Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003066-75.2020.4.03.6144

RELATOR: Gab. 03 - JUIZ CONVOCADO RENATO BECHO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: HENRIQUE EVANDRO PEREIRA DO NASCIMENTO

Advogados do(a) APELADO: GUSTAVO FIERI TREVIZANO - SP203091-A, SERGIO EDUARDO PRIOLLI - SP200110-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003066-75.2020.4.03.6144

RELATOR: Gab. 03 - JUIZ CONVOCADO RENATO BECHO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: HENRIQUE EVANDRO PEREIRA DO NASCIMENTO

Advogados do(a) APELADO: GUSTAVO FIERI TREVIZANO - SP203091-A, SERGIO EDUARDO PRIOLLI - SP200110-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Adiro ao entendimento do Exmo. Des. Fed. Hélio Nogueira:

Trata-se de Apelação da UNIÃO em face da sentença (ID 155817045)  que julgou procedente o pedido de pagamento de férias não gozadas a ex-militar temporário, acrescidas do terço constitucional, e de compensação pecuniária, condenando a apelante ao pagamento de honorários no percentual mínimo legal sobre o valor da condenação, nos termos seguintes:

(...)Diante do acima exposto, procedo ao julgamento da seguinte forma.

a-) Resolvo as questões prévias conforme o acima fundamentado;

b-) Acolho os pedidos formulados pela parte autora e condeno a União Federal em obrigação de pagar o montante correspondente ao período de férias não gozadas do exercício de 2017, acrescido do terço constitucional, tendo por base o valor da última remuneração à época do desligamento do serviço militar, bem como a pagar o valor correspondente ao período de 10 anos (9 anos e 317 dias) como "compensação pecuniária", resolvendo o mérito da demanda na forma do artigo 487, I, do CPC.

Deverão ser abatidos dos valores em atraso, montantes pagos administrativamente pela parte autora, especialmente aqueles pagos como "compensação pecuniária" na forma da Lei  7.963/1989. 

Os juros de mora incidentes são aqueles aplicáveis à poupança (artigo 1º-F da Lei 9.49/97, com redação dada pela Lei n. 11.930/09) e a correção monetária deve ser feita pelo IPCA-E, conforme Tema 810 de Repercussão Geral examinado pelo c. STF, haja vista que se trata de crédito de natureza não-tributária.

Em relação aos demais consectários, aplicar-se-á o Manual de Cálculos da Justiça Federal vigente ao tempo da elaboração da conta de liquidação do julgado, evidentemente no que não contrariar os termos acima fixados.

Condeno a União Federal ao pagamento de honorários advocatícios em favor da parte adversa, que incidirão pelos percentuais mínimos (artigo 85, § 3º, CPC) sobre o valor da condenação, em razão das realidades estampadas no § 2º do mesmo preceito legal. 

A União é isenta de custas na forma do artigo 4, I, da Lei 9.289/96, contudo responde por elas na medida de eventual sucumbência quando houver efetivo desembolso pela parte adversa.

Dispensado o reexame necessário, considerado que o valor não supera mil salários mínimos.

Decorrido o prazo recursal, certifique-se o trânsito em julgado.(...)

 

Em suas razões recursais (ID 155817048),  a UNIÃO pretende a reforma da sentença, aduzindo a ocorrência da prescrição quinquenal, bem como inexistência direito a férias aos militares em serviço obrigatório e na condição de médico voluntário participante de Estágio de Adaptação e Serviço (EAS), nos termos da Lei n.4.375/64, bem como de previsão legal de conversão em pecúnia de férias não gozadas.

Refere que a tese firmada no julgamento do PEDILEF n. 5000793-77.2016.404.7101/RS, pelo TNU  (Representativo de Controvérsia - Tema 162), aplica-se apenas ao militar incorporado de forma permanente às Forças Armadas, após a prestação do serviço inicial.

Sustenta que ao militar transferido para a inatividade só são pagas as férias não gozadas referentes ao ano imediatamente anterior (período de férias a que tiver direito) e, proporcionalmente ao do ano em que for desligado do serviço ativo (incompleto, na proporção de um doze avos por mês de efetivo serviço, ou fração superior a quinze dias), de acordo com o contido no art. 80, § 1° do Decreto n° 4.307/2002.

Caso reconhecido o direito à indenização pretendida, defende que o quantum deverá ter como base a “a remuneração respectiva à base de seu valor histórico, que não se admite a conversão em pecúnia em dobro; que os juros de mora devem corresponder aos aplicados a caderneta de poupança, contados da citação, e a correção monetária pelos índices oficiais do período a partir do ajuizamento da ação. Por fim, pleiteia a concessão de efeito suspensivo à sentença em face do perigo da irreversibilidade.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte Regional.

Dispensada a revisão, nos termos regimentais.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


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1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003066-75.2020.4.03.6144

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APELADO: HENRIQUE EVANDRO PEREIRA DO NASCIMENTO

Advogados do(a) APELADO: GUSTAVO FIERI TREVIZANO - SP203091-A, SERGIO EDUARDO PRIOLLI - SP200110-A

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V O T O

 

 

Adiro ao entendimento do Exmo. Des. Fed. Hélio Nogueira:

Tempestiva a apelação, dela conheço e a recebo em seus regulares efeitos.

Prescrição

Conforme dispõe o Decreto n. 20.910/32, as dívidas da Fazenda Pública prescrevem em cinco anos. Deve-se observar, entretanto, que se a dívida for de trato sucessivo, não há prescrição do todo, mas apenas da parte atingida pela prescrição, conforme o artigo 3º daquele ato normativo:

Artigo 3º - Quando o pagamento se dividir por dias, meses ou anos, a prescrição atingirá progressivamente as prestações, à medida que completarem os prazos estabelecidos pelo presente decreto.

 

Na jurisprudência, a questão foi pacificada após o STJ editar a Súmula de n. 85, de seguinte teor:

 

Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação.

 

Prevalece no âmbito da jurisprudência do STJ, pela sistemática do artigo 543-C do CPC, esse entendimento:

 

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (ARTIGO 543-C DO CPC). RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL (ART. 1º DO DECRETO 20.910/32) X PRAZO TRIENAL (ART. 206, § 3º, V, DO CC). PREVALÊNCIA DA LEI ESPECIAL. ORIENTAÇÃO PACIFICADA NO ÂMBITO DO STJ. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. 1. A controvérsia do presente recurso especial, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC e da Res. STJ n 8/2008, está limitada ao prazo prescricional em ação indenizatória ajuizada contra a Fazenda Pública, em face da aparente antinomia do prazo trienal (art. 206, § 3º, V, do Código Civil) e o prazo quinquenal (art. 1º do Decreto 20.910/32). 2. O tema analisado no presente caso não estava pacificado, visto que o prazo prescricional nas ações indenizatórias contra a Fazenda Pública era defendido de maneira antagônica nos âmbitos doutrinário e jurisprudencial. Efetivamente, as Turmas de Direito Público desta Corte Superior divergiam sobre o tema, pois existem julgados de ambos os órgãos julgadores no sentido da aplicação do prazo prescricional trienal previsto no Código Civil de 2002 nas ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública. Nesse sentido, o seguintes precedentes: REsp 1.238.260/PB, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 5.5.2011; REsp 1.217.933/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 25.4.2011; REsp 1.182.973/PR, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJe de 10.2.2011; REsp 1.066.063/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe de 17.11.2008; EREspsim 1.066.063/RS, 1ª Seção, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 22/10/2009). A tese do prazo prescricional trienal também é defendida no âmbito doutrinário, dentre outros renomados doutrinadores: José dos Santos Carvalho Filho ("Manual de Direito Administrativo", 24ª Ed., Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris, 2011, págs. 529/530) e Leonardo José Carneiro da Cunha ("A Fazenda Pública em Juízo", 8ª ed, São Paulo: Dialética, 2010, págs. 88/90). 3. Entretanto, não obstante os judiciosos entendimentos apontados, o atual e consolidado entendimento deste Tribunal Superior sobre o tema é no sentido da aplicação do prazo prescricional quinquenal - previsto do Decreto 20.910/32 - nas ações indenizatórias ajuizadas contra a Fazenda Pública, em detrimento do prazo trienal contido do Código Civil de 2002. 4. O principal fundamento que autoriza tal afirmação decorre da natureza especial do Decreto 20.910/32, que regula a prescrição, seja qual for a sua natureza, das pretensões formuladas contra a Fazenda Pública, ao contrário da disposição prevista no Código Civil, norma geral que regula o tema de maneira genérica, a qual não Superior Tribunal de Justiça altera o caráter especial da legislação, muito menos é capaz de determinar a sua revogação. Sobre o tema: Rui Stoco ("Tratado de Responsabilidade Civil". Editora Revista dos Tribunais, 7ª Ed. - São Paulo, 2007; págs. 207/208) e Lucas Rocha Furtado ("Curso de Direito Administrativo". Editora Fórum, 2ª Ed. - Belo Horizonte, 2010; pág. 1042). 5. A previsão contida no art. 10 do Decreto 20.910/32, por si só, não autoriza a afirmação de que o prazo prescricional nas ações indenizatórias contra a Fazenda Pública foi reduzido pelo Código Civil de 2002, a qual deve ser interpretada pelos critérios histórico e hermenêutico. Nesse sentido: Marçal Justen Filho ("Curso de Direito Administrativo". Editora Saraiva, 5ª Ed. - São Paulo, 2010; págs. 1.296/1.299). 6. Sobre o tema, os recentes julgados desta Corte Superior: AgRg no AREsp 69.696/SE, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 21.8.2012; AgRg nos EREsp 1.200.764/AC, 1ª Seção, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe de 6.6.2012; AgRg no REsp 1.195.013/AP, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 23.5.2012; REsp 1.236.599/RR, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJe de 21.5.2012; AgRg no AREsp 131.894/GO, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJe de 26.4.2012; AgRg no AREsp 34.053/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 21.5.2012; AgRg no AREsp 36.517/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 23.2.2012; EREsp 1.081.885/RR, 1ª Seção, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe de 1º.2.2011. 7. No caso concreto, a Corte a quo, ao julgar recurso contra sentença que reconheceu prazo trienal em ação indenizatória ajuizada por particular em face do Município, corretamente reformou a sentença para aplicar a prescrição qüinqüenal prevista no Decreto 20.910/32, em manifesta sintonia com o entendimento desta Corte Superior sobre o tema. 8. Recurso especial não provido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.

(REsp 1251993/PR, 1ª Seção, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, julgado em 12/12/2012, DJE 19/12/2012).


 

Ainda quanto à prescrição, a jurisprudência firmou-se no sentido de que  o termo inicial do prazo prescricional para o exercício do direito de pleitear a indenização de férias não gozadas inicia-se com a impossibilidade de usufruí-las, in casu, a data do desligamento do serviço ativo. Confira-se:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. MILITAR. REFORMA. CÔMPUTO EM DOBRO DE FÉRIAS NÃO GOZADAS. PRESCRIÇÃO INEXISTENTE.
1. O Superior Tribunal de Justiça já assentou entendimento, segundo o qual o termo inicial da prescrição do direito de pleitear a indenização referente a férias não gozadas tem início com a impossibilidade de não mais usufruí-las.
2. In casu, passando o autor a ser inativo em 26.10.2003, e a ação ordinária proposta em 17.1.2007, o direito pleiteado permanece intocável pela prescrição.
Agravo regimental improvido.
(AgRg no AREsp 255.215/BA, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2012, DJe 17/12/2012)

 

 

Na hipótese, o ex-militar foi desligado do serviço ativo da Marinha em 17.02.2019, por conclusão de Estágio, conforme Portaria n. 53/2019 do Com8ºDN e licenciado ex officio, por meio da portaria n. 1116/DPMM, de 28.05.2019 (ID  259076508).

A presente ação foi ajuizada em 12.08.2020, ou seja, dentro  do prazo prescricional quinquenal contado da publicação da portaria que o licenciou.

Das férias não gozadas – Licenciamento

Na inicial consta que o autor, então 3º Sargento do Corpo Auxiliar de Praças (3SG CAP QATP), ao ser licenciado ex officio por conclusão de tempo de serviço, não foi indenizado em razão de férias não gozadas referentes ao exercício de 2017, com seu respectivo terço constitucional, razão pela qual sustenta fazer jus ao montante de e R$ 6.936,00 (R$ 5.202,00 das férias + R$ 1.734,00 do terço), mediante expedição de requisição de pequeno valor (RPV).

Alega, também, não ter recebido o valor correto relativo à “compensação pecuniária” que, segundo ele, deveria ser de dez remunerações a título de “compensação pecuniária” e não nove  remunerações como efetivou-se, pois prestou serviços à Marinha por 9 (nove) anos completos + 317 (trezentos e dezessete) dias, que correspondem a uma fração de tempo superior a cento e oitenta dias.

Pleiteou, assim,  a condenação da ré em obrigação de fazer consistente na expedição do respectivo ato administrativo, com o pagamento dos valores pretendidos  e a anulação, do item “c” da Ordem de Serviço nº 191/2019, a qual veiculou o respectivo ajuste de contas.

A UNIÃO, por sua vez, sustenta que nos casos em que o militar não prestou o serviço militar inicial, o tempo passado pelo militar em órgão de formação de Praças da ativa, é considerado como tempo de serviço militar obrigatório e, portanto, não é computado no cálculo da compensação pecuniária, nos termos do “O art. 1º, § 2º, da Lei nº 7.963/1989.

Quanto à indenização por férias não gozadas, a UNIÃO defende que tanto a Lei do Serviço Militar, Lei n. 4.375/64, quanto a Lei n. 5.292/67, não preveem o direito à férias  para aqueles que prestam serviço militar obrigatório e  “na condição de médico voluntário participante de estágio de adaptação e serviço (EAS)”.

O magistrado sentenciante, após destacar a legislação de regência, concluiu que os pagamentos de férias e de compensação pecuniária feito ao autor administrativamente por conta de seu licenciamento apresentam incorreções de acordo, respectivamente, com o Decreto n. 4.307/2002 e com o art.1º da Lei n. 7.963/89. Repisou, também, a vedação do enriquecimento sem causa da Administração Pública causado pela não indenização de afastamentos remunerados e não usufruídos, nos seguintes termos:

 (...) Quanto à compensação pecuniária, o artigo 1° da Lei n. 7.963/1989 garante a compensação pecuniária equivalente a uma remuneração mensal por ano de efetivo serviço militar prestado, tomando-se por base de cálculo o valor da remuneração correspondente ao posto ou à graduação. E para efeito de apuração dos anos de efetivo tempo de serviço, a fração de tempo igual ou superior a 180 dias será considerada um ano.

Nesse ponto, entendo incorreta a decisão administrativa impugnada pelo autor (ID 36843795), já que ele comprova 9 anos e 317 dias de tempo de serviço para o fim de compensação pecuniária (ID 36843778). Inviável a desconsideração do tempo em curso de formação de cabos. A lei manda desconsiderar apenas o período de serviço militar obrigatório. Descabido pretender interpretação extensiva de norma de cunho excepcional. E evidentemente não se confunde o período de serviço militar obrigatório com período em curso de formação. Nesse sentido:

"ADMINISTRATIVO. MILITAR. APRENDIZ DE MARINHEIRO. INCORPORAÇÃO VOLUNTÁRIA APÓS CONCURSO PÚBLICO. LEI Nº 7.963/89. DIREITO À COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA.

O art. 1º da Lei nº 7.963/89 mostra que a compensação pecuniária deve ser concedida quando do licenciamento de militares temporários, com base no tempo de efetivo serviço militar, desligado ex officio. O tempo relativo ao serviço militar obrigatório não é computado, mas, no caso, o ingresso se deu através de concurso público para o curso de formação de marinheiros, e isto por si só é suficiente para evidenciar que a natureza de tal tempo não se confunde com a incorporação para a prestação de serviço militar obrigatório. Apelação desprovida." (grifei).

(TRF2 - AC  00035084820114025117 - Relator: Desembargador Federal Guilherme Couto de Castro - Publicado no Dje de 21/05/2014).

  

Na mesma senda, confira-se o seguinte julgado do TRF1: AC 00363045219994013400.

Medida de rigor, portanto, a consideração do período de 10 anos (9 anos e 317 dias) para fins de pagamento de valores como "compensação pecuniária", conforme artigo 1º, § 1º, da 7.963/1989. 

A respeito das férias, nota-se do assentamento funcional do autor que ele não gozou do descanso referente ao exercício de 2017 e de 2018 (ID 36843788). E quando do desligamento do serviço ativo a ele foram pagos apenas os valores respectivos do exercício de 2018 e de 2019, conforme ajuste de contas detalhado em linhas anteriores.

Leitura dos dispositivos que regem a matéria não impõem qualquer restrição ao pagamento dos períodos de férias adquiridas e não gozadas pelo autor.

Ao contrário. De acordo com o Decreto 4.307/2002, o militar excluído do serviço ativo por licenciamento “perceberá o valor relativo ao período de férias a que tiver direito e ao incompleto, na proporção de um doze avos por mês de efetivo serviço, ou fração superior a quinze dias” (artigo 80, §1°).

O citado dispositivo quando diz “a que tiver direito” não impõe qualquer regra procedimental no sentido de impedir o pagamento da totalidade dos períodos de férias adquiridos e não gozados pelo militar. A União Federal agiu erroneamente ao não efetuar o pagamento do período de férias referente ao exercício de 2017.

E a jurisprudência é assente no sentido de vedar o enriquecimento sem causa da administração pública causado pela não indenização de afastamentos remunerados e não usufruídos. Desnecessário dizer mais a respeito, notadamente diante do Tema 635 do STF, cuja linha de exegese se aplica ao caso. A própria Administração passou a reconhecer a correção do pagamento desses valores.

Portanto, reputo indevida a postura adotada pela União Federal ao promover à época do desligamento apenas o pagamento de férias do exercício imediatamente anterior e do último ainda incompleto. Parte autora faz jus ao pagamento das férias correspondentes ao ano de 2017 e respectivo terço constitucional. (...)

 

Não há elementos a ensejar a reforma da sentença.

Por primeiro, impende destacar que o autor pertenceu ao Quadro de Praças da Marinha do Corpo Auxiliar de Praças, cujo ingresso se dá modo voluntário por meio de concurso público e foi licenciado por conclusão de tempo de serviço e incluído na Reserva Não Remunerada, na categoria de Reservista de Segunda Classe (RM2), tratando-se, portanto, de militar temporário.

Como consabido, o direito às férias é garantido a todo militar, seja de carreira ou temporários, conforme dispõe a Lei n. 6.880/80:

 Art. 3° Os membros das Forças Armadas, em razão de sua destinação constitucional, formam uma categoria especial de servidores da Pátria e são denominados militares.

        § 1° Os militares encontram-se em uma das seguintes situações:

        a) na ativa:

        I - os de carreira;

        II - os temporários, incorporados às Forças Armadas para prestação de serviço militar, obrigatório ou voluntário, durante os prazos previstos na legislação que trata do serviço militar ou durante as prorrogações desses prazos;        (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

        III - os componentes da reserva das Forças Armadas quando convocados, reincluídos, designados ou mobilizados;

        IV - os alunos de órgão de formação de militares da ativa e da reserva; e

        V - em tempo de guerra, todo cidadão brasileiro mobilizado para o serviço ativo nas Forças Armadas.

(...)

  Art. 63. Férias são afastamentos totais do serviço, anual e obrigatoriamente concedidos aos militares para descanso, a partir do último mês do ano a que se referem e durante todo o ano seguinte.

(...)

Art. 80.  O adicional de férias será pago, antecipadamente, no valor correspondente a um terço da remuneração do mês de início das férias.

§ 1o  O militar excluído do serviço ativo, por transferência para a reserva remunerada, reforma, demissão, licenciamento, no retorno à inatividade após a convocação ou na designação para o serviço ativo, perceberá o valor relativo ao período de férias a que tiver direito e ao incompleto, na proporção de um doze avos por mês de efetivo serviço, ou fração superior a quinze dias.

§ 2o  O pagamento do adiantamento de remuneração das férias do militar será efetuado até dois dias antes do respectivo período, desde que o requeira com pelo menos sessenta dias de antecedência.

§ 3o  O militar que opera direta e permanentemente com raios X ou substâncias radioativas e tem direito a férias de vinte dias consecutivos, por semestre de atividade, faz jus ao adicional de férias proporcionalmente ao período de afastamento.

 

Há que se destacar, igualmente, que  o Decreto 4.307/2002, que veio regulamentar a MP 2.215-10/2001, já estabelecia que aos licenciados do serviço ativo seriam devidas férias proporcionais:

(...)Art. 80.  O adicional de férias será pago, antecipadamente, no valor correspondente a um terço da remuneração do mês de início das férias.

§ 1o O militar excluído do serviço ativo, por transferência para a reserva remunerada, reforma, demissão, licenciamento, no retorno à inatividade após a convocação ou na designação para o serviço ativo, perceberá o valor relativo ao período de férias a que tiver direito e ao incompleto, na proporção de um doze avos por mês de efetivo serviço, ou fração superior a quinze dias.

§ 2o O pagamento do adiantamento de remuneração das férias do militar será efetuado até dois dias antes do respectivo período, desde que o requeira com pelo menos sessenta dias de antecedência.

§ 3o O militar que opera direta e permanentemente com raios X ou substâncias radioativas e tem direito a férias de vinte dias consecutivos, por semestre de atividade, faz jus ao adicional de férias proporcionalmente ao período de afastamento.(...)

Na mesma esteira, o artigo 1° da Lei n. 7.963/1989, contemplou os militares temporários com a benesse da compensação pecuniária, excetuando o período correspondente ao serviço militar obrigatório:

(...) Art. 1º O oficial ou a praça, licenciado ex officio por término de prorrogação de tempo de serviço, fará jus à compensação pecuniária equivalente a 1 (uma) remuneração mensal por ano de efetivo serviço militar prestado, tomando-se como base de cálculo o valor da remuneração correspondente ao posto ou à graduação, na data de pagamento da referida compensação.

§ 1º Para efeito de apuração dos anos de efetivo serviço, a fração de tempo igual ou superior a cento e oitenta dias será considerada um ano.

§ 2º O benefício desta Lei não se aplica ao período do serviço militar obrigatório.(...)

 

Na hipótese, observa-se na documentação oriunda da Administração Militar, que quando do licenciamento do autor, o mesmo contava com Tempo Total de Serviço Militar de 09 (nove) anos e 317 (trezentos e dezessete) dias e que ele não gozou férias referentes ao exercício 2017 e exercício 2018 (Ids 259076479 e  259076486).  

Contudo, na Ordem de Serviço n. 191/2019, a qual determinou o pagamento das verbas devidas ao autor, constou o pagamento das férias referentes ao ano de 2018 e as férias proporcionais relativas ao ano de 2019 (na proporção de 5/12 avos), bem como o pagamento de  compensação pecuniária referente ao período de 09 anos e 157 dias.

Logo, verifica-se, de fato, que não foram pagas as férias correspondentes ao ano de 2017, além de ter sido desconsiderada uma parcela do total de dias de tempo de serviço militar (317 -157 = 160 dias) no cálculo da compensação pecuniária devida. Portanto, faz jus o autor ao pagamento das férias correspondentes ao ano de 2017 e respectivo terço constitucional. 

No que toca à compensação pecuniária, conquanto a Lei n. 7.963/89 determine a não aplicação do benefício ao período do serviço militar obrigatório, fato é que a UNIÃO não demonstrou, no caso dos autos,  que o autor encaixava-se em tal regra a justificar a diferença do total de dias computados para pagamento. Ainda que se deduza que as etapas iniciais, geralmente de cursos de formação, após a aprovação em concurso para ingresso nos quadros da Marinha, possam, eventualmente, ser equiparados ao “serviço militar obrigatório”, não houve demonstração nesse sentido.

Aliás, a compensação pecuniária não foi objeto de recurso. A UNIÃO devolveu apenas a matéria referente às férias e apresentou teses distoantes da situação jurídica analisada e dos pedidos formulados na inicial. Destaco alguns:

(...)Apenas em homenagem ao Princípio da Eventualidade, cabe ressaltar que, ainda que se entenda pela procedência do pedido de conversão em pecúnia dos supostos períodos não gozados de férias, a indenização eventualmente devida deve corresponder a 5/12 (cinco doze avos) do valor da última remuneração recebida pelo autor na ativa, tendo em vista que apenas não foram considerados como período aquisitivo de férias os meses de agosto a dezembro de 1988

(...)

Nesse contexto, como o demandante foi transferido para reserva remunerada e desligado desta Força em 9 de março de 2017, fez jus ao pagamento das férias proporcionais relativas ao ano que foi para inatividade (2017), e aos integrais do ano imediatamente anterior (2016). Vale repisar que tais valores foram implantados no bilhete de pagamento do autor no mês de março de 2017 (v. apêndice V), logo não há que se arguir qualquer pagamento a título férias atrasadas, bem como a incidência de juros e correção monetária, conforme consta na exordial.(...)

Deste modo, irreparável a sentença que reconheceu os equívocos no ajuste de contas efetuado quando do licenciamento do autor.

Os valores devem ter como base o valor da última remuneração à época do desligamento do serviço militar, de acordo com a orientação jurisprudencial:

PEDIDOS DE UNIFORMIZAÇÃO DE AMBAS AS PARTES. NO PEDILEF N. 5000793-77.2016.4.04.7101, AFETADO COMO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA, FOI FIRMADA A SEGUINTE TESE: "O PERÍODO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO GERA DIREITO A FÉRIAS REGULAMENTARES AO MILITAR INCORPORADO, UMA VEZ QUE INEXISTE QUALQUER DISTINÇÃO ENTRE AS MODALIDADES DOS SERVIÇOS MILITARES (OBRIGATÓRIO E DE CARREIRA) NO ARTIGO 63, DA LEI Nº 6.880/80, CABENDO A REPARAÇÃO MEDIANTE INDENIZAÇÃO EM PECÚNIA, SEM DIREITO À DOBRA, CORRESPONDENTE À ÚLTIMA REMUNERAÇÃO NA ATIVA, ACRESCIDA DO TERÇO CONSTITUCIONAL, OBEDECIDOS OS DISPOSITIVOS LEGAIS APLICÁVEIS, NOS CASOS EM QUE A PARTE JÁ HOUVER SIDO DESLIGADA DAS FORÇAS ARMADAS". O ACÓRDÃO ENCONTRA-SE NO MESMO SENTIDO DO DECIDIDO PELA TNU. PEDILEF DA UNIÃO NÃO CONHECIDO. QO 13. EM RELAÇÃO AO PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DA PARTE AUTORA, TAMBÉM  NÃO MERECE SER CONHECIDO, UMA VEZ QUE, PARA ANALISAR O CABIMENTO DA INDENIZAÇÃO PELA ALEGADA DEMORA NA CONCESSÃO DA REFORMA MILITAR SERIA NECESSÁRIO O REVOLVIMENTO DAS PROVAS - O QUE É IMPOSSIVEL DE SER FEITO POR ESTA CORTE UNIFORMIZADORA - SÚMULA 42 DA TNU.   


(Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) 5060468-17.2015.4.04.7000, CARMEN ELIZANGELA DIAS MOREIRA DE RESENDE - TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO, 23/11/2018.)

 

Encargos da sucumbência

Os valores atrasados deverão ser acrescidos de juros moratórios, incidentes desde a citação e atualizadas monetariamente da seguinte forma:

a) até a MP n. 2.180-35/2001, que acresceu o art. 1º-F à Lei n. 9.494/97, deve incidir correção monetária, desde os respectivos vencimentos, pela variação dos indexadores previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, e juros de mora à razão de 1% ao mês;

b) a partir da MP n. 2.180-35/2001 e até a edição da Lei n. 11.960/2009 deve incidir correção monetária, desde os respectivos vencimentos, pela variação dos indexadores previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, e juros de mora à razão de 0,5% ao mês;

c) a partir da Lei n. 11.960/2009, cuja vigência teve início em 30/06/2009, os juros moratórios deverão incidir no percentual estabelecido para caderneta de poupança, e quanto à correção monetária deve ser  aplicado, portanto, o índice IPCA-E, previsto no Manual de Orientação de Cálculos da Justiça Federal e que melhor reflete a inflação acumulada no período.

Portanto,  irretorquível a sentença ao determinar a atualização nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, incidindo juros de mora aplicáveis à poupança desde a citação (art. 1º-F da Lei n. 9.494/97).

 

Encargos da sucumbência

Custas ex lege.

Mantida a decisão em grau recursal, impõe-se a majoração dos honorários a serem pagos pela parte vencida por incidência do disposto no §11º do artigo 85 do NCPC.

Assim, acresço 1% ao percentual fixado em primeira instância, totalizando 11% (onze por cento) sobre o valor da condenação.

Dispositivo

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

ADMINISTRATIVO. MILITAR TEMPORÁRIO. MARINHA. FÉRIAS NÃO GOZADAS. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA. LICENCIAMENTO. AJUSTE DE CONTAS. EQUÍVOCOS. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.

1. Apelação da UNIÃO em face da sentença (ID 155817045)  que julgou procedente o pedido de pagamento de férias não gozadas a ex-militar temporário, acrescidas do terço constitucional, e de compensação pecuniária, condenando a apelante ao pagamento de honorários no percentual mínimo legal sobre o valor da condenação.

2. Prescrição quinquenal. Na hipótese, o ex-militar foi desligado do serviço ativo da Marinha em 17.02.2019, por conclusão de tempo de serviço, conforme Portaria n. 53/2019 do Com8ºDN e licenciado ex officio, por meio da portaria n. 1116/DPMM, de 28.05.2019 (ID  259076508). A presente ação foi ajuizada em 12.08.2020, ou seja, dentro  do prazo prescricional quinquenal contado da publicação da portaria que o licenciou.

3. Na inicial consta que o autor, então 3º Sargento do Corpo Auxiliar de Praças (3SG CAP QATP), ao ser licenciado ex officio por conclusão de tempo de serviço, não foi indenizado em razão de férias não gozadas referentes ao exercício de 2017, com seu respectivo terço constitucional, razão pela qual sustenta fazer jus ao montante de e R$ 6.936,00 (R$ 5.202,00 das férias + R$ 1.734,00 do terço), mediante expedição de requisição de pequeno valor (RPV). Alega, também, não ter recebido o valor correto relativo à “compensação pecuniária” que, segundo ele, deveria ser de dez remunerações a título de “compensação pecuniária” e não nove  remunerações como efetivou-se, pois prestou serviços à Marinha por 9 (nove) anos completos + 317 (trezentos e dezessete) dias, que correspondem a uma fração de tempo superior a cento e oitenta dias.

3. O magistrado sentenciante, após destacar a legislação de regência, concluiu que os pagamentos de férias e de compensação pecuniária feito ao autor administrativamente por conta de seu licenciamento apresentam incorreções de acordo, respectivamente, com o Decreto n. 4.307/2002 e com o art.1º da Lei n. 7.963/89. Repisou, também, a vedação do enriquecimento sem causa da Administração Pública causado pela não indenização de afastamentos remunerados e não usufruídos.

4. O autor pertenceu ao Quadro de Praças da Marinha do Corpo Auxiliar de Praças, cujo ingresso se dá modo voluntário por meio de concurso público e foi licenciado por conclusão de tempo de serviço e incluído na Reserva Não Remunerada, na categoria de Reservista de Segunda Classe (RM2), tratando-se, portanto, de militar temporário.

5. Como consabido, o direito às férias é garantido a todo militar, seja de carreira ou temporários, conforme dispõe a Lei n. 6.880/80.

6. Na Ordem de Serviço n. 191/2019, a qual determinou o pagamento das verbas devidas ao autor, constou o pagamento das férias referentes ao ano de 2018 e as férias proporcionais relativas ao ano de 2019 (na proporção de 5/12 avos), bem como o pagamento de  compensação pecuniária referente ao período de 09 anos e 157 dias. Verifica-se, de fato, que não foram pagas as férias correspondentes ao ano de 2017, além de ter sido desconsiderada uma parcela do total de dias de tempo de serviço militar (317 -157 = 160 dias) no cálculo da compensação pecuniária devida.

7. Os valores devem ter como base o valor da última remuneração à época do desligamento do serviço militar, de acordo com a orientação firmada no Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) 5060468-17.2015.4.04.7000.

8. Atualização nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.

9. Apelo não provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.