Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001611-05.2014.4.03.6102

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, SERVICO DE APOIO AS MICRO E PEQ EMPRESAS DE SAO PAULO, SERVICO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL, SERVICO SOCIAL DA INDUSTRIA - SESI

Advogado do(a) APELANTE: PRISCILLA DE HELD MENA BARRETO SILVEIRA - SP154087-A
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANO VALENTE FERNANDES BUSTO - SP211043-A

SUCESSOR: INDUSTRIA DE BEBIDAS DON LTDA - EPP

Advogado do(a) SUCESSOR: JOSE LUIZ MATTHES - SP76544-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001611-05.2014.4.03.6102

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, SERVICO DE APOIO AS MICRO E PEQ EMPRESAS DE SAO PAULO, SERVICO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL, SERVICO SOCIAL DA INDUSTRIA - SESI

Advogado do(a) APELANTE: PRISCILLA DE HELD MENA BARRETO SILVEIRA - SP154087-A
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANO VALENTE FERNANDES BUSTO - SP211043-A

SUCESSOR: INDUSTRIA DE BEBIDAS DON LTDA - EPP

Advogado do(a) SUCESSOR: JOSE LUIZ MATTHES - SP76544-A

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R E L A T Ó R I O

O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Trata-se de embargos de declaração opostos pelo Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo – SEBRAE-SP, pelo Serviço Social da Indústria – SESI e Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI e pela União Federal, em face de acórdão deste colegiado.

Em síntese, o SEBRAE afirma que o julgado incidiu em omissão. O SESI, o SENAI e a União Federal também alegam a existência de omissões no julgado, prequestionando dispositivos legais e constitucionais. Por isso, as embargantes pedem que sejam sanados os problemas que indicam.

Apresentadas contrarrazões pela parte autora, os autos vieram conclusos.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001611-05.2014.4.03.6102

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, SERVICO DE APOIO AS MICRO E PEQ EMPRESAS DE SAO PAULO, SERVICO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL, SERVICO SOCIAL DA INDUSTRIA - SESI

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Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANO VALENTE FERNANDES BUSTO - SP211043-A

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Advogado do(a) SUCESSOR: JOSE LUIZ MATTHES - SP76544-A

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V O T O

 

 

 

O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Nos termos do art. 1.022 do CPC/2015, os embargos de declaração podem ser opostos contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão, e corrigir erro material. E, conforme dispõe o art. 1.025 do mesmo CPC/2015, consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade.

Embora essa via recursal seja importante para a correção da prestação jurisdicional, os embargos de declaração não servem para rediscutir o que já foi objeto de pronunciamento judicial coerente e suficiente na decisão recorrida. Os efeitos infringentes somente são cabíveis se o julgado tiver falha (em tema de direito ou de fato) que implique em alteração do julgado, e não quando desagradar o litigante.

Por força do art. 1.026, §§2º e 3º, do CPC/2015, se os embargos forem manifestamente protelatórios, o embargante deve ser condenado a pagar ao embargado multa não excedente a 2% sobre o valor atualizado da causa (elevada a até 10% no caso de reiteração), e a interposição de qualquer recurso ficará condicionada ao depósito prévio do valor da multa (à exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que a recolherão ao final). E a celeridade e a lealdade impõem a inadmissibilidade de novos embargos de declaração se os 2 anteriores forem considerados protelatórios.

No caso dos autos, o SEBRAE alega que o julgado se omitiu quanto à fixação de honorários de sucumbência. O SESI e o SENAI também alegam a existência de omissão e contradição no acórdão acerca da questão relacionada à sua legitimidade passiva, em especial, sobre o disposto nos artigos 3º do Decreto-lei nº 9.403/46; art. 49 do Decreto n.º 57.375/1965; artigos 4º e 6º do Decreto-lei nº 4.048/42, artigo 50 do Decreto 494/1962,e, art. 1º, § 1º e § 5º e 3º da Lei 6.246/44, pleiteando a sua manutenção no polo passivo do feito ou, subsidiariamente, sendo mantida a sua exclusão, a fixação de honorários de sucumbência, prequestionando a matéria suscitada. A União Federal também alega a existência de omissão acerca das questões discutidas, discorrendo sobre a contribuição previdenciária, os julgados proferidos pelos Tribunais Superiores e prequestionando as matérias suscitadas, inclusive os dispositivos legais e constitucionais aplicáveis. A decisão recorrida tem o seguinte conteúdo:

 

Quanto ao legitimado passivo para lides tributárias, particularmente acredito que as ações judiciais sempre devem ser intentadas em face da pessoa jurídica de Direito Público que tem capacidade tributária ativa (assim entendida a atribuição para fiscalizar e para arrecadar a exação), independentemente da competência para legislar e da destinação legal ou constitucional do produto da arrecadação. É da seara do Direito Financeiro analisar se a arrecadação tributária será dividida ou se ficará exclusivamente com um ente estatal, preocupação que não se projeta para a legitimidade processual no que concerne a aspectos de incidência tributária (sujeita aos domínios do Direito Tributário e afetos à capacidade tributária para fiscalizar e arrecadar tributos).

Porque compete às Delegacias da Receita Federal do Brasil (órgãos da União Federal) a capacidade tributária ativa de tributos como os ora combatidos, por força do art. 2º, do art. 16 e do art. 23 da Lei 11.457/2007, os entes estatais que recebem parte do produto arrecadado (integrantes do denominado “Sistema S”, na proporção equivalente às contribuições para “terceiros”) não têm legitimação processual, dado que seu interesse é apenas econômico.

Houve importante controvérsia judicial a esse respeito, com acórdãos concomitantes e divergentes sobre a legitimação passiva de feitos como o presente (p. ex., no E.STJ: AgInt no AREsp 1153575/RS AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2017/0204450-8, Rel. Min MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, j. 21/11/2017, DJe 27/11/2017, e REsp 1698012/PR RECURSO ESPECIAL 2017/0227329-8, Rel. Min. Ministro OG FERNANDES, também da SEGUNDA TURMA, j. 07/12/2017, DJe 18/12/2017).

Posteriormente, a jurisprudência se consolidou para, em ações como a presente, excluir a legitimidade passiva de entidades que não ostentam condição de sujeito ativo da obrigação tributária (ainda que recebam o produto da arrecadação). Nesse sentido, trago à colação o seguinte julgado da Primeira Seção do E.STJ:

 

PROCESSUAL CIVIL, FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. CONTRIBUIÇÕES DESTINADAS A TERCEIROS. SERVIÇOS SOCIAIS AUTÔNOMOS. DESTINAÇÃO DO PRODUTO. SUBVENÇÃO ECONÔMICA. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. LITISCONSÓRCIO. INEXISTÊNCIA.

1. O ente federado detentor da competência tributária e aquele a quem é atribuído o produto da arrecadação de tributo, bem como as autarquias e entidades às quais foram delegadas a capacidade tributária ativa, têm, em princípio, legitimidade passiva ad causam para as ações declaratórias e/ou condenatórias referentes à relação jurídico-tributária.

2. Na capacidade tributária ativa, há arrecadação do próprio tributo, o qual ingressa, nessa qualidade, no caixa da pessoa jurídica.

3. Arrecadado o tributo e, posteriormente, destinado seu produto a um terceiro, há espécie de subvenção.

4. A constatação efetiva da legitimidade passiva deve ser aferida caso a caso, conforme a causa de pedir e o contexto normativo em que se apoia a relação de direito material invocada na ação pela parte autora.

5. Hipótese em que não se verifica a legitimidade dos serviços sociais autônomos para constarem no polo passivo de ações judiciais em que são partes o contribuinte e o/a INSS/União Federal e nas quais se discutem a relação jurídico-tributária e a repetição de indébito, porquanto aqueles (os serviços sociais) são meros destinatários de subvenção econômica.

6. Embargos de divergência providos para declarar a ilegitimidade passiva ad causam do SEBRAE e da APEX e, por decorrência do efeito expansivo, da ABDI.

(EREsp 1619954/SC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/04/2019, DJe 16/04/2019)

 

E verdade que, no que concerne à incidência a título de salário-educação, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE tem capacidade tributária ativa, nos termos da Lei 5.537/1968, do Decreto-Lei 1.422/1975 (art. 2º), dos Decretos 76.923/1975 (arts. 5º e 6º) e 87.043/1982 (art. 5º), e das Leis 9.424/1996 (art. 15) e 9.766/1998 (art. 1º, 4º e 5º). Ocorre que, mesmo em relação ao FNDE, a legitimação processual foi unificada na União Federal, tal como consolidado pelo E.STJ, orientação ao qual me filio em favor da pacificação dos litígios (com ressalva de meu entendimento):

 

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. CONTRIBUIÇÕES DESTINADAS A TERCEIROS. LEGITIMIDADE PASSIVA. LEI 11.457/2007. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA PRIMEIRA SEÇÃO DO STJ NOS ERESP 1.619.954/SC.

1. A parte sustenta que o art. 1.022 do CPC foi violado, mas deixa de apontar, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Assevera apenas ter oposto Embargos de Declaração no Tribunal a quo, sem indicar as matérias sobre as quais deveria pronunciar-se a instância ordinária, nem demonstrar a relevância delas para o julgamento do feito (Súmula 284/STF).

2. Em recente análise da matéria, nos EREsp 1.619.954/SC, a Primeira Seção do STJ firmou a seguinte compreensão: "(...) não se verifica a legitimidade dos serviços sociais autônomos para constarem no polo passivo de ações judiciais em que são partes o contribuinte e o/a INSS/União Federal e nas quais se discutem a relação jurídico-tributária e a repetição de indébito, porquanto aqueles (os serviços sociais) são meros destinatários de subvenção econômica" (Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 16.4.2019).

3. Na ocasião, a Min. Assusete Magalhães proferiu voto-vista esclarecendo que esse entendimento é também aplicável às contribuições ao salário-educação: "(...) Conquanto os acórdãos embargados citem dois precedentes de minha relatoria, de 2015, que admitem a legitimidade passiva do FNDE, ao lado da União, em ação de repetição de contribuição para o salário-educação, reexaminando detidamente o assunto, à luz da Lei 11.457, de 16/03/2007, e de toda a legislação que rege a matéria, especialmente as Instruções Normativas RFB 900/2008 e 1.300/2012, já revogadas, e a vigente Instrução Normativa RFB 1.717/2017 - que dispõem no sentido de que 'compete à RFB efetuar a restituição dos valores recolhidos para outras entidades ou fundos, exceto nos casos de arrecadação direta, realizada mediante convênio -, reconsidero minha posição, aliás, hoje já superada pela mais recente jurisprudência da própria Segunda Turma, sobre a matéria".

4. O acórdão recorrido está em dissonância do entendimento do STJ de que ao FNDE deixou de ter legitimidade passiva ad causam para ações que visem à cobrança de contribuições tributárias ou à sua restituição, após a entrada em vigor da Lei 11.457/2007. Contraria a jurisprudência do STJ também quando afasta a legitimidade passiva da Fazenda Nacional.

5. O recorrente Jonas Noriyashu Kakimoto pugna pelo reconhecimento do litisconsórcio passivo necessário da União e do FNDE para figurar no polo passivo da demanda.

6. A análise do apelo se encontra prejudicada, pois se confunde totalmente com a matéria trazida pela Fazenda Nacional em seu apelo, razão pela qual o conhecimento do apelo se encontra prejudicado.

7. Recurso Especial da Fazenda Nacional parcialmente conhecido, e, nessa extensão, provido para reconhecer sua legitimidade passiva ad causam e afastar a legitimidade do FNDE. Recurso Especial de Jonas Noriyashu Kakimoto prejudicado.

(REsp 1841564/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/12/2019, DJe 19/12/2019)

 

Assim, acolho a preliminar e reconheço a ilegitimidade de parte do Serviço de Apoio às Micros e Pequenas Empresas de São Paulo - SEBRAE-SP, Serviço Social da Indústria - SESI e Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI.

Quanto ao tema central, a lide posta nos autos versa sobre a interpretação dos conceitos constitucionais de empregador, trabalhador, folha de salários, e demais rendimentos do trabalho, e ganhos habituais, expressos no art. 195, I e II, e art. 201, § 4º, ambos do ordenamento de 1988 (agora, respectivamente, no art. 195, I, “a”, e II, e art. 201, § 11, com as alterações da Emenda 20/1998).

Para se extrair o comando normativo contido em dispositivo da Constituição Federal relativo à Seguridade Social, vários elementos e dados jurídicos devem ser considerados no contexto interpretativo, dentre os quais a lógica o caráter contributivo em vista da igualdade e da solidariedade no financiamento do sistema de seguro estruturado no Regime Geral de Previdência Social (RGPS).

Para o que importa ao presente recurso, os conceitos constitucionais de empregador, trabalhador, folha de salários, rendimentos do trabalho e ganhos habituais gravitam em torno de pessoa física que presta serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário, inserindo-se no contexto do art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Portanto, havendo relação de emprego, é imperioso discutir se os valores pagos se inserem no âmbito constitucional de salário, demais rendimentos do trabalho e ganhos habituais.

Salário é espécie do gênero remuneração paga em decorrência de relação de emprego tecnicamente caracteriza (marcada pela subordinação). O ordenamento constitucional de 1988 emprega sentido amplo de salário, de modo que está exposta à incidência de contribuição tanto o salário propriamente dito quanto os demais ganhos habituais do empregado, pagos a qualquer título (vale dizer, toda remuneração habitual, ainda que em montantes variáveis). Essa amplitude de incidência é manifesta após a edição da Emenda 20/1998, que, introduzindo o art. 195, I, “a”, da Constituição, previu contribuições para a seguridade exigidas do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício. Essa amplitude se verifica também em relação a essa exação exigida do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, em conformidade com o art. 195, II, da Constituição (tanto na redação da Emenda 20/1998 quanto na da Emenda 103/2019).

Além disso, a redação originária do art. 201, § 4º, da Constituição de 1988, repetida no art. 201, § 11 do mesmo ordenamento (com renumeração dada pela Emenda 20/1998, prevê que a previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, sendo que “Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.”

Portanto, o texto constitucional confiou à União Federal amplo campo de incidência para exercício de sua competência tributária, compreendendo o conjunto das verbas remuneratórias habituais (ou seja, salários e demais ganhos), o que por si só não se traduz em exigência tributária concreta, uma vez que caberá à lei ordinária estabelecer a hipótese de incidência hábil para realizar as necessárias imposições tributárias, excluídas as isenções que a própria legislação estabelecer.

Porém, nem tudo o que o empregador paga ao empregado pode ser tributado como salário ou rendimento do trabalho, pois há verbas que não estão no campo constitucional de incidência (p. ex., por terem natureza de indenizações), além das eventuais imunidades previstos pelo sistema constitucional.

Atualmente, a conformação normativa da imposição das contribuições patronais para o sistema de seguridade está essencialmente consolidada na Lei 8.212/1991 (notadamente em seu art. 22), muito embora demais diplomas normativos sirvam para a definição e alcance da legislação tributária (art. 109 e art. 110 do CTN), dentre ele os recepcionados arts. 457 e seguintes da CLT, prevendo que a remuneração do empregado compreende o salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber, e demais remunerações. É verdade que o art. 457-A, da CLT (introduzido pela MP 905/2019) estabelece que gorjetas não são receitas do empregador, mas ainda assim estão no conteúdo amplo de salário estabelecido pela pelo art. 195, I, “a”, e II, Constituição para a incidência de contribuições previdenciárias (patronais e do trabalhador).

Para fins trabalhistas (que repercutem na área tributária em razão do contido no art. 110 do CTN), integram o salário não só a importância fixa estipulada, como também as comissões, percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador. O meio de pagamento da remuneração pode ser dinheiro, alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações “in natura” que o empregador utilizar para retribuir o trabalho do empregado, desde que o faça habitualmente (vedadas as bebidas alcoólicas e demais drogas).

Embora pessoalmente admita a possibilidade de a natureza jurídica de certas verbas não estarem inseridas no conceito de salário em sentido estrito, estaremos diante de verba salarial em sentido amplo quando se tratar de pagamentos habituais decorrentes da relação de emprego, abrigado pelo art. 195 e pelo art. 201 da Constituição (nesse caso, desde sua redação originária) para a imposição de contribuições previdenciárias. E tudo o que foi dito em relação à incidência de contribuição previdenciária se aplica ao adicional dessa mesma exação calculado pelo segundo o regramento do Fator Acidentário de Prevenção (FAP) e dos Riscos Ambientais de Trabalho (RAT).

À evidência, não há que se falar em exercício de competência residual, expressa no § 4º do art. 195, da Constituição, já que a exação em tela encontra conformação na competência originária constante desde a redação originária do art. 195, I, e do art. 201, ambos do texto de 1988 (não alterados nesse particular pela Emenda 20/1998 ou pela Emenda 103/2019).

O E.STF, no RE 565160, Pleno, v.u., Rel. Min. Marco Aurélio, j. 29/03/2017, firmou a seguinte Tese no Tema 20: “A contribuição social a cargo do empregador incide sobre ganhos habituais do empregado, quer anteriores ou posteriores à Emenda Constitucional 20/1998”. Nesse RE 565160, o Pretório Excelso cuidou da incidência de contribuição previdenciária sobre adicionais (de periculosidade e insalubridade), gorjetas, prêmios, adicionais noturnos, ajudas de custo e diárias de viagem (quando excederem 50% do salário recebido), comissões e quaisquer outras parcelas pagas habitualmente (ainda que em unidades), previstas em acordo ou convenção coletiva ou mesmo que concedidas por liberalidade do empregador não integrantes na definição de salário, afirmando o sentido amplo de salário e de rendimento do trabalho. 

Por sua vez, o art. 28, § 9º, da Lei 8.212/1991 traz rol de situações nas quais a contribuição ora em tela não é exigida, contudo, sem apresentar rigoroso critério distintivo de hipóteses de não incidência (p. ex., por se tratar de pagamento com natureza indenizatória) ou de casos de isenção (favor fiscal). Por óbvio, o efeito prático de verba expressamente indicada nesse preceito legal é a desoneração tributária, o que resulta na ausência de interesse de agir (salvo se, ainda assim, o ente estatal resistir à legítima pretensão do contribuinte).

No caso dos autos, discute-se a incidência de contribuições sobre pagamentos efetuados a título de:

15 primeiros dias do auxílio-doença;

15 primeiros dias auxílio-acidente;

Férias gozadas e seus reflexos

1/3 constitucional de férias e diferença de 1/3 de férias;

 

Para a análise desses pontos, creio apropriado fazer análises agrupadas nos termos que se seguem.

 

15 PRIMEIROS DIAS DO AUXÍLIO-DOENÇA

No que tange ao auxílio-doença, é certo que o empregador não está sujeito à contribuição em tela no que tange à complementação ao valor do auxílio-doença após o 16º dia do afastamento (desde que esse direito seja extensivo à totalidade dos empregados da empresa), conforme expressa previsão do art. 28, § 9º, “n”, da Lei 8.212/1991. Já no que tange à obrigação legal de pagar o auxílio-doença nos 15 primeiros dias do afastamento, a jurisprudência se consolidou no sentido de que tal verba tem caráter previdenciário (mesmo quando paga pelo empregador), descaracterizando a natureza salarial para afastar a incidência de contribuição social. Nesse sentido, anoto julgamento do E. STJ:

 

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PRIMEIROS QUINZE DIAS DE AUXÍLIO-DOENÇA. NÃO INCIDÊNCIA.

1. No julgamento do Recurso Especial 1.230.957/RS, sob o rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou o entendimento de que sobre a importância paga pelo empregador ao empregado durante os primeiros quinze dias de afastamento por motivo de doença não incide a contribuição previdenciária, por não se enquadrar na hipótese de incidência da exação, que exige verba de natureza remuneratória. (REsp 1.230.957/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 18/3/2014).

2. Dessume-se que o acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento do STJ, razão pela qual incide, in casu, o princípio estabelecido na Súmula 83/STJ: "Não se conhece do Recurso Especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida".

3. Agravo Interno provido para não conhecer do Recurso Especial da União.

(AgInt no REsp 1701325/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/11/2019, DJe 19/12/2019)

 

Estarão também desoneradas, pelos mesmos motivos, as repercussões dessas complementações do auxílio-doença no 13º salário. Note-se que não se trata da simples desoneração de contribuições previdenciárias sobre 13º salário (ou gratificação natalina) para aos trabalhadores que prestaram serviços regulares ao empregador, mas repercussão da complementação de auxílio-doença extensível a todos os empregados por força de convenção coletiva.

 

15 PRIMEIROS DIAS DO AUXÍLIO-ACIDENTE

O auxílio-acidente é benefício previdenciário, nos termos do art. 86, § 2º, da Lei n. 8.212/1991, de maneira que não há falar em incidência de contribuição previdenciária. A empresa é responsável pelo pagamento dos 15 (quinze) primeiros dias a partir da data do acidente, e a Previdência Social é responsável pelo pagamento a partir do 16º dia da data do afastamento da atividade.

Todavia, caso o empregador faça pagamentos a título de liberalidade extensível a todos os empregados nessa situação excepcional, não obstante os termos do art. 111 do CTN e atentando para a elevada solidariedade contemplada pelo sistema constitucional, justifica-se a extensão da isenção nos mesmos termos da prevista no art. 28, § 9º, “n” da Lei 8.212/1991, a título de complementação ao valor do auxílio-doença (frise-se, desde que esse direito seja extensivo à totalidade dos empregados da empresa).

No que concerne ao auxílio-acidente, tem-se o seguinte posicionamento da jurisprudência do E. STJ:

 

TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE A IMPORTÂNCIA PAGA NOS QUINZE DIAS QUE ANTECEDEM O AUXÍLIO-ACIDENTE, E NÃO SOBRE O AUXÍLIO EM SI.

1. Não incide contribuição previdenciária patronal sobre os valores referentes aos primeiros quinze dias de afastamento que antecedem o auxílio-acidente. Precedentes.

2. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 1177168/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 19/11/2019)

 

 

1/3 CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS E DIFERENÇA DE 1/3 DE FÉRIAS

 

No que tange ao adicional de um terço de férias a que se refere o art. 7º, XVII, da Constituição Federal, parece-me clara a inserção dessas verbas no campo de incidência das contribuições incidentes sobre a folha de salários. Diversamente da natureza manifestamente indenizatória do montante decorrente da venda de um terço dos dias de férias (bem como a média correspondente), paga nos moldes do art. 143 e do art. 144 da CLT e desonerada da imposição de contribuições pelo art. 28, § 9º, da Lei 8.212/1991, os pagamentos do adicional constitucional de um terço de férias de que cuida o art. 7º, XVII, da Constituição são inerentes à relação de emprego, pagos com habitualidade e sem qualquer natureza indenizatória.

Contudo, admito que a orientação jurisprudencial caminhou em outro sentido, como se nota da posição adotada pelo E. STJ:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INCIDÊNCIA SOBRE AS PARCELAS RECEBIDAS A TÍTULO DE 13o. (DÉCIMO TERCEIRO) SALÁRIO, AUXÍLIO-MATERNIDADE, HORAS-EXTRAS, ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE, NOTURNO E PERICULOSIDADE, REPOUSO SEMANAL. AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO PAGO EM ESPÉCIE. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE O ABONO ASSIDUIDADE CONVERTIDO EM PECÚNIA. AGRAVO INTERNO DA EMPRESA DESPROVIDO. 1. A Primeira Seção desta Corte, no julgamento dos Recursos Especiais 1.358.281/SP e 1.230.957/RS, sob o rito dos recursos repetitivos previsto art. 543-C do CPC, entendeu que não incide a Contribuição Previdenciária sobre o adicional de um terço de férias, sobre o aviso prévio indenizado e sobre os primeiros quinze dias de auxílio-doença e auxílio-acidente; incidindo sobre o adicional noturno e de periculosidade, sobre os salários maternidade e paternidade, e sobre as horas-extras.

2. Consolidou-se na Seção de Direito Público desta Corte o entendimento de que incide Contribuição Previdenciária sobre a verba relativa aos adicionais de periculosidade, insalubridade, décimo-terceiro salário, abono pecuniário, repouso semanal, auxílio-alimentação pago em espécie e adicional de sobreaviso.

3. A jurisprudência desta Corte assentou o entendimento de que incide Contribuição Previdenciária sobre o valor pago a título de faltas abonadas. Todavia, de natureza indenizatória são as verbas pagas a título de abono assiduidade convertido em pecúnia, uma vez que tem por objetivo premiar o empregado que desempenha de forma exemplar as suas funções, de modo que não integram o salário de contribuição para fins de incidência da Contribuição Previdenciária.

4. Também já se encontra consolidado nesta Corte a orientação de que o adicional de transferência possui natureza salarial, conforme firme jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, pois, da leitura do § 3o. do art. 463 da CLT, extrai-se que a transferência do empregado é um direito do empregador, sendo que do exercício regular desse direito decorre para o empregado transferido, em contrapartida, o direito de receber o correspondente adicional de transferência (REsp. 1.581.122/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 31.5.2016). No mesmo sentido, citam-se: REsp. 1.217.238/MG, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe de 3.2.2011; AgRg no REsp. 1.432.886/RS, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe de 11.4.2014).

5. Quanto à verba recebida a título de prêmio desempenho, é firme o entendimento de que, configurado o caráter permanente ou a habitualidade da verba recebida, bem como a natureza remuneratória da rubrica, incide Contribuição Previdenciária sobre as parcelas recebidas pelo empregado.

6. Agravo Interno da Empresa desprovido.

(AgInt nos EDcl no REsp 1566704/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019)

 

No mesmo caminho estão diferenças pagas a título de 1/3 de férias, decorrentes de correções de cálculos, as quais também não devem ter incidência de contribuição previdenciária.

Outrossim, observo que a presente demanda não questiona a legitimidade das contribuições destinadas ao INCRA, SEBRAE, FUNRURAL, Salário Educação e ao SENAI, mas sim, a impossibilidade de que as verbas de natureza indenizatória e eventuais sirvam como base de cálculo para incidência dessas contribuições, de modo que não conheço do pleito dessa natureza formulado pela União Federal.

Finalmente, quanto à incidência de contribuições previdenciárias sobre “férias gozadas”, não conheço do recurso da União Federal nessa porção, à míngua de condenação nesse sentido.

Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.

Com fundamento no art. 85, §11, do CPC, majoro em 20% o percentual da verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição, respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E.STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, DJe de 19/10/2017).

Ante o exposto, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva e extingo o feito, sem exame do mérito, em relação aos réus Serviço de Apoio às Micros e Pequenas Empresas de São Paulo - SEBRAE-SP, Serviço Social da Indústria - SESI e Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI, restando prejudicados os respectivos recursos de apelação, conheço em parte do recurso da União Federal e nego-lhe provimento.

É o voto. (destaquei)

Discute-se nos autos a incidência de contribuições previdenciárias patronais, ao SAT/RAT e a terceiras entidades sobre diversas verbas pagas pela parte autora (empregadora) a seus empregados, dentre as quais, o salário-maternidade e o terço constitucional de férias gozadas. Em relação ao terço constitucional de férias gozadas, o pedido foi julgado procedente na origem, sendo rejeitado com relação ao salário-maternidade (id nº 104912514, p. 09/16). Não foi interposta apelação pela parte autora. Já a União Federal, o SEBRAE e o SESI/SENAI recorreram da sentença. E o acórdão ora embargado acolheu preliminar de ilegitimidade passiva e extinguiu o feito, sem exame do mérito, em relação aos réus SEBRAE-SP, SESI e SENAI, restando prejudicados os respectivos recursos de apelação. Além disso, conheceu em parte do recurso da União Federal, negando-lhe provimento.

Sobre a questão relacionada à incidência das contribuições sobre o terço constitucional de férias gozadas e salário-maternidade, é necessário ressaltar que o ordenamento constitucional de 1988 (notadamente a partir da Emenda Constitucional nº 45/2004) deu maior impulso aos efeitos de decisões judiciais a partir da ampliação de vinculações (em controle abstrato de constitucionalidade) e obrigatoriedades (firmadas em mecanismos de precedentes). No plano infraconstitucional, há múltiplos atos legislativos implementando esses mecanismos, com destaque para o Código de Processo Civil assegurando o distinguishing e o overruling (art. 489, § 1º, VI,), bem como prevendo observância obrigatória de Súmulas Vinculantes e de Teses fixadas em Temas por todas as instâncias judiciárias (art. 932 e art. 1.030), revisão das mesmas ao Tribunal que as pronunciou (no rito do art. 927), reclamações (art. 988), retratações (art. 1.041), impugnações ao cumprimento de sentença (art. 525) e ações rescisórias (art. 966), dentre outras medidas possíveis.

Todas essas providências vão ao encontro de primados do processo como a igualdade, a segurança e a eficiência da prestação jurisdicional. Por isso, os embargos de declaração servem para que o mesmo órgão judiciário prolator retifique seu pronunciamento visando ajustá-lo àquele consolidado pelo obrigatório sistema de precedentes do E.STJ ou do E.STF (repetitivo ou repercussão geral) ou pelo vinculante entendimento do Pretório Excelso, ainda que supervenientes à decisão embargada.  O mesmo não ocorre se a orientação de tribunais superiores for desprovida de força obrigatória ou vinculante, quando então efeitos infringentes em embargos de declaração somente podem ser conferidos em casos de erro, obscuridade, omissão ou contradição (art. 1022 do CPC).

Há firme orientação do E.STJ nesse sentido, como se nota nos seguintes julgados: EDcl no REsp 734.403/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 14/03/2017, DJe 17/03/2017; EDcl no AgRg no AREsp 655.033/RJ,  Primeira  Turma,  Rel.  Min.  Sérgio Kukina, julgado em 21/06/2016,  DJe 28/06/2016; EDcl no AgRg no REsp 1461864/RS, Segunda Turma,  Rel.  Min.  Herman  Benjamin,  julgado  em  05/04/2016,  DJe 25/05/2016; e EDcl  no  AgRg  no REsp 1349604/SC, Segunda Turma, Rel. Min.  Og  Fernandes,  julgado em 10/03/2015, DJe 23/03/2015.

No caso dos autos, a sentença foi proferida em 05/07/2018 e o acórdão em 07/07/2020. Contudo, em 04/08/2020, julgando o RE 576967, o E.STF se posicionou pela inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade, prevista no art. 28, §2º, e na parte final do seu § 9º, "a", da mesma Lei nº 8.212/1991, sob o fundamento de que, durante o período de licença, a trabalhadora se afasta de suas atividades e deixa de prestar serviços e de receber salários do empregador, de tal modo que esse benefício não compõe a base de cálculo da contribuição social sobre a folha salarial, não bastando para tanto o simples fato de a mulher continuar a constar formalmente na folha de salários (imposição decorrente da manutenção do vínculo trabalhista). Nesse mesmo RE 576967, o E.STF concluiu que a exigência do art. 28, §2º da Lei nº 8.212/1991 não cumpre os requisitos para imposição de nova fonte de custeio da seguridade social exigidos pelo art. 195, §4º da Constituição, fixando a seguinte Tese no Tema 72: "É inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário maternidade".

Acerca da incidência da contribuição patronal sobre o terço constitucional de férias, o E.STF mudou sua orientação ao julgar o RE 1072485 (Sessão Virtual de 21/08/2020 a 28/08/2020, tendo sido a ata de julgamento nº 24, de 31/08/2020, publicada no DJE nº 228, divulgado em 14/09/2020), ao fundamento de que o terço constitucional de férias usufruídas (art. 7º, XVII, da Constituição) é de verba periódica auferida como complemento à remuneração do trabalho, e que por isso, está no campo de incidência de contribuições incidentes sobre a folha de salários, firmando a seguinte Tese no Tema 985: “É legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias”.

Portanto, é imperativo que a decisão recorrida seja ajustada, em favor da unificação do direito e da celeridade processual, porquanto incidentes as contribuições sobre o terço constitucional das férias usufruídas não incidindo sobre o salário-maternidade, garantido o direito à compensação pela parte autora, conforme o acórdão embargado.

Vale ressaltar que o acórdão, diante do não provimento do recurso de apelação da União, fixou honorários recursais. Porém, uma vez reconhecida a incidência das contribuições sobre o terço constitucional de férias gozadas, deve ser excluída essa majoração.

Quanto às demais questões trazidas pela União Federal, revelam, na verdade, a intenção de rediscutir o mérito do julgado, o que não é possível por meio de embargos de declaração.

Tampouco há que se falar em omissão no tocante à legitimidade do SESI e do SENAI, os quais, pretendem, na verdade a rediscussão da matéria. Além disso, incabível a sua admissão como assistentes, conforme diversos julgados deste Tribunal:

AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. CONTRIBUIÇÕES DE TERCEIROS. ARRECADAÇÃO INDIRETA. ASSISTÊNCIA LITISCONSORCIAL. INCABÍVEL. ASSISTÊNCIA SIMPLES. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIO. AUSÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO.

1. Não assiste razão às recorrentes quanto ao pedido de ingresso no feito como assistentes litisconsorciais.

2. O E. STJ tem entendido que nas demandas em que se discuta sobre as contribuições destinadas a terceiros, cuja arrecadação seja na forma indireta, não se reconhece a existência do litisconsórcio passivo necessário aos destinatários, como no presente caso, SESI e SENAI.

 3. As próprias recorrentes admitem que o agravado sequer é contribuinte das referidas contribuições, razão pela qual não acolhido o pedido subsidiário de assistência simples, uma vez que inexiste interesse jurídico e econômico das agravantes e, ainda, porque a controvérsia, na verdade, discute sobre competência tributária. Nesse sentido, apenas o ente tributante (qual seja, a União Federal) detém legitimidade para figurar no polo passivo da demanda.

4. Agravo interno desprovido.

(AGRAVO DE INSTRUMENTO 5028524-96.2020.4.03.0000, Quarta Turma, Relatora: Des. Fed. Marli Ferreira; j. 23/09/2021, DJe 27/09/2021

TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SESI. SENAI. PEDIDO DE INGRESSO NA LIDE COMO TERCEIRO PREJUDICADO. ASSISTÊNCIA. INTERESSE JURÍDICO. AUSÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO.

- Compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil a fiscalização, arrecadação cobrança e recolhimento das contribuições devidas a terceiros. Inteligência dos artigos 2º e 3º da Lei n.º 11.457/07.

 - Na qualidade de destinatários dos recursos arrecadados, os agravantes (SESI e SENAI) têm apenas interesse econômico na demanda, mas não jurídico que autorize a sua admissão na relação processual.

 - Agravo interno desprovido.

(APELAÇÃO CÍVEL 5003026-44.2020.4.03.6128; Quarta Turma, Relator: Des. Fed. André Nabarrete; j. 27/04/2022, DJe. 29/04/2022

AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. CONTRIBUIÇÕES DE TERCEIROS. ARRECADAÇÃO INDIRETA. ASSISTÊNCIA LITISCONSORCIAL. INCABÍVEL. ASSISTÊNCIA SIMPLES. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIO. AUSÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO.

1. Da leitura das razões recursais, verifica-se que as recorrentes admitem que o impetrante é contribuinte na modalidade "indireta".

2. A arrecadação é feita pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, nos termos da Lei n° 11.457/2007.

3. Não assiste razão às recorrentes quanto ao pedido de ingresso no feito como assistentes litisconsorciais.

4. A controvérsia já foi analisada, inclusive, pelo E. STJ, sendo decidido que como compete à União Federal arrecadar, ela possui legitimidade exclusiva para figurar no polo passivo da demanda, não havendo que se falar em litisconsórcio passivo entre a União e os beneficiários das contribuições debatidas.

5. Não acolhido o pedido subsidiário, uma vez que a controvérsia, na verdade, discute sobre competência tributária. Nesse sentido, apenas o ente tributante (qual seja, a União Federal) detém legitimidade para figurar no polo passivo da demanda.

7. Agravo interno desprovido.

(AGRAVO DE INSTRUMENTO 5027760-13.2020.4.03.0000, Quarta Turma, Relatora. Des. Fed. Marli Ferreira, j. 26/04/2021, DJe 04/05/2021)

 

Por fim, tem razão o SESI/SENAI e o SEBRAE ao alegarem a omissão do julgado no tocante à fixação de verbas de sucumbência, eis que, diante de sua exclusão do polo passivo, a parte contrária deve ser condenada ao pagamento de honorários. Conforme despacho id nº 104912512, p. 83, foi determinado à parte autora que promovesse a citação das entidades. Não tendo recorrido dessa decisão, promoveu as citações (id nº 104912512, p. 88). E uma vez excluídas do polo passivo pelo acórdão ora embargado, lhes são devidos os honorários. Portanto, nos termos do art. 85,§3º do CPC, condeno a parte-autora ao pagamento da verba honorária, fixada mediante aplicação do percentual mínimo das faixas previstas sobre o montante atribuído à causa (correspondente ao proveito econômico tratado nos autos), rateada em partes iguais pelas referidas entidades terceiras. Custas e demais ônus processuais têm os mesmos parâmetros.

Portanto, acolhidos os embargos de SEBRAE e parcialmente acolhidos aqueles opostos pelo SESI/SENAI, constato que o acórdão recorrido, quanto às demais questões suscitadas, tem fundamentação completa e regular para a lide posta nos autos. Ademais, o órgão julgador deve solucionar as questões relevantes e imprescindíveis para a resolução da controvérsia, não sendo obrigado a rebater (um a um) todos os argumentos trazidos pelas partes quando abrangidos pelas razões adotadas no pronunciamento judicial. A esse respeito, exemplifico com os seguintes julgados do E.STJ: AgInt nos EDcl no AREsp 1.290.119/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 30/08/2019; AgInt no REsp 1.675.749/RJ, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 23/08/2019; REsp 1.817.010/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 20/08/2019; AgInt no AREsp 1.227.864/RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 20/11/2018; e AREsp 1535259/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 07/11/2019, DJe 22/11/2019.

Ante o exposto i) nego provimento aos embargos de declaração da União Federal; ii) dou provimento aos embargos de declaração do SEBRAE e dou parcial provimento aos embargos de declaração do SESI/SENAI para fixar honorários em favor dessas entidades, nos termos do art. 85, §3º do CPC, mediante aplicação do percentual mínimo das faixas previstas sobre o montante atribuído à causa (correspondente ao proveito econômico tratado nos autos), rateados em partes iguais entre as entidades e, iii) de ofício, ajusto o julgado para reconhecer a não incidência da contribuição previdenciária, ao SAT/RAT e a terceiras entidades sobre o valor correspondente ao salário-maternidade e para reconhecer a incidência das contribuições sobre o montante correspondente ao terço constitucional de férias usufruídas; iv) excluo a condenação da União ao pagamento de honorários recursais.

É o voto.

 



E M E N T A

 

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS PATRONAIS. CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS A TERCEIROS. ILEGITIMIDADE DE PARTE. SALÁRIO E GANHOS HABITUAIS DO TRABALHO. VERBAS INDENIZATÓRIAS. OMISSÃO SANADA. HONORÁRIOS.

- Sobre a questão relacionada à incidência das contribuições sobre o terço constitucional de férias gozadas e salário-maternidade, é necessário ressaltar que o ordenamento constitucional de 1988 (notadamente a partir da Emenda Constitucional nº 45/2004) deu maior impulso aos efeitos de decisões judiciais a partir da ampliação de vinculações (em controle abstrato de constitucionalidade) e obrigatoriedades (firmadas em mecanismos de precedentes). No plano infraconstitucional, há múltiplos atos legislativos implementando esses mecanismos. Todas essas providências vão ao encontro de primados do processo como a igualdade, a segurança e a eficiência da prestação jurisdicional.

- No caso dos autos, a sentença foi proferida em 05/07/2018 e o acórdão em 07/07/2020. Contudo, em 04/08/2020, julgando o RE 576967, o E.STF se posicionou pela inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade, prevista no art. 28, §2º, e na parte final do seu § 9º, "a", da mesma Lei nº 8.212/1991, fixando a seguinte Tese no Tema 72: "É inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário maternidade".

- Acerca da incidência da contribuição patronal sobre o terço constitucional de férias, o E.STF mudou sua orientação ao julgar o RE 1072485 (Sessão Virtual de 21/08/2020 a 28/08/2020, tendo sido a ata de julgamento nº 24, de 31/08/2020, publicada no DJE nº 228, divulgado em 14/09/2020), ao fundamento de que o terço constitucional de férias usufruídas (art. 7º, XVII, da Constituição) é de verba periódica auferida como complemento à remuneração do trabalho, e que por isso, está no campo de incidência de contribuições incidentes sobre a folha de salários, firmando a seguinte Tese no Tema 985: “É legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias”.

- É imperativo que a decisão recorrida seja ajustada, em favor da unificação do direito e da celeridade processual, porquanto incidentes as contribuições sobre o terço constitucional das férias usufruídas não incidindo sobre o salário-maternidade, garantido o direito à compensação pela parte autora, conforme o acórdão embargado. O acórdão, diante do não provimento do recurso de apelação da União, fixou honorários recursais. Porém, uma vez reconhecida a incidência das contribuições sobre o terço constitucional de férias gozadas, deve ser excluída essa majoração.

- Quanto às demais questões trazidas pela União Federal, revelam, na verdade, a intenção de rediscutir o mérito do julgado, o que não é possível por meio de embargos de declaração. Tampouco há que se falar em omissão no tocante à legitimidade do SESI e do SENAI, os quais, pretendem, na verdade a rediscussão da matéria. Além disso, incabível a sua admissão como assistentes, conforme diversos julgados deste Tribunal.

- Tem razão o SESI/SENAI e o SEBRAE ao alegarem a omissão do julgado no tocante à fixação de verbas de sucumbência, eis que, diante de sua exclusão do polo passivo, a parte contrária deve ser condenada ao pagamento de honorários.

- Embargos da União Federal desprovidos. Embargos do SEBRAE providos e embargos de declaração do SESI/SENAI parcialmente providos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento aos embargos de declaração da União Federal; dar provimento aos embargos de declaração do SEBRAE e dar parcial provimento aos embargos de declaração do SESI/SENAI; de ofício, ajustar o julgado para reconhecer a não incidência da contribuição previdenciária, ao SAT/RAT e a terceiras entidades sobre o valor correspondente ao salário-maternidade e para reconhecer a incidência das contribuições sobre o montante correspondente ao terço constitucional de férias usufruídas; e excluir a condenação da União ao pagamento de honorários recursais; nos termos do voto do senhor Desembargador Federal relator, com ressalva de entendimento da senhora Juíza Federal convocada Audrey Gasparini, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.