APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004489-84.2021.4.03.6128
RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: WISE PLASTICOS S.A
Advogado do(a) APELADO: LUMY MIYANO MIZUKAWA - SP157952-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004489-84.2021.4.03.6128 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: WISE PLASTICOS S.A Advogado do(a) APELADO: LUMY MIYANO MIZUKAWA - SP157952-A R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação e remessa oficial, tida por submetida, contra sentença que, em mandado de segurança, assegurou creditamento de PIS/COFINS sobre aquisição de desperdícios, resíduos ou aparas de plástico, papel ou cartão, vidro, ferro ou aço, cobre, níquel, alumínio, chumbo, zinco e estanho, e garantiu restituição/compensação segundo critérios apontados (trânsito em julgado, artigos 73 e 74 da Lei 9.430/1996, prescrição quinquenal e taxa SELIC exclusivamente), sem verba honorária. Apelou a PFN, alegando, em síntese: impossibilidade de creditamento de PIS/COFINS sobre aquisição do materiais descritos na exordial, já que "O sistema de creditamento de PIS e Cofins jamais teve o objetivo de gerar créditos indiscriminadamente à pessoa jurídica, mas, isto sim, apenas o de atenuar o efeito da incidência cumulativa ao longo da cadeia de produção e consumo, desonerando o preço do bem ou serviço ao respectivo consumidor final"; os artigos 47 e 48 da Lei 11.196/2005 devem ser interpretados de forma conjunta, de modo a afastar o direito ao creditamento à impetrante, pessoa jurídica que apura o PIS/COFINS com base no lucro real; "Sendo o benefício fiscal em comento semelhante à isenção, os dispositivos que o instituem devem ser interpretados de forma restritiva (art. 111 do CTN)"; "Neutralizada a vedação ao crédito prevista no art. 47 da Lei 11.196/2005 pelo art. 48, que afastou a incidência de PIS e Cofins sobre os mesmos itens, inexiste a cumulatividade aventada pela impetrante, não havendo, assim, de se falar em desrespeito ao meio ambiente (art. 170 e 225 da CRFB/88); aos princípios da livre concorrência, busca do pleno emprego e da legalidade (art. 1º, IV, 5º, II, 170 da CRFB/88); ao princípio da não cumulatividade (art. 195, §12, da CRFB/88); e ao princípio da isonomia e da capacidade contributiva (art. 150, II, e 145, §1º da CRFB/88)"; e estando pendente de julgamento definitivo o RE 607.109 pela Suprema Corte, de ser observada a jurisprudência favorável à impetrante, cabendo, pois a reforma da sentença, ou, sendo essa mantida, deve ser afastada a restituição administrativa, por ofensa ao sistema de precatórios previsto no artigo 100, da CF. Houve contrarrazões e parecer ministerial pela dispensa de intervenção quanto ao mérito. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004489-84.2021.4.03.6128 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: WISE PLASTICOS S.A Advogado do(a) APELADO: LUMY MIYANO MIZUKAWA - SP157952-A V O T O Senhores Desembargadores, preliminarmente cabe remessa oficial, que se tem por submetida, a teor do previsto no artigo 14, § 1º, da Lei 12.016/2009. Foram pleiteados créditos de PIS/COFINS, dentro do regime não cumulativo, por aquisição de desperdícios, resíduos ou aparas de plástico, papel ou cartão, vidro, ferro ou aço, cobre, níquel, alumínio, chumbo, zinco e estanho, sendo apontado serem tais itens insumos essenciais à consecução de suas atividades econômicas e que a proibição do creditamento de tais aquisições (artigos 47 e 48 da Lei 11.196/2005) viola diversos princípios constitucionais, em especial os da isonomia (artigos 5º e 150, II), proporcionalidade, razoabilidade, capacidade contributiva (artigo 145, § 1º), não confisco (artigo 150, IV), não cumulatividade (artigo 195, § 12) e proteção do meio ambiente (artigos 170, VI, e 225, CF). Eis os termos legais em que prevista a menciona vedação: Art. 47. Fica vedada a utilização do crédito de que tratam o inciso II do caput do art. 3º da Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e o inciso II do caput do art. 3º da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, nas aquisições de desperdícios, resíduos ou aparas de plástico, de papel ou cartão, de vidro, de ferro ou aço, de cobre, de níquel, de alumínio, de chumbo, de zinco e de estanho, classificados respectivamente nas posições 39.15, 47.07, 70.01, 72.04, 74.04, 75.03, 76.02, 78.02, 79.02 e 80.02 da Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI, e demais desperdícios e resíduos metálicos do Capítulo 81 da Tipi. Art. 48. A incidência da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins fica suspensa no caso de venda de desperdícios, resíduos ou aparas de que trata o art. 47 desta Lei, para pessoa jurídica que apure o imposto de renda com base no lucro real. Parágrafo único. A suspensão de que trata o caput deste artigo não se aplica às vendas efetuadas por pessoa jurídica optante pelo Simples. Acerca de tais dispositivos, cumpre ressaltar que o Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, firmou a tese no sentido de que "São inconstitucionais os arts. 47 e 48 da Lei 11.196/2005, que vedam a apuração de créditos de PIS/Cofins na aquisição de insumos recicláveis", conforme acórdão no RE 607.109 (Tema 304), redator p/ acórdão Min. GILMAR MENDES, assim ementado: "RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO TRIBUTÁRIO AMBIENTAL. 2. Tema 304 da sistemática da Repercussão Geral. 3. Artigos 47 e 48 da Lei federal 11.196/2005. Possibilidade de apuração de créditos de PIS/Cofins na aquisição de insumos recicláveis. 4. Coexistência dos regimes cumulativo e não cumulativo da contribuição ao PIS/Cofins. Dualidade de alíquotas. Prejuízos econômicos ao contribuinte industrial dedicado à reciclagem. 5. Inconstitucionalidade de tratamento tributário prejudicial à indústria de reciclagem. Princípio do protetor recebedor. Possibilidade concreta de os créditos fiscais superarem o valor do PIS/Cofins recolhido na etapa anterior da cadeia de produção. Afronta aos princípios da isonomia tributária, neutralidade fiscal e ao regime tributário favorecido e simplificado devido à microempresa e à empresa de pequeno porte. 6. Ética ambiental. Estado Socioambiental de Direito. Sustentabilidade ecológica e social. Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Artigos 170, inciso VI, e 225, da Constituição Federal. Vinculação do Legislador ordinário. Impossibilidade do esvaziamento do substrato axiológico dos direitos fundamentais ambientais. Inconstitucionalidade de tratamento tributário mais gravoso ao elo mais frágil da cadeia produtiva. População de baixa renda. Afronta às normas fundamentais de defesa do meio ambiente e da valorização do trabalho humano. 7. Fixação da tese: “São inconstitucionais os arts. 47 e 48 da Lei 11.196/2005, que vedam a apuração de créditos de PIS/Cofins na aquisição de insumos recicláveis". Relevam os seguintes trechos do voto vencedor do relator para o acórdão: "(...) Como visto, o benefício tributário assegurado pelas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 consiste basicamente no seguinte: as empresas recolhem as contribuições para o PIS e Cofins por uma alíquota mais elevada, de 9,25%, mas, a título de compensação, têm o direito de abater os créditos assegurados pela legislação tributária. No presente recurso extraordinário, a discussão cinge-se à constitucionalidade de dispositivos legais que, destoando dessa lógica, proíbem empresas submetidas ao regime não cumulativo – sujeitas, portanto, à alíquota majorada – de compensarem créditos oriundos da aquisição de insumos recicláveis. (...) Não há espaço, contudo, para o esvaziamento do substrato axiológico da norma prevista no art. 170, inciso VI, da CF, mediante a imposição de tratamento tributário prejudicial às empresas que, realizando os objetivos previstos na Política Nacional de Resíduos Sólidos (art. 7º da Lei 12.305/10), investiram em métodos industriais menos lesivos ao meio ambiente. O prejuízo causado pelo art. 47 da Lei 11.196/2005 às cadeias de produção dedicadas à reciclagem de resíduos sólidos foi minuciosamente descrito pela eminente Ministra Rosa Weber. Contudo, na visão de Sua Excelência, uma “ interpretação conjunta dos arts. 47 e 48 da Lei nº 11.196 /2005 afasta o alegado tratamento tributário mais gravoso para a aquisição de produtos não recicláveis” . Por essa perspectiva, não haveria “ violação ao princípio da isonomia, ou menoscabo da proteção ao meio ambiente (ainda que se admita que este pudesse ser aplicado para afastar incidência tributária, o que não me parece ser o caso)... Peço vênia para dissentir das conclusões da eminente relatora, pois, como demonstrei no decorrer do voto, parece-me que a proibição de abatimento de créditos na aquisição de insumos reutilizáveis (art. 47 da Lei 11.196/2005) não é suficientemente compensada pela isenção de PIS/Cofins concedida em benefício das cooperativas de catadores (art. 48), resultando em uma elevação da carga tributária total incidente sobre o processo de reciclagem. O resultado é estarrecedor. Hoje, do ponto de vista tributário, há maiores incentivos econômicos para os produtores que investem em tecnologias convencionais, assentadas no manejo florestal, do que para aqueles que adotam alternativas menos agressivas ao meio ambiente. (...) A injustiça desse sistema é perversa, pois, em rigor, os maiores prejudicados por tamanho desatino serão justamente os agentes econômicos que compõem elo mais frágil da cadeia produtiva, no caso, as cooperativas de catadores de materiais recicláveis, formadas por pessoas físicas de baixa renda. São elas que, invariavelmente, suportarão as consequências nocivas da política tributária instituída pela Lei 11.196/2005, já que, no limite, serão obrigadas a reduzir sua margem de lucro para compensar a elevação da carga tributária gerada pelo impedimento à compensação de créditos fiscais. (...) Assim, as empresas do ramo de reciclagem retornarão para o regime geral do PIS/Cofins, aplicável indiscriminadamente aos demais agentes econômicos, afastando o risco de o Tribunal incorrer em casuísmo e, involuntariamente, agravar as imperfeições sistêmicas da legislação tributária. (...) embora o legislador tenha visado a beneficiar os catadores de papel, a legislação provocou graves distorções que acabam por desestimular a compra de materiais reciclados. Hoje, do ponto de vista tributário, é economicamente mais vantajoso comprar insumos da indústria extrativista do que adquirir matéria-prima de cooperativas de catadores de materiais recicláveis. Trata-se, portanto, de legislação que, na tentativa de beneficiar as cooperativas de catadores, introduziu externalidades negativas na indústria de reciclagem, obliterando as vantagens competitivas dos agentes econômicos que a integram. Dito de outro modo, os dispositivos impugnados espraiam efeitos nocivos na indústria da celulose, fomentando as produtoras de celulose a migrarem para o método extrativista, o qual, mesmo quando promovido de forma sustentável, produz maior grau de degradação ambiental. Veja que, nesse contexto, para ganharem sobrevida no mercado, as cooperativas de materiais reciclados são obrigadas a reduzir o valor de seus produtos, na proporção necessária à neutralização das externalidades geradas pelos arts. 47 e 48 da Lei 11.196/2005. Do contrário, perdem espaço para a indústria extrativista, que, por um descuido do legislador, é favorecida pela legislação tributária. (...) Há, aqui, ofensa frontal ao princípio da isonomia em matéria tributária, previsto no art. 150, inciso II, da Constituição a Federal, na linha do parecer elaborado pelo professor Humberto Ávila (eDOC 1, p. 237257). Nele, demonstra o parecerista que a legislação impugnada discrimina empresas que concorrem em um mesmo segmento econômico (fabricação de celulose) com base em um critério de distinção ilegítimo". Na espécie, houve aquisição de desperdícios, resíduos ou aparas de plástico, papel ou cartão, vidro, ferro ou aço, cobre, níquel, alumínio, chumbo, zinco e estanho para consecução de atividades do objeto social (ID 255313074 - atividade principal: 38.32-7-00 - Recuperação de materiais plásticos; atividade secundária: 22.29-3-01 - Fabricação de artefatos de material plástico para uso pessoal e doméstico; 22.29-3-02 - Fabricação de artefatos de material plástico para usos industriais; 22.29-3-03 - Fabricação de artefatos de material plástico para uso na construção, exceto tubos e acessórios; 22.29-3-99 - Fabricação de artefatos de material plástico para outros usos não especificados anteriormente; 47.85-7-99 - Comercio varejista de outros artigos usados; 47.89-0-99 - Comércio varejista de outros produtos não especificados anteriormente; 63.63-8-00 - Outras sociedades de participação, exceto holdings; 64.99-9-99 - Outras atividades de serviços financeiros não especificados anteriormente; 68.10-2-02 - Aluguel de imóveis próprios; 77.29-2-99 - Aluguel de outros objetos pessoais e domésticos não especificados anteriormente; 77.39-0-99 - Aluguel de outras máquinas e equipamentos comerciais e industriais não especificados anteriormente, sem operador). Cotejando as aquisições e objeto social referente à atividade principal exercida, é inequívoco que tais bens devem ser reputados como insumos, segundo o teste de essencialidade a que se refere o paradigma firmado no REsp 1.221.770, julgado sob rito repetitivo. De outra parte, a atividade econômica enquadra-se na tipologia legal de produção de bens, assim atendendo à especificação setorial da previsão de creditamento constante do artigo 3º, caput, II, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 ("bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda"). Finalmente, declarada a inconstitucionalidade do artigo 48 da Lei 11.196/2005, a aquisição de tais bens passa a ser tributada a título de PIS/COFINS, cumprindo, portanto, o requisito previsto no artigo 3º, § 2º, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 ("não dará direito a crédito o valor" (...) da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição"). Assim, sem prejuízo da fiscalização, pela Receita Federal, das operações geradoras de crédito (inclusive quanto a condicionantes outros, como a necessidade da aquisição ocorrer de pessoa jurídica domiciliada no país - artigo 3º, § 3º, I das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003), tem-se que o pleito amolda-se ao regramento legal da matéria, à luz da decisão do Supremo Tribunal Federal quanto à inconstitucionalidade das vedações contidas na Lei 11.196/2005. A propósito, assim também já decidiu a Turma: ApCiv 5005398-90.2020.4.03.6119, Des. Fed. CONSUELO YOSHIDA, DJEN 10/08/2022: "DIREITO CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PIS/COFINS. CREDITAMENTO. ARTS. 47 E 48 DA LEI 11.196/2005. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO MANIFESTADO PELO STF NO TEMA 304 DA REPERCUSSÃO GERAL. 1. O art. 47 da Lei 11.196/2005 veda o direito ao creditamento de desperdícios, resíduos ou aparas utilizados como insumos. 2. O C. Supremo Tribunal Federal, no RE 607.109 - Tema 304, submetido à sistemática prevista no art. 543-B do CPC/73, art. 1036 do CPC/15, examinou a questão posta a julgamento e firmou a tese no sentido de que: "São inconstitucionais os arts. 47 e 48 da Lei 11.196/2005, que vedam a apuração de créditos de PIS/Cofins na aquisição de insumos recicláveis". 3. Extrai-se do voto condutor de lavra do e. Min. Gilmar Mendes que a vedação imposta pelo art. 47 Lei 11.196/05 viola o disposto no art. 170, inciso VI, da CF e as normas constitucionais relacionadas com a promoção e a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois impõe tratamento tributário prejudicial às empresas que, realizando os objetivos previstos na Política Nacional de Resíduos Sólidos (art. 7º da Lei 12.305/10), investiram em métodos industriais menos lesivos ao meio ambiente, bem como fere a isonomia tributária, ao discriminar empresas que concorrem em um mesmo segmento econômico com base em um critério de distinção ilegítimo. 4. No caso em apreço, a impetrante possui o seguinte objeto social (Id. 153725616): COMÉRCIO ATACADISTA DE RESÍDUOS E SUCATAS METÁLICOS, DE RESÍDUOS DE PAPEL E PAPELÃO E RESÍDUOS E SUCATAS NÃO METÁLICOS. 5. Diante da declaração de inconstitucionalidade do dispositivo legal, o creditamento deve ser viabilizado, em observância ao precedente vinculante. 6. O contribuinte poderá realizar a compensação administrativa dos valores indevidamente recolhidos a esse título após o trânsito em julgado da ação (art. 170-A do CTN), com atualização dos valores mediante aplicação da taxa Selic (art. 39, § 4º, da Lei 9.250/1995) e observância do disposto no art. 74 da Lei 9.430/1996 e demais dispositivos vigentes na data da propositura da ação. 7. A análise e exigência da documentação necessária para apuração do valor, bem como os critérios para a efetivação da compensação cabem ao Fisco, nos termos da legislação de regência, observando-se a revogação do parágrafo único do art. 26 da Lei 11.457/2007, pelo art. 8º da Lei 13.670 de 30 de maio de 2018, que também incluiu o art. 26-A da Lei 11.457/2007, elucidando a aplicabilidade do disposto no art. 74 da Lei 9.430/96, vedando a compensação com as contribuições previdenciárias nele mencionadas. 8. Apelação provida". No tocante à apuração e ressarcimento do indébito fiscal, a sentença assim decidiu (Id. 255313651): "Constatada a existência de pagamentos indevidos ou a maior, sobretudo em razão da não apuração, apropriação e utilização de créditos em tempo oportuno, a impetrante faz jus à compensação/restituição dos valores indevidamente recolhidos, assim como à consequente apuração e utilização dos créditos devidos, relativos período dos cinco anos que antecedem a propositura desta ação, a partir do trânsito em julgado da sentença (artigo 170-A do CTN)". [...] Em razão do exposto, CONCEDO A SEGURANÇA pleiteada, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inc. I, do CPC, para: [...] b) declarar o direito de restituição/compensação dos pagamentos indevidos, na forma dos artigos 73 e 74 da Lei 9.430/96, ressalvado o preenchimento dos requisitos aplicáveis a posterior regramento, a partir do trânsito em julgado desta sentença, observada a prescrição quinquenal e incidindo a variação da taxa SELIC, ressalvado o direito da Autoridade Fazendária em promover as diligências necessárias a fim de verificar a regularidade da operação, bem como à apuração e utilização dos créditos relativos ao mencionado quinquênio, nos termos da fundamentação da presente sentença. Contudo, não se trata, no caso, de compensação de valor indevidamente recolhido, e sim de saldo de crédito escritural não utilizado. O lançamento contábil extemporâneo, tal como pleiteado e deferido, opera-se ex nunc, e não com imputação retroativa aos eventuais pagamentos pretéritos de PIS/COFINS, para identificação de recolhimentos a maior anteriores. O manejo pretendido é dos próprios créditos escriturais, e não do saldo excedente pago ao Fisco pela falta de apropriação de tais valores contábeis, à época própria. Sucede que, nestes termos, em se tratando de compensação de crédito escritural, sem notícia de anterior resistência fiscal, a SELIC incide apenas após escoado o prazo de 360 dias para análise do pedido administrativo respectivo pelo Fisco, tal como decidido pelo Superior Tribunal de Justiça sob sistemática repetitiva (REsp 1.767.945, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 06/05/2020). Ademais, diversamente do que fez consignar o Juízo a quo, nenhum valor reconhecido nos autos pode ser objeto de ressarcimento ou restituição administrativa em espécie, sob pena de violação do regime constitucional de precatórios. Assim, créditos escriturais reconhecidos podem ser lançados extemporaneamente na escrita fiscal, sem atualização monetária e sob prescrição quinquenal (Decreto 20.910/1932) a partir da propositura da ação (sem prejuízo de eventual decisão do Supremo Tribunal Federal sobre modulação dos efeitos da inconstitucionalidade, conforme aplicável), para amortização das contribuições devidas, ou, na ausência de valores de PIS/COFINS a pagar, para compensação na via administrativa, em procedimento próprio, com comprovação e liquidação dos valores envolvidos, observados os critérios consagrados na jurisprudência; artigo 170-A, CTN (trânsito em julgado da decisão); artigo 74 da Lei 9.430/1996 e demais textos legais de regência, conforme regime legal vigente na propositura da ação. Em se tratando de declaração de compensação de crédito escritural, ausente resistência fiscal anterior, a SELIC é devida após 360 dias do protocolo do encontro de contas. Conforme já antecipado, a respeito da restituição administrativa, que tem sido deferida com base na Súmula 461 do Superior Tribunal de Justiça, é importante observar que o enunciado, ao fazer referência expressa a "precatório", registra entendimento de que não é possível que o ressarcimento de indébito fiscal, em espécie, reconhecido judicialmente, possa gerar condenação a pagamento fora do regime constitucional do precatório (artigo 100, Constituição Federal). De fato, o regime de precatório busca preservar a ordem cronológica das requisições e, sobretudo, as preferências alimentares, o que não se verifica possível ou garantido na via administrativa, até porque, nela, não concorrem, de forma conjunta e simultânea, as variadas cobranças em dinheiro contra a Fazenda Pública, ao contrário do que ocorre com requisições judiciais de precatórios que, inclusive, são todas globalmente organizadas e inseridas cronologicamente na previsão orçamentária anual para execução no exercício financeiro posterior. Permitir que o contribuinte utilize a via administrativa para receber pagamento de indébito fiscal em detrimento do sistema de precatório já foi reconhecido, inclusive, como inconstitucional pela Suprema Corte que, por semelhança, aplicou a solução expressa no Tema 831 da sistemática de repercussão geral (RE 1.069.065, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJe 19/12/2019). Na espécie, a sentença deve ser reformada, considerando o acima exposto e os limites da devolução, para: (1) explicitar, no tocante à compensação na via administrativa, que devem ser observados os critérios acima apontados; e (2) afastar a restituição administrativa. Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação e à remessa oficial, tida por submetida, para reformar a sentença, nos termos supracitados. É como voto.
E M E N T A
DIREITO CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PIS/COFINS. CREDITAMENTO. ARTIGOS 47 E 48 DA LEI 11.196/2005. TEMA 304. REPERCUSSÃO GERAL. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. INSUMOS. TESTE DE ESSENCIALIDADE. RESP 1.221.170. RESSARCIMENTO CABÍVEL. CRÉDITOS ESCRITURAIS. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. Cabível remessa oficial, que se tem por submetida, a teor da previsão contida no artigo 14, § 1º, da Lei 12.016/2009.
2. Foram pleiteados créditos de PIS/COFINS, no regime não cumulativo, por aquisição de desperdícios, resíduos ou aparas de plástico, papel ou cartão, vidro, ferro ou aço, cobre, níquel, alumínio, chumbo, zinco e estanho, sendo apontado serem tais itens insumos essenciais à consecução de suas atividades econômicas e que a proibição do creditamento de tais aquisições (artigos 47 e 48 da Lei 11.196/2005) viola diversos princípios constitucionais, em especial os da isonomia (artigos 5º e 150, II), proporcionalidade, razoabilidade, capacidade contributiva (artigo 145, § 1º), não confisco (artigo 150, IV), não cumulatividade (artigo 195, § 12) e proteção do meio ambiente (artigos 170, VI, e 225, CF).
3. Acerca de tais dispositivos, cumpre ressaltar que o Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, firmou a tese no sentido de que "São inconstitucionais os arts. 47 e 48 da Lei 11.196/2005, que vedam a apuração de créditos de PIS/Cofins na aquisição de insumos recicláveis", conforme acórdão no RE 607.109 (Tema 304).
4. Cotejando bens adquiridos (desperdícios, resíduos ou aparas de plástico, papel ou cartão, vidro, ferro ou aço, cobre, níquel, alumínio, chumbo, zinco e estanho) com atividades do objeto social (atividade principal de recuperação de materiais plásticos e atividades secundárias de fabricação de artefatos de material plástico para diversos usos, etc.), é inequívoco que a aquisição refere-se a insumos, segundo teste de essencialidade (REsp 1.221.770). De outra parte, a atividade econômica enquadra-se na tipologia legal de produção de bens, assim atendendo à especificação setorial da previsão de creditamento constante do artigo 3º, caput, II, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003.
5. Finalmente, declarada inconstitucionalidade do artigo 48 da Lei 11.196/2005, a aquisição de tais bens passa a ser tributada a título de PIS/COFINS, cumprindo, assim, o requisito previsto no artigo 3º, § 2º, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003.
6. Contudo, não se trata de compensação de indébito fiscal, mas de saldo de crédito escritural não utilizado. O lançamento contábil extemporâneo, pleiteado e deferido, opera-se ex nunc, e não com imputação retroativa a eventuais pagamentos pretéritos de PIS/COFINS, para identificação de recolhimentos a maior anteriores. O manejo pretendido é dos próprios créditos escriturais, e não do saldo excedente pago ao Fisco pela falta de apropriação de tais valores contábeis, à época própria. Em se tratando de compensação de crédito escritural sem notícia de anterior resistência fiscal, a SELIC incide apenas após escoado o prazo de 360 dias para análise do pedido administrativo respectivo pelo Fisco, tal como decidido pelo Superior Tribunal de Justiça sob sistemática repetitiva (REsp 1.767.945). Logo, nenhum valor reconhecido nos autos pode ser objeto de ressarcimento ou restituição administrativa em espécie, sob pena de violação do regime constitucional de precatórios.
7. Os créditos escriturais reconhecidos podem ser lançados extemporaneamente na escrita fiscal, sem atualização monetária e sob prescrição quinquenal (Decreto 20.910/1932) a partir da propositura da ação (sem prejuízo de eventual decisão do Supremo Tribunal Federal sobre modulação dos efeitos da inconstitucionalidade, conforme aplicável), para amortização das contribuições devidas, ou, na ausência de valores de PIS/COFINS a pagar, para compensação na via administrativa, em procedimento próprio, com comprovação e liquidação dos valores envolvidos, observados os critérios consagrados na jurisprudência; artigo 170-A, CTN (trânsito em julgado da decisão); artigo 74 da Lei 9.430/1996 e demais textos legais de regência, conforme regime legal vigente na propositura da ação. Em se tratando de declaração de compensação de crédito escritural, ausente resistência fiscal anterior, a SELIC é devida após 360 dias do protocolo do encontro de contas.
8. Sobre a restituição administrativa, que tem sido deferida com base na Súmula 461 do Superior Tribunal de Justiça, cabe observar que o enunciado, ao fazer referência expressa a "precatório", registra entendimento de que não é possível que o ressarcimento de indébito fiscal, em espécie, reconhecido judicialmente, possa gerar condenação a pagamento fora do regime constitucional do precatório (artigo 100, Constituição Federal). De fato, o regime de precatório busca preservar a ordem cronológica de requisições e, sobretudo, preferências alimentares, o que não se verifica possível ou garantido na via administrativa, até porque, nela, não concorrem, de forma conjunta e simultânea, as variadas cobranças em dinheiro contra a Fazenda Pública, ao contrário do que ocorre com requisições judiciais de precatórios que, inclusive, são todas globalmente organizadas e inseridas cronologicamente na previsão orçamentária anual para execução no exercício financeiro posterior. Permitir que se utilize a via administrativa para receber pagamento de indébito fiscal em detrimento do sistema de precatório foi reconhecido, inclusive, como inconstitucional pela Suprema Corte que, por semelhança, aplicou a solução expressa no Tema 831 da sistemática de repercussão geral (RE 1.069.065).
9. Apelação e remessa necessária, tida por submetida, providas em parte.