REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5009711-59.2017.4.03.6100
RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE
PARTE AUTORA: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
PARTE RE: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5009711-59.2017.4.03.6100 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE PARTE AUTORA: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL PARTE RE: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: MBV R E L A T Ó R I O Remessa oficial de sentença que julgou improcedente a ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em desfavor da UNIÃO FEDERAL, nos seguintes termos (Id. 3619778): “(...) Acompanhando essa linha de raciocínio, verifico não haver previsão legal de recurso de decisão tomada por autoridade máxima de conselho profissional, uma vez que, não fazendo eles parte do Poder Executivo, não lhes é aplicável o artigo 16 da Lei n. 12.527/2011. Com efeito, referido artigo prevê: Art. 16 – Negado o acesso a informações pelos órgãos ou entidades do Poder Executivo Federal, o requerente poderá recorrer à Controladoria-Geral da União, que deliberará no prazo de 5 (cinco) dias se: ... § 3º - Negado o acesso à informação pela Controladoria Geral da União, poderá ser interposto recurso à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, a que se refere o art. 35.” E as competências da Comissão Mista de Reavaliação de Informações estão previstas no Decreto n. 7724/2012, em seu artigo 47. Entre elas está decidir recursos apresentados contra decisão proferida pela Controladoria-Geral da União, em grau recursal, ou pelo Ministro de Estado ou autoridade com a mesma prerrogativa. Assim, a premissa para que haja recurso à Controladoria-Geral da União e, posteriormente, à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, é que haja uma negativa de informação por órgão ou entidade do Poder Executivo Federal. Não sendo, os conselhos profissionais, órgãos do Poder Executivo, por óbvio não se lhes aplicam tais dispositivos. Assim, a referida Súmula n. 7 não representa alteração da competência da Comissão, como alegado pelo autor, mas mera interpretação dos dispositivos legais. Não tem, portanto, razão, o autor, ao pretender a anulação da referida súmula. Nem ao pretender impedir a referida Comissão de aprovar súmula que exclua de sua competência algo que ela já não tem competência para fazer, por falta de previsão legal. Diante do exposto, julgo IMPROCEDENTE a presente ação. Sem condenação em honorários, nos termos do previsto no artigo 18 da Lei n. 7.347/85. Sentença sujeita ao duplo grau obrigatório, aplicando-se o artigo 19 da Lei n. 4.717/65. Publique-se. Registre-se. Intimem-se”. O Ministério Público Federal manifestou-se pelo provimento da remessa necessária e reforma integral da sentença judicial (Id. 268072440). É o relatório.
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5009711-59.2017.4.03.6100 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE PARTE AUTORA: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL PARTE RE: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O I – DOS FATOS E PROCESSAMENTO Trata-se de ação civil pública, com pedido de tutela provisória de urgência, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra a UNIÃO FEDERAL, para que seja determinada a anulação da Súmula nº 07 da Comissão Mista de Reavaliação de Informações – CMRI e ordenado à União que se abstenha de: “aprovar ato normativo ou súmula que exclua de sua competência a apreciação de recursos contra decisão tomada por autoridade máxima de conselho profissional, limitando-se, no âmbito de sua competência normativa, a seguir o disposto no art. 35 da Lei 12.527/11 e no Decreto Federal nº 7.724/12” (Id. 3619621 a Id. 3619624). Segundo o autor, a ação é resultante da investigação procedida no âmbito do Inquérito Civil nº 1.34.001.005915/2015-52, instaurado a partir de representação que questionava o conteúdo da Súmula nº 07 da Comissão Mista de Reavaliação de Informações – CMRI. Relata que no bojo do procedimento foi expedida recomendação ao Ministro-chefe da Casa Civil, Presidente da Comissão Mista de Reavaliação de Informações, para que anulasse a súmula e se abstivesse de aprovar orientações normativas que proibissem a interposição dos recursos previstos no artigo 16 da Lei nº 12.527/2011, contra decisão tomada por autoridade máxima de conselho profissional. Em resposta, a autoridade manifestou-se sobre as informações requisitadas, mas nada mencionou sobre a recomendação, o que ensejou novo encaminhamento da orientação, sem ter havido qualquer manifestação. Quanto à matéria de fundo, afirma que a Lei nº 12.527/2011, que concretiza o direito fundamental de acesso à informação previsto no artigo 5º, inciso XXXIII, da Constituição Federal, abarca todos os órgãos e entidades da administração pública direta e indireta, sem qualquer exceção, e que a norma e o Decreto Federal nº 7.724/2012, estabelecem que a Comissão Mista de Reavaliação de Informações tem competência, no âmbito de toda a administração pública federal, para decidir sobre o tratamento e classificação de informações sigilosas e rever a classificação das ultrassecretas ou secretas, de oficio ou mediante provocação do interessado, inclusive contra decisão proferida por Ministro de Estado ou autoridade máxima da entidade pública. Diz que referida competência é imodificável e apenas pode ser objeto de regulamento a composição, organização e funcionamento da comissão (artigo 35). Assevera que o órgão, ao subtrair da sua atribuição a apreciação de recursos oriundos dos conselhos profissionais, modificou sua própria competência, com afronta direta à previsão legal. Ressalta que a Súmula é eivada de grave vício de competência, pois não há autorização legal para que a comissão modifique sua própria competência e afaste a aplicação da Lei nº 12.527/2011 e Decreto Federal nº 7.724/2012. Salienta que as orientações normativas, de caráter geral, expedidas com base no poder regulamentar, não podem contrariar a lei, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade, e que a súmula desborda dos limites legais ao conferir uma interpretação restritiva à lei e afastar a incidência do decreto aos conselhos profissionais, bem como ofende o princípio da isonomia, uma vez que autoriza tratamento jurídico diferenciado aos conselhos, que são autarquias submetidas ao regime jurídico-administrativo, em relação a outras entidades da administração pública, sem justificativa pautada no interesse público. Requer seja determinada a anulação da Súmula nº 07 da Comissão Mista de Reavaliação de Informações – CMRI e à União que se abstenha de: “aprovar ato normativo ou súmula que exclua de sua competência a apreciação de recursos contra decisão tomada por autoridade máxima de conselho profissional, limitando-se, no âmbito de sua competência normativa, a seguir o disposto no art. 35 da Lei 12.527/11 e no Decreto Federal nº 7.724/12”. A inicial foi instruída com o Inquérito Civil – IC nº 1.34.001.005915/2015-52 da Procuradoria da República no Estado de São Paulo (Id. 3619625 a Id. 3619751). A União requereu a juntada da Nota SAJ nº 108/2017/GABIN/SAJ/CC-PR da Casa Civil da Presidência da República e outros documentos (Id. 3619755 e Id. 3619757). O pedido de antecipação de tutela foi indeferido (Id. 3619758). A UNIÃO apresentou contestação e documentos (Id. 3619762 a Id. 3619764). Sobreveio a sentença que julgou improcedente a ação (Id. 3619778). II – DA NATUREZA JURÍDICA DOS CONSELHOS PROFISSIONAIS As autarquias são consideradas pessoas jurídicas de direito público interno, conforme previsão do artigo 41, inciso IV, do Código Civil. De acordo com o Decreto-lei nº 200/1967, que dispõe sobre a organização da administração pública federal, elas integram a administração pública indireta (artigos 4º, inciso II, “a”) e são definidas como: “o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada” (artigo 5º, inciso I). Gabriel Lino de Paula Pires, ao tratar das pessoas integrantes da administração pública indireta, faz a seguinte observação (Manual de Direito Administrativo, Parte II – Elementos do Direito Administrativo, A) Os Sujeitos da Ação Administrativa do Estado, 4. Estrutura da Administração Pública Brasileira, Ed. 2021, Editor: Revista dos Tribunais, Página RB-4.9, acesso: https://proview.thomsonreuters.com/launchapp/title/rt/monografias/192884511/v2/page/RB-4.9): “As autarquias possuem autonomias: a autonomia administrativa significa capacidade de autoadministração; a autonomia financeira significa a existência de previsões orçamentárias próprias e gestão do orçamento por si própria; a autonomia funcional significa a prerrogativa de tomar decisões independentes com relação à sua atividade-fim; e a autonomia patrimonial significa a existência de um patrimônio próprio da autarquia e distinto do patrimônio da pessoa política criadora. A própria definição legal da autarquia (art. 5º, I, do Decreto-Lei n. 200/1967) ressalta a existência das suas autonomias, já que a lei a define como “o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada”. Embora a autarquia tenha conceitualmente as referidas autonomias, não se pode esquecer que a medida dessa autonomia será dada pela própria lei instituidora da entidade. Além disso, ainda que autônoma, a autarquia está sujeita ao controle pela Administração Pública Direta, tal como disposto no art. 26 do DL 200/67, há pouco citado (supervisão ministerial, tutela, vinculação ou controle). (...) De volta ao regime geral das autarquias, diante de sua autonomia patrimonial, as autarquias respondem por seus próprios atos, ao passo que a pessoa política criadora somente tem responsabilidade subsidiária pela atuação da autarquia”. O Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que as autarquias têm personalidade jurídica distintas da entidade política à qual estão vinculadas, autonomia administrativa e financeira e seus dirigentes têm legitimidade para figurar como autoridade coatora nos mandados de segurança. Confira-se: AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO. FALTA. MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE PASSIVA. AUTARQUIA. PERSONALIDADE JURÍDICA PRÓPRIA. LEGITIMIDADE. 1 - No exame de recurso especial, não se conhece de matéria que não foi objeto de apreciação pelo Tribunal de origem, inexistente, assim, o necessário prequestionamento. 2 - Segundo precedentes, "as autarquias possuem personalidade jurídica distinta da entidade política à qual estão vinculadas, bem como autonomia administrativa e financeira, razão pela qual seus dirigentes possuem legitimidade passiva para figurar como autoridades coatoras em mandado de segurança" (AgRg no REsp nº 462.226/RS, Relatora a Ministra Denise Arruda, DJU de 3/5/2004). 3 - Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no Ag n. 800.695/DF, relator Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, julgado em 11/3/2008, DJe de 22/4/2008). Relativamente às autarquias profissionais, conhecidas como conselhos de fiscalização, o doutrinador salienta que, a despeito de terem natureza jurídica de autarquia, são submetidos a um regime especial. Registra que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI nº 1.717, afastou a possibilidade de se considerar sua natureza como privada ao declarar a inconstitucionalidade do artigo 58 da Lei nº 9.649/1998. São aplicadas a tais entidades as normas gerais de direito público, como o deslocamento das causas à Justiça Federal (Súmula nº 66 do STF) e a submissão do quadro de pessoal ao regime jurídico adotado na Lei nº 8.112/90, incluído o direito de aposentaria. A despeito da natureza pública dos conselhos, para alguns temas não se aplica o regime geral das autarquias, como acentuado pelo STF no julgamento do RE 938.837, em que prevaleceu o entendimento de que os pagamentos devidos por tais entidades não se submetem ao regime de precatórios. Gabriel Lino de Paula Pires apresenta as seguintes especificidades dos conselhos profissionais destacadas no precedente mencionado: “- o patrimônio dessas autarquias especiais não é formado por dotações orçamentárias diretas ou indiretas da União, como sói ocorrer com as demais autarquias, mas pela arrecadação das contribuições parafiscais pagas pelos profissionais vinculados a cada uma dessas autarquias; - seus dirigentes são eleitos de forma distinta das demais autarquias. Enquanto os dirigentes das autarquias comuns são escolhidos por uma autoridade da administração direta, os dos conselhos profissionais são eleitos dentre os seus membros e exercem mandatos de prazo determinado estabelecido previamente na respectiva lei de regência; - em relação ao controle externo exercido pelo Tribunal de Contas da União, o STF decidiu pela submissão dos conselhos profissionais ao artigo 70, parágrafo único, da Constituição Federal, e, portanto, ao controle citado. O controle, entretanto, é diferenciado em relação aos conselhos profissionais, pois IN 47/2004 dispõe que “os responsáveis pelas entidades de fiscalização do exercício profissional estão dispensados de apresentar prestação de contas ordinárias ao Tribunal, sem prejuízo da manutenção das demais formas de fiscalização exercidas pelo controle externo”; - os conselhos profissionais não estão sujeitos à vinculação ou subordinação em relação à Administração Pública, como ocorre com as demais autarquias; - os conselhos profissionais não têm os seus cargos criados por lei; - os conselhos de fiscalização profissional possuem duas atribuições distintas: uma é a proteção dos profissionais a eles vinculados, atuando como uma espécie de organização da sociedade civil, promovendo por vezes a defesa dos interesses corporativos.; a outra é a atribuição lhes foi destinada pelo Estado, mediante a delegação da regulação oficial da profissão em benefício do interesse público. Neste campo, tem poderes de regulamentação, de execução, de sanção e de disciplina (poder de polícia); - a despeito da natureza autárquica dos conselhos, parte da doutrina contemporânea já sustenta atribuir-lhes regime jurídico híbrido, congregando, simultaneamente, sujeições e prerrogativas de natureza pública e não estatal. Ter-se-ia a incidência de um regime jurídico híbrido, ora aplicando-se regras próprias do direito público, ora regras específicas para essa espécie de pessoa jurídica não compreendida na estrutura orgânica da Administração; - de outro lado, é preciso refletir de modo cuidadoso sobre a aplicação de cada uma das grandes regras do regime público aos conselhos profissionais, dadas as peculiaridades dessas entidades”. Nessa acepção, cabe destacar: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ORGANIZAÇÃO DO ESTADO. REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO. NATUREZA SUI GENERIS DOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. POSSIBILIDADE DE CONTRATAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS PELO REGIME DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO. CONSTITUCIONALIDADE. 1. Os Conselhos Profissionais, enquanto autarquias corporativas criadas por lei com outorga para o exercício de atividade típica do Estado, tem maior grau de autonomia administrativa e financeira, constituindo espécie sui generis de pessoa jurídica de direito público não estatal, a qual não se aplica a obrigatoriedade do regime jurídico único preconizado pelo artigo 39 do texto constitucional. 2. Trata-se de natureza peculiar que justifica o afastamento de algumas das regras ordinárias impostas às pessoas jurídicas de direito público. Precedentes: RE 938.837 (Rel. Min. EDSON FACHIN, redator p/ acórdão Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 19/4/2017, DJe de 25/9/2017; e ADI 3.026 (Rel. Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, DJ de 29/9/2006. 3. Constitucionalidade da legislação que permite a contratação no âmbito dos Conselhos Profissionais sob o regime celetista. ADC 36 julgada procedente, para declarar a constitucionalidade do art. 58, § 3º, da Lei 9.649/1998. ADI 5367 e ADPF 367 julgadas improcedentes. (STF, ADPF 367, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 08/09/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-272 DIVULG 13-11-2020 PUBLIC 16-11-2020) CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ORGANIZAÇÃO DO ESTADO. REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO. NATUREZA SUI GENERIS DOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. POSSIBILIDADE DE CONTRATAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS PELO REGIME DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO. CONSTITUCIONALIDADE. 1. Os Conselhos Profissionais, enquanto autarquias corporativas criadas por lei com outorga para o exercício de atividade típica do Estado, tem maior grau de autonomia administrativa e financeira, constituindo espécie sui generis de pessoa jurídica de direito público não estatal, a qual não se aplica a obrigatoriedade do regime jurídico único preconizado pelo artigo 39 do texto constitucional. 2. Trata-se de natureza peculiar que justifica o afastamento de algumas das regras ordinárias impostas às pessoas jurídicas de direito público. Precedentes: RE 938.837 (Rel. Min. EDSON FACHIN, redator p/ acórdão Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 19/4/2017, DJe de 25/9/2017; e ADI 3.026 (Rel. Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, DJ de 29/9/2006. 3. Constitucionalidade da legislação que permite a contratação no âmbito dos Conselhos Profissionais sob o regime celetista. ADC 36 julgada procedente, para declarar a constitucionalidade do art. 58, § 3º, da Lei 9.649/1998. ADI 5367 e ADPF 367 julgadas improcedentes. (STF, ADC 36, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 08/09/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-272 DIVULG 13-11-2020 PUBLIC 16-11-2020) O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que os conselhos de fiscalização, a despeito da natureza jurídica de autarquia, de exercerem atividade tipicamente pública e do dever de prestar contas ao Tribunal de Contas da União, entre outros, são classificados como autarquias corporativas não integrantes da Administração Pública, mas colaboradoras com esta para o exercício da atividade de polícia das profissões. Confira-se: ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. ART. 37, II, DA CF. NATUREZA JURÍDICA. AUTARQUIA. FISCALIZAÇÃO. ATIVIDADE TÍPICA DE ESTADO. 1. Os conselhos de fiscalização profissional, posto autarquias criadas por lei e ostentando personalidade jurídica de direito público, exercendo atividade tipicamente pública, qual seja, a fiscalização do exercício profissional, submetem-se às regras encartadas no artigo 37, inciso II, da CB/88, quando da contratação de servidores. 2. Os conselhos de fiscalização profissional têm natureza jurídica de autarquias, consoante decidido no MS 22.643, ocasião na qual restou consignado que: (i) estas entidades são criadas por lei, tendo personalidade jurídica de direito público com autonomia administrativa e financeira; (ii) exercem a atividade de fiscalização de exercício profissional que, como decorre do disposto nos artigos 5º, XIII, 21, XXIV, é atividade tipicamente pública; (iii) têm o dever de prestar contas ao Tribunal de Contas da União. 3. A fiscalização das profissões, por se tratar de uma atividade típica de Estado, que abrange o poder de polícia, de tributar e de punir, não pode ser delegada (ADI 1.717), excetuando-se a Ordem dos Advogados do Brasil (ADI 3.026). 4. In casu, o acórdão recorrido assentou: EMENTA: REMESSA OFICIAL EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONSELHO PROFISSIONAL. NÃO ADSTRIÇÃO À EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO, PREVISTA NO ART. 37, II, DA CF. PROVIMENTO. I – Os conselhos profissionais, não obstante possuírem natureza jurídica autárquica conferida por lei, estão, no campo doutrinário, classificados como autarquias corporativas, não integrando a Administração Pública, mas apenas com esta colaborando para o exercício da atividade de polícia das profissões. Conclusão em que se aporta por carecerem aqueles do exercício de atividade tipicamente estatal, o que lhe acarreta supervisão ministral mitigada (art. 1º, Decreto-lei 968/69), e de serem mantidas sem percepção de dotações inscritas no orçamento da União. II – Aos entes autárquicos corporativos não são aplicáveis o art. 37, II, da Lei Maior, encargo exclusivo das autarquias integrantes da estrutura administrativa do estado, únicas qualificáveis como longa manus deste. III – Remessa oficial provida. Pedido julgado improcedente. 5. Recurso Extraordinário a que se dá provimento. (STF, RE 539224, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 22/05/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-118 DIVULG 15-06-2012 PUBLIC 18-06-2012 RT v. 101, n. 923, 2012, p. 684-690) Diante do exposto, conclui-se que, diferentemente das demais autarquias, os conselhos profissionais não são vinculados ou subordinados à Administração Pública e, a despeito de comporem a administração pública indireta e da sua natureza pública federal, não integram a estrutura administrativa do Estado e nem fazem parte do Poder Executivo federal. III – DA SÚMULA Nº 7 DA COMISSÃO MISTA DE REAVALIAÇÃO DE INFORMAÇÕES – CRMI A Lei Nº 12.527/2011, que regula o acesso a informações previsto nos artigos 5º, inciso XXXII, 37 e 216, § 2º, da Constituição Federal, estabelece que estão subordinados ao seu regime jurídico, entre outros, as autarquias, fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios (artigo 1º). De acordo com o artigo 6º, cabe aos órgãos e entidades do poder público, observadas as normas e procedimentos aplicáveis, assegurar a gestão transparente da informação, propiciando amplo acesso a ela e sua divulgação, proteção da informação, garantindo-se sua disponibilidade, autenticidade e integridade e proteção da informação sigilosa e da informação pessoal, observada a sua disponibilidade, autenticidade, integridade e eventual restrição de acesso. O artigo 7º prevê que o acesso à informação compreende o direito de obter orientação sobre os procedimentos para a consecução de acesso e local onde pode ser encontrado ou obtido o dado almejado e informação contida em registros ou documentos, produzidos ou acumulados por seus órgãos ou entidades, recolhidos ou não a arquivos públicos, produzida ou custodiada por pessoa física ou entidade privada decorrente de qualquer vínculo com seus órgãos ou entidades, mesmo que já tenha cessado, primária, íntegra, autêntica e atualizada, sobre atividades exercidas pelos órgãos e entidades, inclusive as relativas à sua política, organização e serviços, pertinente à administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos administrativos e outras. A norma garante que qualquer interessado pode apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades públicos por qualquer meio legítimo, com a exigência de que pedido deve conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida (artigo 10), que o serviço de busca e fornecimento de informação é gratuito (artigo 12) e que o acesso à informação que esteja disponível deve ser autorizada de imediato (artigo 11). Por fim, segundo o artigo 15, o interessado pode interpor recurso contra a decisão que indefere o acesso a informações, ou às razões da negativa do acesso, dirigido à autoridade hierarquicamente superior à que exarou a decisão impugnada, no prazo de dez dias, contados da sua ciência. O artigo 16 da Lei nº 12.527/2011 trata especificamente do recurso interposto contra decisão proferida por órgãos ou entidades do Poder Executivo Federal que negarem acesso a informações. Nesse caso, o requerente pode recorrer à Controladoria-Geral da União, que no prazo de cinco dias, deve deliberar se o acesso à informação não classificada como sigilosa for negado, a decisão de negativa de acesso à informação total ou parcialmente classificada como sigilosa não indicar a autoridade classificadora ou a hierarquicamente superior a quem possa ser dirigido pedido de acesso ou desclassificação, os procedimentos de classificação de informação sigilosa estabelecidos na lei não tiverem sido observados e estiverem sendo descumpridos prazos ou outros procedimentos previstos nesta Lei. Caso o acesso à informação seja negado pela Controladoria-Geral da União, caberá recurso à Comissão Mista de Reavaliação de Informações. Nessa acepção, a Comissão Mista de Reavaliação de Informações-CMRI, aprovou a Súmula CMRI nº 7/2015. Com o seguinte enunciado: “CONSELHOS PROFISSIONAIS - Não são cabíveis os recursos de que trata o art. 16 da Lei nº 12.527, de 2011, contra decisão tomada por autoridade máxima de conselho profissional, visto que estes não integram o Poder Executivo Federal, não estando sujeitos, em consequência, à disciplina do Decreto nº 7.724/2012”. Nas justificativas apresentadas para a aprovação da súmula, os membros da comissão salientaram que os conselhos profissionais não integram a estrutura do Poder Executivo federal, sua administração não está vinculada ao Estado e o órgão dirigente é composto integralmente por representantes da própria classe disciplinada pela entidade, eleitos por associados, que elaboram os regulamentos da entidade, sem a participação estatal. Enfatizam que a administração pública não influencia suas decisões, que os recursos de que dispõe são provenientes de contribuições pagas pela categoria e não lhes é destinado recursos orçamentários e nem fixadas despesas pela lei orçamentária anual. Afirmam que não há relação necessária entre a entidade ter natureza de direito público e integrar a estrutura estatal e que os conselhos são entidades públicas por determinação da própria lei que os instituiu e decorre das funções para as quais foram criadas, que envolvem o poder de autoridade, atributo típico de poder público, e das prerrogativas e sujeições tipicamente públicas, como a cobrança de anuidades e cobranças de débitos por meio de execução fiscal, gozo da imunidade tributária, sujeição a controle do tribunal de Contas. Salientam que as entidades de fiscalização profissional não foram tratadas pela lei como parte integrante da administração. “Muito pelo contrário. Acompanhando uma tendência presente no direito comparado, a regulação das atividades profissionais no Brasil foi atribuída a entidades de caráter corporativo, com personalidade de direito público, mas visivelmente destacadas da estrutura burocrática estatal”. Aduzem que os conselhos profissionais são regidos por um regime jurídico especial que os diferencia das demais autarquias, pois são dotados de total autonomia em relação à entidade política matriz, e que não se submetem às mesmas normas que regem as entidades que tradicionalmente integram a administração pública indireta. Concluem que o regime a que estão submetidas as entidades não foram concebidos como entes vinculados ao Estado e, dessa forma, se desenvolvem sem qualquer ingerência estatal em relação à estrutura, administração, receita e submissão a qualquer controle por parte da administração centralizada apenas ao controle externo, ligado aos poderes Judiciário e Legislativo, mas sem vincular-se ou subordinar-se a qualquer órgão público ou admitir qualquer influência do Estado na sua administração, e que o desenvolvimento como entidades fechadas, com estrutura e funcionamento completamente apartado da administração pública federal, demonstra a independência ampla do Estado: “não apenas nos seus aspectos estruturais, ligados à sua organização, completamente alheios à disciplina prevista no Decreto-Lei nº 200, de 1967, mas também quanto ao regime jurídico aplicado em relação aos seus bens, receitas, despesas, finanças, contabilidade, compras, contratos e pessoal”. Por fim, reiteram que a natureza pública das entidades de fiscalização profissional não implica que integrem a estrutura do estado ou façam parte do Poder Executivo federal, motivo pelo qual o Decreto nº 7.724, de 2012 não lhes é aplicável. Segundo o Autor, a súmula está eivada de graves irregularidades, porquanto não há fundamento legal para que a comissão modifique sua própria competência e afaste a aplicação da Lei nº 12.527/2011 e Decreto Federal nº 7.724/2012, para subtrair da sua atribuição a apreciação de recursos oriundos dos conselhos profissionais. Como mencionado, os conselhos profissionais têm autonomia administrativa e financeira, não são subordinados ou vinculados à União e, a despeito de integrarem a administração pública indireta, não fazem parte do Poder Executivo federal. In casu, o artigo 16 da Lei nº 12.257/2011 é direcionado àqueles que tem o pedido de acesso à informação negado pelos órgãos ou entidades do Poder Executivo Federal, caso em que caberá recurso à Controladoria-Geral da União e, posteriormente, à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, se aquela negar o acesso ao dado buscado. Para os demais órgãos e entidades, incluídos os conselhos de fiscalização, contra o indeferimento do pedido caberá recurso à autoridade hierarquicamente superior à que exarou a decisão impugnada, como estabelece o artigo 15 da lei. Nesse sentido, cabe extrair o seguinte trecho da sentença: “a premissa para que haja recurso à Controladoria-Geral da União e, posteriormente, à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, é que haja uma negativa de informação por órgão ou entidade do Poder Executivo Federal. Não sendo, os conselhos profissionais, órgãos do Poder Executivo, por óbvio não se lhes aplicam tais dispositivos”. Assim, não se verifica qualquer ilegalidade no enunciado da Súmula CMRI nº 7/2015 e, diferentemente do alegado, sua redação não afastou a Lei nº 12.527/2011 e o Decreto Federal nº 7.724/2012 e nem subtraiu da Comissão Mista de Reavaliação de Informações-CMRI a competência para apreciar recursos oriundos dos conselhos profissionais, uma vez que a lei não lhe conferiu tal atribuição, mas sim à autoridade hierarquicamente superior àquela que exarou a decisão impugnada, existente dentro da estrutura do conselho profissional de acordo com seus estatutos, como estabelece o artigo 15 da lei. Pelos mesmos fundamentos, descabe o pedido de determinar à comissão que se abstenha de aprovar ato normativo ou súmula que exclua de sua competência a apreciação de recursos contra decisão tomada por autoridade máxima de conselho profissional. IV - DO DISPOSITIVO Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO AO REEXAME NECESSÁRIO, nos termos da fundamentação. É como voto
E M E N T A
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REEXAME NECESSÁRIO. ILEGALIDADE DA SÚMULA 07 DA CMRI. EXCLUSÃO DE COMPETÊNCIA PARA APRECIAÇÃO DE RECURSOS CONTRA DECISÃO DE AUTORIDADE MÁXIMA DE CONSELHO PROFISSIONAL. ARTIGO 16 DA LEI Nº 12.527/2011. AUTARQUIAS. NÃO VINCULADAS OU SUBORDINADAS À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ILEGALIDADE NÃO VERIFICADA. REMESSA OFICIAL DESPROVIDA.
- As autarquias são consideradas pessoas jurídicas de direito público interno, conforme previsão do artigo 41, inciso IV, do Código Civil. De acordo com o Decreto-lei nº 200/1967, que dispõe sobre a organização da administração pública federal, elas integram a administração pública indireta (artigos 4º, inciso II, “a”) e são definidas como: “o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada” (artigo 5º, inciso I).
- O Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que as autarquias têm personalidade jurídica distintas da entidade política à qual estão vinculadas, autonomia administrativa e financeira e seus dirigentes têm legitimidade para figurar como autoridade coatora nos mandados de segurança. Precedente.
- Relativamente às autarquias profissionais, conhecidas como conselhos de fiscalização, o doutrinador salienta que, a despeito de terem natureza jurídica de autarquia, são submetidos a um regime especial. Registra que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI nº 1.717, afastou a possibilidade de se considerar sua natureza como privada ao declarar a inconstitucionalidade do artigo 58 da Lei nº 9.649/1998. São aplicadas a tais entidades as normas gerais de direito público, como o deslocamento das causas à Justiça Federal (Súmula nº 66 do STF) e a submissão do quadro de pessoal ao regime jurídico adotado na Lei nº 8.112/90, incluído o direito de aposentaria. A despeito da natureza pública dos conselhos, para alguns temas não se aplica o regime geral das autarquias, como acentuado pelo STF no julgamento do RE 938.837, em que prevaleceu o entendimento de que os pagamentos devidos por tais entidades não se submetem ao regime de precatórios. Precedentes.
- O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que os conselhos de fiscalização, a despeito da natureza jurídica de autarquia, de exercerem atividade tipicamente pública e do dever de prestar contas ao Tribunal de Contas da União, entre outros, são classificados como autarquias corporativas não integrantes da Administração Pública, mas colaboradoras com esta para o exercício da atividade de polícia das profissões. Precedente.
- O artigo 16 da Lei nº 12.257/2011 é direcionado àqueles que tem o pedido de acesso à informação negado pelos órgãos ou entidades do Poder Executivo Federal, caso em que caberá recurso à Controladoria-Geral da União e, posteriormente, à Comissão Mista de Reavaliação de Informações, se aquela negar o acesso ao dado buscado. Para os demais órgãos e entidades, incluídos os conselhos de fiscalização, contra o indeferimento do pedido caberá recurso à autoridade hierarquicamente superior à que exarou a decisão impugnada, como estabelece o artigo 15 da lei.
- Não se verifica qualquer ilegalidade no enunciado da Súmula CMRI nº 7/2015 e, diferentemente do alegado, sua redação não afastou a Lei nº 12.527/2011 e o Decreto Federal nº 7.724/2012 e nem subtraiu da Comissão Mista de Reavaliação de Informações-CMRI a competência para apreciar recursos oriundos dos conselhos profissionais, uma vez que a lei não lhe conferiu tal atribuição, mas sim à autoridade hierarquicamente superior àquela que exarou a decisão impugnada, existente dentro da estrutura do conselho profissional de acordo com seus estatutos, como estabelece o artigo 15 da lei. Pelos mesmos fundamentos, descabe o pedido de determinar à comissão que se abstenha de aprovar ato normativo ou súmula que exclua de sua competência a apreciação de recursos contra decisão tomada por autoridade máxima de conselho profissional.
- Reexame necessário não provido.