Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5032246-45.2018.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: KITCHENS EMPREEND IMOBILIARIOS E PARTICIPACOES LTDA

Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO AUGUSTO NOGUEIRA - SP369704-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5032246-45.2018.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: KITCHENS EMPREEND IMOBILIARIOS E PARTICIPACOES LTDA

Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO AUGUSTO NOGUEIRA - SP369704-A

APELADO: DELEGADO ESPECIAL DA ADMINISTRACAO TRIBUTARIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - SAO PAULO, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

(cfg)

 

  

 

 

R E L A T Ó R I O 

 

Apelação interposta por KITCHENS EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. contra a sentença (ID 170729571) que denegou a segurança e julgou extinto o processo com resolução do mérito, ao considerar que não há prova nos autos quanto ao cumprimento da obrigação de desistência expressa das impugnações apresentadas ou recursos interpostos para a consolidação de débitos no Programa Especial de Regularização Tributária (PERT). 

 

Aduz a apelante (ID 170729577): 

a) os parágrafos 3º e 4º do artigo 8º da Instrução Normativa nº 1.711/2017 da Receita Federal do Brasil são excludentes entre si, ou seja, a regra genérica está no 3º e a exceção está no 4º, onde não foi mencionada a expressão “por ocasião da consolidação”; 

b) pode-se descrever o momento em que se efetiva, no PERT, a desistência tácita dos processos administrativos: i) à declaração de compensação (DCOMP) não homologada, aplica-se a regra do citado § 4º, em que a desistência é tácita quando do pagamento à vista ou da primeira parcela; ii) às demais discussões administrativas em andamento, aplica-se o § 3º, em que a desistência é tácita quando da consolidação; 

c) no caso concreto, quando aderiu ao PERT, incluiu também débitos decorrentes de DCOMP não homologadas que se encontravam em discussão administrativa; 

d) esses dispositivos ratificam o entendimento do pedido liminar, pois está explícito que a norma produz efeitos a partir do “requerimento”, condicionado ao “pagamento” e, uma vez cumpridos os requisitos e condições, pode-se afirmar que está constituída a relação jurídica de parcelamento entre o fisco e o contribuinte, de forma plena e irretratável, quanto aos casos de DCOMP não homologadas, como procedeu; 

e) segundo a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, qualquer norma vigora até ser revogada por outra lei de mesma hierarquia, mas com ela incompatível e, no caso em tela, com a alteração da IN RFB nº 1.711/2017 pela IN RFB nº 1.752/2017, operou-se a revogação geral da norma anterior;  

f) não se pode atribuir complementaridade à nova norma, pois a última passou a prescrever explicitamente a desistência expressa, que antes não era exigida e, assim, mudou radicalmente o procedimento, ou seja, o que antes se dava tacitamente, agora tem de ser expresso; 

g) todo fato jurídico, quer pelas suas condições de forma ou de substância, quer em relação a todos os seus efeitos passados, presentes e futuros, é regulado pela lei do tempo em que o fato foi juridicamente realizado; 

h) não se pretende invalidar a alteração promovida pela IN RFB nº 1.752/2017, mas, tão somente, validá-la a partir do momento de sua eficácia, isto é, para as adesões a partir 26/10/2017, pois antes dessa data as adesões ao PERT de débitos decorrentes de DCOMP não homologadas davam-se em desistência tácita, como previa a norma vigente até 25/10/2017; 

i) as matérias vinculadas ao direito das obrigações, incluindo o direito tributário, sempre são regidas pela lei vigente ao tempo da constituição, que rege a validade ou invalidade e a capacidade legal dos obrigados; 

j) o procedimento à época para caracterizar a constituição do PERT foi cumprido, com o requerimento da adesão protocolizado e o pagamento à vista realizado, dentro do prazo previsto legalmente, o que concretiza o direito adquirido; 

k) se a adesão ao PERT tivesse ocorrido a partir de 26/10/2017, na vigência da alteração promovida pela IN RFB nº 1.752, inescusável o reconhecimento da validade da desistência expressa dos processos administrativos decorrentes de DCOMP não homologadas, mas se aplicado o § 4º da IN RFB nº 1.711 vigente à época, aos débitos decorrentes de DCOMP não homologadas, a desistência tácita fez nascer o direito adquirido de adesão ao programa; 

l) todo o pagamento realizado no curso do PERT, mais precisamente os 5% (cinco por cento) do valor consolidado da dívida, considerou os valores dos débitos ora discutidos, os quais desde o momento da adesão foram incluídos no programa de regularização; 

m) como contribuinte, criou a expectativa de que cumpria a IN nº 1.711/2017, tanto que sempre incluiu os valores dos processos administrativos no parcelamento e a própria Receita Federal recebia os valores pagos sem objeção, mas, posteriormente, impediu a inclusão destes mesmos débitos no programa de regularização, com fundamento da modificação da norma (IN nº 1.752/2017), sobre a qual sequer foi notificado; 

n) não há previsão na Lei nº 13.496/2017 quanto à ausência de desistência de recursos administrativos ou judiciais, como motivo de exclusão do PERT, o que torna a medida ilegítima; 

o) o Superior Tribunal de Justiça já proferiu decisão, em sede de recurso repetitivo, no qual considerou indevida a exigência da desistência dos processos administrativos anteriores, após o contribuinte pagar regularmente o parcelamento sem a contestação da Receita Federal; 

p) cumpriu com todos os requisitos presentes no artigo 1º, § 4º, da Lei nº 13.496/2017 e a não formalização da desistência dos processos administrativos (protocolo de petição), motivado por mero erro formal, não é motivo suficiente para exclusão dos débitos do programa de regularização; 

q) anteriormente à consolidação no PERT dos débitos ora em discussão, requereu a expedição de certidão positiva com efeitos de negativa junto à Receita Federal do Brasil, a qual foi deferida, dado que necessitava da demonstração dos débitos a serem incluídos no programa de regularização, o que comprova estar o órgão ciente dos valores incluídos no PERT desde antes da consolidação, razão pela qual não há de se escusar de incluir os processos administrativos nesse programa de regularização, sob o pretexto de desconhecer a vontade da empresa em fazê-lo; 

r) é evidente, portanto, o direito de ter a possibilidade de incluir no PERT os débitos cuja discussão administrativa foi renunciada tacitamente, conforme permissivo do §4º do artigo 8º da Instrução Normativa nº 1.711/2017. 

 

Contrarrazões foram apresentadas pela UNIÃO (ID 170729594), nas quais requereu o desprovimento do recurso interposto. 

 

O Ministério Público Federal, instado, não se pronunciou sobre a causa por considerar ausente o interesse público ou socialmente relevante, bem como por não versar sobre direito individual indisponível, difuso ou coletivo que suscitasse a intervenção do órgão (ID 174961563). 

 

A apelação foi recebida apenas no efeito devolutivo (ID 175017193). 

 

É o relatório. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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V O T O 

 

Postula a apelante a inclusão no PERT (Programa Especial de Regularização Tributária) de débitos não previdenciários discriminados em processos administrativos relacionados a declarações de compensação (DCOMP) não homologadas, os quais foram excluídos do programa em razão da falta de desistência expressa da manifestação de inconformidade ou de recurso administrativo relacionados às referidas dívidas. Alega que a sua adesão ao programa, ocorreu na vigência da Instrução Normativa RFB nº 1.711, de 16 de junho de 2017, que previa a desistência tácita, consoante disposto no artigo 8º, parágrafos 3º e 4º, in verbis

 

Art. 8º A inclusão no Pert de débitos que se encontrem em discussão administrativa ou judicial deverá ser precedida da desistência das impugnações ou dos recursos administrativos e das ações judiciais que tenham por objeto os débitos que serão liquidados, e da renúncia a quaisquer alegações de direito sobre as quais se fundem as referidas impugnações e recursos ou ações judiciais e, no caso de ações judicias, deverá ser protocolado requerimento de extinção do processo com resolução do mérito, nos termos da alínea “c” do inciso III do art. 487 do CPC. 

(...) 

§ 3º O pagamento à vista ou a inclusão nos parcelamentos, por ocasião da consolidação, de débitos que se encontrem com exigibilidade suspensa em razão de impugnação ou de recurso administrativo implicará desistência tácita do procedimento que motivou a suspensão. 

§ 4º O pagamento à vista ou a inclusão nos parcelamentos de débitos informados na Declaração de Compensação (DCOMP) a que se refere o § 1º do art. 74 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, não homologada, implica desistência tácita da manifestação de inconformidade ou do recurso administrativo relativo ao crédito objeto da discussão. 

(...) 

 

A apelante comprovou que a sua adesão ao PERT ocorreu em 28/09/2017 (ID 170729537). A IN nº 1.711 foi alterada posteriormente ao ingresso da empresa no referido programa por meio da IN 1.752, de 25 de outubro de 2017, que modificou, entre outros, a redação dos parágrafos 3º e 4º, de forma que passou a exigir a desistência expressa da manifestação de inconformidade ou do recurso administrativo relativo ao crédito objeto da discussão, in verbis

 

(...) 

§ 3º A desistência de impugnação ou de recursos administrativos deverá ser efetuada na forma do Anexo Único, a ser apresentado à RFB até o último dia útil do mês de novembro de 2017, em formato digital, devendo ser observado, no que couber, o disposto na Instrução Normativa RFB nº 1.412, de 22 de novembro de 2013.  (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1752, de 25 de outubro de 2017) 

§ 4º O disposto no § 3º aplica-se inclusive à inclusão no pagamento à vista ou no parcelamento, de débitos informados na Declaração de Compensação (DCOMP) a que se refere o § 1º do art. 74 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, não homologada, hipótese em que o sujeito passivo deverá desistir da manifestação de inconformidade ou do recurso administrativo relativo ao crédito objeto da discussão.  (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1752, de 25 de outubro de 2017) 

(...) 

 

Aduz a apelante que em todos os pagamentos realizados no curso do programa de regularização foram considerados os débitos excluídos posteriormente do PERT em sua base de cálculo. 

Não se desconhece que o devedor não possui o direito subjetivo de parcelar a dívida. O parcelamento do débito tributário é um benefício conferido ao contribuinte, que somente pode ser usufruído se obedecidas as regras legais estabelecidas pelo ente público, sob pena de exclusão ou de não inclusão em determinado programa. No caso concreto, a adesão ao PERT, autorizada pela Medida Provisória nº 783/2017, posteriormente convertida na Lei nº 13.496, de 24 de outubro de 2017, se deu na vigência da IN RFB nº 1.711/2017, que não exigia, quanto aos débitos informados na Declaração de Compensação (DCOMP) não homologada, a desistência expressa de manifestação de inconformidade ou do recurso administrativo em relação a esses créditos da fazenda pública. O citado dispositivo infralegal presumia tácita a desistência de eventual manifestação de contrariedade do contribuindo quando fosse realizado o pagamento ou a inclusão desses débitos no parcelamento (artigo 8º, parágrafo 4º). 

 De acordo com a redação originária da IN nº 1.711/2017, as hipóteses previstas nos parágrafos 3º e 4º do artigo 8º são distintas. O parágrafo 4º originário, ao tratar da DCOMP não homologada, não fazia referência ao pagamento à vista ou a inclusão nos parcelamentos por ocasião da consolidação, conforme previsto no anterior parágrafo 3º. Com a alteração destes dispositivos por meio da IN nº 1.752/2017, esta distinção ficou mais evidente, na medida em que o parágrafo 4º acrescentou a necessidade de desistência de impugnação ou de recursos administrativos na forma estabelecida no parágrafo anterior, inclusive no que diz respeito à inclusão no pagamento à vista ou no parcelamento de débitos informados na Declaração de Compensação (DCOMP), o que reforça a ideia da diferença. 

Ainda que a hipótese de desistência tácita prevista na IN 1.711 já destoasse do contido no artigo 5º da MP nº 783, que previa a exigência de desistência expressa nos autos de processos administrativos ao tempo da adesão ao PERT, a norma infralegal criou no contribuinte a aparência de validade justamente por ter sido positivada em ato normativo da administração. Nesse sentido, não é razoável que o ente público desconsidere a ação do contribuinte imbuído de boa-fé que agiu segundo o regulamento vigente à época da adesão ao programa de regularização tributária. O descumprimento de uma exigência formal, posteriormente criada em razão da alteração da mesma instrução normativa (desistência expressa a recursos ou manifestações de contrariedade), regra que o contribuinte reputava se encontrar tacitamente atendida, não deve servir de fundamento para a exclusão dos débitos relativos às DCOMP não homologadas, desde de que comprovados os demais requisitos que validavam a inclusão destes débitos no PERT à época da adesão. A fazenda pública deve pautar a sua conduta nos princípios da razoabilidade e do interesse público para não causar impedimentos desnecessários ao contribuinte que quer pagar a dívida parceladamente, pois a recuperação dos tributos devidos é o objetivo final deste tipo de programa. Apesar de não haver discricionariedade na conduta do administrador público quanto à decisão de incluir ou de excluir determinado débito do programa de parcelamento tributário, cabe ao Judiciário sopesar outros princípios presentes em determinada situação, como a boa-fé e demais parâmetros jurídicos que podem abrir exceções às regras administrativas. Nesse sentido, já se decidiu no âmbito desta corte regional: 

 

  
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXCLUSÃO PERT. LEI 13.496/2017. DESISTÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO E RECURSOS ADMINISTRATIVOS.APELAÇÃO PROVIDA.  

-Na hipótese, constata-se que a adesão ocorreu nos termos da Instrução Normativa nº RFB nº 1.711/2017, cujo § 3º do art. 8º estava vigente em sua redação original.  

-Dessa forma, considerando que, à época da adesão, o impetrante observou o disposto na Instrução Normativa nº RFB nº 1.711/2017, e que só posteriormente a Instrução Normativa RFB nº 1752/2017 previu a necessidade de manifestação expressa do contribuinte em relação à desistência das impugnações ou dos recursos administrativos, constata-se que o pedido extemporâneo de desistência não pode elidir a realidade dos fatos, especialmente quando evidenciado o direito do apelante, que  pagou integralmente o valor da entrada  e vem efetuando regularmente a quitação das parcelas impostas, consoante demonstram os comprovantes acostados nos autos principais.  

-Apelação provida.  

(TRF3, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL/SP, 5001074-58.2018.4.03.6109, Relator(a) Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, Órgão Julgador 4ª Turma, Data do Julgamento 12/11/2021, Data da Publicação/Fonte DJEN DATA: 19/11/2021)  

 

 

  
PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PROGRAMA ESPECIAL DE REGULARIZAÇÃO TRIBUTÁRIA (PERT). LEI Nº 13.496/2017. RECURSOS ADMINISTRATIVOS. IMPUGNAÇÕES ADMINISTRATIVAS.  DESISTÊNCIA TÁCITA. IMPOSSIBILIDADE. DESCUMPRIMENTO DE EXIGÊNCIA FORMAL. APRECIAÇÃO CONTEXTUALIZADA DE ASPECTOS  JURÍDICOS.  BOA-FÉ. INTERESSE PÚBLICO. RAZOABILIDADE. LEGALIDADE. INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. EXCEÇÕES ÀS RÍGIDAS REGRAS ADMINISTRATIVAS. APELO DESPROVIDO.  

- O sistema normativo brasileiro prevê a obrigação tributária (principal ou acessória) como tema de direito público, do que decorre a indisponibilidade dos interesses a ela relacionados. Por óbvio, com o surgimento da obrigação tributária principal (concernente ao pagamento do tributo ou da multa pecuniária, ainda que decorrente de obrigação acessória), a legislação de regência estabelece prazo para o recolhimento, de maneira que a inadimplência expõe o devedor a um conjunto de mecanismos diretos e indiretos de cobrança. Portanto, após o vencimento do prazo da obrigação tributária, em regra o devedor não tem direito subjetivo a parcelar a dívida, exceto se a legislação estabelecer tal possibilidade mediante comandos normativos que se aproximam de benefício fiscal ou “favor” legislativo.  

- As hipóteses de parcelamento das dívidas tributárias, bem como os termos pelos quais esses parcelamentos são concedidos, devem estar previamente estabelecidos na legislação tributária (na amplitude do art. 96 do CTN). À luz de parâmetros constitucionais, a concessão de parcelamentos não se insere nas matérias reservadas exclusivamente à lei ordinária, embora esse ato legislativo primário possa ser editado com precedência em relação e atos normativos tais como decretos regulamentares. Esse assunto é cercado de controvérsia, especialmente porque o art. 152 ao art. 155-A, todos do CTN, estabelecem reserva de lei ordinária para moratórias e parcelamentos, a despeito de previsões constitucionais que dão maior amplitude normativa para atos normativos da Administração.  

- A impetrante, após aderir ao parcelamento da Lei nº 13.496/2017, foi impedida de consolidar os débitos referentes aos Processos Administrativos nºs 11487.720009/2013-64 e 10831.723560/2013-30,  ao argumento de inobservância do § 3º do art. 8º da IN 1.711/2017, com a redação dada pela IN 1752/2017”, de 25/10/2017, pois não teria desistido das respectivas impugnação e ou recursos administrativos. A adesão ao PERT, autorizada pela Medida Provisória 783/2017 (convertida na Lei 13.496/17), foi efetivada em  24/10/2017  

- Assim,  tem-se que na data em que formalizada a adesão  ao PERT pela impetrante, não se exigia desistência expressa do procedimento que motivou a suspensão da exigibilidade, sendo prevista ainda a desistência tácita quando da sua inclusão no parcelamento, nos moldes do do art. 8º, §3º, da IN RFB 1711/2017.  Ocorre que a desistência tácita prevista na IN RFB nº 1.711/2017 já destoava do contido no art. 5º da MP 783, DOU de 31/05/2017 (resultante na Lei 13.496/2017), que previu a exigência de desistência expressa nos autos de processos administrativos já ao tempo da adesão ao PERT  

- Se de um lado a desistência tácita prevista no art. 8º, §3º, da IN RFB nº 1.711/2017 contrariou a previsão do art. 5º, §2º da MP 783/2017, de outro lado criou no contribuinte a aparência de validade justamente por ter sido positivada em ato normativo da administração. Em situações como essa, emerge a garantia da confiança legítima, postulado do sistema jurídico brasileiro (p. ex., art. 100 do CTN, art. 54 da Lei 9.784/1999, e art. 48, § 12, da Lei 9.430/1996).  

- Expressão do direito fundamental à segurança jurídica, a confiança legítima gerada nessa situação sub judice exige que a administração pública respeite ações ou omissões de contribuintes que se comportaram exatamente como seus atos normativos infralegais orientaram. Em outras palavras, ainda que inválida à luz do contido no art. 5º, §2º da MP 783/2017, o art. 8º, §3º, a IN RFB nº 1.711/2017 gerou confiança digna de proteção, até porque não consta que a parte-impetrante tenha deixado de cumprir outros regramentos do PERT.  

- Pelo conjunto de elementos postos nos autos, a irregularidade que ensejou a exclusão da parte-impetrante do PERT foi em não ter requerido desistência expressa dos processos administrativos  nºs 11487.720009/2013-64 e 10831.723560/2013-30, descumprimento de exigência formal que não é suficiente para invalidar todas as demais práticas pelo contribuinte no sentido de aderir e de cumprir os requisitos formais e materiais do parcelamento.  

- É certo que a necessária vinculação que move a atuação do Fisco Federal impede que as autoridades fiscais façam flexibilizações tais como a presente, de modo que não é reprovável a medida de exclusão levada a efeito pela autoridade impetrada. No contexto da delimitação das escolhas do poder público, da atuação setorizada da administração tributária e demais predicados necessários à condução da coisa pública (especialmente a isonomia), cabia ao Fisco agir nos termos do ato atacado. Por outro lado, é plenamente possível que o Poder Judiciário faça apreciação contextualizada entre diversos aspectos jurídicos, boa-fé, modicidade de valores e demais parâmetros jurídicos que podem abrir legítimas exceções às rígidas regras administrativas.  

- Usando a conjugação prudente do interesse público, da razoabilidade, da legalidade e da instrumentalidade das formas, é cabível a pretensão deduzida nos autos, justamente para viabilizar a vontade de pagamento de dívida por parte do devedor, e o direito ao recebimento por parte do credor, dando prevalência a aspectos materiais em desfavor de irregularidades formais.  

-  Apelo fazendário e remessa oficial desprovidos.  

(TRF3, ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA/SP 5013446-51.2018.4.03.6105, Relator(a) para Acórdão Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, Relator(a) Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, Órgão Julgador 2ª Turma, Data do Julgamento 20/10/2021, Data da Publicação/Fonte DJEN DATA: 26/10/2021) 

  
 

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação e concedo a segurança pleiteada para determinar a inclusão no Programa Especial de Regularização Tributária (PERT) dos débitos decorrentes das Declarações de Compensação (DCOMP) não homologadas, relativos aos processos administrativos indicados pela apelante. 

Sem honorários, a teor do artigo 25 da Lei nº 12.016/2009. 

Custas na forma da lei. 

 

É como voto. 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A 

 

 

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. PROGRAMA ESPECIAL DE REGULARIZAÇÃO TRIBUTÁRIA (PERT). IN RFB 1.711/2017. VIGÊNCIA À ÉPOCA DA ADESÃO. DECLARAÇÕES DE COMPENSAÇÃO (DCOMP) NÃO HOMOLOGADAS. DESISTÊNCIA TÁCITA DE MANIFESTAÇÃO DE INCONFORMIDADE OU DE RECURSO ADMINISTRATIVO. INCLUSÃO DOS DÉBITOS NO PROGRAMA. RECURSO PROVIDO. 

- A adesão ao PERT, autorizada pela Medida Provisória nº 783/2017, posteriormente convertida na Lei nº 13.496, de 24 de outubro de 2017, se deu na vigência da IN RFB nº 1.711/2017, que não exigia, quanto aos débitos informados na Declaração de Compensação (DCOMP) não homologada, a desistência expressa de manifestação de inconformidade ou do recurso administrativo em relação a esses créditos da fazenda pública. 

- A norma infralegal criou no contribuinte a aparência de validade justamente por ter sido positivada em ato normativo da administração. Nesse sentido, não é razoável que o ente público desconsidere a ação do contribuinte imbuído de boa-fé que agiu segundo o regulamento vigente à época da adesão ao programa de regularização tributária. O descumprimento de uma exigência formal, posteriormente criada em razão da alteração da mesma instrução normativa (desistência expressa a recursos ou manifestações de contrariedade), regra que o contribuinte reputava se encontrar tacitamente atendida, não deve servir de fundamento para a exclusão do PERT dos débitos relativos às DCOMP não homologadas, desde de que comprovados os demais requisitos que validavam a inclusão destes débitos à época da adesão. 

- Apesar de não haver discricionariedade na conduta do administrador público quanto à decisão de incluir ou de excluir determinado débito do programa de parcelamento tributário, cabe ao Judiciário sopesar outros princípios presentes em determinada situação, como a boa-fé e demais parâmetros jurídicos que podem abrir exceções às regras administrativas. 

- Apelação provida. 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu DAR PROVIMENTO à apelação e conceder a segurança pleiteada para determinar a inclusão no Programa Especial de Regularização Tributária (PERT) dos débitos decorrentes das Declarações de Compensação (DCOMP) não homologadas, relativos aos processos administrativos indicados pela apelante. Sem honorários, a teor do artigo 25 da Lei nº 12.016/2009. Custas na forma da lei, nos termos do voto do Juiz Fed. Conv. SIDMAR MARTINS (Relator), com quem votaram a Des. Fed. MARLI FERREIRA e a Des. Fed. MÔNICA NOBRE. Ausente, justificadamente, em razão de férias, o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (substituído pelo Juiz Fed. Conv. SIDMAR MARTINS) , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.