AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5017988-55.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO
AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
AGRAVADO: GIRASSOL BRASIL EDICOES EIRELI
Advogado do(a) AGRAVADO: NELSON ANTONIO REIS SIMAS JUNIOR - SC22332-A
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5017988-55.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL AGRAVADO: GIRASSOL BRASIL EDICOES EIRELI Advogado do(a) AGRAVADO: NELSON ANTONIO REIS SIMAS JUNIOR - SC22332-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator: Trata-se de agravo interno interposto por GIRASSOL BRASIL EDIÇÕES EIRELI contra decisão monocrática, de minha relatoria, que deu provimento ao agravo de instrumento interposto pela União. Em suas razões, a agravante aduz que não há qualquer embasamento legal que justifique a cassação da decisão proferida no juízo de origem, eis que esta última está em conformidade com a jurisprudência do STF, do TRF4 e desse egrégio TRF3. Sustenta que o art. 1º da Lei nº 2.770/1956 não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, baseando-se no fato de o Supremo Tribunal Federal ter julgado inconstitucional o § 2º do art. 7º da Lei nº 12.016/09, que igualmente proibia a concessão de medida liminar para a entrega de mercadorias importadas. Defende que a concessão da medida liminar pleiteada não resulta em quaisquer prejuízos para o Fisco, mas tão somente para a agravante, que já está há 229 dias com as mercadorias apreendidas. Alega a inaplicabilidade do Tema 1.042 do STF ao presente caso. Contrarrazões da União (ID 262139147). O feito foi incluído em pauta e, após a intimação das partes, a empresa agravante peticionou nos autos, informando que realizou o depósito judicial do montante integral dos tributos e multa cobrados no auto de infração e que a Fazenda Nacional reconheceu a suficiência do depósito e procedeu com a suspensão da cobrança. Com isso, requereu a revogação da decisão anteriormente proferida neste agravo de instrumento, para determinar que a União prossiga com o despacho aduaneiro dos livros infantis (ID 263959181). É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5017988-55.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL AGRAVADO: GIRASSOL BRASIL EDICOES EIRELI Advogado do(a) AGRAVADO: NELSON ANTONIO REIS SIMAS JUNIOR - SC22332-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator: No tocante ao fato novo apresentado em petição pela agravante diretamente a esta Corte (depósito do valor integral dos tributos e multas cobrados), inclusive após a intimação da pauta de julgamento do agravo interno, observo que não foi apreciado na decisão agravada, sendo vedado a este Tribunal sobre ele se manifestar neste momento processual. A matéria referente à existência de depósito judicial, portanto, é inepta, por veicular pedido que não pode ser atendido por esta Turma, porquanto implica supressão de instância. Isto porque o recurso de agravo de instrumento é dotado de devolutividade restrita, isto é, presta-se a rever apenas o que restou efetivamente decidido na decisão objurgada e não para analisar questões nela não examinadas pelo juízo a quo, sob pena de supressão de instância e malferimento aos princípios do juiz natural e do duplo grau de jurisdição. A leitura da interlocutória proferida em 1º grau indica que o d. magistrado de origem não se pronunciou especificamente quanto a tal pleito. Nem podia, já que se trata de fato novo, que demanda nova análise e decisão pelo d. magistrado de piso. No mais, os argumentos expendidos pela agravante não abalaram a fundamentação e a conclusão exaradas por este Relator. Assim, submeto o recurso à apreciação do órgão Colegiado. Não é dado ao Judiciário – sem declaração de inconstitucionalidade – descumprir a lei vigente. No caso, a interlocutória ofende o art. 1º da Lei nº 2.770/1956 (“Nas ações e procedimentos judiciais de qualquer natureza, que visem obter a liberação de mercadorias, bens ou coisas de qualquer espécie procedentes do estrangeiro, não se concederá, em caso algum, medida preventiva ou liminar que, direta ou indiretamente importe na entrega da mercadoria, bem ou coisa”). Essa posição legal vem de longa data, sendo que o referido art. 1º da Lei n. 2.770/56 permanece vigente e, portanto, deve ser aplicado. Não bastasse isso, a decisão de natureza precária (tutela antecipada) tem o mesmo objeto do pedido final da parte e sua concessão esgota de modo irreversível o objeto da demanda, o que ofende o § 3º do art. 1º da Lei nº 8.437/92, o qual diz que “não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação”. Nesse sentido: STF - MS 28177 MC-AgR, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 30/09/2009, DJe-237 DIVULG 17-12-2009 PUBLIC 18-12-2009 EMENT VOL-02387-03 PP-00429; STJ - REsp n. 1.343.233/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 5/9/2013, DJe de 17/9/2013. A declaração de inconstitucionalidade do §2º do art. 7º da Lei nº 12.016/09 nada tem a ver com a situação dos autos, vez que não foi este o fundamento adotado por este Relator para o provimento do recurso da União. “Embora o Supremo Tribunal Federal (STF) venha sinalizando pela necessidade de conferir interpretação conforme às normas que vedem genericamente a concessão de tutela antecipada, não existe pronunciamento específico acerca do art. 1º da Lei n. 2.770/56, que permanece vigente e, portanto, deve ser aplicada, sob pena de desrespeito à Súmula Vinculante n. 10” (REsp n. 1.184.720/DF, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 5/8/2010, DJe de 1/9/2010). Além disso, a liberação das mercadorias em casos como o mencionado nos autos apenas é possível desde que condicionada à prestação de caução, nos termos da legislação de regência, notadamente artigo 51, §§ 1º e 2º, do DL 37/66 e artigo 571 do Regulamento Aduaneiro. Nesse sentido: TRF 3ª Região, 3ª Turma,AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5028425-63.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 19/03/2020, Intimação via sistema DATA: 24/03/2020 - 3ª Turma, ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 5006801-13.2018.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal CECILIA MARIA PIEDRA MARCONDES, julgado em 08/11/2019, Intimação via sistema DATA: 13/11/2019 - 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5003136-86.2018.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal MAIRAN GONCALVES MAIA JUNIOR, julgado em 17/10/2019, Intimação via sistema DATA: 24/10/2019. Em destaque, nem se diga que a apreensão da mercadoria se deu para “obrigar” o pagamento de tributação incidente sobre a operação de internalização; é que foi constatado o descompasso entre classificação dada pelo importador e o quanto se verifica, em “canal vermelho”, pela SRF; de modo que se trata de retenção para fins de conferência aduaneira. Em caso semelhante, esta Sexta Turma já entendeu que é correto o “impedimento da liberação de bem importado pela aplicação de sanção por infração administrativa” (AMS 00129951620114036119, DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/12/2016). O caso dos autos revela que não se cuida de apreensão de mercadorias como meio coercitivo (vedado na Súmula 323/STF), mas sim de regular negativa do desembaraço aduaneiro enquanto não se acharem satisfeitas as condições previstas na legislação aduaneira para a internalização de mercadorias alienígenas. Além disto, o depósito do montante integral é necessário para o efeito de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nos termos do art. 151, inciso II do CTN, mas como dito a matéria deve ser apreciada primeiro pelo Juízo a quo. O Judiciário – que constitucionalmente não é vocacionado a "legislar" – não pode, a seu talante, "criar" possibilidades de suspensão da exigibilidade de créditos públicos fora do cenário previsto pelo legislador; fazê-lo é desempenhar um írrito ativismo inconstitucional, porquanto essa conduta invade competência alheia. Sobre o tema, nesta Sexta Turma: AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5012413-71.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 23/02/2021, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 26/02/2021 - AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5019105-52.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 23/02/2021, Intimação via sistema DATA: 25/02/2021. A decisão encontra-se em nítido confronto com a legislação vigente (art. 1º da Lei nº 2.770/56 -- art. 1º, § 3º da Lei nº 8.437/92 -- DL 37/66 -- Regimento Aduaneiro – art. 151, inc. II do CTN) e com a jurisprudência das Cortes Superiores e deste Tribunal. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo interno. É como voto.
E M E N T A
AGRAVO INTERNO. MANDADO DE SEGURANÇA. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. LIBERAÇÃO DE MERCADORIAS. AUSÊNCIA DE CAUÇÃO. LIMINAR SATISFATIVA. ART. 1º DA LEI Nº 2.770/1956. AUSÊNCIA DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. DEPÓSITO JUDICIAL REALIZADO POSTERIORMENTE. FATO NOVO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. RECURSO IMPROVIDO.
1. No tocante ao fato novo apresentado em petição pela agravante diretamente a esta Corte (depósito do valor integral dos tributos e multas cobrados), inclusive após a intimação da pauta de julgamento do agravo interno, observo que não foi apreciado na decisão agravada, sendo vedado a este Tribunal sobre ele se manifestar neste momento processual. A matéria referente à existência de depósito judicial, portanto, é inepta, por veicular pedido que não pode ser atendido por esta Turma, porquanto implica supressão de instância.
2. A interlocutória agravada ofende o art. 1º da Lei nº 2.770/1956 (“Nas ações e procedimentos judiciais de qualquer natureza, que visem obter a liberação de mercadorias, bens ou coisas de qualquer espécie procedentes do estrangeiro, não se concederá, em caso algum, medida preventiva ou liminar que, direta ou indiretamente importe na entrega da mercadoria, bem ou coisa”).
3. O art. 1º da Lei n. 2.770/56 permanece vigente e, portanto, deve ser aplicado.
4. A decisão de natureza precária (tutela antecipada) tem o mesmo objeto do pedido final da parte e sua concessão esgota de modo irreversível o objeto da demanda, o que ofende o § 3º do art. 1º da Lei nº 8.437/92, o qual diz que “não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação”.
5. A declaração de inconstitucionalidade do §2º do art. 7º da Lei nº 12.016/09 nada tem a ver com a situação dos autos, vez que não foi este o fundamento adotado pelo Relator para o provimento do recurso da União.
6. Além disso, a liberação das mercadorias em casos como o mencionado nos autos apenas é possível desde que condicionada à prestação de caução, nos termos da legislação de regência, notadamente artigo 51, §§ 1º e 2º, do DL 37/66 e artigo 571 do Regulamento Aduaneiro.
7. Em destaque, nem se diga que a apreensão da mercadoria se deu para “obrigar” o pagamento de tributação incidente sobre a operação de internalização; é que foi constatado o descompasso entre classificação dada pelo importador e o quanto se verifica, em “canal vermelho”, pela SRF; de modo que se trata de retenção para fins de conferência aduaneira. O caso dos autos revela que não se cuida de apreensão de mercadorias como meio coercitivo (vedado na Súmula 323/STF), mas sim de regular negativa do desembaraço aduaneiro enquanto não se acharem satisfeitas as condições previstas na legislação aduaneira para a internalização de mercadorias alienígenas.
8. O depósito do montante integral é necessário para o efeito de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nos termos do art. 151, inciso II do CTN, mas, como dito, a matéria deve ser apreciada primeiro pelo Juízo a quo.
9. Agravo interno desprovido.