APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005347-06.2015.4.03.6002
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: BANCO DO BRASIL SA
Advogado do(a) APELANTE: MARCELO PONCE CARVALHO - MS11443-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, RITIE TOMONAGA MATSUBARA, RYUITI MATSUBARA
Advogado do(a) APELADO: PERICLES LANDGRAF ARAUJO DE OLIVEIRA - PR18294-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005347-06.2015.4.03.6002 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: BANCO DO BRASIL SA Advogado do(a) APELANTE: MARCELO PONCE CARVALHO - MS11443-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, RITIE TOMONAGA MATSUBARA, RYUITI MATSUBARA Advogado do(a) APELADO: PERICLES LANDGRAF ARAUJO DE OLIVEIRA - PR18294-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Exmo. Sr. Desembargador Federal CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de apelação interposta pelo BANCO DO BRASIL S/A em face de sentença que, integrada por embargos de declaração, assim decidiu: Em face do expendido, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido (art. 487, I, CPC) para: I. declarar, nos contratos discutidos nesta ação, a nulidade das cláusulas que permitiram a incidência de juros remuneratórios superiores a 12% (doze por cento) ao ano, considerada a data da assinatura dos contratos até a data da realização das operações de securitização e alongamento; II. declarar, no que tange ao alongamento das cédulas rurais, a nulidade das cláusulas que permitiram a incidência de juros remuneratórios superiores a 3% ao ano, com capitalização que não seja anual, conforme a Lei nº 9.138/95 art. 5º, 5º, II; III. afastar eventual anatocismo, devendo, na evolução da dívida, serem os juros computados em conta apartada do saldo devedor; IV. afastar os efeitos da mora da parte autora; V. obstar, no período da inadimplência, a cumulação de comissão de permanência com juros remuneratórios, moratórios ou multa contratual; VI. Excluir, no caso de incidência de verbas moratórias, a incidência de multa moratória acima de 10% e juros de mora superiores a 1% ao mês; VII. condenar os Réus a excluírem (ou absterem-se de inscrever) o nome dos autores de cadastros de proteção ao crédito em razão da dívida questionada nesta ação, ressalvada a possibilidade de inscrição em caso de futura inadimplência após a readequação da dívida aos termos desta sentença; e VIII. condenar os Réus a promoverem a revisão da dívida, conforme os parâmetros estabelecidos nesta sentença. Diante da sucumbência mínima dos autores, os honorários advocatícios e as despesas processuais serão suportados pelos réus, em percentual a ser definido em liquidação, nos termos do artigo 85, 4º, II, c/c artigo 86, parágrafo único do Código de Processo Civil. Após o trânsito em julgado, o Réu Banco do Brasil deverá ser intimado para promover, no prazo de 60 (sessenta) dias, a revisão dos contratos originários e alongamentos, informando os novos valores encontrados a partir de seu implemento. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Por força do acolhimento dos embargos de declaração interpostos, o dispositivo sofreu as seguintes alterações: Neste ponto, altera-se o dispositivo da sentença para que, onde se lê: VI. Excluir, no caso de incidência de verbas moratórias, a incidência de multa moratória acima de 10% e juros de mora superiores a 1% ao mês. Leia-se: VI. Excluir, no caso de incidência de verbas moratórias, a incidência de multa moratória acima de 10% e, após 1/08/1996, a multa moratória acima de 2%, bem como os juros de mora superiores a 1% ao ano; Assim, onde se lê: VIII. condenar os Réus a promoverem a revisão da dívida, conforme os parâmetros estabelecidos nesta sentença. Leia-se: VIII. condenar os Réus a promoverem a revisão da dívida, conforme os parâmetros estabelecidos nesta sentença, subtraindo, em seguida, as quantias pagas, atualizadas monetariamente, apurando, assim, o quantum ainda devido, se o caso. Se a dívida for quitada e subsistirem valores a serem devolvidos, a restituição por parte das rés deverá ser realizada na forma simples Alega o recorrente, preliminarmente, a impossibilidade jurídica do pedido, tendo em vista a ocorrência de ato jurídico perfeito; a ingerência do Poder Público em negócios jurídicos privados (“factum principis”); bem como a prescrição/decadência da pretensão de revisão. No mérito, defende a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, a necessidade de reforma da sentença quanto à limitação dos juros a 12% ao ano para as Cédulas Rurais, a legalidade da pactuação da comissão de permanência, a legalidade da multa de 10% em Cédula de Crédito Rural. Com as respectivas contrarrazões, vieram os autos a esta Corte. É o breve relatório. Passo a decidir.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005347-06.2015.4.03.6002 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: BANCO DO BRASIL SA Advogado do(a) APELANTE: MARCELO PONCE CARVALHO - MS11443-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, RITIE TOMONAGA MATSUBARA, RYUITI MATSUBARA Advogado do(a) APELADO: PERICLES LANDGRAF ARAUJO DE OLIVEIRA - PR18294-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Exmo. Desembargador Federal CARLOS FRANCISCO (Relator): Tendo em vista a data de publicação da sentença apelada (14/03/2019), aplica-se ao julgamento dos presentes recursos o Código de Processo Civil/2015, consoante orientação dos Enunciados Administrativos nºs 2 e 3 do Superior Tribunal de Justiça. Feito esse esclarecimento, passo ao exame do recurso. Inicialmente, afasto a alegação de impossibilidade jurídica do pedido, tendo em vista suposta ofensa ao ato jurídico perfeito. De fato, aduz o apelante que a sentença permitiu que fossem revistos títulos de crédito livre e legitimamente emitidos pelo autor. Portanto a sentença seria nula, visto que não se pode desconsiderar o ato jurídico perfeito e revisar cláusulas de cédulas regularmente emitidas e posteriormente renegociadas com base em permissivo legal (Lei nº 9.138/95). Entretanto, a matéria tratada no art. 6º, caput e § 1º, da LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) não afasta a possibilidade de revisão de cláusulas contratuais consideradas ilegais ou abusivas, até mesmo como forma de coibir o enriquecimento sem causa, não havendo que se falar em ofensa à garantia do ato jurídico perfeito. Nesse diapasão, entendimento do Supremo Tribunal Federal: EMENTA Agravo regimental no agravo de instrumento. Direito Civil. Princípio da legalidade. Ato jurídico perfeito. Revisão judicial dos contratos para coibir enriquecimento sem causa. Possibilidade. Contrato de mútuo. Legislação infraconstitucional. Ofensa reflexa. Cláusulas contratuais. Fatos e provas. Reexame. Impossibilidade. Precedentes. 1. A afronta aos princípios da legalidade, do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório, dos limites da coisa julgada ou da prestação jurisdicional, quando depende, para ser reconhecida como tal, da análise de normas infraconstitucionais, configura apenas ofensa indireta ou reflexa à Constituição Federal. 2. A jurisprudência da Corte é de que a garantia constitucional do ato jurídico perfeito não elide a possibilidade da revisão judicial do contrato para coibir enriquecimento sem causa. 3. Inadmissível, em recurso extraordinário, a análise da legislação infraconstitucional e o reexame de cláusulas contratuais e do conjunto fático-probatório da causa. Incidência das Súmulas nºs 636, 454 e 279/STF. 4. Agravo regimental não provido. (AI 863832 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 01/03/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-051 DIVULG 17-03-2016 PUBLIC 18-03-2016) É preciso trazer à colação, ademais, a orientação contida na Súmula nº 286 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual “A renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores”. Assim, uma vez que inexiste, na ordem jurídica, vedação à formulação de pedido de revisão de cláusulas contratuais, não há que se falar de impossibilidade jurídica do pedido. Da mesma forma, a alegação de que “(...) a edição da referida Medida Provisória não se configura como negócio jurídico envolvendo o Banco do Brasil e a União Federal e sim “factum principis”, a que aquela instituição está subordinada (...)”, não justifica a conclusão do apelante, de que não pode haver a prática de qualquer ilegalidade. Com efeito, o fato do príncipe, ato de autoridade não diretamente relacionado com o contrato, mas que acaba por afetar, indiretamente, o pacto firmado entre a Administração Pública e o particular, não exonera o Poder Público de restabelecer o equilíbrio contratual rompido, não impedindo, de outro lado, a revisão de cláusulas que se revelem abusivas. Vale lembrar que o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular não é absoluto, encontrando limites nos próprios direitos assegurados pela ordem jurídica aos administrados. Quanto à alegação de prescrição, é preciso registrar que o Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial nº 1361730/RS, submeteu a julgamento as seguintes questões: I - do prazo prescricional para o ajuizamento de ação revisional cumulada com repetição de indébito relativas a cédulas de crédito rural; e II - do termo inicial da contagem do prazo prescricional. Concluindo o julgamento, o STJ firmou as seguintes teses sob a sistemática dos Recursos Repetitivos (Tema nº 919): I - A pretensão de repetição de indébito de contrato de cédula de crédito rural prescreve no prazo de vinte anos, sob a égide do art. 177 do Código Civil de 1916, e de três anos, sob o amparo do art. 206, §3º, IV, do Código Civil de 2002, observada a norma de transição do art. 2.028 desse último Diploma Legal; II - O termo inicial da prescrição da pretensão de repetição de indébito de contrato de cédula de crédito rural é a data da efetiva lesão, ou seja, do pagamento. In casu, registre-se que, quanto aos contratos/nota de crédito de nº 89/00379-9, 89/00453-1, 91/00261-3, 92/00186-6, 92/00241-2, 94/00176-6, 94/00177-4, 94/00287-8 e 94/00294-0, antes do decurso do prazo prescricional, foram renegociados/securitizados, por intermédio da cédula de securitização de n° 96/70160-9, cuja data de vencimento ocorrerá apenas em 2025. Assim, levando-se em conta, neste ponto, o quanto disposto no art. 199, II, do Código Civil/2002 (correspondente ao art. 170, II, do CC/1916), segundo o qual, não corre a prescrição enquanto não estiver vencido o prazo, é de se concluir que o prazo prescricional sequer teve início. Já quanto aos contratos de confissão de dívida, firmados em 25/01/1999 e 26/10/2003, denota-se que os mesmos também foram renegociados/securitizados antes do decurso do prazo prescricional, valendo ressaltar que a data de vencimento das referidas escrituras estava previsto para 2018 e 2016. Assim, levando-se em conta que a presente ação revisional foi proposta em 18/12/2015 (ID 131902828, fls. 03), também não resta verificada a ocorrência da prescrição trienal. Superadas as preliminares, passo ao exame do mérito. Como se sabe, as cédulas de crédito (rural, industrial, comercial etc.) constituem títulos civis que exteriorizam verdadeira promessa de pagamento de quantia em dinheiro, feita pelo devedor em razão de um financiamento concedido pelo credor, estando vinculadas à prestação de uma garantia da dívida, sob a forma de bens móveis ou imóveis. Mais especificamente quanto à cédula de crédito rural, ela encontra regulamentação no Decreto-Lei nº 167/1967, que cuida de defini-la em seus arts. 9º e 10, assim redigidos à época dos fatos da causa: Art 9º A cédula de crédito rural é promessa de pagamento em dinheiro, sem ou com garantia real cedularmente constituída, sob as seguintes denominações e modalidades: I - Cédula Rural Pignoratícia. II - Cédula Rural Hipotecária. III - Cédula Rural Pignoratícia e Hipotecária. IV - Nota de Crédito Rural. Art 10. A cédula de crédito rural é título civil, líquido e certo, exigível pela soma dela constante ou do endosso, além dos juros, da comissão de fiscalização, se houver, e demais despesas que o credor fizer para segurança, regularidade e realização de seu direito creditório. O art. 5º do referido Decreto-Lei nº 167/1967 estabelece que as importâncias fornecidas pelo financiador vencerão juros, às taxas que o Conselho Monetário Nacional (CMN) fixar. Ocorre que, diante da omissão do CMN, deve ser aplicada a regra geral prevista no art. 1º do Decreto nº 22.626/1933 (Lei da Usura), que veda a cobrança de juros em percentual superior ao dobro da taxa legal, ou seja, 12% ao ano. Esse o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. EXECUÇÃO FISCAL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL CEDIDA À UNIÃO. APLICABILIDADE DO CDC. REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 5/STJ. (...) 5. Da mesma forma, constitui orientação pacífica no STJ que os juros bancários não estão limitados a 12% ao ano, contudo as cédulas de crédito rural, comercial e industrial estão submetidas a regramentos próprios - quais sejam, o da Lei 6.840/80 e o do Decreto-Lei 413/69 - que, por sua vez, conferem ao Conselho Monetário Nacional o dever de fixar os juros a serem praticados. Em razão da omissão do CMN, incide a limitação de 12% ao ano, prevista no Decreto 22.626/33 (Lei da Usura). (...) (REsp 1659813/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/05/2017, DJe 20/06/2017) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REVISÃO. LIMITAÇÃO JUROS REMUNERATÓRIOS EM CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. TEMA NÃO JULGADO SOB O RITO DE RECURSO REPETITIVO. JUÍZO DE RETRATAÇÃO INDEVIDO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. TEMA AFETADO SOB O RITO DE REPETITIVO. DEVOLUÇÃO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LIMITAÇÃO. JUROS REMUNERATÓRIOS EM CÉDULA DE CRÉDITO INDUSTRIAL. OMISSÃO DO CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL. APLICAÇÃO DA LEI DE USURA. LIMITAÇÃO A 12% AO ANO. AGRAVO NÃO PROVIDO. Prosseguindo, acerca dos encargos moratórios, cumpre esclarecer que a comissão de permanência tem por finalidade atualizar e remunerar o capital na hipótese de inadimplemento, encontrando previsão na Resolução nº 1.129/86 do Banco Central do Brasil, in verbis: I- Facultar aos bancos comerciais, bancos de desenvolvimento, bancos de investimento, caixas econômicas, cooperativas de crédito, sociedades de crédito, financiamento e investimento, sociedades de arrendamento mercantil cobrar de seus devedores por dia de atraso no pagamento ou na liquidação de seus débitos, além de juros de mora na forma da legislação em vigor, " comissão de permanência ", que será calculada às mesmas taxas pactuadas no contrato original ou à taxa de mercado do dia do pagamento. Sobre a legalidade da sua cobrança, assim dispõe a Súmula nº 294 do Superior Tribunal de Justiça: Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa de contrato. Entretanto, em que pese a orientação jurisprudencial acima, o mesmo Superior Tribunal de Justiça, especificamente no que toca à cédula de crédito rural, firmou o entendimento no sentido de ser indevida a cobrança de comissão de permanência, tendo em vista a limitação imposta pelo já mencionado art. 5º do Decreto-Lei nº 167/1967. Nessa linha, o julgado a seguir: COMERCIAL. CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA E HIPOTECÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. JULGAMENTO EX OFFICIO. INOCORRÊNCIA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. INEXIGIBILIDADE. JUROS NA INADIMPLÊNCIA. TERMO FINAL. (...) II. Inobstante a possibilidade da cobrança da comissão de permanência em contratos estabelecidos pelos bancos, a cédula rural pignoratícia e hipotecária tem disciplina específica no Decreto-lei n. 167/67, art. 5º, parágrafo único, que prevê somente a cobrança de juros e multa no caso de inadimplemento. Ademais, ainda que convencionada, a incidência cumulada com a correção monetária, multa ou juros moratórios - estes últimos estipulados in casu -, encontra óbice na própria norma instituidora (Resolução n. 1.129/86 do BACEN). (...) (REsp 330.110/MG, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 18/10/2001, DJ 25/02/2002, p. 388) AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. OMISSÃO NO ACÓRDÃO DE ORIGEM. NÃO OCORRÊNCIA. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. QUESTÕES FACTUAIS. REVISÃO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULAS 5 E 7/STJ. NÃO PROVIMENTO. Outrossim, em caso de mora, ou seja, de retardamento culposo ou cumprimento deficiente da obrigação contratada, tem-se que as instituições financeiras estão autorizadas a cobrar os juros remuneratórios e os de mora, além de multa moratória e correção monetária. Confira-se: AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL. CÉDULA DE CRÉDITO COMERCIAL. TAXA DE JUROS. LIMITAÇÃO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. INEXIGIBILIDADE. Nas Cédulas de Crédito Rural, Industrial ou Comercial, a instituição financeira está autorizada a cobrar, após a inadimplência, a taxa de juros remuneratórios, limitada a 12% ao ano, elevada de 1%, a título de juros de mora, além de multa de 10% e correção monetária, sendo inexigível a cobrança de comissão de permanência. Agravo improvido. (STJ, Terceira Turma, AgRg no REsp n. 804.118/DF, rel. Min. Sidnei Beneti, DJe de 12/12/2008.) AGRAVO REGIMENTAL. CÉDULA DE CRÉDITO INDUSTRIAL. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. INADIMPLÊNCIA. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. Não se admite a cobrança de comissão de permanência nas cédulas de crédito industrial. 2. Inadimplida a obrigação, ficam as instituições financeiras autorizadas a cobrar, em substituição à comissão de permanência, os encargos previstos para a fase de normalidade, acrescidos de juros de mora e multa. 3. Nas cédulas de crédito rural, comercial e industrial incide a limitação de 12% aos juros remuneratórios. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp n. 3.154/MG, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 4/8/2011, DJe de 12/8/2011.) Relativamente à multa, tem-se que deve ser mantida no patamar de 10%, tal como prevista no art. 71 do Decreto-Lei nº 167/1967, tendo em vista que não se aplica ao caso o disposto no art. 52, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, com a redação dada pela Lei nº 9.298/1996, que veda a aplicação de multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu termo, em patamares superiores a 2% do valor da prestação. Com efeito, não se aplica o Código de Defesa do Consumidor à pessoa jurídica, nas hipóteses em que o produto adquirido ou o serviço contratado for utilizado para implementação da atividade econômica explorada pela adquirente contratante. Isso é assim, pois em casos tais não se revela presente a figura do consumidor, assim definido como a pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final (art. 2º, caput, do CDC). O que se tem, na verdade, é uma relação de insumo, e não de consumo, o que afasta a incidência da legislação consumerista. A ementa a seguir confirma esse entendimento: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS A EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. AFRONTA AO ART. 535 DO CPC/1973. SÚMULA N. 284/STF. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO. SÚMULA N. 211/STJ. MULTA MORATÓRIA. CDC. INAPLICABILIDADE. SÚMULA N. 83/STJ. DECISÃO MANTIDA. (...) 4. Segundo a orientação jurisprudencial do STJ, não incide o CDC, por ausência da figura do consumidor (art. 2º do CDC), nos casos de financiamento bancário ou de aplicação financeira com o propósito de ampliar capital de giro e atividade profissional. 5. No caso, o acórdão impugnado pelo recurso especial julgou em conformidade com entendimento desta Corte ao manter a multa moratória contratada, considerando a inadequação dos insurgentes ao conceito de "consumidor final". 6. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 555.083/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 25/6/2019, DJe de 1/7/2019.) Diante do exposto, REJEITO a matéria preliminar e DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação para afastar a redução da multa moratória a 2% após 01/08/1996, mantendo-a no percentual de 10%, tal como prevista em contrato. Em razão da sucumbência recíproca, nos termos do art. 85, §3º do CPC, condeno cada uma das partes ao pagamento da verba honorária, fixada mediante aplicação do percentual mínimo das faixas previstas sobre o montante que for apurado na fase de cumprimento de sentença (que arbitro como equivalente ao proveito econômico tratado nos autos, não obstante a procedência parcial da pretensão), na seguinte proporção: 80% para o autor e 20% para os réus (10% para cada um deles). Custas e demais ônus processuais têm os mesmos parâmetros. É como voto.
1. No julgamento do recurso repetitivo n. 1.061.530/RS houve ressalva expressa quanto a aplicação do entendimento sobre a limitação dos juros remuneratórios às cédulas de crédito rural, comercial e industrial uma vez que estão submetidas a regramentos próprios - quais sejam, o da Lei 6.840/80 e o do Decreto-Lei 413/69 - que, por sua vez, conferem ao Conselho Monetário Nacional o dever de fixar os juros a serem praticados. Em razão da omissão do CMN, incide a limitação de 12% ao ano, prevista no Decreto 22.626/33 (Lei da Usura). 2. Dessa forma, não há falar em juízo de retratação no tocante à questão da limitação dos juros remuneratórios em cédula de crédito rural, porquanto não definida em sede de recurso repetitivo.
3. A questão relativa à repetição em dobro de indébito está afetada para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, sendo necessária a devolução dos autos à Corte de origem para que lá aguarde o julgamento e o posterior juízo de retratação.
4. Agravo interno parcialmente provido, para afastar a determinação de juízo de retratação no tocante à questão da limitação dos juros remuneratórios em cédula de crédito rural.
(AgInt no AREsp n. 686.281/PR, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 10/10/2017, DJe de 16/10/2017.)
1. As cédulas de crédito rural, comercial e industrial estão sujeitas a legislação própria (Lei 6.840/80 e Decreto-Lei 413/69), que confere ao Conselho Monetário Nacional o dever de fixar os juros a serem praticados, razão pela qual, diante da omissão do CMN, ficam sujeitas à limitação de 12% ao ano, prevista no Decreto 22.626/33 (Lei da Usura). 2. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp n. 414.457/ES, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 7/2/2019, DJe de 19/2/2019.)
1. Se as questões trazidas à discussão foram dirimidas, pelo Tribunal de origem, de forma suficientemente ampla, fundamentada e sem omissões, obscuridades ou contradições, deve ser afastada a alegada ofensa ao art. 1.022, I e II, do Código de Processo Civil.
2. "Inadimplida a obrigação, ficam as instituições financeiras autorizadas a cobrar, em substituição à comissão de permanência, os encargos previstos para a fase de normalidade, acrescidos de juros de mora e multa. Nas cédulas de crédito rural, comercial e industrial incide a limitação de 12% aos juros remuneratórios" (Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 3.154/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Quarta Turma, DJe de 12/8/2011).
3. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória e a interpretação de cláusulas contratuais (Súmulas 5 e 7/STJ).
4. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp n. 1.656.561/PR, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 3/10/2022, DJe de 7/10/2022.)
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. MATÉRIA PRELIMINAR. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. FATO DO PRÍNCIPE. PRESCRIÇÃO. CÉDULAS DE CRÉDITO RURAL. TAXA DE JUROS. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MULTA MORATÓRIA. INAPLICABILIDADE DO CDC.
- Afastada a alegação de impossibilidade jurídica do pedido, tendo em vista suposta ofensa ao ato jurídico perfeito. A matéria tratada no art. 6º, caput e § 1º, da LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) não afasta a possibilidade de revisão de cláusulas contratuais consideradas ilegais ou abusivas, até mesmo como forma de coibir o enriquecimento sem causa, não havendo que se falar em ofensa à garantia do ato jurídico perfeito.
- O fato do príncipe, ato de autoridade não diretamente relacionado com o contrato, mas que acaba por afetar, indiretamente, o pacto firmado entre a Administração Pública e o particular, não exonera o Poder Público de restabelecer o equilíbrio contratual rompido, não impedindo, de outro lado, a revisão de cláusulas que se revelem abusivas. Vale lembrar que o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular não é absoluto, encontrando limites nos próprios direitos assegurados pela ordem jurídica aos administrados.
- Quanto à alegação de prescrição, no Tema 919/STF foi firmada a seguinte Tese: I - A pretensão de repetição de indébito de contrato de cédula de crédito rural prescreve no prazo de vinte anos, sob a égide do art. 177 do Código Civil de 1916, e de três anos, sob o amparo do art. 206, §3º, IV, do Código Civil de 2002, observada a norma de transição do art. 2.028 desse último Diploma Legal; II - O termo inicial da prescrição da pretensão de repetição de indébito de contrato de cédula de crédito rural é a data da efetiva lesão, ou seja, do pagamento.
- Levando-se em conta que a presente ação revisional foi proposta em 18/12/2015, não resta verificada a ocorrência da prescrição trienal.
- O art. 5º do Decreto-Lei nº 167/1967 estabelece que as importâncias fornecidas pelo financiador vencerão juros, às taxas que o Conselho Monetário Nacional (CMN) fixar. Ocorre que, diante da omissão do CMN, para as cédulas de crédito rural deve ser aplicada a regra geral prevista no art. 1º do Decreto nº 22.626/33 (Lei da Usura), que veda a cobrança de juros em percentual superior ao dobro da taxa legal (ou seja, 12% ao ano).
- É indevida a cobrança de comissão de permanência no bojo da cédula de crédito rural, tendo em vista a limitação imposta pelo já mencionado art. 5º do Decreto-Lei nº 167/1967. Em caso de mora, ou seja, de retardamento culposo ou cumprimento deficiente da obrigação contratada, as instituições financeiras estão autorizadas a cobrar os juros remuneratórios e os de mora, além de multa moratória e correção monetária.
- A multa das cédulas de crédito rural deve ser mantida no patamar de 10%, tal como prevista no art. 71 do Decreto-Lei nº 167/1967, tendo em vista que não se aplica ao caso o disposto no art. 52, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, que veda a aplicação de multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu termo, em patamares superiores a 2% do valor da prestação.
- Não se aplica o Código de Defesa do Consumidor à pessoa jurídica quandoo produto adquirido ou o serviço contratado for utilizado para implementação da atividade econômica explorada pela adquirente contratante. Isso é assim, pois em casos tais não se revela presente a figura do consumidor, assim definido como a pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final (art. 2º, caput, do CDC). O que se tem, na verdade, é uma relação de insumo, e não de consumo, o que afasta a incidência da legislação consumerista.
- Matéria preliminar rejeitada. Apelação parcialmente provida para afastar a redução da multa moratória a 2% após 01/08/1996, mantendo-a no percentual de 10%, tal como prevista em contrato.