
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5006693-58.2021.4.03.6110
RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS
PARTE AUTORA: I. L. D. S. O.
REPRESENTANTE: DAYANE KELLY DA SILVA OLIVEIRA
Advogados do(a) PARTE AUTORA: GRAZIELA COSTA LEITE - SP303190-N,
PARTE RE: UNIÃO FEDERAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5006693-58.2021.4.03.6110 RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS PARTE AUTORA: I. L. D. S. O. Advogados do(a) PARTE AUTORA: GRAZIELA COSTA LEITE - SP303190-N, PARTE RE: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação ajuizada por Isis Lorena da Silva Oliveira, representada por sua genitora Dayane Kelly da Silva Oliveira, em face da União, objetivando o fornecimento do medicamento “Zolgensma” (onasemnogeno abeparvoveque), para tratamento de Amiotrofia Espinhal Progressiva Tipo II – Ame. A tutela de urgência foi deferida para determinar que a União promova, no prazo de 10 (dez) dias, às suas expensas e em ambiente clínico adequado, o tratamento de terapia gênica com “Zolgensma” (onasemnogene abeparvovec-xioi), na forma da prescrição médica (ID 265241333). Dessa decisão a União interpôs agravo de instrumento, cujo pedido de efeito suspensivo foi indeferido (ID 265241396) e, ao final, foi julgado prejudicado ante a prolação da sentença. A MM. Juíza a quo julgou procedente o pedido, confirmando a antecipação dos efeitos da tutela, para o fim de condenar a União, às suas expensas, a custear integralmente o tratamento da autora de terapia gênica com “Zolgensma”, nos termos das prescrições médicas, incluindo pagamento de assistência médica e hospitalar a ser realizada em ambiente hospitalar situado na capital do Estado. Condenou a ré, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios fixados, por apreciação equitativa, em R$ 9.000,00 (nove mil reais), nos termos do artigo 85, § 8º do Código de Processo Civil (ID 265241469). Vieram os autos a este Tribunal para o reexame necessário. A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra do Dr. Walter Claudius Rothenburg, opinou pela confirmação da sentença (ID 265626188). É o relatório.
REPRESENTANTE: DAYANE KELLY DA SILVA OLIVEIRA
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5006693-58.2021.4.03.6110 RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS PARTE AUTORA: I. L. D. S. O. Advogados do(a) PARTE AUTORA: GRAZIELA COSTA LEITE - SP303190-N, PARTE RE: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): Trata-se de ação ajuizada com o fito de obter o fornecimento do medicamento “Zolgensma” (onasemnogeno abeparvoveque), para tratamento de Amiotrofia Espinhal Progressiva Tipo II – Ame. O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.657.156/RJ, em 25.04.2018, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, estabeleceu a seguinte tese, a ser observada nos processos distribuídos a partir daquela decisão: Constitui obrigação do Poder Público o fornecimento de medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS, desde que presentes, cumulativamente, os seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) Incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; e (iii) Existência de registro na ANVISA do medicamento. No caso sub judice, há exames, relatórios e prescrições médicas (ID’s 265241043, 265241044, 265241045 e 265241332) que comprovam ser a autora portadora de Amiotrofia Espinhal Tipo II - AME, enfermidade caracterizada por fraqueza muscular e hipotonia resultante da degeneração e perda dos neurônios motores inferiores da medula espinhal e do núcleo do tronco cerebral. Segundo a médica neurologista infantil que acompanha a autora, “a AME é uma doença neurodegenerativa grave, autossômica recessiva, decorrente de defeito no gene do neurônio motor (SMN) das células do corno anterior da medula. (...) Dentro do sistema nervoso, os neurônios motores são os principais alvos da doença, resultando em sua degeneração, que resulta em fraqueza muscular, seguida de paralisia dos membros inferiores, falha respiratória e morte. Foi indicado tratamento com Zolgensma. (...) Atualmente é o único tratamento modificador da doença que age corrigindo o defeito genético, ou seja, agindo na raiz e de maneira mais eficaz. (...) Há melhor prognostico da doença nesse paciente, por manter boa funcionalidade muscular e capacidade ventilatória, porém há necessidade de receber URGENTE, uma vez que os resultados são melhores quanto mais rápido receber o tratamento. Por ser doença neurodegenerativa, há urgência pelo risco de rápida piora por perda de neurônios funcionais (...).” (ID 265241332). O laudo médico pericial de ID 265241447 confirmou o diagnóstico da doença e atestou não existir estudos comprovando superioridade do medicamento “Zolgensma” em relação à alternativa disponível no SUS, qual seja, o “Spinraza”. Além disso, afirmou que o medicamento pleiteado está indicado para crianças com menos de 2 anos de idade e não há evidência de eficácia do medicamento para aplicação em crianças acima de 2 anos de idade, como é o caso da autora. Ocorre que a autora foi diagnosticada com atrofia muscular espinhal com um 1 ano e meio, não tendo recebido o medicamento antes dos 2 anos por causa das burocracias administrativas que envolvem a aquisição de medicamento importado de alto custo, mas isso não impede que a menor receba a medicação. Conforme bem consignado pelo juízo a quo, “muito embora o laudo médico se estribe na faixa etária da requerente, certo é que outros fatores são preponderantes na indicação do tratamento para a criança” (ID 265241469 - Pág. 5), como o fato de a autora possuir melhor prognóstico da doença, isto é, não apresentar grau elevado de degeneração dos músculos, e a bula do “Zolgensma” indicar o fármaco para pacientes pediátricos com até 13 quilos, no qual se encaixa a autora, com aproximadamente 9 quilos. O medicamento “Zolgensma”, ademais, encontra-se registrado junto à ANVISA desde 17.08.2020, sob nº 100681174, bem como se trata do único medicamento no mercado que pode trazer a cura definitiva para os portadores de AME, visto que o seu princípio ativo substitui a função do gene do neurônio motor de sobrevivência (SMN1), enquanto o medicamento “Spinraza”, disponibilizado pelo SUS, tem a função apenas de controle dos efeitos da doença, mediante a substituição da proteína em falta no organismo do paciente. Considerando, assim, o alto custo do fármaco e não tendo a autora condições de custeá-lo, negar-lhe o fornecimento pretendido implicaria desrespeito às normas constitucionais que garantem o direito à saúde e à vida. A respeito do tema, colhem-se os seguintes precedentes desta Corte Regional: “PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTO. HIPOSSUFICIÊNCIA DO REQUERENTE. REGISTRO NA ANVISA. IMPRESCINDIBILIDADE DO FÁRMACO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. 1. A questão posta nos autos diz respeito à concessão gratuita de medicamentos não incorporados em atos normativos do Sistema Única de Saúde – SUS. 2. A tutela provisória de urgência, em sua modalidade antecipada, objetiva adiantar a satisfação da medida pleiteada, garantindo a efetividade do direito material discutido. Para tanto, nos termos do art. 300 do atual Código de Processo Civil, exige-se, cumulativamente, a demonstração da probabilidade do direito (fumus boni iuris) e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora). 3. Ainda que no campo da definição de políticas públicas, seja possível priorizar a tutela das necessidades coletivas, não se pode, com esse raciocínio, deixar de promover a guarda dos direitos fundamentais, especialmente no que concerne ao chamado mínimo existencial, quando não houver, por parte do poder público, o devido suprimento às necessidades básicas do indivíduo. 5. Não se cogita, igualmente, de indevida ingerência do Poder Judiciário na gestão de políticas públicas, visto que, em situações excepcionais, é cabível controle judicial para determinar que a Administração Pública cumpra determinada obrigação de fazer, cuja inadimplência possa comprometer a real eficácia dos direitos fundamentais, sem que isso configure violação do princípio da separação de poderes. 6. No julgamento do REsp nº 1.657.156/RJ, pelo C. Superior Tribunal de Justiça, foi fixada a seguinte tese, acerca do fornecimento de medicamentos não distribuídos gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde – SUS: a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento , assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência. 7. No caso em comento, a insuficiência de recursos do demandante para arcar com o tratamento desejado foi demonstrada por documentos juntados à petição inicial (ID 160747408 – fl. 57). A este respeito, soma-se à baixa renda dos responsáveis pela postulante, o valor exorbitante da medicação em tela. 8. Verifica-se, em consulta ao Portal da ANVISA (http://portal.anvisa.gov.br/consulta-produtos-registrados), que o medicamento Zolgensma (Onasemngene Abeparvovecxioi), encontra-se atualmente registrado pela Agência Reguladora, sob o número 100681174 (processo nº 25351.030622/2020-65), desde 17.08.2020. O relatório médico trazido aos autos (ID 160747408 – fl. 62/63), por sua vez, atesta o diagnóstico da paciente e confirmara a indispensabilidade do fármaco para a melhora da condição de saúde desta, uma vez que inexiste, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, tratamento de eficácia semelhante. 9. Ressalta-se que a eficiência da terapêutica à base de Zolgensma (Onasemngene Abeparvovecxioi) exige sua ministração em pacientes de até 2 anos de idade, conforme recomendações de sua própria bula. Haja vista que a requerente é nascida em 11.08.2020, reputa-se suficientemente assegurada a adequação do tratamento pretendido, não cabendo qualquer outra divagação a respeito da idade da parte autora. 10. Agravo interno prejudicado. Agravo de instrumento desprovido”. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5012127-25.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 08/10/2021, Intimação via sistema DATA: 18/10/2021) (grifei) “ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO. ZOLGENSMA. AGRAVANTE PORTADORA DE AME - AMIOTROFIA MUSCULAR ESPINHAL TIPO 1. IMPRESCINDIBILIDADE PARA A VIDA E SAÚDE DA POSTULANTE. EXPECTATIVA DE CURA DA PATOLOGIA. INEFICÁCIA DA TERAPIA FORNECIDA PELO SUS. PROVIMENTO DO RECURSO. 1. Os direitos fundamentais à vida e à saúde são de natureza subjetiva, inatos à pessoa humana, irrenunciáveis, indisponíveis e inalienáveis, constitucionalmente protegidos, cujo fundamento, em um Estado Democrático de Direito, erguido sobre o pilar da proteção à dignidade da pessoa humana, há de superar quaisquer espécies de restrições legais. 2. É assente a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça no sentido de ser obrigação inafastável do Estado assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária à cura, controle ou abrandamento de suas enfermidades, mormente as mais graves, bem como de haver responsabilidade solidária entre os entes federativos no exercício desse múnus constitucional. Precedentes. 3. A jurisprudência se assentou no sentido de que, havendo conflito entre o direito fundamental à vida (art. 5º, Constituição Federal) e à saúde (art. 6º, Constituição Federal) do cidadão hipossuficiente e eventual custo financeiro imposto ao Poder Público, deve ser dada prioridade àqueles, pois o Sistema Único de Saúde - SUS - deve prover os meios para se fornecer medicação e tratamentos que sejam necessários a preservação da vida, saúde e dignidade do paciente sem condições financeiras para custeio pessoal ou familiar, segundo prescrição médica. Precedentes. 4. O E. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do REsp 1.657.156/RJ, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, estabeleceu os requisitos para a concessão judicial de medicamentos não previstos pelo SUS: (i) comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento. A Corte Superior estabeleceu, ainda, que tais critérios somente seriam exigidos para os processos distribuídos a partir da conclusão do presente julgamento. 5. No julgamento do mérito do RE 657.718, em 22/05/2019, Tema 500 da Repercussão Geral, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, no qual se discute a possibilidade, ou não, de se obrigar o Estado a fornecer medicamento não registrado na ANVISA, à luz dos arts. 1º, inc. II; 6º; 23, inc. II; 196; 198, II e § 2º; e 204 da Constituição Federal (publicação no DJe 232, divulgado em 24/10/2019), o Pleno do Supremo Tribunal Federal, por maioria, fixou tese no sentido de que: “1. O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. 2. A ausência de registro na ANVISA impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. 3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2006), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras); (ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. 4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União.” 6. Ainda, o Supremo Tribunal Federal, decidiu, por maioria, no âmbito do RE 566.471 relativo à obrigatoriedade do Estado fornecer medicamento de alto custo a portador de doença grave que não possui condições financeiras para aquisição – Tema 6 da Repercussão Geral, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, em 11/03/2020, que o Estado não é obrigado a fornecer medicamentos de alto custo solicitados judicialmente, quando não estiverem previstos na relação do Programa de Dispensação de Medicamentos em Caráter Excepcional, do Sistema Único de Saúde (SUS), ressalvadas situações excepcionais, as quais serão definidas na formulação da tese. Entretanto, colhe-se, de Notícia veiculada no sítio eletrônico da Corte Superior, também em 11/03/2020, acerca do referido julgado, que a tese “vencedora entendeu que, nos casos de remédios de alto custo não disponíveis no sistema, o Estado pode ser obrigado a fornecê-los, desde que comprovadas a extrema necessidade do medicamento e a incapacidade financeira do paciente e de sua família para sua aquisição.” 7. Existindo requerimento de registro do ZOLGENSMA na ANVISA, conforme DOU de 17/08/2020, por meio da Resolução 3.061/2020, tendo sido o fármaco foi registrado na ANVISA, os elementos probatórios constantes dos autos são conclusivos ao atestarem que a agravante é portadora de AME – AME - AMIOTROFIA MUSCULAR ESPINHAL TIPO 1, doença grave, degenerativa e rara, sendo o medicamento por ela requerido, ZOLGENSMA, o único do mundo existente para o tratamento, com expectativa de cura da patologia. 8. Patente, portanto, a imprescindibilidade do fármaco para assegurar à agravante o cumprimento do direito fundamental à saúde (CF, art. 6º e 196) e, consequentemente, ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III). 9. Agravo de instrumento provido”. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5012001-09.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal GISELLE DE AMARO E FRANCA, julgado em 08/09/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 10/09/2020) (grifei) Uma leitura constitucional do caso demonstra que o postulado da dignidade da pessoa humana não permite, em nenhuma hipótese, o estabelecimento rígido do fornecimento de determinado medicamento/tratamento, sem chances de modificação somente para que assim se onere menos o Estado. Deste modo, todos, sem exceção, devem ter acesso a tratamento médico digno e eficaz, mormente quando não possuam recursos para custeá-lo. Deveras, em circunstâncias tão especiais, de perigo de vida ou à saúde, deve o Poder Público primar pelo direito subjetivo essencial relacionado à dignidade da pessoa humana, previsto e tutelado pela Constituição Federal. Ressalta-se, ademais, que a jurisprudência é pacífica no sentido de ser obrigação inafastável do Estado assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária à cura, controle ou abrandamento de suas moléstias, sobretudo às mais graves, como a do caso em comento. Logo, em vista dos preceitos constitucionais que regem a matéria (artigo 5º, caput, e artigos 196 e 198), reafirmados pela jurisprudência pátria, e verificada a particularidade do caso, a r. sentença deve ser mantida tal como lançada. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à remessa necessária.
REPRESENTANTE: DAYANE KELLY DA SILVA OLIVEIRA
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO. AMIOTROFIA ESPINHAL PROGRESSIVA. “ZOLGENSMA” (ONASEMNOGENO ABEPARVOVEQUE). NECESSIDADE DEMONSTRADA. DIREITO À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDA.
1. Trata-se de ação ajuizada com o fito de obter o fornecimento do medicamento “Zolgensma” (onasemnogeno abeparvoveque), para tratamento de Amiotrofia Espinhal Progressiva Tipo II – AME.
2. No caso sub judice, há exames, relatórios e prescrições médicas que comprovam ser a autora portadora de Amiotrofia Espinhal Tipo II - AME, enfermidade caracterizada por fraqueza muscular e hipotonia resultante da degeneração e perda dos neurônios motores inferiores da medula espinhal e do núcleo do tronco cerebral.
3. A autora foi diagnosticada com atrofia muscular espinhal com um 1 ano e meio, não tendo recebido o medicamento antes dos 2 anos por causa das burocracias administrativas que envolvem a aquisição de medicamento importado de alto custo, mas isso não impede que a menor receba a medicação.
4. Conquanto o laudo pericial se estribe na faixa etária da autora, certo é que outros fatores são preponderantes na indicação do tratamento para a criança, como o fato de possuir melhor prognóstico da doença, isto é, não apresentar grau elevado de degeneração dos músculos, e a bula do “Zolgensma” indicar o fármaco para pacientes pediátricos com até 13 quilos, no qual se encaixa a autora, com aproximadamente 9 quilos.
5. O medicamento “Zolgensma” encontra-se registrado junto à ANVISA desde 17.08.2020, sob nº 100681174, bem como se trata do único medicamento no mercado que pode trazer a cura definitiva para os portadores de AME, visto que o seu princípio ativo substitui a função do gene do neurônio motor de sobrevivência (SMN1), enquanto o medicamento “Spinraza”, disponibilizado pelo SUS, tem a função apenas de controle dos efeitos da doença, mediante a substituição da proteína em falta no organismo do paciente.
6. Considerando o alto custo do fármaco e não tendo a autora condições de custeá-lo, negar-lhe o fornecimento pretendido implicaria desrespeito às normas constitucionais que garantem o direito à saúde e à vida.
7. Uma leitura constitucional do caso demonstra que o postulado da dignidade da pessoa humana não permite, em nenhuma hipótese, o estabelecimento rígido do fornecimento de determinado medicamento/tratamento, sem chances de modificação somente para que assim se onere menos o Estado.
8. Remessa necessária desprovida.