APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006575-37.2020.4.03.6104
RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE
APELANTE: SCHENKER DO BRASIL TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA
Advogados do(a) APELANTE: BAUDILIO GONZALEZ REGUEIRA - SP139684-A, JOAO PAULO ALVES JUSTO BRAUN - SP184716-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006575-37.2020.4.03.6104 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: SCHENKER DO BRASIL TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA Advogados do(a) APELANTE: BAUDILIO GONZALEZ REGUEIRA - SP139684-A, JOAO PAULO ALVES JUSTO BRAUN - SP184716-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: [ialima] R E L A T Ó R I O Embargos de declaração opostos pela União contra acórdão que deu provimento à apelação para reformar a sentença e reconhecer a ocorrência da prescrição intercorrente na via administrativa (Id 263557631). Aduz (Id 264996940) que o decisum é omisso, aos argumentos de que: a) as obrigações aduaneiras, isto é, os encargos com o objetivo de facilitar o controle aduaneiro, por meio da fiscalização de tributos, podem ser classificadas obrigações tributárias acessórias que, pela sua inobservância, se convertem em principal, nos termos do artigo 113 do Código Tributário Nacional; b) na forma dos artigos 766 e 768 do Decreto n.º 6.759/09, o crédito tributário abrange a penalidade, de modo que que é inegável a natureza jurídico-tributária das sanções aduaneiras; c) com a lavratura do auto de infração e sua notificação ao sujeito passivo da obrigação tributária consuma-se o lançamento do crédito tributário. Após, se houver impugnação do contribuinte, instaura-se o contencioso administrativo fiscal (artigo 14 do Decreto n.º 70.235/72), com a consequente suspensão de exigibilidade do crédito tributário (artigo 151, inciso III, do CTN) e da prescrição; c) o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 622: a notificação do auto de infração faz cessar a contagem da decadência para a constituição do crédito tributário; exaurida a instância administrativa com o decurso do prazo para a impugnação ou com a notificação do seu julgamento definitivo e esgotado o prazo concedido pela Administração para o pagamento voluntário, inicia-se o prazo prescricional para a cobrança judicial. A leitura da súmula jurisprudencial deixa claro que a prescrição não flui durante o curso do contencioso administrativo tributário; d) conforme a Súmula n.º 11 do Conselho Administrativo de Recursos Fiscal, não se aplica a prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal; e) há incompatibilidade na aplicação do artigo 1º, §1º, da Lei 9.873/99 aos processos administrativos que discutem multas aduaneiras, pois o princípio da actio nata o torna incompatível com o Decreto n.º 70.235/72 e o artigo 151, inciso III, do CTN; f) a Lei n.º 9.873/99, em seu artigo 5º, expressamente salienta que as disposições nela contidas não se aplicam aos processos e procedimentos de natureza tributária, de modo que reconhece a autonomia do processo administrativo fiscal. Por fim, prequestiona os artigos 113, §§ 2º e 3º e 151, inciso III, do Código Tributário Nacional, 3º da Lei n.º 6.562/78, 1º, §1º, e 5º, da Lei 9.873/99, 707, inciso II, 766 e 768 do Decreto n.º 6.759/09. Transcorreu in albis o prazo para resposta da parte embargada. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006575-37.2020.4.03.6104 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: SCHENKER DO BRASIL TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA Advogados do(a) APELANTE: BAUDILIO GONZALEZ REGUEIRA - SP139684-A, JOAO PAULO ALVES JUSTO BRAUN - SP184716-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Ao contrário do afirmado pela parte embargante, não se verifica a omissão na análise da prescrição intercorrente no processo administrativo, pois devidamente apreciada pelo decisum: Inicialmente, cumpre destacar que a atividade administrativa aduaneira tem como objetivo a fiscalização e controle das operações de comércio exterior, com vista a garantir os direitos da sociedade à segurança, à saúde, ao meio ambiente, à propriedade intelectual, bem como dos interesses fazendários nacionais, conforme disposto nos artigos 237 da Constituição e 15 do Decreto n.º 6.759/09. No desenvolvimento das atribuições de natureza aduaneira é possível verificar a intersecção entre as esferas tributária e administrativa, com o surgimento de obrigações oriundas de uma relação aduaneira-tributária com natureza tributária e obrigações provenientes de uma relação aduaneira não-tributária, com natureza administrativa[1]. O Decreto-Lei n.º 37/66, que dispõe sobre o imposto de importação e reorganiza os serviços aduaneiros, contempla a penalidade da multa às infrações de natureza tributária, como aquelas descritas no artigo 106, diretamente relacionadas aos elementos que compõem o imposto de importação, bem como àquelas de natureza não-tributária referentes ao controle das atividades de comércio exterior, decorrentes do exercício do poder de polícia, enumeradas no artigo 107. O poder de polícia da aduana não se confunde com o tributário, porquanto distintas as suas obrigações, como leciona Rodrigo Mineiro Fernandes[2]: preferimos adotar a denominação obrigação aduaneira, sem classificá-las como principal ou acessória, visto que sua natureza sempre será vinculada ao bem jurídico protegido pelo Direito Aduaneiro, qual seja, o controle aduaneiro. Dessa forma, toda a obrigação aduaneira seria principal e essencial ao devido controle aduaneiro, previsto no art. 237 da Constituição Federal. Se a obrigação foi imposta pela autoridade aduaneira, ela estará sempre vinculada ao poder constitucionalmente outorgado à Aduana, o devido controle aduaneiro. Outra questão será a obrigação tributária, vinculada à arrecadação de tributos, essa sim classificada como principal ou acessória. No caso, a recorrida foi autuada em decorrência da inclusão intempestiva de informações no Sistema Integrado de Comércio Exterior - SISCOMEX, nos termos dos artigos 107, inciso V, alínea “e”, do Decreto-Lei n.º 37/99, 37 e 44 da Instrução Normativa SRF n.º 28/9407, que assim dispunham à época dos fatos: IN SRF n. º 28/94 Art. 37. Imediatamente após realizado o embarque da mercadoria, o transportador registrará os dados pertinentes, no SISCOMEX, com base nos documentos por ele emitidos. Art. 44. O descumprimento, pelo transportador, do disposto nos arts. 37, 41 e § 3º do art. 42 desta Instrução Normativa constitui embaraço à atividade de fiscalização aduaneira, sujeitando o infrator ao pagamento da multa prevista no art. 107 do Decreto-lei nº 37/66 com a redação do art. 5º do Decreto-lei nº 751, de 10 de agosto de 1969, sem prejuízo de sanções de caráter administrativo cabíveis Decreto-Lei n.º 37/66 Art. 107. Aplicam-se ainda as seguintes multas: (...) V - de R$ 5.000,00 (cinco mil reais): (...) e) por deixar de prestar informação sobre veículo ou carga nele transportada, ou sobre as operações que execute, na forma e no prazo estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal, aplicada à empresa de transporte internacional, inclusive a prestadora de serviços de transporte internacional expresso porta-a-porta, ou ao agente de carga; e [destaquei] Não obstante o processo administrativo fiscal federal (PAF) seja regido pelo Decreto nº 70.235/72, impende destacar que é norma que rege o processo administrativo de determinação e exigência dos créditos tributários da União e que não há disposição que trate dos institutos da decadência e da prescrição. Outrossim, em atenção ao princípio da especialidade, ao se tratar do reconhecimento desses institutos em relação à penalidade administrativa de natureza aduaneira não-tributária, é aplicável a Lei n.º 9.873/1999, verbis: Art. 1º. Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado. §1º. Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso. Art. 5º.O disposto nesta Lei não se aplica às infrações de natureza funcional e aos processos e procedimentos de natureza tributária. [destaquei] No caso, o auto de infração foi lavrado em 01.08.2013 (Id 235835947, p. 04), a empresa notificada em 16.09.2013 (Id 235835947, p. 69) com a apresentação de impugnação em 08.10.2013 (Id 235835947, p. 73/89) e julgamento em 24.02.2017 (Id 235835947, p. 169/180). Intimada em 02.05.2017, interposto o recurso voluntário em 12.05.2017 (Id 235835947, p. 243/263) e realizado o julgamento pelo CARF em 29.07.2020 (Id 235835947, p. 275/285), observa-se o decurso do prazo de três anos sem movimentação do feito. Nesse sentido, confira-se: TRIBUTÁRIO. ADUANEIRO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. MULTA SUBSTITUTIVA DA PENA DE PERDIMENTO. NATUREZA ADMINISTRATIVA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. LEI 9.873/99. OCORRÊNCIA. DESPROVIMENTO. HONORÁRIOS RECURSAIS. 1. O débito tem origem em multa administrativa substitutiva da pena de perdimento de mercadoria, aplicada no exercício do poder de polícia pela Administração Aduaneira por infração à legislação aduaneira. Não tem natureza tributária, portanto, aplicando-se as normas da Lei 9.873/99 que estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva por parte da Administração Pública Federal. 2. A prescrição em relação ao poder sancionador da Administração Púbica Federal está disciplinada na Lei 9.873/1999, que estabelece três prazos que devem ser observados: (a) cinco anos para o início da apuração da infração administrativa e constituição da penalidade; (b) três anos para a conclusão do processo administrativo; e (c) cinco anos contados da constituição definitiva da multa, para a cobrança judicial. 3. A prescrição intercorrente pressupõe a inércia da autoridade administrativa em promover atos que impulsionem de maneira eficiente o procedimento administrativo de apuração do ato infracional e constituição da respectiva multa, em período superior a três anos. O § 1º do art. 1º da Lei 9.873/1999 reputa paralisado o processo administrativo desprovido de julgamento ou despacho. 4. Verificado que o processo administrativo em questão ficou paralisado por prazo superior a três anos, reputa-se consumada a prescrição intercorrente no caso concreto. 5. Recurso de apelação desprovido. Honorários advocatícios majorados na forma do art. 85, § 11 do CPC. (TRF 4ª Região, AC 5006066-10.2020.4.04.7000, Primeira Turma, Rel. Roger Raupp Rios, j. 14.04.2021, destaquei). DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCON. MULTA ADMINISTRATIVA. CEF. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. OCORRÊNCIA. A pretensão punitiva da Administração Pública prescreve em cinco anos, contados da data do fato punível; instaurado o procedimento administrativo para apurá-lo, incide a prescrição intercorrente de trata o §1º do artigo 1º da Lei nº 9.873/99, que é de três anos. Na hipótese, resta inequívoca a ocorrência da prescrição intercorrente no processo administrativo, tendo em vista que o feito permaneceu paralisado por mais de três anos sem que houvesse a prática de qualquer ato inequívoco que importe apuração do fato ou capaz de suspender ou interromper o curso do prazo prescricional. (TRF 4ª Região, AC 5026433-60.2017.4.04.7000, Quarta Turma, Rel. Vivian Josete Pantaleão Caminha, j. 18.05.2018, destaquei). Por fim, as questões relativas aos demais dispositivos mencionados no recurso, quais sejam, 189 do CC, 113, §§2º e 3º, e 151, inciso III, do CTN, 14 e 33 do Decreto n.º 70.235/72 24 da Lei n.º 12.815/13, 564, 707, inciso II, 766, 768 e 781 do Decreto n.º 6.759/09, 46 do Decreto-Lei n.º 37/66, 69 da Lei n.º 9.784/99, 2º do Decreto-Lei n.º 2.120/84, 3º da Lei n.º 6.562/78, 27, § 4º, do Decreto-Lei n.º 1.455/76, 10 e 11, inciso III, alínea “c”, da Lei Complementar n.º 95/98, bem como a e a Súmula 11 do CARF, não interferem nesse entendimento pelos motivos já indicados. Assim, observa-se que a embargante se utiliza dos presentes embargos como verdadeira peça de impugnação aos fundamentos do decisum. Pretende claramente rediscuti-lo, o que não se admite nesta sede. Os aclaratórios não podem ser acolhidos para fins de atribuição de efeito modificativo, com a finalidade de adequação do julgado à tese defendida, tampouco para fins de prequestionamento, uma vez que ausentes os requisitos do artigo 1022 do CPC, consoante se observa das ementas a seguir transcritas: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HIPÓTESES DO ARTIGO 1.022 DO CPC/2015. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. REDISCUSSÃO DO MÉRITO DO ACÓRDÃO EMBARGADO. INADEQUAÇÃO. 1. É plenamente possível aferir-se o exato alcance do acórdão embargado e de seus fundamentos. Não há ponto omisso, obscuro ou contraditório no julgado. 2. O questionamento do acórdão pelos embargantes aponta para típico e autêntico inconformismo com a decisão, contrariedade que não enseja o acolhimento do presente recurso, uma vez que ausentes quaisquer dos vícios elencados no artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015. Embargos revestidos de nítido caráter infringente, objetivando discutir o conteúdo jurídico do acórdão. 3. Ainda que os embargos tenham como propósito o prequestionamento da matéria, faz-se imprescindível, para o conhecimento do recurso, que se verifique a existência de quaisquer dos vícios descritos no artigo 1.022 do CPC/2015. Precedentes do STJ. (...) 5. Embargos de declaração rejeitados, retificado, de ofício, o erro material existente no item 11 da ementa do acórdão embargado. (TRF 3ª Região, AC 0003399-61.2013.4.03.6111, Terceira Turma, Rel. Des. Fed. Cecília Marcondes, j. 21.11.2018, e-DJF3 Judicial 1 de 28.11.2018, destaquei). DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VÍCIOS INEXISTENTES. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS REJEITADOS. - A teor do disposto no art. 1.022 do CPC, somente têm cabimento nos casos de obscuridade ou contradição (inc. I), de omissão (inc. II) e de erro material (inc. III). - Não se presta ao manejo dos declaratórios, hipótese na qual o embargante pretenda rediscutir matéria já decidida, emprestando-lhe caráter infringente, ou sua pretensão para que sejam respondidos, articuladamente, quesitos formulados. - Mesmo que opostos os embargos de declaração objetivando ao prequestionamento, não há como se afastar o embargante de evidenciar a presença dos requisitos de que trata o artigo 1.022 do CPC. - As questões trazidas nos presentes embargos foram oportunamente enfrentadas, motivo pelo que não há falar em vícios a serem sanados. (...) - Embargos de declaração rejeitados. (TRF 3ª Região, Quarta Turma, AI 0001831-68.2017.4.03.0000, Quarta Turma, Rel. Des. Fed. Mônica Nobre, j. 24.10.2018, e-DJF3 Judicial 1 de 19.11.2018, destaquei). Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração. É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. ARTIGO 1.022 DO CPC. OMISSÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ACLARATÓRIOS REJEITADOS.
- Não há vício algum apto a ensejar a integração do julgado, nem mesmo para fins de prequestionamento. A embargante pretende, na verdade, a rediscussão do julgado, o que é inviável nesta via recursal.
- Embargos de declaração rejeitados.