APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003375-43.2020.4.03.6000
RELATOR: Gab. 03 - JUIZ CONVOCADO RENATO BECHO
APELANTE: VITOR EMANOEL AQUINO DE MENEZES
Advogado do(a) APELANTE: CELSO GONCALVES - MS20050-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003375-43.2020.4.03.6000 RELATOR: Gab. 03 - JUIZ CONVOCADO RENATO BECHO APELANTE: VITOR EMANOEL AQUINO DE MENEZES Advogado do(a) APELANTE: CELSO GONCALVES - MS20050-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Adiro ao entendimento do Exmo. Des. Fed. Hélio Nogueira: Trata-se de Apelação interposta pelo autor, VITOR EMANOEL AQUINO DE MENEZES, militar reformado do Exército, contra sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Federal de Campo Grande que julgou improcedente o pedido de reforma por incapacidade física, com os proventos calculados com base no soldo do posto de 1º Tenente, com fundamento legal no art. 108, V c/c o art. 110, § 1º e § 2º, “a”, da Lei nº 6.880/80, por ser portador de cardiopatia grave, e condenou a parte autora em honorários advocatícios no percentual mínimo previsto no art. 85, I a V, do CPC, sobre o valor da causa corrigido, suspensa a exigibilidade nos termos do art. 98, §3º, do NCPC. Em suas razões recursais (fls. 198 e ss – ID 145088086), a parte autora pretende a reforma da sentença e repisa a inicial, aduzindo que: - o laudo pericial da Dra. Camila da Costa Natera Torres, cardiologista, Aspirante a Oficial Médica, que apontou a possibilidade do recorrente ter que realizar um transplante de coração, e portanto, a invalidez, não foi devidamente valorado pelo magistrado de piso, tornando a relação processual desproporcional, o que indica a necessidade de anulação da sentença e realização de perícia judicial; - patologias cardíacas diagnosticadas são suficientes para que o autor seja reformado com a remuneração calculada com base no soldo do grau hierárquico imediato, por ser portador de doença grave desde 2005, data do diagnóstico das doenças: E10. Diabetes mellitus insulino-dependente; E78. Distúrbios do metabolismo de lipoproteínas e outras lipidemias; I10. Hipertensão essencial (primária); I20. Angina pectoris; I25. Doença isquêmica crônica do coração; I25.5. Miocardiopatia isquêmica; e Z95.5. Presença de implante e enxerto de angioplastia coronária; - os elementos de prova carreado aos atos revelam que o autor é portador de cardiopatia grave, cujo conceito baseia-se nos aspectos de gravidade das cardiopatias, colocados em perspectiva com a capacidade de exercer as funções laborativas e suas relações como prognóstico de longo prazo e a sobrevivência do indivíduo, está inserida no rol das doenças incapacitantes do inciso V do art. 108 da Lei n. 6.880/1980. Apresentadas as contrarrazões (D 258806895), subiram os autos a esta Corte Regional. É o relatório. Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003375-43.2020.4.03.6000 RELATOR: Gab. 03 - JUIZ CONVOCADO RENATO BECHO APELANTE: VITOR EMANOEL AQUINO DE MENEZES Advogado do(a) APELANTE: CELSO GONCALVES - MS20050-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Art. 106. A reforma será aplicada ao militar que: I - atingir as seguintes idades-limite de permanência na reserva: a) para Oficial-General, 68 (sessenta e oito) anos; b) para Oficial Superior, inclusive membros do Magistério Militar, 64 (sessenta e quatro) anos; c) para Capitão-Tenente, Capitão e oficial subalterno, 60 (sessenta) anos; e d) para Praças, 56 (cinqüenta e seis) anos. II - for julgado incapaz, definitivamente, para o serviço ativo das Forças Armadas; III - estiver agregado por mais de 2 (dois) anos por ter sido julgado incapaz, temporariamente, mediante homologação de Junta Superior de Saúde, ainda que se trate de moléstia curável; IV - for condenado à pena de reforma prevista no Código Penal Militar, por sentença transitada em julgado; V - sendo oficial, a tiver determinada em julgado do Superior Tribunal Militar, efetuado em conseqüência de Conselho de Justificação a que foi submetido; e VI - sendo Guarda-Marinha, Aspirante-a-Oficial ou praça com estabilidade assegurada, for para tal indicado, ao Ministro respectivo, em julgamento de Conselho de Disciplina. Parágrafo único. O militar reformado na forma do item V ou VI só poderá readquirir a situação militar anterior: a) no caso do item V, por outra sentença do Superior Tribunal Militar e nas condições nela estabelecidas; e b) no caso do item VI, por decisão do Ministro respectivo. Parágrafo único. O militar reformado na forma do item V ou VI só poderá readquirir a situação militar anterior: a) no caso do item V, por outra sentença do Superior Tribunal Militar e nas condições nela estabelecidas; e b) no caso do item VI, por decisão do Ministro respectivo. Art. 107. Anualmente, no mês de fevereiro, o órgão competente da Marinha, do Exército e da Aeronáutica organizará a relação dos militares, inclusive membros do Magistério Militar, que houverem atingido a idade-limite de permanência na reserva, a fim de serem reformados. Parágrafo único. A situação de inatividade do militar da reserva remunerada, quando reformado por limite de idade, não sofre solução de continuidade, exceto quanto às condições de mobilização. Art. 108. A incapacidade definitiva pode sobrevir em conseqüência de: I - ferimento recebido em campanha ou na manutenção da ordem pública; II - enfermidade contraída em campanha ou na manutenção da ordem pública, ou enfermidade cuja causa eficiente decorra de uma dessas situações; III - acidente em serviço; IV - doença, moléstia ou enfermidade adquirida em tempo de paz, com relação de causa e efeito a condições inerentes ao serviço; V - tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, lepra, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, mal de Parkinson, pênfigo, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave e outras moléstias que a lei indicar com base nas conclusões da medicina especializada; e (Redação dada pela Lei nº 12.670, de 2012) VI - acidente ou doença, moléstia ou enfermidade, sem relação de causa e efeito com o serviço. § 1º Os casos de que tratam os itens I, II, III e IV serão provados por atestado de origem, inquérito sanitário de origem ou ficha de evacuação, sendo os termos do acidente, baixa ao hospital, papeleta de tratamento nas enfermarias e hospitais, e os registros de baixa utilizados como meios subsidiários para esclarecer a situação. § 2º Os militares julgados incapazes por um dos motivos constantes do item V deste artigo somente poderão ser reformados após a homologação, por Junta Superior de Saúde, da inspeção de saúde que concluiu pela incapacidade definitiva, obedecida à regulamentação específica de cada Força Singular. Art. 109. O militar da ativa julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes dos itens I, II, III, IV e V do artigo anterior será reformado com qualquer tempo de serviço. Art. 110. O militar da ativa ou da reserva remunerada, julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes dos incisos I e II do art. 108, será reformado com a remuneração calculada com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediato ao que possuir ou que possuía na ativa, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 7.580, de 1986) § 1º Aplica-se o disposto neste artigo aos casos previstos nos itens III, IV e V do artigo 108, quando, verificada a incapacidade definitiva, for o militar considerado inválido, isto é, impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho. Art. 111. O militar da ativa julgado incapaz definitivamente por um dos motivos constantes do item VI do artigo 108 será reformado: I - com remuneração proporcional ao tempo de serviço, se oficial ou praça com estabilidade assegurada; e II - com remuneração calculada com base no soldo integral do posto ou graduação, desde que, com qualquer tempo de serviço, seja considerado inválido, isto é, impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho.
Adiro ao entendimento do Exmo. Des. Fed. Hélio Nogueira:
Tempestivo e próprio o apelo, dele conheço e o recebo em seus regulares efeitos.
Consta da inicial que o autor, militar do Exército Brasileiro, foi incorporado ao serviço ativo em 04.02.1985 e transferido, a pedido, para a Reserva Remunerada, a contar de 01.10.2013, conforme a Portaria nº. 494-DCIPAS.12, de 24.09.2013 e Ficha Controle nº 1803. Refere que ao ser inspecionado para fins de “reforma de militar da reserva”, obteve o seguinte parecer da Junta de Recurso da 9º Região Militar: "Incapaz definitivamente para o serviço do Exército. Não é inválido" - “A incapacidade está enquadrada no inciso VI do Art. 108 da Lei nº 6.880, de 09 Dez 1980. Não é portador de doença especificada na Lei nº 7.713/1988, alterada pelas Leis nº 8.541/1992, 9.250/1995 e 11.052/2004”.
Alega o autor, porém, que se encontra inválido em decorrência de cardiopatia grave, diagnosticada por médicos militares desde de 2005. Refere que a cardiologista do Exército, Dra. CAMILA DA COSTA NATERA TORRES, quando da perícia médica solicitada pela Administração Militar, atestou em 12.09.2019, que é portador de insuficiência coronariana isquêmica, com sintomas reportados desde 2005, o que lhe permite apenas a realização de mínimas tarefas diárias com prognóstico incerto e reservado, condição que revela invalidez e enseja a reforma com fundamento no inciso V do art. 108 c/c a letra “a” do § 2º e § 1º do art. 110, ambos da Lei nº 6.880/80, a contar de 2005.
O magistrado indeferiu o pedido ao fundamento da não comprovação da invalidez de acordo com a prova técnica produzida no âmbito da Administração Militar e os demais documentos colacionados pelas partes. Destacou que o autor, após a transferência para a reserva remunerada, foi nomeado, no ano de 2018, para exercer Assessoria Técnica Administrativa na Área de Pessoal, o que esvazia a tese da defesa acerca da invalidez total desde 2005. Pertinente a transcrição do excerto da sentença:
(...) Ocorre que, conforme consta em ficha de registro de dados de inspeção anexada nos autos em (id. 32227792,p.23 e 24), fica demonstrado que o Autor não se desincumbiu do ônus de provar ser definitivamente inválido para todo e qualquer trabalho.
Como demonstrado no referido documento, o Autor apenas é incapaz para atividades ligadas ao serviço militar, o que não significa dizer invalidade para todo e qualquer trabalho, fato que ficou comprovado com os demais documentos anexados conjuntamente com os autos, documentos estes que foram produzidos no âmbito administrativo e gozam por regra do benefício da presunção de veracidade e legalidade.
Em consonância com esse entendimento, reitero mais uma vez, que embora o Autor tenha sido transferido para a reserva remunerada no ano de 2013, foi nomeado em 05.02.2018 para exercer Assessoria Técnica Administrativa na Área de Pessoal (ID 35662783), reforçando a tese de que a cardiopatia da qual é portador desde o ano de 2005 não o incapacitou para todas as atividades.
Sendo assim, acrescento que apesar do Autor não se enquadrar nas hipóteses previstas para concessão do benefício do art. 110, §1 da Lei nº 6.880/1980, faz jus ao que é disposto pelo art. 106, II, da Lei nº 6.880/1980: (...)
Por primeiro, destaco que não subsiste a nulidade da sentença em razão da ausência de perícia médica judicial por violação ao contraditório e ampla defesa, alegada pelo apelante em razões recursais.
Note-se que o autor, na inicial, fundamentou seu pedido no parecer técnico da cardiologista do Exército (Dra. CAMILA DA COSTA NATERA TORRES, Cardiologista, CRM/MS nº 9885, Aspirante a Oficial Médica do Hospital Militar de Área de Campo Grande (H Mil A CG) e destacou a desnecessidade de realização de perícia judicial em razão do diagnóstico realizado no âmbito da Administração Pública por especialista na patologia. Transcrevo o excerto:
(...) Excelência a documentação carreada aos autos, comprova cabalmente que o Autor é portador de cardiopatia grave, na letra f) do Anexo G a Dra. CAMILA DA COSTA NATERA TORRES, Cardiologista, CRM/MS nº 9885 referese até a possibilidade de o Autor realizar um transplante de coração. Na letra m) a referida médica atesta que a gravidade da doença do Autor, só lhe permite a realização de tarefas mínimas, sendo portador de deficiência funcional grau 3. Nesse sentido, por se tratar de atos da Administração Pública Direta, dotados de presunção relativa de legitimidade e veracidade, bem como por se tratar de matéria de direito, desnecessário a realização de perícia médica judicial, conforme entendimento jurisprudencial, já que a doença foi diagnosticada por profissionais do serviço público e privado, experts nas patologias.(...)
Além disso, intimado para especificar provas o autor quedou-se inerte.
Deste modo, a alegação de que “esperava que o magistrado baseado nas provas carreadas aos autos e em seus pedidos nomeasse perito judicial para que esse pudesse com toda a isenção valorar as provas produzidas” é no mínimo contraditória.
No mais, considerando os fatos relatados, os seguintes dispositivos do Estatuto dos Militares - Lei 6.880/1980 (na redação anterior à Lei n. 13.954/19, posto que a transferência para inatividade ocorreu em 2013 e a inspeção para reforma em 08.2019) - são relevantes para o deslinde da controvérsia:
Da análise dos dispositivos infere-se que:
a) se o acidente ou moléstia tiver relação com o serviço a reforma é devida ao militar estável e incapacitado para a atividade castrense, com proventos integrais, se caso, também, constada a incapacidade definitiva para a vida civil, invalidez social, os proventos serão calculados com base no grau hierárquico imediato;
b) a denominada “melhoria de reforma” consiste no pagamento de proventos relativos ao grau hierárquico imediatamente superior ao militar reformado por incapacidade e que teve agravamento da sua doença, acarretando-lhe invalidez, ou ao militar da reserva, inválido;
c) a melhoria de reforma não é devida àquele já contemplado, quando da passagem para inatividade, com a percepção dos proventos correspondentes ao grau hierárquico imediato.
d) nos casos das doenças incapacitantes descritas no artigo 108, inciso V, a reforma é devida independentemente do tempo de serviço, com proventos integrais e, caso constatada a invalidez, com proventos correspondentes ao grau hierárquico imediato.
Deste modo, cabe aferir na hipótese se quando da passagem para a inatividade o autor encontra-se inválido ou portador de doença incapacitante (art. 108, V, da Lei n. 6.880/80), ou quando já na reserva remunerada, passou a situação de invalidez.
Dos documentos coligidos, verifica-se que:
- 24.09.2013 - transferência a pedido para a reserva remunerada ocorreu por meio da Portaria - DCIPAS n. 494 (Id s 258806823/4);
- 02.02.2018: o autor, atuando como Prestador de Tarefa por Tempo Certo é exonerado, a contar de 31.02.2018, e nomeado para exercer a tarefa de “Assessoria Técnica Administrativa na Área de Pessoal”, pelo prazo de 24 meses a contar de 01.02.2018;
-12.08.2019 – Perícia Médica realizada em âmbito de recurso administrativo pela Dra. Camila da Costa Natera Torres, Cardiologista, CRM/MS nº 9885, Aspirante a Oficial Médica do Hospital Militar de Área de Campo Grande (H Mil A CG), onde consta:
- diagnóstico: insuficiência coronariana isquêmica (CID I.20), dislipidemia (CID E.78), diabetes melitius CID I.48), retinopatia diabética;
- ausência de necessidade de cuidados de cuidadores e enfermagem;
- data de início imprecisa, com sintomas desde 2005 – angina;
- tratamento adequado: reabilitação cardíaca diária e , se refratário, avaliação de indicação de transplante a depender da evolução;
- piora da angina e arterosclerose;
- sem resposta adequada para recuperação – “em piora”;
- tarefas compatíveis: mínimas tarefas diárias – classe funcional 3;
- prognóstico incerto e reservado, devido a alto risco cardiovascular;
- 26.09.2019 - Inspeção de saúde para fins de reforma de militar da reserva: Diagnóstico: “E10. Diabetes mellitus-dependente. E78. Distúrbios do metabolismo de lipoproteínas e outras lipidemias. I10. Hipertensão essencial (primária) (ETIOLÓGICO) / NÃO É CARDIOPATIA GRAVE). I20. Angina pectoris (FUNCIONAL / NÃO É CARDIOPATIA GRAVE). I25.5. Miocardiopatia isquêmica (ANATÔMICO / NÃO É CARDIOPATIA GRAVE). Z95.5. Presença de implante e enxerto de angioplastia coronária). CID-10”. – Parecer: “Incapaz definitivamente para o serviço do Exército. Não é inválido(a)”. Ob.: Não é portador de doença especificada na Lei n. 7.713/1988, alterada pelas Leis n. 8.541/92 e 11.052/2004. A incapacidade está enquadrada no inciso VI do art. 108 da Lei n. 6.880, de 09.12.1980.
De acordo com Portaria Normativa nº 1174 do Ministério da Defesa, de 06 de setembro de 2006:
“CAPÍTULO III - DOENÇAS ESPECIFICADAS EM LEISeção 2 - Cardiopatia Grave
4. Conceituação
4.1. Para o entendimento de cardiopatia grave torna-se necessário englobar no conceito todas as doenças relacionadas ao coração, tanto crônicas, como agudas.
4.2. São consideradas cardiopatias graves: a) as cardiopatias agudas que, habitualmente rápidas em sua evolução, tornarem-se crônicas, caracterizando uma cardiopatia grave, ou as que evoluírem para o óbito, situação que, desde logo, deve ser considerada como cardiopatia grave, com todas as injunções legais; e b) as cardiopatias crônicas, quando limitarem, progressivamente, a capacidade física, funcional do coração (ultrapassando os limites de eficiência dos mecanismos de compensação) e profissional, não obstante o tratamento clínico e/ou cirúrgico adequado, ou quando induzirem à morte prematura.
4.3. A limitação da capacidade física, funcional e profissional é definida, habitualmente, pela presença de uma ou mais das seguintes síndromes: a) insuficiência cardíaca; b) insuficiência coronariana; c) arritmias complexas; d) hipoxemia; e e) manifestações de baixo débito cerebral, secundárias a uma cardiopatia.
4.4. A avaliação da capacidade funcional do coração permite a distribuição dos indivíduos em classes ou graus assim descritos:
a) Classe/Grau I: indivíduos portadores de doença cardíaca sem limitação da atividade física. A atividade física normal não provoca sintomas de fadiga acentuada, nem palpitações, nem dispnéias, nem angina de peito; b) Classe/Grau II: indivíduos portadores de doença cardíaca com leve limitação da atividade física. Esses indivíduos sentem-se bem em repouso, porém os grandes esforços provocam fadiga, dispnéia, palpitações ou angina de peito; c) Classe/Grau III: indivíduos portadores de doença cardíaca com nítida limitação da atividade física. Esses indivíduos sentem-se bem em repouso, embora acusem fadiga, dispnéia, palpitações ou angina de peito quando efetuam pequenos esforços; e d) Classe/Grau IV: indivíduos portadores de doença cardíaca que os impossibilita de qualquer atividadefísica. Esses indivíduos, mesmo em repouso, apresentam dispnéia, palpitações, fadiga ou angina de peito.
4.4.1. Os meios de diagnóstico a serem empregados na avaliação da capacidade funcional do coração, cientificamente, são os seguintes: a) história clínica, com dados evolutivos da doença; b) exame clínico; c) eletrocardiograma, em repouso; d) eletrocardiografia dinâmica (Holter); e) teste ergométrico; f) ecocardiograma, em repouso; g) ecocardiograma associado a esforço ou procedimentos farmacológicos; h) estudo radiológico do tórax, objetivando o coração, vasos e campos pulmonares, usando um mínimo de duas incidências; i) cintilografia miocárdica, associada a teste ergométrico (Tálio, MIBI, Tecnécio); j) cintilografia miocárdica associada a Dipiridamol e outros fármacos; e l) cinecoronarioventriculografia.
4.4.2. Nos inspecionandos portadores de doenças cardíacas não identificáveis com os meios de diagnóstico citados no item 4.4.1 destas Normas deverão ser utilizados outros exames e métodos complementares que a medicina especializada venha a exigir.
4.5. Os achados fortuitos em exames complementares especializados não são, por si só, suficientes para o enquadramento legal de cardiopatia grave se não estiverem vinculados aos elementos clínicos e laboratoriais que caracterizem uma doença cardíaca incapacitante.
4.6. O quadro clínico, bem como os recursos complementares, com os sinais e sintomas que permitem estabelecer o diagnóstico de cardiopatia grave estão relacionados para as seguintes cardiopatias: a) cardiopatia isquêmica; b) cardiopatia hipertensiva; c) miocardiopatia; d) arritmia cardíaca; e) "cor pulmonale" crônico; f) cardiopatia congênita; e g) valvopatia.4.6.1. Em algumas condições, um determinado item pode, isoladamente, configurar cardiopatia grave (por exemplo, fração de ejeção < 0,35); porém, na grande maioria dos casos, a princípio é necessária uma avaliação conjunta dos diversos dados do exame clínico e dos achados complementares, para melhor conceituá-la.(...)(g.n)
De acordo com as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia ( Id 258806808): “Considera-se um servidor (ativo ou inativo) como portador de Cardiopatia Grave, quando existir uma doença cardíaca que acarrete o total e definitivo impedimento das condições laborativas, existindo, implicitamente, uma expectativa de vida reduzida ou diminuída, baseando-se o avaliador na documentação e no diagnóstico da cardiopatia.”
Deste modo, em resumo, de acordo com as provas coligidas e os normativos de regência, o autor é portador de doença cardíaca crônica, angina pectoris CID I.20, causada por esquemia (insuficiência de etiologia isquêmica), de classe/grau III (indivíduos portadores de doença cardíaca com nítida limitação da atividade física. Esses indivíduos sentem-se bem em repouso, embora acusem fadiga, dispnéia, palpitações ou angina de peito quando efetuam pequenos esforços), cujo tratamento indicado é a reabilitação cardíaca e caso, seja refrátaria, a depender da evolução, poderia levar a necessidade de transplante.
Ainda segundo os elementos constantes nos autos, o autor pode realizar tarefas diárias mínimas, mas não necessita de cuidadores ou enfermeiros.
Infere-se, ainda, que o autor submete-se a tratamento para angina há anos, inclusive com a realização de angioplastia, e que mesmo assim, houve uma piora do seu estado de saúde ano a ano. O prognóstico, segundo a perita militar é “incerto e reservado, devido ao alto risco cardiovascular”.
Neste contexto, tenho que o quadro atual do autor, revelado a partir de 2019 com atestado do médico particular Henrique Horta, e confirmado pela perita militar, em 08.2019, de acordo com as normas de regência, enquadra-se no conceito de cardiopatia grave em razão do impedimento das condições laborativas, da progressiva piora, mesmo com as intervenções coronárias, sem possibilidade de recuperação e, por conseguinte, da implícita e provável redução da expectativa de vida.
De outro turno, embora o autor seja, de modo inconteste, incapaz definitivamente para atividade militar, a perita militar afastou a necessidade de assistência de enfermeiros e cuidadores e consignou que o mesmo é capaz para as atividades mínimas do dia a dia, o que revela a inaptidão para o exercício de qualquer atividade laboral, mas não o direito ao auxílio-invalidez, nos termos da Lei n. 11.421/06.
Também é certo, ao contrário do afirmado na inicial, que embora o autor já tivesse apresentado sintomas de angina em 2005, o mesmo permaneceu ativo profissionalmente até 2018/2019, o que afasta a alegação de que a incapacidade total já estivesse instalada àquela época. Note-se que a doença do autor é crônica e somente veio a caracterizar o quadro clínico da cardiopatia grave em 2019.
Logo entendo que a situação a situação fático-jurídica enquadra-se, no art. 108, V, c.c art. 110, §1º, da Lei n. 6.880/80, doença incapacitante, com invalidez social (inaptidão para o exercício de qualquer atividade laboral), a contar do laudo médico que atestou pela primeira vez esta condição, qual seja, o laudo do médico formulado pelo Dr. Henrique Horta, de 22.07.2019 (ID 258806800), ratificado, pela perícia realizada no âmbito militar pela Dra. Camila Torres, em 12.08.2019.
Assim, sendo merece parcial reforma a sentença no sentido de que o autor seja reformado com base no soldo do posto de grau hierárquico imediato, com fundamento legal no art. 108, V c/c o art. 110, § 1º da Lei nº 6.880/80, a contar de 22.07.2019.
Por conseguinte, reconhecida a cardiopatia grave, faz jus o autor a isenção do imposto de renda, nos moldes do art.6º, XIV, da Lei n. 7.713/88, a contar de 22.07.2019.
Encargos da sucumbência
Custas ex lege.
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência este regramento.
Considerando a sucumbência recíproca das partes, cumpre a redistribuição dos honorários de sucumbência.
Assim, em atenção ao disposto no artigo 85, § 6º, do CPC/2015, bem como aos critérios estipulados nos incisos I a IV do § 2º do mesmo dispositivo legal, e aos princípios da causalidade e proporcionalidade, entendo adequado o arbitramento da verba honorária advocatícia nos seguintes patamares:
a) condeno a parte autora ao pagamento de verba honorária que ora fixo em 10% sobre o valor da causa, observada a gratuidade da justiça;
b) condeno a parte ré ao pagamento de verba honorária que ora fixo em 10% sobre o valor da condenação, a ser apurado na fase da liquidação.
Deixo de aplicar a regra do art. 85, §11, do CPC, pois não preenchidos os requisitos cumulativos.
Dispositivo
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso, no sentido de que a reforma do autor se dê com base no soldo do posto de grau hierárquico imediato, com fundamento legal no art. 108, V c/c o art. 110, § 1º da Lei nº 6.880/80, a contar de 22.07.2019, assim como para reconhecer o direito à isenção do imposto de renda, nos moldes do art.6º, XIV, da Lei n. 7.713/88, a contar do mesmo termo.
É o voto
E M E N T A
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. MILITAR REFORMADO. REFORMA COM PROVENTOS CORRESPONDENTES AO SOLDO EM GRAU HIERÁRQUICO IMEDIATO. CARDIOPATIA GRAVE. DOENÇA INCAPACITANTE. RECURSO PROVIDO EM PARTE.
1. Apelação interposta pelo autor, militar reformado do Exército, contra sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Federal de Campo Grande que julgou improcedente o pedido de reforma por incapacidade física, com os proventos calculados com base no soldo do posto de 1º Tenente, com fundamento legal no art. 108, V c/c o art. 110, § 1º e § 2º, “a”, da Lei nº 6.880/80, por ser portador de cardiopatia grave, e condenou a parte autora em honorários advocatícios no percentual mínimo previsto no art. 85, I a V, do CPC, sobre o valor da causa corrigido, suspensa a exigibilidade nos termos do art. 98, §3º, do NCPC.
2. Não subsiste a nulidade da sentença em razão da ausência de perícia médica judicial por violação ao contraditório e ampla defesa, alegada pelo apelante em razões recursais. Note-se que o autor, na inicial, fundamentou seu pedido no parecer técnico da cardiologista do Exército e destacou a desnecessidade de realização de perícia judicial em razão do diagnóstico realizado no âmbito da Administração Pública por especialista na patologia. Além disso, intimado para especificar provas o autor quedou-se inerte.
3. A denominada “melhoria de reforma” consiste no pagamento de proventos relativos ao grau hierárquico imediatamente superior ao militar reformado por incapacidade, nos termos dos incisos I e II do art. 108 da Lei 6.880/80, e que teve agravamento da sua doença, acarretando-lhe invalidez; ou ao militar da ativa ou da reserva que seja considerado inválido. Nos casos das doenças incapacitantes descritas no artigo 108, inciso V, a reforma é devida independentemente do tempo de serviço, com proventos integrais e, caso constatada a invalidez, com proventos correspondentes ao grau hierárquico imediato.
4. De acordo com Portaria Normativa nº 1174 do Ministério da Defesa, de 06 de setembro de 2006: (...)4.2. São consideradas cardiopatias graves(...) b) as cardiopatias crônicas, quando limitarem, progressivamente, a capacidade física, funcional do coração (ultrapassando os limites de eficiência dos mecanismos de compensação) e profissional, não obstante o tratamento clínico e/ou cirúrgico adequado, ou quando induzirem à morte prematura(...) c) Classe/Grau III: indivíduos portadores de doença cardíaca com nítida limitação da atividade física. Esses indivíduos sentem-se bem em repouso, embora acusem fadiga, dispnéia, palpitações ou angina de peito quando efetuam pequenos esforços; (...)
5. De acordo com as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia ( Id 258806808): “Considera-se um servidor (ativo ou inativo) como portador de Cardiopatia Grave, quando existir uma doença cardíaca que acarrete o total e definitivo impedimento das condições laborativas, existindo, implicitamente, uma expectativa de vida reduzida ou diminuída, baseando-se o avaliador na documentação e no diagnóstico da cardiopatia.”
6. Deste modo, em resumo, de acordo com as provas coligidas e os normativos de regência, o autor é portador de doença cardíaca crônica, angina pectoris CID I.20, causada por esquemia (insuficiência de etiologia isquêmica), de classe/grau III (indivíduos portadores de doença cardíaca com nítida limitação da atividade física. Esses indivíduos sentem-se bem em repouso, embora acusem fadiga, dispnéia, palpitações ou angina de peito quando efetuam pequenos esforços), cujo tratamento indicado é a reabilitação cardíaca e caso, seja refrátaria, a depender da evolução, poderia levar a necessidade de transplante. Infere-se, ainda, que o autor submete-se a tratamento para angina há anos, inclusive com a realização de angioplastia, e que mesmo assim, houve uma piora do seu estado de saúde ano a ano. O prognóstico, segundo a perita militar é “incerto e reservado, devido ao alto risco cardiovascular”.
7. Neste contexto, tenho que o quadro atual do autor, revelado a partir de 2019 com atestado do médico particular Henrique Horta, e confirmado pela perita militar, em 08.2019, de acordo com as normas de regência, enquadra-se no conceito de cardiopatia grave em razão do impedimento das condições laborativas, da progressiva piora, mesmo com as intervenções coronárias, sem possibilidade de recuperação e, por conseguinte, da implícita e provável redução da expectativa de vida.
8. De outro turno, embora o autor seja, de modo inconteste, incapaz definitivamente para atividade militar, a perita militar afastou a necessidade de assistência de enfermeiros e cuidadores e consignou que o mesmo é capaz para as atividades mínimas do dia a dia, o que revela a inaptidão para o exercício de qualquer atividade laboral, mas não o direito ao auxílio-invalidez, nos termos da Lei n. 11.421/06.
9.Também é certo, ao contrário do afirmado na inicial, que embora o autor já tivesse apresentado sintomas de angina em 2005, o mesmo permaneceu ativo profissionalmente até 2018/2019, o que afasta a alegação de que a incapacidade total já estivesse instalada àquela época. Note-se que a doença do autor é crônica e somente veio a caracterizar o quadro clínico da cardiopatia grave em 2019.
10. Logo entendo que a situação a situação fático-jurídica enquadra-se, no art. 108, V, c.c art. 110, §1º, da Lei n. 6.880/80, doença incapacitante, com invalidez social (inaptidão para o exercício de qualquer atividade laboral), a contar do laudo médico que atestou pela primeira vez esta condição, qual seja, o laudo do médico formulado pelo Dr. Henrique Horta, de 22.07.2019 (ID 258806800), ratificado, pela perícia realizada no âmbito militar pela Dra. Camila Torres, em 12.08.2019. Por conseguinte, reconhecida a cardiopatia grave, faz jus o autor a isenção do imposto de renda, nos moldes do art.6º, XIV, da Lei n. 7.713/88, a contar de 22.07.2019.
11. Sentença reformada em parte. Honorários redistribuídos.
12. Recurso provido em parte, no sentido de que a reforma do autor se dê com base no soldo do posto de grau hierárquico imediato, com fundamento legal no art. 108, V c/c o art. 110, § 1º da Lei nº 6.880/80, a contar de 22.07.2019, assim como para reconhecer o direito à isenção do imposto de renda, nos moldes do art.6º, XIV, da Lei n. 7.713/88, a contar do mesmo termo.