedida na origem e reformada nesta Corte, foi notificada a apresentar documentos exigidos no edital. O novo pedido de reconsideração foi indeferido (Id 264476306, f. 01).

A CEF apresentou resposta ao agravo interno da PROTEGE S/A (Id 264612147, f. 01).

Houve contraminuta da PROTEGE S/A pelo desprovimento do recurso (Id 265000194, f. 01).

O Ministério Público Federal manifestou-se pela desnecessidade de intervenção como custos legis, tendo em vista a demanda tratar de interesses individuais disponíveis (Id 267112811, f. 01).

É o relatório.

 

 


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V O T O

 

 

Senhores Desembargadores, a medida liminar foi deferida nos seguintes termos (Id 259502498):

 

“Vistos em plantão judiciário.

Trata-se de mandado de segurança preventivo, com requerimento de medida liminar, impetrado pela sociedade empresária Protege S/A — Proteção e Transporte de Valores, devidamente qualificada nos autos, em face de comportamento comissivo iminente atribuído à pregoeira oficial da Central Nacional de Contratações de Bauru (CECOT/BU), autoridade administrativa posicionada na intimidade estrutural da Caixa Econômica Federal, empresa pública vinculada ao Ministério da Economia.

Nesta sede processual mandamental, a impetrante almeja provimento jurisdicional que lhe assegure a participação no Pregão Eletrônico nº 0276/2022 — CECOT/BU, sem que para isso tenha de observar a cláusula ‘8.5.2’ do instrumento convocatório do certame.

A referida cláusula institui requisito de qualificação consistente na ‘[d]eclaração da licitante de que no momento da contratação, possuirá veículos especiais e base operacional de atendimento no(s) município(s) listado(s) abaixo [Divinópolis/MG], e/ou outro município, desde que esteja localizado em um raio de no máximo, 50 km do marco zero destes municípios, equipamentos e aparelhamento adequados e compatíveis para a execução dos serviços objeto deste edital’ (Id. 259435279).

Em apertada síntese, a causa de pedir consiste nas seguintes alegações: a cláusula editalícia impugnada restringe o caráter competitivo do certame, na medida em que consagra exigência de qualificação técnica não essencial à garantia do cumprimento do contrato; a impetrante possui base operacional em Belo Horizonte/MG, distante aproximadamente 150 Km de Divinópolis/MG, da qual pretende se servir para desempenhar o serviço representativo do objeto licitado; a impetrante presta, com desenvoltura, serviços análogos aos ora licitados para as agências do Banco do Brasil de Uberlândia/MG, e para isso se serve de base operacional sediada em Goiânia/GO, a aproximadamente 350 Km das agências bancárias atendidas.

A petição inicial veio instruída com procuração e documentos (Ids. 259435261 a 259435292).

Certificaram-se a falta de recolhimento das custas iniciais e a retificação dos registros processuais (Id. 25948467)

É o relatório. Fundamento e decido.

Ante a natureza do procedimento judicial, o juízo federal plantonista é competente para examinar o requerimento de tutela provisória de urgência (art. 1º, alínea “a”, da Resolução nº 71/2009, do Conselho Nacional de Justiça).

Nos termos do art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009, será cabível medida liminar em mandado de segurança ‘quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica’. Em outras palavras, defere-se a tutela de urgência na ação mandamental quando presentes o fumus boni juris e o periculum in mora.

Cumpre, então, perquirir se tais requisitos estão presentes no caso concreto ora sub judice.

A questão submetida ao escrutínio do Poder Judiciário consiste em saber se a exigência formulada por intermédio da cláusula ‘8.5.2’ do edital do Pregão Eletrônico nº 0276/2022 — CECOT/BU adere ao bloco de juridicidade e, nesta medida, se a impetrante tem direito líquido e certo à habilitação no certame independentemente da declaração de existência ou da efetiva existência de base operacional em Divinópolis/MG ou em município situado em um raio de, no máximo, 50 km do marco zero deste município. A primeira indagação merece resposta negativa; a segunda, afirmativa.

Decerto, a norma que consagra a teoria da separação dos poderes, plasmada no art. 2º da Constituição Federal, franqueia à Administração Pública significativo espaço de autonomia para eleger prioridades e, a partir de então, forjar estratégias e estruturas predispostas à consecução do interesse geral correspondente. Entretanto, daí não se segue que o exercício de competências administrativas discricionárias seja absoluto, incondicionado ou desregrado. Definitivamente, não o é.

Por imperativo constitucional, a Administração Pública de qualquer dos poderes políticos do Estado, em todos os níveis federativos, está sujeita ao princípio da legalidade (art. 37, caput). Este mandamento de otimização tem em perspectiva a busca de um estado ideal de coisas mediante a sujeição da potestade pública à lei e ao direito (art. 2º, parágrafo único, I, da Lei nº 9.784/1999). O substantivo ‘lei’, para este fim, tem acepção ampla, e corresponde à normatividade constitucional, legal e regulamentar.

Em matéria de licitação e contratação administrativa, impõe-se a observância daquilo que se contém no art. 37, XXI, parte final, da Constituição Federal. Na dicção deste dispositivo constitucional, ‘ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações’ (destaquei).

Sublinhe-se a restrição inscrita na parte final da previsão constitucional: as normas legais e infralegais que regulam o processo administrativo destinado a selecionar a proposta mais vantajosa para ulterior contratação pública não pode veicular exigências de qualificação técnica e econômica dissociadas da necessidade de garantia do cumprimento do negócio jurídico publicístico.

No âmbito das empresas públicas e das sociedades de economia mista, a licitação está sujeita ao disposto no art. 58, II, da Lei nº 13.303/2016, segundo o qual a ‘habilitação será apreciada exclusivamente a partir dos seguintes parâmetros: […] qualificação técnica, restrita a parcelas do objeto técnica ou economicamente relevantes, de acordo com parâmetros estabelecidos de forma expressa no instrumento convocatório’ (destaquei).

Interpretação literal do enunciado normativo poderia sugerir que o espaço de conformação administrativa é amplíssimo e, portanto, não haveria limites rígidos para o delineamento das exigências de qualificação técnica. Porém, não é disso que se trata, máxime diante do incremento da processualidade administrativa e da vinculação da ação estatal a princípios de finalidade, razoabilidade, proporcionalidade, segurança jurídica, interesse público e eficiência (art. 2º, caput, da Lei nº 9.784/1999)

Nessa linha de intelecção, convém tomar de empréstimo, por analogia, o art. 30, II, parte final, da Lei nº 8.666/1993 — subsidiariamente aplicável ao pregão (art. 9º da Lei nº 10.520/2002) —, ainda em vigor, e o art. 67, III, da Lei nº 14.133/2021.

De acordo com o primeiro dispositivo, acima mencionado, a ‘documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á a: […] comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos’ (destaquei).

O segundo comando legal sob exame estabelece que a ‘documentação relativa à qualificação técnico-profissional e técnico-operacional será restrita a: […] indicação do pessoal técnico, das instalações e do aparelhamento adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada membro da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos’ (destaquei).

Não passa despercebida a norma de exclusão contemplada no art. 1º, § 1º, da Lei nº 14.133/2021, que retira de seu espectro de abrangência as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as respectivas subsidiárias. Entretanto, a Lei nº 8.666/1993 ainda está em vigor, e sua invocação é bastante para os fins colimados com a aplicação analógica ora implementada. De resto, o art. 67, III, da Lei nº 14.133/2021 é empregado com o exclusivo propósito de delimitar o sentido e o alcance da qualificação técnica referida no art. 58, II, da Lei nº 13.303/2016, cuja eficácia jurídica não sofre mitigação.

Presente esse contexto, impõe-se reconhecer que, no tocante às instalações do contratado, as exigências de qualificação técnica não podem exorbitar daquilo que goze dos atributos da adequação e da disponibilidade para a execução do objeto contratual.

No caso concreto, o certame tem por objeto a contratação de serviços comuns de transporte, tratamento e custódia de valores para agências da Caixa Econômica e casas lotéricas para a região de Divinópolis/MG. Contudo, há um impasse no tocante à cláusula editalícia que considera requisito da habilitação a apresentação de declaração de existência de base operacional em Divinópolis/MG ou em município situado em um raio de, no máximo, 50 km do marco zero deste município (cláusula ‘8.5.2’).

A decisão proferida na impugnação apresentada pela impetrante permite concluir que a autoridade coatora se ampara no princípio da separação dos poderes, na discricionariedade administrativa de que se acha investida, nas peculiaridades da região que será atendida pela contratada, na potencial existência de quatro licitantes credenciáveis (cf. pregão realizado para a região de Montes Claros/MG), e, finalmente, em entendimento manifestado pelo Plenário do Tribunal de Contas da União há quase 10 anos (Acórdão nº 255/2013, rel. min. Valmir Campelo).

Contudo, tais argumentos não resistem a uma análise mais aprofundada dos contextos jurídico e factual.

A ideia de que o aludido limite espacial é fundamental para o sucesso da execução contratual é posto em xeque diante da constatação de que a impetrante presta serviços para agências do Banco do Brasil situadas em Uberlândia/MG, e para isso recorre à base operacional de Goiânia/GO, distante 337,3 Km.

Ainda que a minuta do contrato refira o atendimento a casas lotéricas da região de Divinópolis/MG, numa distância superior aos 118 Km que separam este município e a capital mineira, há indícios robustos de que a impetrante possui veículos e instalações bastantes para a satisfação do interesse público substantivado nas atividades de transporte, coleta e tratamento de valores sob a custódia da Caixa Econômica Federal e de seus permissionários no Polo Oeste do Estado de Minas Gerais.

A eventual imprecisão da estimativa da impetrante quanto ao número de licitantes passíveis de credenciamento não constitui fundamento bastante para a autoridade coatora adotar medidas limitativas da concorrência. Dito de outra forma, a existência de mais de duas sociedades empresárias elegíveis à disputa — a exemplo do que se verificou no pregão realizado para a região de Montes Claros/MG — não legitima a formulação de exigências que alijem a impetrante do certame.

Por fim, o precedente do Tribunal de Contas da União deve ser lido com parcimônia, porque retrata um juízo valorativo formulado noutra conjuntura histórico-social. Não é seguro afirmar que, se voltasse à pauta da corte de contas, o caso teria o mesmo encaminhamento de antanho.

O perigo da demora está relacionado à iminência das sessões de credenciamento e apresentação da documentação correspondente às propostas e à habilitação — respectivamente, 9h e 10h do dia 12 de agosto de 2022 (hoje).

Em face do exposto, defiro a medida liminar e determino que a autoridade coatora se abstenha de inabilitar a impetrante pelo fato de não apresentar a declaração de que trata a cláusula “8.5.2” do edital do Pregão Eletrônico nº 0276/2022 — CECOT/BU ou, ainda, de não possuir base operacional em Divinópolis/MG ou em município situado em um raio de, no máximo, 50 km do marco zero deste município”.

 

No caso, a Caixa Econômica Federal, através da Centralizadora Nacional Contratações - Bauru (CECOT/BU), promoveu o Pregão Eletrônico 0276/2022 para Prestação de serviços comuns de transporte, tratamento e custódia de valores para Unidades CAIXA, unidades lotéricas (UL), Clientes CAIXA AQUI (CCA) e Clientes, no âmbito do Estado de Minas Gerais, Item Divinópolis, pelo prazo de 24 (vinte e quatro) meses”.

O edital previu como requisito para qualificação técnica, no “item 8.5.2”, base operacional da participante em raio de, no máximo, 50km do marco zero do município de Divinópolis (Id 262538565, f. 87):

 

“8 DOCUMENTAÇÃO NECESSÁRIA PARA HABILITAÇÃO

[...]

8.5 A qualificação técnica será comprovada mediante:

[...]

8.5.2 Declaração da licitante de que no momento da contratação, possuirá veículos especiais e base operacional de atendimento no(s) município(s) listado(s) abaixo, e/ou outro município, desde que esteja localizado em um raio de no máximo, 50 km do marco zero destes municípios, equipamentos e aparelhamento adequados e compatíveis para a execução dos serviços objeto deste edital:

Item: Divinópolis

Município(s) de Localização da Base: Divinópolis”

 

Na impetração, a agravada impugnou tal requisito de habilitação técnica, alegando que (i) a CEF é a única instituição financeira a impor tal exigência; (ii) possui contrato de prestação de serviço de objeto idêntico com o Banco do Brasil em Uberlândia tendo base operacional estabelecida em Goiânia/GO, distando 337,3km, o que demonstra ser possível prestar, de forma excelente, o serviço de transporte de valores possuindo base operacional distante mais de 50km; (iii) para o pregão eletrônico CAIXA 0276/2022 tem base operacional em Belo Horizonte, distante 136,7km de Divinópolis, não havendo prejuízo na prestação do serviço; (iv) o artigo 37, XXI, CF, prevê que somente podem ser exigidas qualificações técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento do contrato administrativo; (v) qualificação técnica não-essencial à execução do contrato restringe indevidamente a participação de interessados, impedindo a Administração Pública de buscar melhor proposta, violando princípio da soberania do interesse público, tendo feito roposta vencedora de R$ 755.847,92 inferior à da segunda colocada.

Embora alegue que contrato com Banco do Brasil em Uberlândia, atendido por base operacional em Goiânia (contrato 2021/7421-6558 e licitação 2021/03232) deva servir de paradigma para afastar exigência da licitação promovida pela CEF, que fixou distância máxima de 50km entre a agência de Divinópolis e a respectiva base operacional, é certo que as normas supostamente violadas não permitem adotar simetria para vincular instituições distintas a mesmo critério técnico, desconsiderando razões e circunstâncias que motivaram, em cada caso, critério distinto e próprio quanto à distância da base operacional da empresa de transporte de valores para prestação do serviço a ser contratado.

De toda sorte, ainda que, por hipótese, pudesse ser relevante tal simetria, revelam os autos que o conteúdo da contratação apontada não corresponde ao que se pretende extrair como critério vinculante para a espécie.

O contrato firmado com Banco do Brasil S/A em Uberlândia (Contrato 2021/7421-6558) abrangeu “serviços de transporte de valores, processamento de numerário e custódia de valores e abastecimento e apoio logístico a terminais de autoatendimento [...] para as dependências [...] a partir do estado de Minas Gerais - Lotes 01 a 03” (Id 262538567, f. 115), prevendo "Termo de Referência” que o endereço de “bases da transportadora de valores” seria “indicado pelo BB” posteriormente (Id 262538567, f. 102).

Na contratação inicial (Contrato 2021/7421-6558), sagrando-se a agravada vencedora na Licitação Eletrônica 2021/03232(7421), Banco do Brasil definiu a base operacional da transportadora em Uberlândia para serviços definidos nos três lotes licitados (Lote 01, Lote 02 e Lote 03).

De acordo com o “Documento 03” de tal certame do Banco do Brasil (Id 262538567, f. 172):

 

(1) o lote 1 abrange (i) serviços de “Transporte de Valores” em território “Urbano/intermunicipal”; (ii) “Abastecimento e Apoio Logístico a Terminais de Autoatendimento” em área “microrregional” e “regional 01”; e (iii) “Processamento de Numerário e Custódia de Valores”;

(2) o lote 2 abrange (i) “Transporte de Valores” em território “Interurbano”; e (ii) “Processamento de Numerário e Custódia de Valores”; e

(3) o lote 3 abrange (i) “Transporte de Valores” em “Comboio Interurbano”.

 

Cabe destacar que, para delimitação territorial da área de prestação do serviço de transporte, o “Documento 1 do Contrato 2021/7421-6558” fixou o seguinte (Id 262538567, f. 142):

 

“A.1) Urbano/Intermunicipal - transporte de valores realizado entre dependências localizadas em um raio de até 50 (cinquenta) Km da base supridora indicada pelo CONTRATANTE;

A.5) Interurbano - transporte de valores realizado entre dependências indicadas pelo CONTRATANTE e localizadas num raio acima de 50 Km da supridora indicada pelo CONTRATANTE...

[...]

A.7) Comboio Interurbano – transporte de valores realizado entre duas dependências indicadas pelo CONTRATANTE, localizadas num raio acima de 50 km da supridora indicada no lote, com a utilização de dois ou mais carros-fortes para o transporte dos valores. Será assegurada a condução de valores nos dois sentidos do percurso, bem como a realização de uma única viagem ininterrupta para recolhimento e/ou entrega de valores.

[...]

a) Regional 1 – Abastecimentos a terminais de autoatendimento com distância entre o terminal e a supridora indicada pelo CONTRATANTE em um raio acima de 50 (cinquenta) km e até 100 (cem) km”.

 

Com tais esclarecimentos é possível verificar que o “ADITIVO Nº 3 AO CONTRATO Nº 202174216558 CELEBRADO ENTRE O BANCO DO BRASIL S.A. E PROTEGE S/A PROTEÇÃO E TRANSPORTE DE VALORES” promoveu alterações no contrato, incluindo alteração da base operacional da agravada, de Uberlândia para Goiânia, apenas em relação ao lote 3, ou seja, para “Transporte de Valores” em “Comboio Interurbano”, mantendo-se, quanto aos demais lotes, a base operacional em Uberlândia (Id 262538567, f. 108).

Resta claro, pois, que a alteração da base operacional foi adotada para suprir necessidade pontual da instituição financeira, dentro do estabelecido e permitido em contrato quanto à definição da base operacional (“...endereço a ser indicado pelo BB”), tendo decorrido, como visto, da constatação de que o serviço de transporte de valores em “Comboio Urbano” prestado pela agravada - cuja frequência é eventual (item A.7 do Documento 1 do Contrato 2021/7421-6558: “Comboio Interurbano: a) Transporte realizado em COMBOIO, sem frequência preestabelecida, sendo considerado sempre como ‘Eventual’, independentemente da quantidade de viagens realizadas”) - ocorria (ou viria a ocorrer) com mais frequência entre Uberlândia e Goiânia, conforme demonstram notas fiscais de prestação de serviços emitidos, sendo razoável, por questão logística, estabelecer naquela hipótese a base operacional em uma das duas cidades, optando-se pela segunda (Id 262538567, f. 190).

Assim, não é viável a partir de tal alteração, pontual e específica, da base operacional da agravada em contrato com Banco do Brasil, em hipótese exclusivamente de transporte de valores em distâncias acima de 50Km, pretender fixar paradigma para licitação da Caixa Econômica Federal, instituição distinta, e para prestação de serviço em realidade, condições e circunstâncias diversas. 

No caso, o “Termo de Referência” do edital do “Pregão Eletrônico nº 0276/2022” da Caixa Econômica Federal não definiu locais de maior frequência em transportes para serviços “urbanos” e “interurbanos” (até 50km e acima de 51km, respectivamente – item 3.2.1 e 3.2.2 do edital), para permitir, com base em critérios logísticos, fixação de base operacional em contrariedade à previsão do edital. 

Acresça-se que a pretensão de dispensar declaração de exigência de base operacional no próprio município almeja possibilitar estabelecimento de base operacional em local distante tanto para serviços “urbanos” e “interurbanos” (ou seja, a serem prestados até 50km e acima de 51km, respectivamente, do município de Divinópolis – item 3.2.1 e 3.2.2 do edital), o que não ocorre no contrato com Banco do Brasil, que possibilitou tal alteração apenas para transportes entre pontos distantes e, ainda assim, exclusivamente para modalidade de transporte em “Comboio Interurbano”, para local em que se vislumbrou frequência de viagens e que se revelaria mais econômico e eficiente.

A alteração pretendida na impetração para fixação de base operacional distante, a abranger tanto transportes de valores para locais próximos como distantes, gera concreto risco de prejuízo à execução do contrato, violando o próprio objetivo da licitação, por interesse exclusivamente econômico da agravada, inclusive porque há expressa previsão no edital de serviços de embarque emergencial, em que há necessidade de atendimento no prazo de duas horas a partir da solicitação, para serviços urbanos, conforme previsto no item 3.3.4 do edital:

 

“3.3.4 EMBARQUE EMERGENCIAL: Serviços a serem realizados mediante solicitação no dia da prestação do serviço, para atendimento no prazo de 02 (duas) horas para os serviços urbanos e 05 (cinco) horas para os serviços interurbanos, contadas a partir do ato da solicitação pela CAIXA, ou em horário previamente acordado entre as partes, para coletas com entregas imediatas, nas condições e horários de interesse da CAIXA”.

 

A adequação e necessidade de adoção e previsão no edital (item 8.5.2) de declaração de que “no momento da contratação, possuirá veículos especiais e base operacional de atendimento” em Divinópolis ou outro município, desde que no raio máximo 50km, foi realçado, inclusive, quando houve “Julgamento de Impugnação ao edital do Pregão 0276/2022”  ofertada pela agravada (Id 262538567, f. 90):

 

“Com relação ao pleito, não procede sua alegação sobre a mácula na competitividade do certame. Em suas afirmações, a empresa impugnante não leva em consideração que as exigências de qualificação técnica, mais especificamente no que diz respeito à distância máxima delimitada, de 50 Km entre a base e o município de Divinópolis, apresenta-se no Edital de forma a garantir excelência no atendimento ao interesse público, bem como tempestividade na prestação dos serviços de acordo com as necessidades da CAIXA”.

 

Além de o contrato com Banco do Brasil em Uberlândia não possuir identidade em relação às circunstâncias envolvidas na contratação, resta claro que a excepcionalidade da alteração da base operacional para local distante, naquele caso, teve motivo legal e logístico específico, imprevisto na licitação da Caixa Econômica Federal, não se tratando, pois, de qualificação técnica ilegal, despida de razoabilidade ou finalidade própria de garantir cumprimento de futuro contrato, inexistindo ofensa ao artigo 37, XXI, CF, nem de procedimento contrário à busca da melhor proposta com violação ao princípio da soberania do interesse público, em prejuízo ao erário.

Não cabe, pois, alegar que ofertou menor preço e que disto resultou ofensa às normas de regência do processo licitatório se, para tanto, a proposta não observou exigência do edital no tocante à localização da base operacional, enquanto elemento essencial à garantia do cumprimento do contrato com todas as circunstâncias previstas para prestação do serviço, o que, por certo, influenciou na redução de custos, dado que envolveu utilização de base operacional existente, mas distante além do máximo previsto no edital, e não a instalação de nova base operacional em localidade capaz de atender interesse logístico do serviço a ser prestado.

Sucede que nem no contrato com Banco do Brasil coube à contratada escolher base operacional de preferência, já que tal atribuição foi atribuída exclusivamente à contratante em condições especificadas e distintas das aplicáveis ao edital em discussão nos presentes autos. 

Ainda que fosse o caso de contratos com a mesma instituição financeira, mas envolvendo agências em municípios diversos e, portanto, com situação logística própria no tocante aos serviços contratados - e, com maior razão, em se tratando de instituições financeiras distintas -, não haveria fundamento para invocar simetria dissociada de circunstâncias de cada caso concreto em detrimento da presunção de legitimidade do ato de entidade sujeita ao regramento inerente à Administração Pública, como se pretende, sobretudo em sede de juízo sumário da controvérsia.

Mesmo que a PROTEGE S/A alegue que ambos os contratos (o ora discutido, da CEF, e o paradigma, do Banco do Brasil) possuem previsão de transportes “interurbanos” de valores, ou seja, fora dos limites territoriais do município em que localizada a unidade da instituição financeira, não se pode a partir apenas de tal dado e da análise genérica do contrato administrativo 2021/7421-6558, firmado com Banco do Brasil, concluir que o motivo de aceitação de base operacional em município distante mais de 300 quilômetros naquele contrato seja aplicável e exigível no contrato com a Caixa Econômica Federal (Pregão Eletrônico 0276/2022), a despeito do previsto na respectiva licitação, e que nesta contratação existam iguais razões que justificaram a aceitação da medida naquele pacto.

Conforme já registrado, devem ser consideradas causas logísticas ao longo da execução daquele contrato com o Banco do Brasil, mormente o termo de referência que originou tal contratação, indicando que o endereço das “bases da transportadora de valores” seria “endereço a ser indicado [posteriormente] pelo BB”. Por outro lado, a adoção de base territorial distante somente ocorreu quanto ao “item 3” do contrato do Banco do Brasil (especificamente no transporte intermunicipal em comboio), e não em relação à totalidade do objeto, que envolve transporte municipal e intermunicipal comum.

As contratações de tais serviços de transportes de valores são antecedidas de estudos de viabilidade técnica, e o edital e o contrato adotam cláusulas e disposições decorrentes de tais análises, de modo que não basta, para anulá-las por ofensa ao interesse público, invocar comparativo inadequado e genérico de cláusulas e contratos sem atentar para condições e circunstâncias específicas de cada licitação e contratação de serviços, conforme focos operacionais próprios, prestação de serviços em localidades diversas, entre outras características pertinentes a cada contratante e contratação. 

Mesmo que alegado que, “ainda que haja alguma falha na prestação por parte da Agravante – o que se admite somente por hipótese – haverá apólice de seguro em vigor, que garantirá a execução do serviço 1, e há previsões contratuais e editalícias de penalidades à Agravante pela não execução do contrato administrativo”, é certo que o interesse público a ser protegido diz respeito à contratação de serviço-meio através do qual possa a entidade pública prestar, eficientemente, o próprio serviço público que lhe foi legalmente atribuído. A reparação de eventuais danos pela prestadora de serviço contratada não dispensa a Caixa Econômica Federal de exigir qualificações técnicas indispensáveis à garantia do objeto do contrato, razão pela qual a existência de apólice de seguro, obrigação prevista no contrato, não exonera, qualquer das partes, de exigir e de atender requisitos técnicos e operacionais previstos no edital. 

Em verdade, a previsão de garantias e sanções à contratada constitui meio indireto de compelir o cumprimento com rigor, retidão e exatidão do contrato, de modo que mera existência de tal estipulação não demonstra a falta de prejuízo à prestação do serviço à contratante.

A proposta de adoção de base operacional fora dos critérios técnicos do edital para prestação de serviço essencial à atividade econômica da contratante, por envolver segurança no trato e transporte de valores, configura, por si, violação ao edital e impedimento à respectiva admissão, por incompatível com o regramento e o próprio princípio da isonomia, que exige sejam tratados todos os licitantes sem qualquer discriminação de critérios para contratação.

Não é preciso, pois, aguardar o descumprimento do contrato a ser firmado para concluir que o prejuízo ao interesse público já restou consumado, se admitida proposta com adoção de base operacional, contrariando as previsões do edital. Nem é preciso que tal descumprimento ocorra, dado que admitir proposta que não cumpra requisito técnico essencial do edital já basta para tornar ilegal eventual homologação, adjudicação e contratação. 

Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, e julgo prejudicado o agravo interno da PROTEGE S/A.

É como voto.



E M E N T A

 

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PREGÃO ELETRÔNICO 0276/2022. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. SERVIÇO DE TRANSPORTE, TRATAMENTO E CUSTODIA DE VALORES. AGÊNCIA DE DIVINÓPOLIS. QUALIFICAÇÃO TÉCNICA. BASE OPERACIONAL EM RAIO DE NO MÁXIMO 50 KM. RAZOABILIDADE DA EXIGÊNCIA. CRITÉRIOS TÉCNICOS E DISCRICIONÁRIOS BASEADOS EM ESTUDOS ANTECEDENTES AO CERTAME. FALTA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA E SUFICIENTE A AFASTAR A PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE DA EXIGÊNCIA. CONTRATO PARADIGMA. BANCO DO BRASIL. DISTINÇÃO E INAPLICABILIDADE AO CASO: EXIGÊNCIAS ESPECÍFICAS PARA AQUELA HIPÓTESE. INSUFICIÊNCIA DE SEGURO GARANTIA E PENALIDADES POR DESCUMPRIMENTO DO CONTRATO. POSSIBILIDADE DE DANO AO SERVIÇO PRESTADO PELA CONTRATANTE.

1. Não se autoriza descumprimento de edital para prestação de serviços à Caixa Econômica Federal, agência de Divinópolis, a partir da tese de falta de razoabilidade de critério técnico para localização da base operacional no próprio município ou em local até 50km de distância, invocando paralelo com contrato firmado com Banco do Brasil para outra agência e prestando outros serviços. 

2. Embora alegue que contrato com Banco do Brasil em Uberlândia, atendido por base operacional em Goiânia deva servir de paradigma para afastar exigência da licitação feita pela CEF, que fixou distância máxima de 50km entre a agência de Divinópolis e a respectiva base operacional, é certo que as normas supostamente violadas não permitem adotar simetria para vincular instituições distintas a mesmo critério técnico, desconsiderando razões e circunstâncias que motivaram, em cada caso, critério distinto e próprio quanto à distância da base operacional da empresa de transporte de valores para prestação do serviço a ser contratado.

3. De toda sorte, ainda que, por hipótese, pudesse ser relevante tal simetria, verifica-se que o conteúdo da contratação apontada não corresponde ao que se pretende extrair como critério vinculante para a espécie. O contrato com Banco do Brasil S/A em Uberlândia abrangeu “serviços de transporte de valores, processamento de numerário e custódia de valores e abastecimento e apoio logístico a terminais de autoatendimento [...] para as dependências [...] a partir do estado de Minas Gerais - Lotes 01 a 03”, prevendo "Termo de Referência” que o endereço de “bases da transportadora de valores” seria “indicado pelo BB” posteriormente. Foi fixado, de início, base operacional da transportadora em Uberlândia para serviços definidos nos três lotes licitados. No aditivo 3 foi alterada a base operacional da agravada de Uberlândia para Goiânia, mas apenas quanto ao lote 3, referente a “Transporte de Valores” em “Comboio Interurbano”, sem alteração quanto aos demais lotes de serviço. A alteração da base operacional foi adotada para suprir necessidade pontual do Banco do Brasil em relação ao serviço de transporte de valores em “Comboio Urbano”, com frequência eventual, e que ocorria, em geral, entre Uberlândia e Goiânia, conforme revelam notas fiscais de prestação de serviços emitidos, sendo razoável, por questão logística, estabelecer naquela hipótese a base operacional em uma das duas cidades, optando-se pela segunda. Assim, não é viável a partir de tal alteração, pontual e específica, da base operacional da agravada em contrato com Banco do Brasil, em hipótese exclusivamente de transporte de valores em distâncias acima de 50Km, pretender fixar paradigma para licitação da Caixa Econômica Federal, instituição distinta, e para prestação de serviço em realidade, condições e circunstâncias diversas. 

4. “Termo de Referência” do edital do “Pregão Eletrônico nº 0276/2022” da Caixa Econômica Federal não definiu locais de maior frequência de viagens para serviços "urbanos" e "interurbanos" (até 50km e acima de 51km, respectivamente – item 3.2.1 e 3.2.2 do edital), para permitir que, com base em critérios logísticos, alterar a base operacional da transportadora prevista em edital. A alteração pretendida na impetração para fixação de base operacional distante, a abranger tanto transportes de valores para locais próximos como distantes, gera concreto risco de prejuízo à execução do contrato, violando o próprio objetivo da licitação, por interesse exclusivamente econômico da agravada, inclusive porque há expressa previsão no edital de serviços de embarque emergencial, em que há necessidade de atendimento no prazo de duas horas a partir da solicitação, para serviços urbanos, conforme previsto no item 3.3.4 do edital. A adequação e necessidade de adoção e previsão no edital (item 8.5.2) de declaração da transportadora de que “no momento da contratação, possuirá veículos especiais e base operacional de atendimento” em Divinópolis ou outro município no raio de até 50km, foi realçado no próprio “Julgamento de Impugnação ao edital do Pregão 0276/2022” ofertada pela agravada.

5. Além de o contrato com Banco do Brasil em Uberlândia não possuir identidade em relação às circunstâncias envolvidas na contratação, resta claro que a excepcionalidade da alteração da base operacional para local distante, naquele caso, teve motivo legal e logístico específico, imprevisto na licitação da Caixa Econômica Federal, não se tratando, pois, de qualificação técnica ilegal, despida de razoabilidade ou finalidade própria de garantir cumprimento de futuro contrato, inexistindo ofensa ao artigo 37, XXI, CF, nem de procedimento contrário à busca da melhor proposta com violação ao princípio da soberania do interesse público, em prejuízo ao erário.

6. Não cabe, pois, alegar que ofertou menor preço e que disto resultou ofensa às normas de regência do processo licitatório se, para tanto, a proposta não observou exigência do edital no tocante à localização da base operacional, enquanto elemento essencial à garantia do cumprimento do contrato com todas as circunstâncias previstas para prestação do serviço, o que, por certo, influenciou na redução de custos, dado que envolveu utilização de base operacional existente, mas distante além do máximo previsto no edital, e não a instalação de nova base operacional em localidade capaz de atender interesse logístico do serviço a ser prestado. Sucede que nem no contrato com Banco do Brasil coube à contratada escolher base operacional de preferência, já que tal atribuição foi atribuída exclusivamente à contratante em condições especificadas e distintas das aplicáveis ao edital em discussão nos presentes autos. 

7. Ainda que fosse caso de contratos com a mesma instituição financeira, mas envolvendo agências em municípios diversos e, portanto, com situação logística própria no tocante aos serviços contratados - e, com maior razão, em se tratando de instituições financeiras distintas -, não haveria fundamento para invocar simetria dissociada de circunstâncias de cada caso concreto em detrimento da presunção de legitimidade do ato de entidade sujeita ao regramento inerente à Administração Pública, como se pretende, sobretudo em sede de juízo sumário da controvérsia.

8. Mesmo que a PROTEGE S/A alegue que ambos os contratos (o ora discutido, da CEF, e o paradigma, do Banco do Brasil) possuem previsão de transportes “interurbanos” de valores, ou seja, fora dos limites territoriais do município em que localizada a unidade da instituição financeira, não se pode a partir apenas de tal dado e da análise genérica do contrato administrativo, firmado com Banco do Brasil, concluir que o motivo de aceitação de base operacional em município distante mais de 300 quilômetros naquele contrato seja aplicável e exigível no contrato com a Caixa Econômica Federal (Pregão Eletrônico 0276/2022), a despeito do previsto na respectiva licitação, e que nesta contratação existam iguais razões que justificaram a aceitação da medida naquele pacto.

9. As contratações de tais serviços de transportes de valores são antecedidas de estudos de viabilidade técnica, e o edital e o contrato adotam cláusulas e disposições decorrentes de tais análises, de modo que não basta, para anulá-las por ofensa ao interesse público, invocar comparativo inadequado e genérico de cláusulas e contratos sem atentar para condições e circunstâncias específicas de cada licitação e contratação de serviços, conforme focos operacionais próprios, prestação de serviços em localidades diversas, entre outras características pertinentes a cada contratante e contratação. 

10. Mesmo que alegado que, “ainda que haja alguma falha na prestação por parte da Agravante – o que se admite somente por hipótese – haverá apólice de seguro em vigor, que garantirá a execução do serviço 1, e há previsões contratuais e editalícias de penalidades à Agravante pela não execução do contrato administrativo”, é certo que o interesse público a ser protegido diz respeito à contratação de serviço-meio através do qual possa a entidade pública prestar, eficientemente, o próprio serviço público que lhe foi legalmente atribuído. A reparação de eventuais danos pela prestadora de serviço contratada não dispensa a Caixa Econômica Federal de exigir qualificações técnicas indispensáveis à garantia do objeto do contrato, razão pela qual a existência de apólice de seguro, obrigação prevista no contrato, não exonera, qualquer das partes, de exigir e de atender requisitos técnicos e operacionais previstos no edital. A rigor, previsão de garantias e sanções à contratada constitui meio indireto de compelir o cumprimento com rigor, retidão e exatidão do contrato, de modo que mera existência de tal estipulação não demonstra a falta de prejuízo à prestação do serviço à contratante.

11. A proposta de adoção de base operacional fora dos critérios técnicos do edital para prestação de serviço essencial à atividade econômica da contratante, por envolver segurança no trato e transporte de valores, configura, por si, violação ao edital e impedimento à respectiva admissão, por incompatível com o regramento e o próprio princípio da isonomia, que exige sejam tratados todos os licitantes sem qualquer discriminação de critérios para contratação. Não é preciso, pois, aguardar o descumprimento do contrato a ser firmado para concluir que o prejuízo ao interesse público já restou consumado, se admitida proposta com adoção de base operacional, contrariando as previsões do edital. Nem é preciso que tal descumprimento ocorra, dado que admitir proposta que não cumpra requisito técnico essencial do edital já basta para tornar ilegal eventual homologação, adjudicação e contratação. 

12. Agravo de instrumento provido, e agravo interno julgado prejudicado. 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Turma, por unanimidade, deu provimento ao agravo de instrumento da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, e julgou prejudicado o agravo interno da PROTEGE S/A, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.