APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000821-30.2014.4.03.6002
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: ADECOAGRO VALE DO IVINHEMA S.A., USINA LAGUNA - ALCOOL E ACUCAR LTDA, ENERGETICA SANTA HELENA S/A - EM RECUPERACAO JUDICIAL, UNIÃO FEDERAL
Advogados do(a) APELANTE: ANDRE RICARDO LEMES DA SILVA - SP156817-A, ANTONIO CARLOS GUIDONI FILHO - SP146997-A, MARCOS RENATO GELSI DOS SANTOS - SP151714-A
Advogado do(a) APELANTE: ILSON ROBERTO MORAO CHERUBIM - MS8251-A
Advogados do(a) APELANTE: ELIAS MUBARAK JUNIOR - SP120415-A, TIAGO MARRAS DE MENDONCA - SP211975-A
APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
OUTROS PARTICIPANTES:
INTERESSADO: CERONA-COMPANHIA DE ENERGIA RENOVAVEL
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: ILSON ROBERTO MORAO CHERUBIM - MS8251-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000821-30.2014.4.03.6002 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: ADECOAGRO VALE DO IVINHEMA S.A., USINA LAGUNA - ALCOOL E ACUCAR LTDA, ENERGETICA SANTA HELENA S/A - EM RECUPERACAO JUDICIAL, UNIÃO FEDERAL Advogados do(a) APELANTE: ANDRE RICARDO LEMES DA SILVA - SP156817-A, ANTONIO CARLOS GUIDONI FILHO - SP146997-A, MARCOS RENATO GELSI DOS SANTOS - SP151714-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: INTERESSADO: CERONA-COMPANHIA DE ENERGIA RENOVAVEL ADVOGADO do(a) INTERESSADO: ILSON ROBERTO MORAO CHERUBIM - MS8251-A R E L A T Ó R I O Trata-se de recursos de apelação interpostos pela União Federal e pelas empresas ADECOAGRO VALE DO IVINHEMA LTDA, USINA LAGUNA ÁLCOOL E AÇÚCAR LTDA e ENERGÉTICA SANTA HELENA LTDA, em face da r. sentença que, rejeitou as preliminares e julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, ante a perda superveniente do interesse de agir; e julgou procedente o pedido no tocante ao disposto na alínea “b” do art. 36 da Lei nº 4.870/65, condenando as rés ANGÉLICA AGROENERGIA LTDA, CERONA COMPANHIA DE ENERGIA RENOVÁVEL, USINA LAGUNA – ÁLCOOL E AÇÚCAR LTDA E ENERGÉTICA SANTA HELENA LTDA a elaborar e implementar o Plano de Assistência Social, aplicando-se o percentual de 1% sobre o valor oficial da tonelada de cana entregue, a qualquer título, às usinas, destilarias anexas ou autônomas, pelos fornecedores ou lavradores da referida matéria, desde o mês de outubro de 2000 até a data de 10/10/2013, observados os limites do pedido, bem como a data em que cada ré iniciou atividade sucroalcooleira, nos termos da fundamentação supra; e condenou a UNIÃO a fiscalizar as demais requeridas quanto à elaboração e implementação do PAS. A presente ação civil pública foi proposta pelo Ministério Público do Trabalho e pelo Ministério Público Federal em face das empresas ANGÉLICA AGROENERGIA LTDA, AMERICA AGROENERGIA LTDA, CERONA COMPANHIA DE ENERGIA RENOVÁVEL, ENERGÉTICA SANTA HELENA LTDA, USINA LAGUNA ÁLCOOL E AÇÚCAR LTDA, ADECOAGRO VALE DO IVINHEMA S.A. e da União Federal, objetivando: a) o efetivo adimplemento do Plano de Assistência Social (PAS), com a consequente elaboração e demonstração da execução na prestação de serviços aos trabalhadores industriais e agrícolas do setor sucroalcooleiro; b) a fiscalização das rés, por parte da União, quanto à elaboração e execução concreta do referido plano; e, c) a condenação pagamento das parcelas vencidas referentes ao Programa de Assistência Social, desde o mês de outubro de 2000 (data em que deixou de ocorrer a fiscalização), até os dias atuais, atendendo-se aos percentuais previstos no art. 36 da Lei nº 4.870/65. A presente ação civil pública foi ajuizada pelo MPF e pelo MPT, objetivando o efetivo adimplemento do Programa de Assistência Social (PAS), com a consequente elaboração e demonstração da execução na prestação de serviços pelos trabalhadores industriais e agrícolas do setor sucroalcooleiro, bem como a fiscalização das rés por parte da União, quanto à elaboração e execução concreta do referido plano. Narra a inicial que, no dia 11/02/2010, a parte autora, de ofício, instaurou o Procedimento Preparatório de Inquérito Civil Público, no âmbito da Procuradoria do Trabalho, do Município de Dourados/MS, a fim de verificar a efetiva aplicação do PAS, em programas assistenciais destinados aos trabalhadores do setor da agroindústria da cana. Alegam, em síntese, que durante a instrução do procedimento, restou plenamente demonstrado que as usinas de açúcar e álcool da região não possuem um plano de assistência social, nos moldes da Lei nº 4.870/65, pois alegam que não estão obrigadas a aplicar os recursos do PAS, uma vez que entendem que a CF/88 não recepcionou a referida lei. Defendem que as demandadas descumprem o aludido diploma legal, na medida em que o seu art. 36 prevê que os produtores de cana de açúcar e álcool estão obrigados a implementar o Plano de Assistência Social, mediante a aplicação, em benefício dos trabalhadores industriais e agrícolas das usinas, destilarias e fornecedores, em serviços de assistências médica, hospitalar, farmacêutica e social, importância correspondente, no mínimo, a 1% do total do açúcar produzido ou comercializado, 2% do total do álcool produzido e comercializado e 1% do total da cana produzida e comercializada. Acrescentam que a União, por sua vez, tem se omitido no seu dever legal de fiscalização desde outubro de 2000. A tutela antecipatória foi indeferida pelo juízo trabalhista (fls. 88/89 dos autos físicos). A tentativa de conciliação restou infrutífera (ID 137093252), prosseguindo-se com a juntada das defesas das demandadas. Foi dispensada a instrução processual, por se tratar de questão de direito. Regularmente processado o feito, sobreveio sentença, proferida pelo juízo trabalhista que, após reconhecer sua competência para a apreciação da causa, afastou as preliminares arguidas pelas rés e julgou procedentes os pedidos formulados na inicial. Foi suscitado o conflito positivo de competência pelo juízo federal, em 20/03/2012, perante o STJ (ID 137093257, fls. 191/192). Paralelamente, as empresas requeridas e a União interpuseram recursos ordinários e o MPT interpôs recurso adesivo, perante o TRT da 24ª Região, ocasião em que o Pleno declarou a incompetência absoluta da Justiça do Trabalho para a apreciação desta causa e determinou a remessa dos autos a uma das varas da Justiça Federal de Dourados/MS (ID 137093259, fls. 256/261). Opostos embargos de declaração pelo MPT, rejeitados na origem. Autos conclusos ao juízo federal de Dourados/MS, sobreveio a prolação da sentença, que extinguiu o processo sem resolução do mérito, face à perda de interesse superveniente, na forma do art. 485, VI do CPC, com relação às obrigações constantes nas alíneas “a” e “c” da Lei nº 4.870/65; e julgou procedente o pedido no tocante ao disposto na alínea “b”, do art. 36 da Lei nº 4.870/65, condenando as empresas rés nos moldes pleiteados na petição inicial (ID 137093260, fls. 137/140). Opostos embargos de declaração pelas rés e pela União, rejeitados os embargos da empresa ENERGÉTICA SANTA HELENA LTDA, parcialmente providos os aclaratórios das empresas CERONA COMPANHIA DE ENERGIA RENOVÁVEL e USINA LAGUNA ÁLCOOL E AÇÚCAR LTDA e providos os embargos opostos pela União, cujo dispositivo restou assim assentado: “À luz do exposto: a) Julgo extinto o processo sem resolução do mérito, face à perda de interesse superveniente, na forma do artigo 485, VI do CPC, com relação às obrigações constantes nas alíneas “a” e “c” da Lei 4870/65; b) Julgo PROCEDENTE o pedido no tocante ao disposto na alínea “b” do art. 36 da Lei 4870/65, condenando as rés ANGÉLICA AGROENERGIA LTDA, CERONA COMPANHIA DE ENERGIA RENOVÁVEL, USINA LAGUNA – ÁLCOOL E AÇUCAR LTDA e ENERGÉTICA SANTA HELENA LTDA para elaborar e implementar o Plano de Assistência Social previsto na referência legal supra mencionada, aplicando o percentual de 1% (um por cento) sobre o valor oficial da tonelada de cana entregue, a qualquer título, às usinas, destilarias anexas ou autônomas, pelos fornecedores ou lavradores da referida matéria, desde o mês de outubro de 2000 até a data de 10/10/2013, observados os limites do pedido, bem como a data em que cada ré iniciou atividade sucroalcooleira, nos termos da fundamentação supra; e condenando a UNIÃO a fiscalizar as demais requeridas quanto à elaboração e implementação do Plano de Assistência Social, nos termos da fundamentação supra. (...) Mantenho todos os demais termos da sentença embargada”. Sobreveio despacho, determinando a expedição de ofício à Caixa Econômica Federal, para fins de solicitação de abertura de conta judicial vinculada a estes autos; bem como, após a abertura da referida conta, a remessa do ofício ao juízo trabalhista da Vara do Trabalho de Nova Andradina/MS, para fins de transferência do saldo total, mais atualizações, da conta referente à reclamatória trabalhista nº 0001292-09.2010.524.0056 (depósito recursal) para a conta informada pela CEF (ID 137093285). Contra a r. sentença, os corréus ADECOAGRO VALE IVINHEMA LTDA (ID 137093298), USINA LAGUNA ÁLCOOL E AÇÚCAR LTDA (ID 137093306) e ENERGÉTICA SANTA HELENA LTDA. (ID137093325) interpuseram apelação, pugnando pela reforma da sentença, pautados nos seguintes fundamentos: a) preliminarmente: a.1) a ilegitimidade ativa do MPT/MPF e a impossibilidade de discussão do art. 36, alínea “b”, da Lei nº 4.870/1965 por meio de ação civil pública; a.2) a ausência de interesse de agir, ante à vedação do princípio do non bis in idem; a.3) a perda de objeto ante a inexistência de manutenção de obrigação anterior à publicação da Lei 12.865/2013; a.4) a nulidade de intimação; a.5) a configuração da prescrição; b) no mérito, defendem a natureza tributária da obrigação relativa ao PAS, ao argumento de que a obrigação relativa à alínea “b”, do art. 36 da Lei n. 4.870/65, não tem natureza de obrigação de fazer, ao contrário do quanto consignado pela r. sentença, mas sim de obrigação de dar (depósito de dinheiro em conta vinculada), aproximando-a ao conceito de tributo. Ainda, sustentam a tese da não recepção da Lei nº 4.870/65 pela CF/88, além da violação ao princípio da isonomia. Por sua vez, a União Federal interpôs apelação, pugnando pela reforma da sentença, alegando, especificamente, a perda de objeto, por força da Lei nº 12.865/2013, ao fundamento de que este diploma legal “revogou a contribuição ao PAS e decretou a extinção de todas as obrigações, ainda que anteriores à sua edição” (ID 137093310). Manifestação da empresa ADECOAGRO VALE IVINHEMA LTDA – em recuperação judicial – no sentido de que não tem objeções a apresentar, em relação ao recurso de apelação apresentado pela corré ENERGÉTICA SANTA HELENA LTDA – em recuperação judicial (ID 13709339). Decorridos os prazos para contrarrazões das empresas do MPF e do MPT, conforme consulta processual no sistema eletrônico PJe de 1º grau, os autos foram remetidos a esta Corte Regional. Parecer ministerial pelo provimento dos apelos interpostos pelas empresas rés e pela União, para extinção do feito, decretando-se a carência da ação, em razão da ausência de interesse processual (ID 138741761). Em apartado, a corré ADECOAGRO VALE DO IVINHEMA S.A., ora apelante, formulou pedido de atribuição de efeito suspensivo ao seu recurso (processo nº 5004323-40.2020.4.03.0000), deferido por esta Relatoria, até o julgamento do mérito recursal, conforme decisão monocrática (ID 255765259). Vieram os autos conclusos. É o relatório.
Advogado do(a) APELANTE: ILSON ROBERTO MORAO CHERUBIM - MS8251-A
Advogados do(a) APELANTE: ELIAS MUBARAK JUNIOR - SP120415-A, TIAGO MARRAS DE MENDONCA - SP211975-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000821-30.2014.4.03.6002 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: ADECOAGRO VALE DO IVINHEMA S.A., USINA LAGUNA - ALCOOL E ACUCAR LTDA, ENERGETICA SANTA HELENA S/A - EM RECUPERACAO JUDICIAL, UNIÃO FEDERAL Advogados do(a) APELANTE: ANDRE RICARDO LEMES DA SILVA - SP156817-A, ANTONIO CARLOS GUIDONI FILHO - SP146997-A, MARCOS RENATO GELSI DOS SANTOS - SP151714-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: INTERESSADO: CERONA-COMPANHIA DE ENERGIA RENOVAVEL ADVOGADO do(a) INTERESSADO: ILSON ROBERTO MORAO CHERUBIM - MS8251-A V O T O O cerne da controvérsia diz respeito à aferição das seguintes matérias: a) preliminarmente: a ilegitimidade ativa do MPT/MPF, a ausência de interesse de agir, a perda de objeto, a nulidade de intimação e a configuração da prescrição; e b) no mérito, se discute sobre: b.1) a natureza tributária da obrigação relativa ao PAS; b.2) se a Lei nº 4.870/65 foi (ou não) recepcionada pela CF/88; b.3) se a r. sentença, ao condenar os requeridos, violou (ou não) o princípio da isonomia; e, b.4) se restou (ou não) configurada a perda de objeto, ante a criação da Lei nº 12.865/2013, que revogou a contribuição ao PAS e decretou a extinção de todas as obrigações, ainda que anteriores à sua edição. Passo ao exame das preliminares levantadas pela defesa das empresas rés. I. DAS PRELIMINARES: I.1. DA CARÊNCIA DA AÇÃO: Preliminarmente, os apelantes sustentam a perda superveniente de objeto, em decorrência da extinção das obrigações dispostas no art. 36 da Lei nº 4.870/65, alterada pela Lei nº 12.865/2013, ainda que anteriores a edição desta lei. A referida preliminar, atinente à superveniente ausência de interesse processual, merece prosperar. Vejamos. Inicialmente, cumpre mencionar que a assistência social do setor sucroalcooleiro foi criada pelo Decreto-Lei nº 9.827/1946, mas somente com a edição da Lei nº 4.870/1965, o legislador possibilitou a aplicação de receitas no Programa de Assistência Social dos trabalhadores da agroindústria canavieira, consoante estabelecido no art. 35, in verbis: “CAPÍTULO V Da Assistência aos Trabalhadores Art. 35 - A parcela resultante do percentual estabelecido na alínea b do art. 23 será aplicada em programas de assistência social aos trabalhadores da agroindústria canavieira, tendo por objeto: a) higiene e saúde, por meio de assistência médica, hospitalar e farmacêutica, bem como à maternidade e à infância, complementando a assistência prestada pela usinas e fornecedores de cana; b) complementação dos programas de educação profissional e de tipo médio gratuitas; c) estímulo e financiamento a cooperativas de consumo; d) financiamento de culturas de subsistência, nas áreas de terras utilizadas pelos trabalhadores rurais, de acôrdo com o disposto no art. 23, do Decreto- Lei nº 6.969, de 19 de outubro de 1944; e) promoção e estímulo de programas educativos, culturais e de recreação”. Por sua vez, o art. 36 do referido diploma legal previa a aplicação do percentual de 1% (sobre o preço oficial de saco de açúcar de 60 kg, sobre o valor da tonelada de cana e sobre o valor oficial do litro de álcool de qualquer tipo produzido nas destilarias), em benefício dos trabalhadores industriais e agrícolas das usinas, destilarias e fornecedores, em serviços de assistências médica, hospitalar, farmacêutica e social. Ainda, o parágrafo 1º deste dispositivo estabelecia que: “Art. 36. (...) §1º. Os recursos previstos neste artigo serão aplicados diretamente pelas usinas, destilarias e fornecedores de cana, individualmente ou através das respectivas associações de classe, mediante plano de sua iniciativa, submetido à aprovação e fiscalização do I.A.A”. Ocorre que a Lei nº 12.865/2013, que regulamentou a autorização do pagamento de subvenção econômica aos produtores da agroindústria canavieira, revogou o art. 36 da Lei nº 4.870/65, extinguindo todas as obrigações, inclusive as anteriores à data da publicação desta lei, consoante expressamente previsto no art. 38, que assim dispõe: “Art. 38. São extintas todas as obrigações, inclusive as anteriores à data de publicação desta Lei, exigidas de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado com fundamento nas alíneas “a” e “c” do caput do art. 36 da Lei nº 4.870, de 1º de dezembro de 1965, preservadas aquelas já adimplidas”. Com efeito, a jurisprudência pacificada no Superior Tribunal de Justiça se alinha no sentido de que, a Lei nº 12.865/2013 revogou o art. 36 da Lei nº 4.870/65, de modo a extinguir qualquer possibilidade de implementação do Plano de Assistência Social (PAS), inclusive quanto às obrigações anteriores à sua edição. Confiram-se: “ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SETOR SUCROALCOOLEIRO. PLANO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL (PAS). LEGISLAÇÃO REVOGADA. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE PROCESSUAL. 1. Conforme aduzido pela União e pelo Ministério Público Federal, o art. 42, IV, da Lei 12.865/2013 revogou o art. 36 da Lei 4.870/1965, base legal utilizada pelo Parquet para obrigar a implementação do Plano de Assistência Social (PAS) pela empresa recorrente. 2. O art. 38 da referida Lei 12.865/2013 declarou "extintas todas as obrigações, inclusive as anteriores à data de publicação desta Lei, exigidas de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado com fundamento nas alíneas 'a' e 'c' do caput do art. 36 da Lei 4.870, de 1º de dezembro de 1965, preservadas aquelas já adimplidas". 3. Com efeito, tem-se que a extinção de todas as obrigações previstas no art. 36 da Lei 4.870/1965, inclusive as anteriores à data da publicação da Lei 12.865/2013, culmina na inequívoca perda superveniente do interesse de agir, nos termos do art. 267, IV, do CPC/1973. No mesmo sentido, citam-se as seguintes decisões monocráticas: REsp 1.451.864/SP, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 8/10/2014; REsp 1.411.097/PB, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 29/8/2014; REsp 1.408.189/SP, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 31/3/2014, e REsp 1.438.579/SP, Rel. Min. Maria Regina Helena Costa, DJe 1º/6/2015. 4. Recurso Especial prejudicado por perda superveniente de seu objeto. Extinto o processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, VI, do CPC/1973”. (STJ - REsp: 1358070 SP 2012/0262096-5, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 07/03/2017, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/04/2017) “ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. ALEGAÇÃO DE NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE OFENSA AO ART. 557 DO CPC/73. RAZÕES DO AGRAVO QUE NÃO IMPUGNAM, ESPECIFICAMENTE, A DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA 182/STJ. REVOGAÇÃO DO ART. 36 DA LEI 4.870/1965. PERDA DO INTERESSE DE AGIR. FALTA DE IMPUGNAÇÃO, NO RECURSO ESPECIAL, DE FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO COMBATIDO, SUFICIENTE PARA A SUA MANUTENÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 283/STF. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESSA EXTENSÃO, IMPROVIDO. (...) V. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a Lei 12.865/2013 revogou o art. 36 da Lei 4.870/65, de modo a extinguir qualquer possibilidade de implementação do Plano de Assistência Social (PAS), inclusive quanto às obrigações anteriores à sua edição. Nesse sentido: STJ, REsp 1.358.070/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/04/2017; AgInt no REsp 1.516.040/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 28/03/2017. VI. Ainda que assim não fosse, no caso, a parte agravante deixou de impugnar o fundamento do acórdão recorrido, no sentido de que "a obrigação do art. 36 da Lei n. 4.870, de 1º/12/1965 (...) não foi recepcionada pela atual Carta Política, sendo que o advento da Lei nº 12.865/2013 tão somente formalizou sua extinção no ordenamento jurídico", atraindo a incidência do óbice previsto na Súmula 283/STF. VII. Agravo interno parcialmente conhecido, e, nessa extensão, improvido”. (STJ - AgInt no AREsp: 1314685 SP 2018/0152516-9, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Julgamento: 04/10/2018, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/10/2018) “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL - PAS. REVOGAÇÃO PELA LEI 12.865/2013. PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE PROCESSUAL. ENTENDIMENTO DESTA CORTE SUPERIOR, APLICÁVEL TAMBÉM ÀS CONTRIBUIÇÕES PRETÉRITAS FUNDADAS NA ALÍNEA B DO ART. 36 DA LEI 4.870/1965. AGRAVO INTERNO DO PRESENTANTE MINISTERIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Nos termos do que decidido pelo Plenário do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Enunciado Administrativo 2). 2. Esta Corte Superior entende que, com a revogação do art. 36 da Lei 4.870/1965 pela Lei 12.865/2013, torna-se impossível determinar a fiscalização ou recolhimento das contribuições respectivas, inclusive as anteriores à Lei revogadora. Julgados: AgInt no AREsp. 1.314.685/SP, Rel. Min. ASSUSETE MAGALHÃES, DJe 11.10.2018; REsp. 1.358.070/SP, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 19.4.2017. 3. Esta egrégia Primeira Turma já teve a oportunidade de destacar que o referido entendimento se aplica, também, às obrigações pretéritas fundadas na alínea b do art. 36 da Lei 4.870/1965. Acórdão paradigma: AgInt no REsp. 1.516.040/SP, Rel. Min. GURGEL DE FARIA, DJe 28.3.2017. 4. Agravo Interno do Presentante Ministerial a que se nega provimento”. (STJ - AgInt no REsp: 1513700 SP 2015/0022491-3, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 29/04/2019, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/05/2019) Desse modo, todas as obrigações decorrentes do art. 36 da Lei nº 4.870/65 foram revogadas, por força da alteração legislativa, promovida pela Lei nº 12.865/2013, que não só extinguiu todas as hipóteses do aludido dispositivo legal, como também aquelas anteriores à data da publicação desta lei, nos moldes de seu art. 38. Nesse contexto, com a extinção de todas as obrigações previstas no art. 36 da Lei nº 4.870/1965, inclusive as anteriores à data da publicação da Lei nº 12.865/2013, resta evidenciada a perda superveniente do interesse processual a partir da publicação desta lei, atingindo as obrigações anteriores, por força do disposto no art. 38 deste diploma legal. Sobre o tema, colho lições de Daniel Amorim Assunção Neves, citando Dinamarco: “A ideia de interesse de agir, também chamado de interesse processual, está intimamente associada à utilidade da prestação jurisdicional que se pretende obter com a movimentação da máquina jurisdicional. Cabe ao autor demonstrar que o provimento jurisdicional pretendido será capaz de lhe proporcionar uma melhora em sua situação fática, o que será o suficiente para justificar o tempo, a energia e o dinheiro que serão gastos pelo Poder Judiciário na resolução da demanda.” (In Manual de Direito Processual Civil, v. único, 10ª ed. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2018, p. 131) Em decorrência da carência da ação, extingo o processo, sem resolução do mérito, nos moldes do art. 485, VI do CPC/15, tornando-se prejudicada a análise das demais preliminares levantadas pelas empresas rés e do mérito. Por fim, não há que se falar em condenação da parte vencida em honorários, por força do art. 18 da Lei nº 7.347/1985. Ante o exposto, acolho a preliminar de perda superveniente do interesse processual para extinguir o processo, sem resolução do mérito, com base no art. 485, VI do CPC/15, e dou provimento aos recursos das empresas rés e da União Federal. É COMO VOTO.
Advogado do(a) APELANTE: ILSON ROBERTO MORAO CHERUBIM - MS8251-A
Advogados do(a) APELANTE: ELIAS MUBARAK JUNIOR - SP120415-A, TIAGO MARRAS DE MENDONCA - SP211975-A
E M E N T A
DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL – PAS. REVOGAÇÃO DO ART. 36 DA LEI N. 4.870/1965 PELA LEI N. 12.865/2013. PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE PROCESSUAL. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIA PACÍFICA NA CORTE SUPERIOR. CARÊNCIA DA AÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA. APELAÇÕES PROVIDAS.
01. O cerne da controvérsia diz respeito à aferição das seguintes matérias: a) preliminarmente: a ilegitimidade ativa do MPT/MPF, a ausência de interesse de agir, a perda de objeto, a nulidade de intimação e a configuração da prescrição; e b) no mérito, se discute sobre: b.1) a natureza tributária da obrigação relativa ao PAS; b.2) se a Lei nº 4.870/65 foi (ou não) recepcionada pela CF/88; b.3) se a r. sentença, ao condenar os requeridos, violou (ou não) o princípio da isonomia; e, b.4) se restou (ou não) configurada a perda de objeto, ante a criação da Lei nº 12.865/2013, que revogou a contribuição ao PAS e decretou a extinção de todas as obrigações, ainda que anteriores à sua edição.
02. Preliminarmente, os apelantes sustentam a perda superveniente de objeto, em decorrência da extinção das obrigações dispostas no art. 36 da Lei nº 4.870/65, alterada pela Lei nº 12.865/2013, ainda que anteriores a edição desta lei.
03. Inicialmente, cumpre mencionar que a assistência social do setor sucroalcooleiro foi criada pelo Decreto-Lei nº 9.827/1946, mas somente com a edição da Lei nº 4.870/1965, o legislador possibilitou a aplicação de receitas no Programa de Assistência Social dos trabalhadores da agroindústria canavieira, consoante estabelecido no art. 35.
04. Por sua vez, o art. 36 do referido diploma legal previa a aplicação do percentual de 1%, em benefício dos trabalhadores industriais e agrícolas das usinas, destilarias e fornecedores, em serviços de assistências médica, hospitalar, farmacêutica e social.
05. Ocorre que a Lei nº 12.865/2013, que regulamentou a autorização do pagamento de subvenção econômica aos produtores da agroindústria canavieira, revogou o art. 36 da Lei nº 4.870/65, extinguindo todas as obrigações, inclusive as anteriores à data da publicação desta lei, consoante expressamente previsto no art. 38.
06. Com efeito, a jurisprudência pacificada no Superior Tribunal de Justiça se alinha no sentido de que, a Lei nº 12.865/2013 revogou o art. 36 da Lei nº 4.870/65, de modo a extinguir qualquer possibilidade de implementação do Plano de Assistência Social (PAS), inclusive quanto às obrigações anteriores à sua edição. Precedentes: REsp: 1358070 SP 2012/0262096-5, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 07/03/2017, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/04/2017; AgInt no REsp: 1513700 SP 2015/0022491-3, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 29/04/2019, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/05/2019.
07. Nesse contexto, com a extinção de todas as obrigações previstas no art. 36 da Lei nº 4.870/1965, inclusive as anteriores à data da publicação da Lei nº 12.865/2013, resta evidenciada a perda superveniente do interesse processual a partir da publicação desta lei, atingindo as obrigações anteriores, por força do disposto no art. 38 deste diploma legal.
08. Reconhecida a carência da ação, em virtude da superveniente perda do interesse processual dos autores. Julgado extinto o presente feito, sem resolução do mérito, nos moldes do art. 485, VI do CPC/15, tornando-se prejudicada a análise das demais preliminares e do mérito.
09. Sem condenação da parte vencida em honorários, por força do art. 18 da Lei nº 7.347/1985.
10. Acolhida a preliminar de perda superveniente do interesse processual. Apelações das rés e da União providas.