Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0024072-40.2015.4.03.6100

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA

APELANTE: DOMINGOS DE PAULA, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogados do(a) APELANTE: GERSON LAURENTINO DA SILVA - SP178182-A, ROGERIO RAIMUNDINI GONCALVES - SP254818-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DOMINGOS DE PAULA

Advogados do(a) APELADO: GERSON LAURENTINO DA SILVA - SP178182-A, ROGERIO RAIMUNDINI GONCALVES - SP254818-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 
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3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0024072-40.2015.4.03.6100

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA

APELANTE: DOMINGOS DE PAULA, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogados do(a) APELANTE: GERSON LAURENTINO DA SILVA - SP178182-A, ROGERIO RAIMUNDINI GONCALVES - SP254818-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DOMINGOS DE PAULA

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R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de recursos de apelação interpostos por ambas as partes em face da r. sentença de id 151376159 que julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer o direito do autor à incidência de imposto de renda sobre os valores recebidos em reclamação trabalhista de acordo com o regime de competência, condenando a União Federal à restituição dos valores recolhidos a maior, a serem apurados em liquidação de sentença, com aplicação da Taxa SELIC, nos moldes da Lei n.º 9.250/95.

Considerando a sucumbência recíproca, a União foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios nos percentuais mínimos previstos nos incisos I a V, do § 3º, do art. 85, do CPC e o autor ao pagamento de honorários advocatícios fixados nos percentuais mínimos previstos nos incisos I a V, do § 3º, do art. 85, do CPC, incidentes sobre o valor dos pedidos improcedentes, de indenização por danos morais e do cálculo de imposto de renda incidente sobre os juros moratórios, a serem apurados em liquidação de sentença. Custas a serem divididas igualmente pelas partes, devendo a União reembolsar o montante de 50% ao autor. Sentença não sujeita ao reexame necessário, nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do CPC.

Os embargos de declaração foram acolhidos (id 151376164) para constar que por ser o autor beneficiário da justiça gratuita, a cobrança de honorários fica suspensa, a teor do art. 98, §3º do CPC.

Aduz Domingos de Paula em síntese, que a decisão é extra petita, pois a discussão dos autos é o valor que não foi restituído e não o cálculo da cobrança do imposto de renda. Assim, o autor requer que a União seja condenada a restituir o valor de R$ 97.914,79. Defende que tem direito a indenização por dano moral, nos termos do art. 159 do CC, pois a Receita Federal alterou sua declaração de imposto de renda zerando seu saldo a receber, prejudicando sua defesa a atrasando sua restituição desde 2011. Requer a reforma da sentença.

Aduz a União, em síntese, que não basta que a parte autora traga aos autos suas declarações de ajuste anual para que a contadoria proceda aos cálculos necessários, uma vez que esta não tem acesso às informações das fontes pagadoras, sujeitas ao sigilo fiscal. Na hipótese de se manter a r. sentença, requer que o valor eventualmente já recebido a título de restituição seja descontado dos valores supostamente devidos, sendo imperiosa, para definição do montante, a manifestação da Receita Federal do Brasil. Requer a reforma da sentença.

Com contrarrazões apenas da União, os autos subiram a esta e. Corte.

É o relatório.

 

 

 

 


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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0024072-40.2015.4.03.6100

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V O T O

 

 

Trata-se de ação de repetição de indébito proposta por Domingos de Paula, na qual relata que em 11/1990 ajuizou uma reclamação trabalhista em face do Banco Central, na qual obteve êxito, tendo sofrido desconto, supostamente indevido, de imposto de renda quando do cumprimento de sentença, no valor de R$ 123.285,39. Alega que está desde 2011 aguardando uma restituição do valor de R$ 97.914,79, sendo certo que também tem direito ao valor de R$ 25.370,60. Foi atribuído à causa o valor de R$ 326.350,18. A inicial foi emendada a fim de se acrescentar o pedido de dano moral, atribuído-se à causa o valor de R$ 483.950,18.

Alega o apelante que requer nesta ação, apenas, o valor exato do imposto de renda retido na fonte, por se tratar de desconto indevido.

Ocorre que a apuração do imposto de renda pessoa física não funciona dessa forma.

O Imposto de Renda é um tributo com fato gerador continuado ou complexivo, ou seja, se aperfeiçoa em um determinado período, cujo montante será definitivamente constituído quando da homologação da declaração de ajuste anual, conforme a exegese dos artigos 43 e 156, VII, do CTN.

Não há um fato gerador instantâneo ou imediato, mas continuado ou complexo, que se consuma ao final do período.

No caso das pessoas físicas, o ciclo se completa no último dia do ano civil.

Nesse sentido leciona o Professor Aliomar Baleeiro:

" ... há fato gerador instantâneo, ou único e imediato, e também fato gerador continuado ou complexo, porque composto de vários fatos conjuntos ou sucessivos. Neste último caso, a ocorrência do fato gerador só se consuma pela realização de todos esses elementos integrativos (in Baleeiro, Aliomar. Direito tributário brasileiro / Aliomar Baleeiro, Misabel Abreu Machado Derzi. – 14. ed., rev. atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 1094)

A renda e os descontos de impostos não representam, no sentido técnico, o tributo em si, pois somente será apurado ao final do ano calendário, momento que ocorre o fato gerador.

Para o cálculo do imposto de renda é necessário que se apure todo o valor percebido pelo sujeito num período e não apenas um determinado montante.

Assim, não se pode efetuar um cálculo de imediato, restituindo-se integralmente o valor de imposto de renda que incidiu sobre os valores supostamente isentos do tributo como defende o apelante.

Para se calcular o imposto de renda devido é necessário se reconstituir a situação da época, considerando todos os rendimentos auferidos pelo contribuinte ao longo do ano-base, redistribuindo os valores reconhecidos judicialmente ao logo do exercício, considerando-se as deduções legais que o contribuinte tinha direito naquele ano, conforme a tabela vigente, chegando-se, assim, ao valor devido.

Ao se compulsar os autos, observa-se que o autor não juntou a cópia integral da declaração original de imposto de renda, mas, apenas, partes das declarações retificadoras. Também não foram juntadas cópias da reclamação trabalhista (principalmente da decisão que transitou em julgado) e de algum documento que trata individualmente das verbas que sofreram a retenção. Também não foi juntado o informe de rendimento emitido pela fonte pagadora.

Há apenas uma cópia do comprovante de retenção, indicando o valor total do principal e do tributo retido (fl. 24).

Foi juntada uma página da declaração de imposto de renda do exercício de 2010 (fl. 18) na qual se observa que o contribuinte declarou um rendimento tributável no valor de R$ 388.009,52 que, após os cálculos do programa, gerou o imposto devido de R$ 97.914,79 que, com o abatimento do valor retido de R$ 123.285,39 gerou a restituição de R$ 25.370,60. Provavelmente essa página faz parte do recibo e páginas de fls. 25/28, que se trata da "declaração retificadora nº 2", entregue 18/04/2011.

Há também (e apenas) a cópia de um recibo de entrega da declaração retificadora do exercício de 2010 (fl. 17), entregue em 09/11/2011, que indica o valor a restituir de R$ 97.914,79.

Nesse cenário, é bem provável que o autor tenha cometido equívocos no preenchimento de sua declaração de imposto de renda e em desacordo com a DIRF - Declaração de Imposto de Renda Retido na Fonte entregue pela Fonte Pagadora, que acarretaram no atraso do processamento de sua declaração.

Por outro lado, afirma a parte que o desconto do tributo incidiu sobre diferenças de salários e horas extras.

A jurisprudência é pacífica no sentido de que incide imposto de renda sobre horas extras.

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. ADVOGADOS DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. ACORDO COLETIVO. "INDENIZAÇÃO" POR HORAS EXTRAORDINÁRIAS. NATUREZA REMUNERATÓRIA. ACRÉSCIMO PATRIMONIAL.
1. A verba decorrente de horas extraordinárias, inclusive quando viabilizada por acordo coletivo, tem caráter remuneratório e configura acréscimo patrimonial, incidindo, pois, Imposto de Renda.
2. É irrelevante o nomen iuris que empregado e empregador atribuem a pagamento que este faz àquele, importando, isto sim, a real natureza jurídica da verba em questão.
3. O fato de o montante ter sido fruto de transação em nada altera a conotação jurídica dos valores envolvidos.
4. Ademais, mesmo que caracterizada a natureza indenizatória do quantum recebido, ainda assim incide Imposto de Renda, se der ensejo a acréscimo patrimonial, como ocorre na hipótese de lucros cessantes.
5. Embargos de Divergência não providos.
(EREsp n. 695.499/RJ, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 9/5/2007, DJ de 24/9/2007, p. 236.)

No mesmo sentido, incide imposto de renda sobre diferenças salariais, por se tratar de renda natureza remuneratória.

Já os juros de mora dependem da natureza jurídica da prestação principal à qual estejam vinculados.

Eventual isenção do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza não pode ser reconhecida se inexistir expressa previsão legal, com a especificação das condições e requisitos para sua concessão (arts. 111 e 176 do CTN).

O fato de o recibo de fl. 19 tratar as verbas recebidas como "indenização" não tem o condão de modificar sua natureza.

Cabe acrescentar que o autor não discute o caráter indenizatório das verbas.

Aliás, não há nos autos qualquer documento que comprove a alegação de que a fonte pagadora teria admitido que reteve indevidamente o imposto de renda sobre parcela não tributável.

Nesse cenário, o julgamento foi convertido em diligência (fl. 106).

Informou a Receita Federal que:

"(...) para o exercício 2010, foi apresentada a Declaração de Ajuste Anual 08/35.964.403 com valor a restituir R$ 25.370,60; tendo sido efetivada a restituição no valor de R$ 29.211,70 na data de 15/09/2011.
Quanto ao exercício 2011, foi apresentada a Declaração de Ajuste Anual 08/35.915.273 (entrega em 13/11/2011) com valor a restituir declarado de R$ 96.892,99. Esta declaração foi analisada e alterada pela equipe de Malha Fiscal, o que resultou em saldo zero de Imposto a Restituir, não havendo saldo a restituir. (...)"

Pode o Fisco proceder a reconstituição das declarações de imposto de renda, pois a revisão do lançamento por iniciativa de ofício da autoridade administrativa é prevista pelo art. 145, III do CTN, como forma de alteração do lançamento tributário.

A mera alegação de que as informações prestadas são inverídicas não é suficiente para desconstituir os atos praticados pela Receita Federal no exercício de suas funções, já que são dotados de fé-pública e presunção relativa de legalidade e veracidade.

Por outro lado, o lançamento tributário deve ser pautado com base no princípio da busca da verdade material.

Embora a parte apelante alegue que a discussão nos autos não é a incidência de imposto de renda de rendimentos recebidos acumuladamente como concluiu a r. sentença, se trata de uma questão incidental favorável ao autor.

Afinal, se o contribuinte não preencheu corretamente sua declaração, o resultado em "saldo zero" pode estar equivocado.

Não caracteriza julgamento ultra ou extra petita quando a lide é decidida nos limites em que lhe foi apresentada, respeitando as circunstâncias fáticas trazidas aos autos e o pedido inicial, e concluindo com fundamento diverso daquele inicialmente trazido.

Cabe ao julgador extrair da inicial aquilo que a parte efetivamente pretende obter por meio da ação, reconhecendo eventuais pedidos implícitos sem que isso caracterize decisão extra petita.

Nesse cenário, deve ser mantida a r. sentença no sentido de reconhecer o direito do autor à incidência de imposto de renda sobre os valores recebidos em reclamação trabalhista de acordo com o regime de competência, condenando a União Federal à restituição dos valores recolhidos a maior, a serem apurados em liquidação de sentença, com aplicação da Taxa SELIC, nos moldes da Lei n.º 9.250/95.

Em face do exposto, nego provimento a ambos os recursos de apelação, nos termos fundamentados.

Incabível a majoração dos honorários na forma do artigo 85, §11, do CPC, tendo em vista que as duas partes recorreram e ambos os recursos foram desprovidos.

É como voto.



E M E N T A

DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DEVOLUÇÃO INTEGRAL DE RETENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. FATO GERADOR COMPLEXO. VERBAS INDENIZATÓRIAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. RECONSTITUIÇÃO DAS DECLARAÇÕES. VERDADE MATERIAL. RECURSOS DE APELAÇÃO DESPROVIDOS.

1 - O Imposto de Renda é um tributo com fato gerador continuado ou complexivo, ou seja, se aperfeiçoa em um determinado período, cujo montante será definitivamente constituído quando da homologação da declaração de ajuste anual, conforme a exegese dos artigos 43 e 156, VII, do CTN.

2 - A renda e os descontos de impostos não representam, no sentido técnico, o tributo em si, pois somente será apurado ao final do ano calendário, momento que ocorre o fato gerador.

3 - Para se calcular o imposto de renda devido é necessário se reconstituir a situação da época, considerando todos os rendimentos auferidos pelo contribuinte ao longo do ano-base, redistribuindo os valores reconhecidos judicialmente ao logo do exercício, considerando-se as deduções legais que o contribuinte tinha direito naquele ano, conforme a tabela vigente, chegando-se, assim, ao valor devido.

4 - Eventual isenção do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza não pode ser reconhecida se inexistir expressa previsão legal, com a especificação das condições e requisitos para sua concessão (arts. 111 e 176 do CTN).

5 - Pode o Fisco proceder a reconstituição das declarações de imposto de renda, pois a revisão do lançamento por iniciativa de ofício da autoridade administrativa é prevista pelo art. 145, III do CTN, como forma de alteração do lançamento tributário.

6 - O lançamento tributário deve ser pautado com base no princípio da busca da verdade material.

7 - Não caracteriza julgamento ultra ou extra petita quando a lide é decidida nos limites em que lhe foi apresentada, respeitando as circunstâncias fáticas trazidas aos autos e o pedido inicial, e concluindo com fundamento diverso daquele inicialmente trazido.

8 - Nesse cenário, deve ser mantida a r. sentença no sentido de reconhecer o direito do autor à incidência de imposto de renda sobre os valores recebidos em reclamação trabalhista de acordo com o regime de competência, condenando a União Federal à restituição dos valores recolhidos a maior, a serem apurados em liquidação de sentença, com aplicação da Taxa SELIC, nos moldes da Lei n.º 9.250/95.

9 - Recursos de apelação de ambas as partes desprovidos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento a ambos os recursos de apelação. Incabível a majoração dos honorários na forma do artigo 85, §11, do CPC, tendo em vista que as duas partes recorreram e ambos os recursos foram desprovidos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.