APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006557-29.2011.4.03.6133
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: LEANDRO JORGE GUASCH
Advogado do(a) APELANTE: EDSON MACHADO FILGUEIRAS JUNIOR - SP198158-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006557-29.2011.4.03.6133 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: LEANDRO JORGE GUASCH Advogado do(a) APELANTE: EDSON MACHADO FILGUEIRAS JUNIOR - SP198158-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Trata-se de embargos de declaração opostos por LEANDRO JORGE GUASCH, contra o v. acórdão proferido pela 7ª Turma que, por unanimidade, negou provimento à apelação por ele interposta. Em suas razões recursais, o embargante sustenta a ocorrência de omissão, pois apenas soube do envolvimento da instituidora com outra pessoa após o óbito. Além disso, afirma que havia mera intenção de separação do casal, o que era insuficiência para afastar sua condição de dependente para fins previdenciários. Diz ainda que a coabitação e a fidelidade do casal são irrelevantes para aferir a persistência do vínculo conjugal. Por fim, diz não haver provas de que o relacionamento entre a falecida e terceiro era "amoroso". É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006557-29.2011.4.03.6133 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: LEANDRO JORGE GUASCH Advogado do(a) APELANTE: EDSON MACHADO FILGUEIRAS JUNIOR - SP198158-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Inicialmente, é importante salientar que o cerne da controvérsia é saber se ocorreu a separação de fato do casal e não precisar a data em que o falecido tomou conhecimento da suposta infidelidade da falecida. A existência de envolvimento da falecida com terceiro não dependia necessariamente do conhecimento que o demandante tinha, ou não, desse fato. Nem se diga que havia mera intenção de separação, pois a falecida já tinha em muito extrapolado o plano da mera cogitação de dissolução do vínculo conjugal. Neste sentido, a prova documental e testemunhal demonstrou que ela não só já havia ingressado com ação de divórcio na Argentina, como também estava se envolvendo com outra pessoa. A formalização da separação só não se consumou, em razão do acidente automobilístico que vitimou fatalmente a instituidora. Quanto à natureza do relacionamento da falecida com terceiro, as próprias alegações desenvolvidas nestes declaratórios entram em contradição. Se ele não era amoroso, porque o próprio patrono do embargante fez questão de usar ditado popular, em linguagem vulgar, para ilustrar o momento em que cessou a ignorância de seu cliente acerca da suposta infidelidade da instituidora (ID 266494285 - p. 3)? É importante salientar que o uso do adjetivo "amoroso" no v. acórdão foi um eufemismo, feito por este magistrado para evitar vulgarizar a discussão desta questão. O mesmo cuidado, contudo, não foi observado no trecho mencionado dos presentes embargos. O depoimento pessoal do demandante, por sua vez, não deixa margem para dúvida de que se tratava de relacionamento amoroso. Afinal, porque o autor acharia relevante citar o envolvimento da falecida com terceiro caso se tratasse de mera amizade? Que importância teria para ele saber da existência desse amigo após o óbito? É presumir uma ingenuidade extrema na análise das provas tentar dissuadir este Juízo de que o relacionamento entre a falecida e o terceiro tinha qualquer outra conotação. O julgado embargado, portanto, não apresenta qualquer obscuridade, contradição ou omissão, nos moldes disciplinados pelo art. 1.022, I e II, do Código de Processo Civil, tampouco incorre em erro material, tendo a Turma Julgadora enfrentado regularmente a matéria de acordo com o entendimento então adotado. Com efeito, o v. acórdão expressamente consignou: " A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força do princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/91. Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido, aposentado ou não. O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência do evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a manutenção da qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter preenchido em vida os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das aposentadorias previstas no Regime Geral de Previdência Social - RGPS. A Lei de Benefícios, no art.16, com a redação dada pela Lei nº 9.032/95, vigente à época do óbito, prevê taxativamente as pessoas que podem ser consideradas dependentes, in verbis: "I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; II - os pais; III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido."(*grifei) O §3º do art. 16 da Lei de Benefícios dispõe que: "Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal". Por sua vez, o Decreto nº 3.048/99, no seu art. 16, § 6º, com a redação vigente à época do óbito, considera união estável "aquela configurada na convivência pública, contínua e duradoura entre o homem e a mulher, estabelecida com intenção de constituição de família, observado o § 1º do art. 1.723 do Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002". Já a Lei nº 9.278/96, que regulamenta o art. 226, § 3º da Constituição Federal, dispõe que: "É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família". Saliente-se que referido conceito consta da atual redação do §6º do art. 16 do RPS e no art. 1.723 do CC. Do caso concreto. O evento morte da Sra. Alicia Susana Gutiérrez, ocorrido em 30/04/2001, restou comprovado com a certidão de óbito. O requisito relativo à qualidade de segurada da falecida restou incontroverso, eis que seu último vínculo empregatício, iniciado em 05/07/1999, findou-se em 01/05/2001 (ID 122827431 - p. 43). A celeuma diz respeito à condição de dependente do autor em relação à instituidora. Segundo a narrativa delineada na petição inicial, o demandante e a falecida contraíram núpcias na Argentina, em 12/09/1997, e jamais se separaram até a data do óbito. A fim de comprovar a persistência do vínculo conjugal, foram anexados aos autos os seguintes documentos: 1 - certidão de casamento entre o autor e a falecida (ID 122827431 - p. 48); 2 - uma conta em nome do autor e outra em nome da falecida enviadas ao mesmo endereço e anexadas em sede recursal, a saber: a) BCP Telecomunicações, em nome de Leandro Jorge Guasch, Rua Jauaperi, 1123, Ap. 82, Indianópolis, São Paulo/SP, com data de emissão em 09/04/2001; e b) Extrato de Conta Universal, em nome de Alicia Susana Gutierrez, Al. Jauaperi, 123, Ap. 82, Indianólopis, São Paulo/SP, com posição em 20.04.2001 (ID 122827632 - p. 51/52). Além disso, foi realizada audiência de instrução em 29/08/2013, na qual foram ouvidos o demandante e uma testemunha. "Eu era casado com a falecida. Nós nos casamos na Argentina em 1997. Nunca nos separamos. Ela faleceu em 2001. Nosso último endereço como casal foi à Rua Juaperi, 1123, apartamento 82, Indianópolis, cidade de São Paulo - SP. O imóvel foi alugado em nome da falecida. Antes disso, nós moramos na Rua Manoel da Nóbrega. Eu sou comerciante do setor de mármore e granito e resido atualmente na Argentina. Cheguei a morar com a instituidora em Mogi das Cruzes, mas não me recordo o endereço. Apenas me lembro que era em frente ao CEASA de Mogi das Cruzes. Era um imóvel alugado. Acho que estava em meu nome e que o fiador era meu tio. Quando eu e a falecida viemos para o Brasil, moramos primeiro em Mogi das Cruzes, depois nos mudamos para a Rua Manoel da Nóbrega e, em seguida, para o bairro de Indianópolis, na capital de São Paulo. A instituidora morreu em Goiás, na cidade de Campo Alegre. Eu sempre tive uma relação ruim com meu sogro, que não gostou da nossa mudança para o Brasil após o matrimônio. Foi isso que o motivou a pedir a anulação do arrolamento de bens que eu tinha promovido. Reconheço que eu e a falecida tínhamos a intenção de nos divorciar à época do óbito, mas o processo jamais se concluiu. Eu e a instituidora não tivemos filhos. A falecida estava se envolvendo com um rapaz do trabalho. Ela estava em Goiás com esse rapaz na data do óbito. Aliás, o declarante na certidão de óbito era o pai do homem que estava se envolvendo com a instituidora. Não sei o porquê de tal pessoa ter sido a declarante do óbito. Também não sei quem fez o pedido de retificação da certidão de óbito. Eu estava em Belo Horizonte comprando pedras quando a instituidora faleceu" (depoimento pessoal do autor). "Conheço o autor há dezesseis anos, por relacionamento de trabalho e por morarmos em cidades pequenas e muito próximas no sul da Argentina. Conheci o autor antes de conhecer a falecida. Primeiro o casal namorou e depois se casou. Eu não fui ao casamento deles. A instituidora e o demandante se casaram na Argentina. Não lembro quando se casaram. Sei que a falecida e o autor brigavam, mas não se separaram. Na data do óbito, o casal ainda estava vivendo junto. Eles moravam em Indianópolis, na Rua Juaperi. Eu frequentava o apartamento deles. Frequentava mais quando a falecida e o autor moravam na Rua Manoel da Nóbrega. Não sei se eles estavam se divorciando. A instituidora faleceu em uma estrada em Brasília. Não sei o que ela estava fazendo lá" (depoimento da testemunha LEANDRO ANDRÉS SOUCAZE). As provas produzidas no curso da instrução, contudo, não permitem afirmar, com segurança, que o casal ainda mantinha o referido relacionamento à época do passamento. De início, há informação do Poder Judiciário Argentino de que a instituidora propusera ação de divórcio em face do autor, em 05 de fevereiro de 2001, no bojo da qual já tinha sido realizada uma audiência em 29 de março de 2001 e designada outra para 28 de maio de 2001, intervalo no qual a autora veio a falecer (30/04/2001), nos termos do artigo 236 do Código Civil então vigente naquele país (ID 122827431 - p. 116). Em consulta ao acervo legislativo do Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos da Argentina (http://servicios.infoleg.gob.ar/infolegInternet/anexos/105000-109999/109481/texact.htm), apurou-se que o casal argentino, após 3 (três) anos de matrimônio, podia solicitar o divórcio, sob o fundamento de que existiam causas graves que tornavam moralmente impossível a vida em comum, nos termos do artigo 215 do Código Civil da Republica Argentina. Ao tomar conhecimento do referido pleito, o Poder Judiciário daquele país então marcava uma audiência para, nos termos do artigo 236 do mesmo diploma legal, não só ouvir os cônjuges e tentar reconciliá-los, mas também averiguar se existia consenso acerca de questões relevantes como pensão alimentícia, guarda e regime de visita dos filhos e partilha dos bens. Se o apaziguamento do casal naquele momento se mostrasse inviável, era designada uma nova audiência e, caso a disposição de dissolução do vínculo conjugal persistisse, o Juízo então decretava o divórcio. Não é possível saber o teor do que foi discutido em tal audiência, pois o mesmo artigo informa que as manifestações produzidas no curso de tal ato processual teriam caráter reservado e sequer constariam em ata. O mesmo artigo 236 do Código Civil Argentino ainda dispunha que o não comparecimento do autor da ação à referida audiência de conciliação constituiria causa suficiente para o próprio "trancamento" do processo. Tais considerações acerca do direito comparado não são trazidas à lume com a intenção de atribuir, em território nacional, efeitos jurídicos às disposições do Código Civil da República Argentina - norma aliás que foi revogada pelo Código Civil e Comercial da Nação, promulgado em 01/08/2015 -, mas apenas servem para demonstrar a obstinação com que atuava a falecida no sentido de dissolver a sociedade conjugal. Ela não apenas propôs o divórcio em sua terra natal, como compareceu à primeira audiência e, devido à impossibilidade de reconciliação, assumiu o compromisso de ir à audiência definitiva. Diante de tais circunstâncias, o ânimo de romper o vínculo matrimonial era evidente, o que revela o grau de desagregação do núcleo familiar que já ocorria à época. O desfecho almejado pela instituidora só não pôde se concretizar, em razão do falecimento dela em 30 de abril de 2001 (ID 122827431 - p. 47), portanto, antes da segunda audiência de conciliação, que seria realizada poucos dias depois, em 28 de maio de 2001. Embora o vínculo conjugal não tivesse sido formalmente extinto, o comportamento da instituidora também já exteriorizava, de forma bastante nítida, o rompimento do vínculo afetivo com o demandante, já que demonstrava clara intenção de não mais observar deveres basilares do matrimônio. Neste sentido, o autor reconheceu que a falecida já estava se envolvendo amorosamente com um colega do trabalho à época do passamento - situação esta incompatível com o dever de lealdade que norteia a relação entre cônjuges. O demandante ainda informou que a instituidora estava viajando com esse rapaz para Goiás, quando sofreu acidente automobilístico fatal. O próprio declarante na certidão de óbito não foi o autor, mas sim o genitor da pessoa com quem ela estava se relacionando (ID 122827431 - p. 47). A propósito, cumpre esclarecer que houve a expedição da primeira certidão de óbito, declarada pelo pai da pessoa com quem a instituidora estava se relacionando (ID 122827431 - p. 37) e, somente posteriormente, se averiguou que ela, na verdade, era casada e então se expediu nova certidão de óbito retificadora constando tal informação (ID 122827431 - p. 47), conforme esclarecimentos prestados pelo Oficial (ID 122827431 - p. 126/128). Não se encontra ainda qualquer evidência material de que a falecida residisse em Mogi das Cruzes na época do passamento. Realmente, ficou comprovado que ela possuiu, em diferentes momentos, apenas os seguintes domicílios: Rua Manoel da Nóbrega, 405, apartamento 22, bairro Paraíso, cidade de São Paulo - SP - conforme registro no Sistema Nacional de Estrangeiros (ID 122827431 - p. 35) -, e Rua Alameda Jauaperi, 1123, apartamento 52, bairro Indianópolis, cidade de São Paulo - SP - indicado em fatura de cartão de crédito com vencimento em abril de 2001 (ID 122827632 - p. 52). Até mesmo na certidão de óbito retificadora constou que a falecida residia na cidade de São Paulo (ID 122827431 - p. 47), ainda que não tenha sido detalhado pormenorizadamente o endereço. Todavia, no requerimento administrativo do benefício de pensão por morte realizado apenas vinte dias após o óbito da instituidora, em 21 de maio de 2001 (ID 122827431 - p. 52), o demandante declarou que residia na Rua Barão de Jaceguai, 601, na cidade de Mogi das Cruzes - SP. Ademais, na petição com proposta de partilha dos bens, protocolada em 24 de julho de 2001, no bojo de ação de inventário (ID 122827431 - p. 140), o demandante também apontou como seu domicílio o mesmo endereço. Tais declarações de domicílio foram feitas voluntariamente pelo próprio pensionista interessado, não havendo razão alguma para duvidar de sua veracidade. Outra forte evidência de que o autor já residia em Mogi das Cruzes na data do óbito é o fato de ele ter proposto a ação de inventário naquela Comarca, e não em São Paulo, que seria supostamente o domicílio do casal. Com efeito, de acordo com o então vigente artigo 96 do Código de Processo Civil de 1973, a competência para processar a ação de inventário, em regra, cabia ao Juízo do domicílio do autor da herança, in verbis: "Art. 96. O foro do domicílio do autor da herança, no Brasil, é o competente para o inventário, a partilha, a arrecadação, o cumprimento de disposições de última vontade e todas as ações em que o espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro" (g. n.). Como não foi apresentada qualquer evidência material de que a falecida residisse em Mogi das Cruzes na época do passamento e tal fato sequer foi mencionado na audiência de instrução, só se pode concluir que, na verdade, o inventário foi aberto no domicílio do autor. E tal equívoco processual - consubstanciado no processamento da ação de inventário por Juízo diverso do domicílio da falecida - é absolutamente compreensível. Ao apresentar a petição inicial do inventário, o demandante anexou a certidão de casamento e declinou o endereço em Mogi das Cruzes como seu domicílio. Assim, quando o Juízo fez o exame de admissibilidade da referida peça processual constatou, em sede de cognição sumária e de acordo com a teoria da asserção, que todas as características do vínculo conjugal se mantinham incólumes, dentre elas a coabitação do casal. Desse modo, tendo o autor declarado que residia na cidade de Mogi das Cruzes, o magistrado foi induzido a presumir que a falecida também residia com o inventariante no mesmo local e, portanto, deferiu o processamento do feito. Entretanto, repise-se, não há qualquer evidência que a instituidora também residisse com o demandante na cidade de Mogi das Cruzes na data do óbito. Aliás, nem mesmo o próprio autor sustentou tal tese ao longo de todo esse processo. Aliás, em ato falho, logo no início do depoimento pessoal, entre 1min 08s e 1min14s de gravação, ao ser indagado onde o casal morava na data do óbito, o autor chega a afirmar "aqui", ou seja, em Mogi das Cruzes, mas depois que o Juiz menciona o nome da cidade, o demandante altera o domicílio para São Paulo. Outrossim, o casal estava em avançado processo de separação, de modo que é absolutamente compreensível que já não mais residissem juntos. Ao contrário de casais que mantém o compartilhamento do imóvel mesmo durante o processo de separação, devido à insuficiência de recursos ou à necessidade de manter a proximidade com os filhos, esse não era o caso da falecida e do autor. Neste sentido, a relação de salários de contribuição comprova que a instituidora tinha considerável poder aquisitivo, já que recebera a remuneração média de R$ 5.212,00 (cinco mil, duzentos e doze reais) entre outubro de 2000 e abril de 2001 (ID 122827431 - p. 40), enquanto o maior salário mínimo no mesmo período era de R$ 151,00 (cento e cinquenta e um reais). Por outro lado, o próprio autor já se declarava como comerciante de mármore e granito. Diante de tais circunstâncias e considerando as máximas de experiências subministradas pelo que ordinariamente acontece (artigo 375 do CPC/2015), não é crível que o casal se submeteria ao desgaste de compartilhar o mesmo imóvel durante o processo de separação já deflagrado e em estágio avançado de conclusão, sobretudo considerando que eles não tinham filhos e a autora já estava se relacionando afetivamente com outra pessoa, segundo depoimento pessoal colhido na audiência de instrução. A conta em nome do autor, relativa ao endereço em São Paulo, apresentada somente em sede recursal, portanto, não altera tal conclusão, uma vez que restou evidente que ele já residia em Mogi das Cruzes na data do óbito. A ausência de coabitação, por si só, não seria óbice intransponível para o reconhecimento da persistência do vínculo conjugal, sobretudo considerando a diversidade das relações afetivas no mundo contemporâneo. No entanto, quando analisada em conjunto com as demais evidências produzidas no curso da instrução, reforça a tese de que o casal já não mais convivia na época do passamento. Reconhecida a separação de fato do casal, caberia ao demandante demonstrar que era dependente economicamente da instituidora na data do óbito, uma vez que não poderia se beneficiar da presunção prevista no artigo 16, §4, da Lei n. 8.213/91. Apesar disso, não foi produzida qualquer prova neste sentido, uma vez que a tese principal que norteou a narrativa desenvolvida pelo demandante foi a de que a ausência de extinção formal do vínculo conjugal, por si só, permitiria sua habilitação como dependente, para fins de recebimento de pensão por morte. Ademais, o demandante sempre se qualificou como "comerciante" e já morava em domicílio diverso da falecida, razão pela qual se conclui que possuía renda própria, em 2001, suficiente para manter o próprio sustento. Desse modo, ausentes os requisitos, o autor não pode ser habilitado como dependente da instituidora. A propósito, reporto-me aos seguintes precedentes desta Corte Regional: “PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. SEPARAÇÃO DE FATO COMPROVADA. SÚMULA N. 336 DO E. STJ. NÃO COMPROVAÇÃO DE NECESSIDADE ECONÔMICA. PRESUNÇÃO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA INFIRMADA. VALORES INTEGRAIS RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. BOA FÉ. RESSARCIMENTO. DESCABIMENTO. TEMA 979 DO STJ. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I - Verifica-se dos autos que a autora obteve a concessão do benefício de pensão por morte decorrente do falecimento de Edilson Joaquim Sousa, ocorrido em 17.06.2016, na condição de esposa deste. Ocorre que a ora autora foi citada nos autos n. 0000465 – 89.2017.4.03.6338, que tramitou no Juizado Especial Federal Cível de São Bernardo do Campo/SP, em face de ação ajuizada por Maria Socorro Barros de Lima, que alegava ser companheira do Sr. Edilson Joaquim Sousa, fazendo jus também ao benefício de pensão por morte. Foi proferida sentença naqueles autos julgando improcedente o pedido, constando, entretanto, a seguinte passagem, que abaixo transcrevo: “Este Juízo também não restou convencido de que o falecido convivia com a corré Neusa, reservando-se, pois, ao INSS, adotar as providências que entender cabíveis quanto à manutenção do benefício de pensão por morte, já que das provas produzidas o convencimento foi no sentido de que o falecido não mantinha união estável à época do óbito”. II - Em face de tal determinação, em dezembro de 2017, a Autarquia Previdenciária expediu ofício comunicando à demandante que, após a avaliação de que trata o artigo 11 da Lei nº 10.666/2003, identificou indício de irregularidade, tendo em vista que não há comprovação da união estável. Após apresentação de defesa pela ora autora, em junho de 2018, concluiu a Autarquia que esta não fazia jus ao recebimento da pensão por morte, devendo promover a restituição aos cofres públicos dos valores recebidos correspondente ao período de 17/06/2016 a 31/10/2017, acarretando um débito no montante de R$ 51.039,92 (cinquenta e um mil e trinta e nove reais e noventa e dois centavos). III - Não há se falar em coisa julgada, posto que, a despeito da participação da ora autora como corré nos autos n. autos n. 0000465 – 89.2017.4.03.6338, que tramitou perante o Juizado Especial Federal Cível de São Bernardo do Campo/SP, o provimento jurisdicional exarado abrangeu exclusivamente a pretensão da então autora, a Sra. Maria Socorro Barros de Lima, nada dispondo sobre o direito da ora autora, razão pela qual é possível adentrar ao mérito no âmbito da presente ação. Outrossim, é de se observar que não se operou a decadência do direito do INSS em revisar o benefício da parte autora, uma vez que não decorreu prazo superior a 10 (dez) anos entre a data da concessão do benefício (17.06.2016) e a deflagração do procedimento administrativo de revisão pela Autarquia (12/2017). IV - Colhe-se dos autos que a autora contraiu núpcias com o Sr. Edilson Joaquim de Sousa em 20.05.1995, não havendo qualquer averbação de separação judicial ou divórcio. Para comprovar que não se encontrava separada de fato do falecido, a autora carreou os seguintes documentos, a saber: certidão de óbito, em que figura como declarante; contrato de locação na qual o falecido ostenta a posição de locatário relativamente a imóvel (apartamento n. 109 – Edifício Itajaí) situado à Rua Oceânica Amabile, n. 346, Praia Grande/SP, no período de 07.06.2014 a 07.12.2016, mesmo endereço indicado como domicílio da autora; plano de assistência funeral familiar, em nome do genitor da autora, o Sr. Theodolino Francisco Jorge, datado de 29.08.2009, em que o finado figura como beneficiário ; e fotografias, sem data, retratando a autora e o de cujus em eventos sociais e com familiares. V - Do exame das provas materiais constantes dos autos e da prova testemunhal produzida, depreende-se que a autora encontrava-se separada de fato do falecido à época do óbito. Com efeito, é certo que não possuíam o mesmo domicílio, conforme se infere do endereço constante na certidão de óbito (Rua Batuíra, n. 647, Assunção, São Bernardo do Campo/SP) com o endereço declinado na inicial e indicado no contrato de locação (rua Oceânica Amabile, nº 346 – apto 109, Ocian – Praia Grande/SP). Insta acentuar que as contas de energia elétrica emitidas à época do óbito estão exclusivamente em nome da autora. As fotografias acostadas aos autos não possuem data e o plano de assistência funeral familiar data de 2009, impossibilitando concluir pela convivência do casal no período imediatamente anterior ao óbito. Por seu turno, a testemunha ouvida em audiência foi categórica no sentido de que o falecido morava sozinho, recebendo a visita esporádica da Sra. Maria Socorro Barros de Lima, não havendo qualquer menção da permanência da autora na residência do de cujus. VI - A despeito de a autora ainda ter contato com o falecido (foi declarante na certidão óbito), restou configurada a separação de fato, de modo a infirmar a presunção de dependência econômica prevista no §4º do art. 16 da Lei n. 8.213/91. VII - Não se pode olvidar que mesmo havendo separação de fato, a autora poderá ser qualificada como dependente se comprovar que, após a separação, o falecido continuou lhe prestando auxílio financeiro, a demonstrar real necessidade econômica superveniente, nos termos do enunciado da Súmula n. 336 do e. STJ. VIII - Não obstante o de cujus ostentasse a posição de locatário de imóvel em que residia a autora, conforme acima reportado, não se comprovou que o pagamento do aluguel fosse por ele realizado. Outrossim, não foram trazidos aos autos qualquer outro documento a demonstrar efetiva prestação de auxílio financeiro, tais como transferência de numerário e/ou aquisição de mantimentos, de forma regular e periódica. Cabe destacar, ainda, que a autora possuía vínculo empregatício, com data de admissão em 01.07.2012, auferindo renda no importe de R$ 1.200,00. IX - Afastada a presunção de dependência econômica que milita em favor da autora, em face da ocorrência de separação de fato, e da não comprovação de prestação de auxílio financeiro pelo de cujus, é de rigor a improcedência do pedido. X - O Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp 1381734, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 979), fixou a tese de que "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo (material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido". XI - Malgrado a autora encontrar-se separada de fato do falecido, restava mantido o vínculo conjugal, ante a ausência de divórcio ou separação judicial, o que poderia sugerir a preservação do direito ao benefício de pensão por morte. Ademais, a autora estava casada desde o ano de 1995, com indícios de manutenção da relação marital até o ano de 2014, o que corrobora a tese no sentido da existência de genuína convicção de que fazia jus ao benefício em comento. XII - Há que se ter em conta também, o caráter alimentar dos benefícios previdenciários, bem como os princípios da segurança jurídica e da presunção de legalidade dos atos administrativos, tendentes a gerar legítima confiança nos administrados de boa-fé. XIII - Ante a sucumbência recíproca, tanto a autora quanto o INSS deverão arcar, respectivamente, com honorários advocatícios no importe de R$ 1.000,00 (um mil reais), sendo que a parte autora, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita, terá a exigibilidade de seu débito suspensa, nos termos do art. 98, §§ 2º e 3º, do CPC. XV - Apelação da parte autora parcialmente provida.” (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002990-94.2019.4.03.6141, Rel. Desembargador Federal SYLVIA MARLENE DE CASTRO FIGUEIREDO, julgado em 13/07/2022, DJEN DATA: 18/07/2022) “PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. SEPARAÇÃO DE FATO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. 1. Havendo rompimento do relacionamento conjugal, ainda que apenas de fato, a dependência econômica não é presumida e deve ser comprovada. 2. Insuficiente o conjunto probatório a demonstrar a dependência econômica entre a autora e o segurado falecido à época do óbito. 3. Preliminar rejeitada. No mérito, apelação da parte autora não provida.” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5346593-79.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal MARCELO GUERRA MARTINS, julgado em 28/06/2022, DJEN DATA: 04/07/2022) “PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 74 E SEGUINTES DA LEI 8.213/91. SEPARAÇÃO DE FATO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO. 1. A pensão por morte é benefício previdenciário concedido aos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, nos termos do artigo 74 da Lei nº 8.213/91. 2. A concessão do benefício de pensão por morte exige o preenchimento dos seguintes requisitos: qualidade de dependente, nos termos da legislação vigente à época do óbito; comprovação da qualidade de segurado do de cujus, ou, em caso de perda da qualidade de segurado, o preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria (artigos 15 e 102 da Lei nº 8.213/91). 3. A separação, de fato ou de direito, por si só, não impede a concessão do benefício postulado. Todavia, a dependência econômica com relação ao ex-cônjuge não mais é presumida, devendo restar efetivamente demonstrada. 4. O conjunto probatório dos autos não é suficiente para demonstrar dependência econômica do autor em relação à falecida. 5. Apelação da parte autora não provida.” (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0001588-52.2011.4.03.6106, Rel. Desembargador Federal NILSON MARTINS LOPES JUNIOR, julgado em 05/05/2022, DJEN DATA: 11/05/2022) Por derradeiro, também não merecem prosperar os argumentos de índole formal opostos pelo autor à cessação do benefício. Em primeiro lugar, não há falar em ilegalidade praticada pelo INSS no ato de suspensão do beneplácito por ausência de prévio procedimento administrativo ou de notificação do demandante. De acordo com a informação prestada pelas partes, corroboradas pelo extrato do CNIS anexado aos autos (ID 122827431 - p. 62), o pagamento do benefício foi suspenso em estrito cumprimento à decisão judicial prolatada no bojo de ação anulatória de arrolamento de bens proposta pelo genitor da falecida em face do demandante. Deveras, constitui responsabilidade do magistrado a condução do processo nos termos do artigo 139 do Código de Processo Civil de 2015 (antigo artigo 125 do CPC/1973), cabendo a ele reprimir ou prevenir atos contrários à dignidade da Justiça. Competente ou não o juízo do inventário, o agente autárquico não poderia, por si só, e sem maiores informações, se eximir de cumprir a ordem judicial exarada, sob pena de incorrer na conduta descrita no artigo 330 do Código Penal, sujeitando o infrator às penas de detenção e multa. Ademais, o atual artigo 139, IV, do Código de Processo Civil de 2015, dispõe que: "Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: (…) IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;" Desse modo, não se pode falar em ilegalidade do INSS por realizar ato em estrito cumprimento à ordem judicial. Realmente, não poderia o agente da Autarquia Previdenciária agir de modo diverso, sob pena de atrair para si a incidência de toda sorte de penalidades processuais e materiais. Tampouco o INSS poderia condicionar o cumprimento da decisão judicial ao desfecho de procedimento administrativo que viesse a ser instaurado para apurar irregularidade no pagamento do benefício de pensão por morte. Isso porque constitui função típica do Poder Judiciário dar a última palavra acerca da legalidade dos atos praticados pelos demais Poderes da República, não podendo mero procedimento administrativo esterilizar a eficácia do provimento jurisdicional. Ademais, soa, no mínimo, incongruente o pleito de anulação do ato de suspensão fundado na ausência de notificação do pensionista pelo INSS. Isso porque o autor era parte na ação anulatória do arrolamento de bens, conforme demonstra a certidão de objeto e pé anexada aos autos (ID 122827431 - p. 178) e, nesta posição, teve acesso à íntegra das decisões judiciais até então tomadas, razão pela qual não houve surpresa ante a cessação do beneplácito. A finalidade da comunicação dos atos administrativos é dar ciência do seu teor ao segurado ou dependente, a fim de que possa exercer seu direito de defesa. No entanto, o caso vertente detém a peculiaridade de que a suspensão decorreu de ordem judicial, de modo que o INSS não teve qualquer discricionariedade na sua prática, atuando como mero agente executor da determinação do juízo. Assim, a impugnação da decisão de suspensão só poderia ser realizada no bojo do mesmo processo judicial que a deferiu, razão pela qual a ausência de notificação na seara administrativa não trouxe qualquer prejuízo ao demandante. Igualmente não merece prosperar a alegação de nulidade do ato de suspensão do benefício, pois decorrente de decisão prolatada por juízo incompetente. Segundo o disposto no artigo 86 do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época da determinação judicial controvertida: "As causas cíveis serão processadas e decididas, ou simplesmente decididas, pelos órgãos jurisdicionais, nos limites de sua competência, ressalvada às partes a faculdade de instituírem juízo arbitral" (g. n.). Entretanto, é importante destacar que a jurisdição é una, eis que constitui expressão da própria soberania do Estado Nacional, estabelecendo a competência apenas o critério organizacional para o exercício deste poder pelas diversas unidades jurisdicionais. Por essa razão, nem todas as decisões prolatadas por juízo incompetente são absolutamente desprovidas de efeitos jurídicos. Neste sentido, o artigo 219 do Código de Processo Civil de 1973 já estabelecia que a citação seria válida e produziria seus efeitos típicos ainda que determinada por juízo incompetente, in verbis: "Art. 219. A citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz litigiosa a coisa; e, ainda quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor e interrompe a prescrição." (g. n.) Ademais, a fim de assegurar a efetividade do processo, desdobramento da garantia constitucional à inafastabilidade da jurisidição, prevista no artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, são consideradas válidas as decisões judiciais tomadas com a finalidade de evitar perecimento de direito ou lesão grave e de difícil reparação, ainda que ordenadas por juízo incompetente no exercício do poder geral de cautela, nos termos do então vigente artigo 798 do Código de Processo Civil de 1973. Esta, aliás, é posição jurisprudencial dominante conforme se infere dos seguintes precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça: "PROCESSUAL. ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. VALIDADE DE DECISÃO PROFERIDA EM REGIME DE URGÊNCIA POR JUÍZO INCOMPETENTE. POSSIBILIDADE. NULIDADE DE DECISÃO SUCINTA. NÃO CABIMENTO. MULTA. EMBARGOS NÃO PROTELATÓRIO. SÚMULA 98/STJ. 1. A Corte de origem apreciou todas as questões relevantes ao deslinde da controvérsia de modo integral e adequado, apenas não adotando a tese vertida pelo agravante. Os fundamentos do aresto a quo são cristalinos. Inexistem, portanto, omissões, contradições, obscuridades ou ausência de motivação a sanar. 2. A recorrente argumenta que não existe decisão judicial válida determinando o bloqueio dos seus bens, pois a decisão proferida pelo juízo incompetente é nula (violação do art. 113 § 2º do CPC) e a do juízo competente carece de fundamentação (ofensa ao art. 165 do CPC). 3. O acórdão recorrido concluiu pela validade: a) da decisão proferida pelo juízo incompetente, que decretou, em antecipação de tutela, a indisponibilidade dos bens em questão com o objetivo de assegurar o ressarcimento do suposto dano ao patrimônio público, até o pronunciamento do juízo competente; b) da decisão do juízo competente que não desbloqueou os bens da recorrente, pois a decisão, embora concisa, está fundamentada nas alegações autorais e nos documentos que instruíram a petição de ingresso (art. 93, IX, CF) (e-STJ fls. 17/18). 4. Em regra, o reconhecimento da incompetência absoluta do juízo implica a nulidade dos atos decisórios por ele praticados, mas isso não o impede, em face do poder de cautela previsto nos arts. 798 e 799 do CPC, de conceder ou manter, em caráter precário, medida de urgência, para prevenir perecimento de direito ou lesão grave e de difícil reparação, até ulterior manifestação do juízo competente. Assim, não ofende o art. 113, § 2º do CPC a decisão que, a despeito de declinar da competência para vara especializada, manteve os efeitos da antecipação de tutela já concedida até a sua reapreciação pelo juízo competente. Precedentes. (…) 10. Recurso especial provido em parte." (REsp n. 1.038.199/ES, relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 7/5/2013, DJe de 16/5/2013.) "AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 NÃO CONFIGURADA. JUÍZO ABSOLUTAMENTE INCOMPETENTE. LIMINAR MANTIDA. PERECIMENTO DE DIREITO. POSSIBILIDADE. 1. Se as questões trazidas à discussão foram dirimidas, pelo Tribunal de origem, de forma suficientemente ampla, fundamentada e sem omissões deve ser afastada a alegada violação ao art. 535 do Código de Processo Civil. "2. Não ofende o art. 113 § 2º do CPC a decisão que, a despeito de declinar da competência para vara especializada, mantém os efeitos da antecipação de tutela já concedida até a sua reapreciação pelo juízo competente." 3. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no REsp n. 937.652/ES, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 19/6/2012, DJe de 28/6/2012.) O Novo Código de Processo Civil de 2015 foi ainda mais explícito nesta questão, consignando expressamente que serão preservados os efeitos das decisões prolatadas por juízo incompetente, até que elas sejam substituídas por outra do juízo competente, nos termos do artigo 64, §4º, do Código de Processo Civil, in verbis: "Art. 64. A incompetência, absoluta ou relativa, será alegada como questão preliminar de contestação. (…) § 4º Salvo decisão judicial em sentido contrário, conservar-se-ão os efeitos de decisão proferida pelo juízo incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente." O próprio C. Superior Tribunal de Justiça já vem adotando tal tese, conforme se infere do seguinte precedente recentíssimo: "PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. RELAÇÃO DE CONSUMO. COMPETÊNCIA ABSOLUTA. DOMICILIO DO CONSUMIDOR. EFEITO DA DECISÃO DO JUÍZO INCOMPETENTE. EXEGESE DO ART. 64, §4º, DO CPC. 1. Ação de busca e apreensão. 2. Tratando-se de relação de consumo, na qual a competência para julgamento da demanda é de natureza absoluta, deve a ação ser interposta no domicílio do consumidor. 3. Não compete a esta Corte proceder a cassação da decisão do juiz singular incompetente que deferiu o pedido de liminar formulado pela parte agravada, uma vez que, conforme preceitua o art. 64, § 4º, do CPC, as decisões proferidas em juízo incompetente em regra conservam o seu efeito, até que outra seja proferida pelo juízo declarado competente. 4. Agravo interno não provido." (AgInt no AREsp n. 1.449.023/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 20/4/2020, DJe de 23/4/2020.) Assim, a incompetência do juízo, por si só, não configuraria condição suficiente para a decretação da nulidade de ato processual, sendo imprescindível analisar o seu conteúdo decisório, mesmo sob a égide do Código de Processo Civil de 1973. Por outro lado, em consulta às informações do site deste Tribunal (www.jfsp.jus.br/comunicacao-publica/indice-noticias/noticias-2012/19062012-vara-federal-em-mogi-das-cruzes-completa-1-ano-de-instalacao), ratificou-se que a primeira Vara Federal somente foi instalada em Mogi das Cruzes em 2011. Tal fato, aliás, é referenciado pelo próprio demandante no seguinte trecho de sua petição inicial (ID 122827431 - p. 8): "(…) a Justiça Federal é o juízo competente para processar e julgar causas em que o INSS - Instituto Nacional do Seguro Social -, entidade autárquica federal, for interessado na condição de autor, ré assistente ou oponente, exceto as de falência, as de acidentes do trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho. Isso porque, como demonstram os documentos anexados aos autos do processo administrativo e o comprovante de residência do autor, seu domicílio está sediado na comarca de Mogi das Cruzes. E, em virtude da recente criação da Vara Federal de Mogi das Cruzes, vem o autor perante este R. Juízo postular o restabelecimento de seu benefício previdenciário de pensão por morte" Ora, como a Subseção Judiciária na qual reside o autor não era sede de Vara Federal em 2004 - época em que foi exarada a decisão controvertida -, por óbvio, eventual ação entre segurado, de um lado, e instituição previdenciária do outro, poderia ser proposta na Justiça Estadual, nos termos do artigo 109, §3º, da Constituição Federal, antes da alteração promovida pela EC n. 103/2019. Por outro lado, ao contrário do cidadão comum, que somente está obrigado a fazer o que a lei determina, o agente público não pode se omitir quando constata a ocorrência de alguma ilegalidade, sobretudo o magistrado, cuja atividade jurisdicional tem o escopo precisamente de garantir o cumprimento das leis. Assim, ao constatar que houve simulação do vínculo conjugal, fundamento que foi utilizado na decisão, segundo informações prestadas pelo próprio autor, não é absurda a determinação de suspensão do pagamento de prestação previdenciária resultante do mesmo tipo de expediente praticado em juízo. Pode-se questionar se a via estreita da ação anulatória de arrolamento de bens comportava a determinação imediata de suspensão do benefício, ou se o procedimento mais adequado seria intimar o INSS para apurar eventual irregularidade no pagamento da pensão por morte no âmbito administrativo. No entanto, tal questão não se confunde com desrespeito à competência - uma vez que tal controvérsia seria apreciada, à época, inevitavelmente pela Justiça Estadual, no exercício da competência delegada, eis que, repise-se, não havia vara da justiça federal instalada na subseção judiciária de Mogi das Cruzes. Por derradeiro, em consulta ao C. Superior Tribunal de Justiça, verifica-se que o último recurso do demandante proposto na referida ação anulatória, o Agravo em Recurso Especial n. 603.868/SP, não foi admitido por manifesta intempestividade, conforma decisão monocrática ora colacionada: " Superior Tribunal de Justiça AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 603.868 - SP (2014/0261457-6) RELATOR : MINISTRO PRESIDENTE DO STJ AGRAVANTE : LEANDRO JORGE GUASCH ADVOGADO : MARCELO FERREIRA MARINHO ALVES E OUTRO(S) AGRAVADO : OSVALDO AUGUSTIN GUTIERREZ ADVOGADOS : MARCO ANTÔNIO MAIA LOUZADA MARIA MARTA DOS SANTOS DIAS DECISÃO Mediante análise dos autos, verifica-se que o v. acórdão recorrido foi publicado em 21/1/2014 (fl. 555), sendo o recurso especial somente interposto em 11/2/2014 (fl. 596). Dessa forma, inadmissível, porquanto intempestivo, eis que interposto fora do prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do art. 508 do CPC. A propósito, conforme jurisprudência dominante nesta Corte, a ocorrência de feriado local, recesso, paralisação ou interrupção do expediente forense deve ser demonstrada por documento idôneo, no ato da interposição do recurso que pretende seja conhecido. Nesse sentido: AgRg no AREsp 527.290/MG, 2ª Turma, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJe de 22/8/2014. Ante o exposto, com fulcro no art. 1º da Resolução STJ n.º 17/2013, nego seguimento ao recurso"". Dessa forma, verifica-se que o presente recurso pretende rediscutir matéria já decidida por este Tribunal, emprestando-lhe indevida natureza infringente, o que não é possível em sede de declaratórios. Precedentes: 3ª Seção, EDcl em EDcl em EInf nº 0006055-03.2012.4.03.6183, Rel. Des. Fed. Tânia Marangoni, j. 28/05/2015, DJe 11/06/2015; TRF3, 7ª Turma, APELREEX 0001070-88.2012.4.03.6183, Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis, j. 30/11/2015, DJe 03/12/2015. Cumpre observar que os embargos de declaração têm a finalidade de esclarecer obscuridades, contradições e omissões da decisão, acaso existentes. Não é instrumento processual viável à manifestação de inconformismo, rediscussão do julgado ou, ainda, prequestionar matéria para interposição de recursos especial ou extraordinário, ausentes as hipóteses delineadas no art. 1.022, I e II, do Código de Processo Civil. Precedentes: STJ, EDcl no AgRg no RMS 45707, Rel. Min. Felix Fischer, j. 09/06/2015 e EDcl no Ag 1104774/RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 07/08/2014, DJe 22/08/2014. Ante o exposto, nego provimento aos embargos de declaração do autor. É como voto.
E M E N T A
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. ERRO MATERIAL. INOCORRÊNCIA. EVIDENTE NATUREZA INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
1 - Inexistência de omissão, contradição, obscuridade ou erro material na decisão embargada, nos moldes do art. 1.022, I e II, CPC.
2 - Inadmissibilidade de reexame da causa, por meio de embargos de declaração, para conformar o julgado ao entendimento da parte embargante. Natureza nitidamente infringente.
3 - Embargos de declaração do autor desprovidos.