Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001074-31.2018.4.03.6118

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: MARIA AUXILIADORA DE MELO MARQUES, UNIÃO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: MARIZA SALGUEIRO - SP268993-N

APELADO: UNIÃO FEDERAL, MARIA AUXILIADORA DE MELO MARQUES, CELIA MATTOS DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: MARIZA SALGUEIRO - SP268993-N
Advogado do(a) APELADO: LUIS ROGERIO COSTA PRADO VALLE - SP259860-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001074-31.2018.4.03.6118

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: MARIA AUXILIADORA DE MELO MARQUES, UNIAO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: MARIZA SALGUEIRO - SP268993-N

APELADO: UNIAO FEDERAL, MARIA AUXILIADORA DE MELO MARQUES, CELIA MATTOS DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: MARIZA SALGUEIRO - SP268993-N
Advogado do(a) APELADO: LUIS ROGERIO COSTA PRADO VALLE - SP259860-N

OUTROS PARTICIPANTES:

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de apelações da autora MARIA AUXILIADORA DE MELO e da União em autos de ação ordinária objetivando a concessão do benefício pensão por morte à autora, a contar do óbito, sendo os valores devidos corrigidos monetariamente e com incidência de juros. A sentença julgou o pedido julgo improcedente por não reconhecer a existência de união estável entre a autora e o “de cujus”.

A autora apelou, sustentando, em suma, alegações apresentadas na exordial, principalmente em relação à documentação hábeis a comprovar a união estável, a exemplo: a escritura da união estável, a coabitação, a dependência econômica e os depoimentos pessoais, a comprovar a existência dos requisitos para a concessão da pensão militar por morte, fazendo jus ao benefício na condição de companheira.

Apelou a União, em resumo, que a concessão da justiça gratuita à parte vencida não afasta sua obrigação de pagamento dos honorários advocatícios, com a ressalva de que a satisfação estará condicionada à existência de patrimônio e enquanto não sobrevier a prescrição regulada pelo §3º do art. 98 do CPC. Portanto, não é o caso de isenção de responsabilidade, e sim, de problema a ser dirimido em sede de cumprimento de sentença.

Com contrarrazões das partes.

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001074-31.2018.4.03.6118

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: MARIA AUXILIADORA DE MELO MARQUES, UNIAO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: MARIZA SALGUEIRO - SP268993-N

APELADO: UNIAO FEDERAL, MARIA AUXILIADORA DE MELO MARQUES, CELIA MATTOS DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: MARIZA SALGUEIRO - SP268993-N
Advogado do(a) APELADO: LUIS ROGERIO COSTA PRADO VALLE - SP259860-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

 

Cinge-se a controvérsia na possibilidade de concomitância de famílias simultâneas, com efeitos jurídicos na percepção do benefício por morte de militar que tenha participado de duas entidades familiares distintas, com o reconhecimento da união estável para fins de percepção da pensão militar por morte à companheira.

Cumpre esclarecer que os requisitos e limitações legais acerca das pensões dos servidores militares regem-se pela legislação em vigor na data do óbito do instituidor do benefício, por força do princípio tempus regit actum" (STF, 1ª Turma, ARE 773.690, Rel. Min. ROSA WEBER, DJE 18.12.2014; STJ, 5ª Turma, AgRg no REsp 1.179.897, Rel. Min. JORGE MUSSI, DJE 18.11.2014).

In casu, o instituidor do benefício faleceu em 16/12/2012 (ID 6536202 - Pág. 25), sendo assim, deve-se observar a lei vigente à época do óbito do instituidor do benefício, momento em que os requisitos legais para a obtenção do direito à benesse deverão estar preenchidos.

Destarte, na ocasião do óbito do ex-militar se encontrava vigente a Lei 3.765/60 com as alterações da MP 2.215-10/2001 e acerca do direito à pensão militar e seus beneficiários o artigo 7º e incisos da Lei nº 3.765/60, estabelecia a seguinte ordem para o deferimento do benefício:

“Art. 7o A pensão militar é deferida em processo de habilitação, tomando-se por base a declaração de beneficiários preenchida em vida pelo contribuinte, na ordem de prioridade e condições a seguir: (Redação dada pela Medida provisória nº 2.215-10, de 31.8.2001)

a) cônjuge;

b) companheiro ou companheira designada ou que comprove união estável como entidade familiar;

c) pessoa desquitada, separada judicialmente, divorciada do instituidor ou a ex-convivente, desde que percebam pensão alimentícia

d) filhos ou enteados até vinte e um anos de idade ou até vinte e quatro anos de idade, se estudantes universitários ou, se inválidos, enquanto durar a invalidez; e

e) menor sob guarda ou tutela até vinte e um anos de idade ou, se estudante universitário, até vinte e quatro anos de idade ou, se inválido, enquanto durar a invalidez. (...)”

Da leitura do dispositivo acima, para obtenção do benefício de pensão por morte, faz-se necessária a comprovação do óbito; a qualidade de segurado do instituidor da pensão, bem como a condição de dependente do beneficiário.

A concomitância de duas ou mais entidades familiares das quais participava o instituidor, não deve, por si só, ser impedimento ao reconhecimento da união estável e, por conseguinte, dos direitos previdenciários dela oriundos. Isto porque, a tutela jurisdicional deve se adequar à realidade familiar contemporânea, a fim de alcançar a diversidade dos modelos familiares, mesmo que tenha que se atribuir interpretação extensiva às normas pertinentes.

Conforme a lição de Maria Berenice Dias, na obra Manual dos direitos das famílias, “negar a existência de famílias simultâneas – quer um casamento e uma união estável, quer duas ou mais uniões estáveis – é simplesmente tentar fazê-las desaparecer. ” Afirma a autora que “uniões que persistem por toda uma existência, muitas vezes com extensa prole e reconhecimento social, são simplesmente expulsas da tutela jurídica” e “o homem que foi infiel, desleal a duas mulheres, é ‘absolvido’. Nada lhe é imposto. Permanece com a titularidade patrimonial, além de desonerado da obrigação de sustento para com quem lhe dedicou a vida”. (Cf. Dias, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 12 ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2017. p. 296 e 298)

Em que pese o relutante entendimento jurisprudencial em sentido contrário (REsp 544.803/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA; REsp 544.803/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA; REsp 1104316/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA), cada vez mais os Tribunais Federais têm aceitado o reconhecimento jurídico de entidades familiares diversas do modelo centralizado no casamento, com a possibilidade de simultaneidade de entidades familiares, especialmente para efeitos previdenciários.

Nesse sentido, as Turmas Colegiadas que compõem os Tribunais Regionais Pátrios, têm entendido nos seguintes moldes:

“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÕES ESTÁVEIS CONCOMITANTES. DUAS COMPANHEIRAS. PROVA MATERIAL CUMULADA COM PROVA ORAL. RECONHECIMENTO. POSSIBILIDADE. RATEIO. PRECEDENTES. 1. Cinge-se a controvérsia ao reconhecimento da união estável entre a autora e o de cujus, supostamente vivenciada de forma simultânea com outra união estável, já reconhecida administrativamente pelo INSS. 2. A Constituição de 1988 reconhece "a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar", qual prescreve o parágrafo 3º do art. 226 e, ainda, nos termos da lei, assegura a percepção de pensão à(o) companheira (o), conforme dispõe o art. 201, V, com a redação da EC nº 20/98. A Lei nº 9.278/96, por sua vez, arrola entre os direitos dos conviventes em entidade familiar a recíproca assistência moral e material (art. 2º, II), inclusive após a dissolução da união entre os amásios (art. 7º). 3. Comprovado, através de prova material cumulada com prova testemunhal, que o de cujus manteve, concomitantemente, duas uniões estáveis, até a data de seu óbito, há de ser rateada a pensão por morte previdenciária entre as companheiras. 4. É possível o reconhecimento da coexistência de duas uniões estáveis, entre um mesmo homem e duas (ou mais) mulheres. Inexiste ofensa ao texto constitucional. Precedentes. 5. Havendo sucumbência recíproca, devida a compensação dos honorários advocatícios. 6. Os critérios de pagamento de juros moratórios e de correção monetária devem observar o Manual de Cálculos da Justiça Federal, na sua versão em vigor ao tempo da execução. 7. Apelação e recurso adesivo providos, para determinar a compensação dos honorários advocatícios em face da sucumbência recíproca. Remessa oficial parcialmente provida para que o cálculo dos juros e da atualização monetária observe as disposições supra.

(TRF-1 - AC: 00108693620094013300 0010869-36.2009.4.01.3300, Relator: JUIZ FEDERAL ANTONIO OSWALDO SCARPA, Data de Julgamento: 30/11/2015, 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DA BAHIA, Data de Publicação: 20/01/2016 e-DJF1 P. 2191). ”

 

“CONSTITUICIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO POR MORTE. ART. 217, I, LEI 8.112/90. COMPANHEIRAS SIMULTÂNEAS. UNIÕES ESTÁVEIS COMPROVADAS. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA DE AMBAS. RATEIO EM IGUALDADE DE CONDIÇÕES. POSSIBILIDADE. PARCELAS DEVIDAS. TERMO A QUO. ÓBITO DO INSTITUIDOR. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Em se tratando de sentença ilíquida proferida em desfavor de pessoa jurídica de direito público, é necessário o reexame necessário, nos termos do art. 475, inciso I, do CPC de 1973 (art. 496, I, NCPC). 2. Cuida-se de decisão proferida na regência do CPC de 1973, sob o qual também foi manifestado o recurso, e conforme o princípio do isolamento dos atos processuais e o da irretroatividade da lei, as decisões já proferidas não são alcançadas pela lei nova, de sorte que não se lhes aplicam as regras do CPC atual, inclusive as concernentes à fixação dos honorários advocatícios, que se regem pela lei anterior. 3. Na relação de trato sucessivo, prescrevem tão somente as parcelas anteriores ao quinquênio que antecede o ajuizamento da ação. 4. Nos termos do art. 217 da Lei n. 8.112/90, são beneficiários de pensões o cônjuge (inciso I), o cônjuge divorciado ou separado judicialmente ou de fato, com percepção de pensão alimentícia estabelecida judicialmente (inciso II), bem como o companheiro ou companheira que comprove união estável como entidade familiar. 5. A percepção de pensão por morte de companheiro está subordinada à demonstração da condição de dependente de segurado e à comprovação da união estável, assim reconhecida a convivência duradoura, pública e continuada, nos termos do art. 226, § 3º, da CF/88. 6. Na hipótese dos autos, restou comprovado o óbito (certidão de óbito, ocorrido em 15/02/2010) e a condição de segurado do falecido servidor. O cerne do litígio diz respeito tão somente à alegada união estável entre a autora e ele e, ainda, entre a litisconsorte e ele, ou seja, duas uniões estáveis simultâneas. 7. A jurisprudência já firmou entendimento no sentido de que a ausência de designação da companheira(o) como beneficiária(o) do(a) falecido(a) não impede, por si só, o reconhecimento do direito à pensão por morte, ante a possibilidade de comprovação da união estável por outros meios de prova. Precedentes deste Tribunal. 8. No caso, há comprovação de que tanto a autora quanto a litisconsorte conviveram em união estável com o falecido, não só pelos diversos comprovantes de mesmo endereço, como também pelos demais comprovantes bancários, contas de energia, água e telefone e, ainda, relatórios médicos constando ambas como companheiras e acompanhantes do falecido - documentos que constituem início de prova material. 9. Nos termos do art. 1.723 do Código Civil, é reconhecida como entidade familiar a união estável entre duas pessoas, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. 10. Presente início razoável de prova material da convivência more uxorio tanto da autora, quanto da litisconsorte com o falecido, devidamente corroborada pela prova testemunhal produzida, clara e segura, há que se reconhecer comprovada a união estável simultânea. Uniões estáveis concomitantes. Possibilidade. Precedente. 11. Ante a comprovação de requisito legal (comprovação de dependência econômica direta e exclusiva), correta a sentença que deferiu o benefício de pensão por morte deixado pelo falecido. O benefício será devido apenas a partir da data do óbito do instituidor, no percentual de 50% para cada uma delas, tendo em vista a existência de requerimento administrativo (autora - DER em 19/02/2010 e litisconsorte - DER em 04/03/2010) 12. Correção monetária e juros moratórios, conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal, observada quanto aos juros a Lei n. 11.960, de 2009, a partir da sua vigência. 13. Honorários advocatícios devidos pela ré, de 10% da condenação. 14. Apelação da FUNASA, remessa oficial e recurso adesivo da autora desprovidos, nos termos do voto. A Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação da FUNASA, à remessa oficial e ao recurso adesivo da parte autora.

(TRF-1 - AC: 00278301820104013300 0027830-18.2010.4.01.3300, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, Data de Julgamento: 13/09/2017, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: 04/10/2017 e-DJF1). ”

 

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. COMPANHEIRA. PENSÃO MILITAR. VERIFICADA A UNIÃO ESTÁVEL. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DE DUAS COMPANHEIRAS CONCOMITANTES. AS PARCELAS EM ATRASO DEVEM SER ARCADAS PELA ADMINISTRAÇÃO. APELOS IMPROVIDOS. 1. O argumento de que não se cuidaria de união estável, mas sim de concubinato impuro, tendo em vista que o falecido militar era casado, e mantinha concomitantemente um relacionamento extraconjugal com a Autora, não merece prosperar, visto que este Tribunal tem decidido em favor da divisão da pensão entre a companheira e a esposa, além de não fazer distinção entre companheirismo e concubinato, em se tratando de pensão. 2. Constam dos autos provas suficientes de que verdadeiramente existiu convivência marital entre a autora e o de cujus, não tendo sucedido apenas mero romance efêmero. 3. A Lei nº 9.278/1996, que regulamentou o § 3º, do art. 226 da Constituição Federal, define no seu art. , a união estável como a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com o objetivo de constituição de família, e não estipulou o tempo mínimo para tal mister. 4. O reconhecimento de duas uniões estáveis concomitantes não é possível no âmbito do Direito de Família, contudo, no caso concreto, trata-se de situação peculiar, onde ambas as companheiras foram exitosas em demonstrar a convivência marital. 5. Desde o requerimento administrativo formulado pela autora, a Administração Pública já era ciente de tal pretensão, não havendo que se falar em desconhecimento. Por outro lado, a então única beneficiária da pensão recebia tais valores de boa-fé não sendo plausível impor a esta o pagamento de quantias que, desde o requerimento administrativo, já poderiam ter sido pagas de forma rateada. 6. Apelos improvidos.

(TRF-5 - AC: 432123 RN 0004762-64.2004.4.05.8400, Relator: Desembargador Federal Francisco Cavalcanti, Data de Julgamento: 11/09/2008, Primeira Turma, Data de Publicação: Fonte: Diário da Justiça - Data: 17/10/2008 - Página: 247 - Nº: 202 - Ano: 2008). ”

Da legislação de regência, se conclui que, para fins de concessão de pensão militar por morte, deve ser demonstrada a existência da união estável entre o instituidor do benefício e a companheira, caracterizada pela convivência duradoura, pública e contínua entre ambos, estabelecida com o objetivo de constituição de uma entidade familiar, o que vem definido no art. 1º, da Lei nº 9.278/96, que regulamentou o § 3º, do artigo 226, da Constituição Federal.

À luz do recente entendimento jurisprudencial e doutrinário sobre o tema, de reconhecer que no mundo fático é possível a constituição de duas ou mais entidades familiares, em concomitância, em torno do mesmo instituidor. Ao julgador cabe aplicar à esta dinâmica realidade os efeitos jurídicos, de acordo com a finalidade da norma, que é a proteção à família.

Entender de modo diverso, seria contradizer a jurisprudência pacificada pelo próprio STJ nos casos de concorrência entre ex-esposa (divórcio anterior) e a companheira do instituidor, o qual consagra não haver preferência entre elas, conforme o aresto abaixo:

“ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MILITAR. PENSÃO. COMPANHEIRA. DESIGNAÇÃO PRÉVIA. DESNECESSIDADE. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. RATEIO COM EX-CÔNJUGE. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. ART 1º DA LEI 8.917194. SEPARAÇÃO DE FATO. COMPROVAÇÃO. MATÉRIA FATICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 71 STJ RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO.

1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento firmado no sentido de que 50% da pensão por morte de militar é devida aos filhos e a outra metade deve ser dividida entre a ex-esposa e a companheira, não havendo falar em ordem de preferência entre elas.

2. Nos casos em que estiver devidamente comprovada a união estável. a ausência de designação prévia de companheira como beneficiária não constitui óbice à concessão de pensão vitalícia. Precedentes.

3. Reconhecida a separação de fato do militar e sua ex-esposa com base no contexto probatório carreado aos autos, é vedada, em sede de recurso especial, a reforma do julgado, nos termos da Súmula 7/STJ

4. Recurso especial conhecido e improvido.

(STJ, REsp 544803/RJ, 5ª Turma, Ministro Arnaldo Esteve Lima, DJ 18.12.2006 p. 464)”

Portanto, nos casos de simultaneidade de famílias, o mesmo entendimento deve ser aplicado por analogia, em observância à proteção família de fato, consagrada na própria Constituição Federal. Nesse sentido:

“MILITAR – PENSÃO – COMPANHEIRA

1. A família de fato tem hoje sua existência consagrada na própria Constituição Federal e produz efeitos jurídicos bem definidos pela jurisprudência, que já consagrou a decisão salomônica da pensão entre a esposa e a companheira quando a concubina tem direito próprio a opor ao da mulher. No presente caso, trata-se de duas companheiras cada qual com direito próprio e reunindo os pressupostos legais para fazer jus à pensão, pois viviam ambas sob a dependência econômica do “de cujus” em uniões estáveis. O direito surgiu para encontrar soluções razoáveis para os absurdos da vida e não solução acadêmica. Assim, nada há a reformar na sentença impugnada.

2. Remessa necessária improvida. (REO nº 92.02.20041-6/RJ, TRF2, 1ª Turma, Rel. Juiz CASTRO AGUIAR, DJ 13/10/94, p. 58103)”

 

Neste espeque, do exame dos documentos acostados, tem-se a Escritura Pública de União Estável lavrada no Tabelião de Notas e de Pindamonhangaba -SP (ID 6536202 - Pág. 20/segs.), onde consta “ que as partes acima qualificadas, por esta escritura de livre e espontânea vontade, sem coação ou induzimento de quem quer que seja, vem declarar como de fato ora declaram para quaisquer fins de direito e a quem possa interessar, que vivem maritalmente desde 15 de fevereiro de 1999, como se casados fossem, de uma forma pública, contínua, duradoura e com o objetivo de constituição de família. II - Declaram que não possuem nenhum dos impedimentos constantes do Artigo n? 1.521 do Código Civil. III - Que obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos, comprometendo-se ambos, durante a convivência, a uma dedicação mútua e esforço em comum no sentido de atingir a harmonia necessária ao bem-estar, que o aconchego do lar lhes poderá oferecer. IV - Que ainda não possuem filhos dessa união. V - Quanto ao Regime de Bens, estipulam o da COMUNHÃO PARCIAL DE BENS (...)” – grifos originais.

Também foi acostado aos autos, comprovantes de pagamento de Contas de Luz (agosto/2008 e janeiro/2012 em nome do falecido José Manuel dos Santos (ID 6536202 - Pág. 47) no mesmo endereço da autora (ID 6536202 - Pág. 40), localizado na Rua Ameixeira, 86, Pindamonhangaba-SP, portanto, tais documentos são aptos a comprovar a coabitação e dependência econômica.

Do conjunto probatório produzido nos autos, a união estável foi certificada através de escritura pública, documento dotado de fé pública, que oficializou a união estável e definiu as regras aplicáveis à relação, declarando que mantinham a união estável desde 1999, ou seja, por mais de 13 (treze) anos e o regime de comunhão parcial e bens. A Declaração de união estável é apta como prova da relação entre os companheiros, pois se trata de declaração oficializada, lavrada por notário oficial e tem a finalidade de dar publicidade aos termos nela contidos perante terceiros, inclusive com efeitos erga omnes. Tem o condão de evitar qualquer alegação negatória da existência da união estável em eventuais disputas entre os companheiros ou em demandas envolvendo terceiros.

No mesmo sentido, vejamos:

“ADMINISTRATIVO. PENSÃO POR MORTE. EX-COMBATENTE. UNIÃO ESTÁVEL. COMPANHEIRA. EXISTÊNCIA DE ESCRITURA. FÉ PÚBLICA. CARACTERIZAÇÃO. A união estável, por não exigir a lei forma especial, pode ser perfeitamente provada por meio de documento (Código Civil, art. 212, II), que, tratando-se de escritura lavrada em notas, possui fé pública e faz prova plena (Código Civil, art. 215) dos fatos ocorridos na presença do tabelião (Código de Processo Civil, art. 364). Assim, em favor da união estável afirmada em escritura pública, milita presunção legal de existência capaz de dispensar o autor da produção de outras provas (Código de Processo Civil, art. 334, IV). Nesse passo, se é certo que tal presunção é relativa, ou seja, admite prova em contrário, cabe ao réu produzi-la, nos termos do disposto no art. 333, II, do Código de Processo Civil, o que não o fez.

(TRF4, APELREEX 5006796-35.2013.4.04.7204, TERCEIRA TURMA, Relatora SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, juntado aos autos em 28/11/2014)”

Sob este prisma, o argumento firmado na sentença primeva, que pretendeu afastar a possibilidade de pluralidade familiar, concomitante e simultânea, constituída pelo mesmo militar falecido não merece prosperar. Sendo cabível a concessão de pensão por morte à companheira de militar, eis que o conjunto probatório contido nos autos demonstra satisfatoriamente a convivência pública, contínua e duradoura desde 1999 até a data do óbito do instituidor, estabelecida com o objetivo de constituição de família.

Por conseguinte, a companheira faz jus à percepção de pensão, nos termos do art. 9º, § 1º, da Lei nº. 3.765/60, vez que sua coexistência com a viúva, por si só, não permite a exclusão do direito, e, ainda que existam dependentes habilitados, de se observar a igualdade de participação no rateio da pensão, de acordo com a devida da cota-parte de cada beneficiário.

Quanto ao termo inicial do benefício, a pensão militar, embora possa ser requerida a qualquer tempo, terá seu pagamento retroativo à data em que a Administração reunia condições de efetivamente identificar seus beneficiários. Inteligência do art. 28 da Lei 3.765/60 c/c art. 71, parágrafo 3º, da Lei 6.880/80. (RESP 201001073904, ARNALDO ESTEVES LIMA, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:23/10/2013).

Considerando-se que a Administração Militar somente foi demandada pela autora quando ela requereu sua habilitação, correta a fixação da data do requerimento administrativo como termo inicial do benefício (07/03/2012 -ID 6536202 - Pág. 61/segs.), data em que a Administração reunia condições de identificar os beneficiários, evitando, assim, o pagamento em duplicidade da pensão militar.

Assim sendo, a sentença recorrida merece reforma, uma vez que a parte autora, quando do falecimento do militar, ostentava a condição de companheira e, como tal, comprovou a dependência econômica, a convivência duradoura, pública e contínua e a intenção de constituição de uma entidade familiar, requisitos necessários à obtenção do benefício pleiteado na inicial, na proporção de sua cota-parte.

Diante da inversão da sucumbência, reformo os honorários advocatícios, a fim de que sejam fixados em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com fundamento no art. 85, §8º, do CPC/2015.

Ante o exposto, nego provimento à apelação da União e dou provimento à apelação para julgar procedente o pedido e reconhecer o direito da autora à percepção da cota-parte devida da pensão militar por morte, ante o reconhecimento da união estável, nos termos da presente fundamentação.

É como o voto.


Declaração de Voto 

 

Cinge-se a controvérsia à possibilidade de concomitância de famílias simultâneas, com efeitos jurídicos na percepção do benefício por morte de militar que tenha participado de duas entidades familiares distintas, com o reconhecimento da união estável para fins de percepção da pensão militar por morte à companheira.

O e. Relator negou provimento ao recurso de apelação da União e deu provimento ao recurso de apelação da parte autora, para julgar procedente o pedido e reconhecer o direito da parte autora à percepção da cota-parte devida da pensão militar por morte, ante o reconhecimento da união estável.

Discordo, com a devida vênia, em parte da solução atribuída ao caso pela Douta Relatoria, no tocante ao reconhecimento do direito da parte autora à percepção da cota-parte devida da pensão militar por morte, pelos motivos abaixo expostos.

A requerente alega ser companheira do segurado falecido e que faz jus à pensão por morte.

Consta dos autos que a alegada união estável do falecido com a autora está documentada por Escritura Pública de União Estável lavrada no Tabelião de Notas e de Pindamonhangaba -SP (ID 6536202 - Pág. 20/segs.), desde 15/02/1999.

O pedido administrativo formulado pela autora foi indeferido sob o fundamento de falta de amparo legal, uma vez que o ex-militar era casado. Consoante a certidão de óbito de fl. 20, o Sr. José Manuel dos Santos faleceu em 16/02/2012 e era casado com Célia Mattos dos Santos com quem tinha duas filhas maiores de idade.

Em seu depoimento pessoal, a própria autora informou que, quando conheceu José Manuel dos Santos, em 1999, sabia que era casado. Sustenta, todavia, que posteriormente o ex-militar foi residir consigo e que manteve auxiliando financeiramente a corré Célia Mattos dos Santos.

De acordo com os documentos de fls. 41 e 132, relativos às contas de energia elétrica datadas do ano de 2012, consta o nome de José Manuel dos Santos em dois endereços: Rua Ameixeira, n. 86, no município de Pindamonhangaba e na R. Silvio de Almeida, n. 27, no município de Aparecida/ SP, o que sugere dupla residência.

Tais elementos de prova, indicados na sentença recorrida, demonstram que o segurado falecido era casado com Celia e vivia um relacionamento com Maria Auxiliadora.

A controvérsia, portanto, cinge-se à possibilidade de a relação extraconjugal mantida na constância do casamento, fato incontroverso nos autos, conferir direito ao recebimento de pensão por morte à companheira sobrevivente.

Sobre a questão, definiu o E. STF no Tema n° 526 da repercussão geral, em 03/08/2021: "É incompatível com a Constituição Federal o reconhecimento de direitos previdenciários (pensão por morte) à pessoa que manteve, durante longo período e com aparência familiar, união com outra casada, porquanto o concubinato não se equipara, para fins de proteção estatal, às uniões afetivas resultantes do casamento e da união estável".

Neste sentido, outrossim, entendimentos desta E. Corte:

PENSÃO POR MORTE. ART. 74 DA LEI N.º 8.213/91. TUTELA DEFERIDA, PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO. CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL. TEMAS 526 e 529 DO STF, SUBMETIDOS À SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. - A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual "a apelação terá efeito suspensivo", é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo inciso V expressamente determina que, "além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou revoga tutela provisória". - Conforme preceitua o tema 526 do STF, é incompatível com a Constituição Federal o reconhecimento de direitos previdenciários (pensão por morte) à pessoa que manteve, durante longo período e com aparência familiar, união com outra casada, porquanto o concubinato não se equipara, para fins de proteção estatal, às uniões afetivas resultantes do casamento e da união estável. - A teor do Tema 529 do STF, a preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, ressalvada a exceção do artigo 1.723, § 1º, do Código Civil. - O segurado falecido era separado de fato, restando possível reconhecer a união estável. - Reconhecimento da procedência do pedido. - Apelação não provida.

(ApCiv 5180055-74.2021.4.03.9999; TRF3 - 8ª Turma, DJEN DATA: 12/09/2022)

 

DEVOLUÇÃO DE DEMANDA (EMBARGOS INFRINGENTES) PELA E. VICE-PRESIDÊNCIA DESTA CORTE (ART. 1.040, INC. II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015) PARA EVENTUAL JUÍZO DE RETRATAÇÃO. JULGAMENTO DO RE 883.160/SC PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (TEMA 526).

- No julgamento pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal do RE 883168 /SC, Tema 526 - Possibilidade de concubinato de longa duração gerar efeitos previdenciários -, restou fixada a seguinte tese: “É incompatível com a Constituição Federal o reconhecimento de direitos previdenciários (pensão por morte) à pessoa que manteve, durante longo período e com aparência familiar, união com outra casada, porquanto o concubinato não se equipara, para fins de proteção estatal, às uniões afetivas resultantes do casamento e da união estável.”

- Reconhecido que a indigitada tese se ajusta ao caso dos autos, em que a parte autora manteve relação de afeto com o “de cujus”, mesmo ele estando na vigência de casamento.

- Juízo de retratação positivo. Conhecidos parcialmente os embargos infringentes. Recurso a que se nega provimento.

(PetCiv – SP 0005878-47.2006.4.03.6119, 3ª Seção, Rel. David Dantas, v.u. 31/07/2022, DJEN DATA: 03/08/2022).

 

De rigor, portanto, a manutenção da improcedência do pedido.

Ante o exposto,  pelo meu voto, nego provimento ao recurso de apelação da União e, com a devida vênia do e. Relator,  nego provimento ao recurso da parte autora.

É COMO VOTO.


E M E N T A

 

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PENSÃO MILITAR. COMPANHEIRA. CONCOMITÂNCIA. CASAMENTO. UNIÃO ESTÁVEL. COMPROVAÇÃO. CABIMENTO. RATEIO ENTRE VIÚVA E COMPANHEIRA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. APELAÇÃO DA UNIÃO NÃO PROVIDA. APELAÇÃO DA AUTORA PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.

1. Cinge-se a controvérsia na possibilidade de concomitância de famílias simultâneas, com efeitos jurídicos na percepção do benefício por morte de militar que tenha participado de duas entidades familiares distintas, com o reconhecimento da união estável para fins de percepção da pensão militar à companheira.

2. Os requisitos e limitações legais acerca das pensões dos servidores militares regem-se pela legislação em vigor na data do óbito do instituidor do benefício, por força do princípio tempus regit actum" (STF, 1ª Turma, ARE 773.690, Rel. Min. ROSA WEBER, DJE 18.12.2014; STJ, 5ª Turma, AgRg no REsp 1.179.897, Rel. Min. JORGE MUSSI, DJE 18.11.2014).

3. O instituidor do benefício faleceu em 16/12/2012 (ID 6536202 - Pág. 25), sendo assim, deve-se observar a lei vigente à época do óbito do instituidor do benefício, momento em que os requisitos legais para a obtenção do direito à benesse deverão estar preenchidos.

4. Na ocasião do óbito do ex-militar se encontrava vigente a Lei 3.765/60 com as alterações da MP 2.215-10/2001 e acerca do direito à pensão militar e seus beneficiários o artigo 7º e incisos da Lei nº 3.765/60, da leitura do dispositivo, para obtenção do benefício de pensão por morte, faz-se necessária a comprovação do óbito; a qualidade de segurado do instituidor da pensão, bem como a condição de dependente do beneficiário.

5. A concomitância de duas ou mais entidades familiares das quais participava o instituidor, não deve, por si só, ser impedimento ao reconhecimento da união estável e, por conseguinte, dos direitos previdenciários dela oriundos. Isto porque, a tutela jurisdicional deve se adequar à realidade familiar contemporânea, a fim de alcançar a diversidade dos modelos familiares, mesmo que tenha que se atribuir interpretação extensiva à Constituição Federal.

6. Conforme a lição de Maria Berenice Dias, na obra Manual dos direitos das famílias, “negar a existência de famílias simultâneas – quer um casamento e uma união estável, quer duas ou mais uniões estáveis – é simplesmente tentar fazê-las desaparecer. ” Afirma a autora que “uniões que persistem por toda uma existência, muitas vezes com extensa prole e reconhecimento social, são simplesmente expulsas da tutela jurídica” e “o homem que foi infiel, desleal a duas mulheres, é ‘absolvido’. Nada lhe é imposto. Permanece com a titularidade patrimonial, além de desonerado da obrigação de sustento para com quem lhe dedicou a vida”. (Cf. Dias, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 12 ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2017. p. 296 e 298)

7. Em que pese o relutante entendimento jurisprudencial em sentido contrário (REsp 544.803/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA; REsp 544.803/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA; REsp 1104316/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA), cada vez mais os Tribunais Federais têm aceitado o reconhecimento jurídico de entidades familiares diversas do modelo centralizado no casamento, com a possibilidade de simultaneidade de entidades familiares, especialmente para efeitos previdenciários. Precedentes.

8. Através da legislação que rege a matéria, se conclui que, para fins de concessão de pensão militar por morte à companheira, deve ser demonstrada a existência da união estável entre o instituidor do benefício e a companheira, caracterizada pela convivência duradoura, pública e contínua entre ambos, estabelecida com o objetivo de constituição de uma entidade familiar, o que vem definido no art. 1º, da Lei nº 9.278/96, que regulamentou o § 3º, do artigo 226, da Constituição Federal.

9. À luz do recente entendimento jurisprudencial e doutrinário sobre o tema, de reconhecer que no mundo fático é possível a constituição de duas ou mais entidades familiares, em concomitância, em torno do mesmo instituidor. Ao julgador cabe aplicar à esta dinâmica realidade os efeitos jurídicos, de acordo com a finalidade da norma, que é a proteção à família.

10. Entender de modo diverso, seria contradizer o entendimento pacificado pelo próprio STJ nos casos de concorrência entre ex-esposa (de divórcio anterior) e a companheira do instituidor, o qual se afirma não haver preferência entre elas. Portanto, nos casos de simultaneidade de famílias, o mesmo entendimento deve ser aplicado por analogia, em observância à proteção família de fato, consagrada na própria Constituição Federal.

11. Do exame dos documentos acostados, tem-se a Escritura Pública de União Estável lavrada no Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Pindamonhangaba -SP (ID  6536202 - Pág. 20/segs.), onde consta “ que as partes acima qualificadas, por esta escritura de livre e espontânea vontade, sem coação ou induzimento de quem quer que seja, vem declarar como de fato ora declaram para quaisquer fins de direito e a quem possa interessar, que vivem maritalmente desde 15 de fevereiro de 1999, como se casados fossem, de uma forma pública, contínua, duradoura e com o objetivo de constituição de família. II - Declaram que não possuem nenhum dos impedimentos constantes do Artigo n? 1.521 do Código Civil. III - Que obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos, comprometendo-se ambos, durante a convivência, a uma dedicação mútua e esforço em comum no sentido de atingir a harmonia necessária ao bem-estar, que o aconchego do lar lhes poderá oferecer. IV - Que ainda não possuem filhos dessa união. V - Quanto ao Regime de Bens, estipulam o da COMUNHÃO PARCIAL DE BENS (...)” – grifos originais.

12. Foi acostado aos autos, comprovante de Conta de Luz (agosto/2008 e janeiro/2012 em nome do falecido José Manuel dos Santos (ID 6536202 - Pág. 47) no mesmo endereço da autora (ID 6536202 - Pág. 40), localizado na Rua Ameixeira, 86, Pindamonhangaba-SP, portanto, tais documentos são aptos a comprovar a coabitação e dependência econômica.

13. Do conjunto probatório produzido nos autos, a união estável foi certificada através de escritura pública, documento dotado de fé pública, que oficializou a união estável e definiu as regras aplicáveis à relação, declarando que mantinham a união estável desde 1999, ou seja, por mais de 13 (treze) anos. A Declaração de união estável é apta como prova da relação entre os companheiros, pois se trata de declaração oficializada, lavrada por notário oficial e tem a finalidade de dar publicidade aos termos nela contidos perante terceiros, inclusive com efeitos erga omnes. Tem o condão de evitar qualquer alegação negatória da existência da união estável em eventuais disputas entre os companheiros ou em demandas envolvendo terceiros.

14. Não merece acolhimento, portanto, o argumento firmado na sentença primeva, que pretendeu afastar a possibilidade de pluralidade familiar, concomitante e simultânea, constituída pelo servidor para efeito de pensão militar por morte.

15. Cabível a concessão de pensão por morte à companheira de militar, eis que o conjunto probatório contido nos autos demonstra satisfatoriamente a convivência pública, contínua e duradoura entre eles até a data do óbito do instituidor, estabelecida com o objetivo de constituição de família.

16. A companheira faz jus à percepção de pensão, nos termos do art. 9º, § 1º, da Lei nº. 3.765/60, vez que sua existência e da viúva, por si só não permite a exclusão e ainda que existam dependentes habilitados, de se observar a igualdade de participação no rateio da pensão, com a ressalva da devida da cota-parte de cada beneficiário.

17. O termo inicial do benefício, a pensão militar, embora possa ser requerida a qualquer tempo, terá seu pagamento retroativo à data em que a Administração reunia condições de efetivamente identificar seus beneficiários. Inteligência do art. 28 da Lei 3.765/60 c/c art. 71, parágrafo 3º, da Lei 6.880/80. (RESP 201001073904, ARNALDO ESTEVES LIMA, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:23/10/2013).

18. Considerando-se que a Administração Militar somente foi demandada pela autora quando ela requereu sua habilitação, correta a fixação da data do requerimento administrativo como termo inicial do benefício (07/03/2012 -ID 6536202 - Pág. 61/segs.), data em que a Administração reunia condições de identificar os beneficiários, evitando, assim, o pagamento em duplicidade da pensão militar.

19. A sentença recorrida merece reforma, uma vez que a parte autora, quando do falecimento do militar, ostentava a condição de companheira e, como tal, comprovou a dependência econômica, a convivência duradoura, pública e contínua e a intenção de constituição de uma entidade familiar, necessários à obtenção do benefício pleiteado na inicial.

20. Honorários advocatícios, fixados em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em favor da parte autora, com fundamento no art. 85, §8º, do CPC/2015.

21. Apelação da União não provida. Apelação da autora provida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, nos termos do artigo 942 do Código de Processo Civil, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação da União e, por maioria, deu provimento à apelação da parte autora para julgar procedente o pedido e reconhecer o direito da autora à percepção da cota-parte devida da pensão militar por morte, ante o reconhecimento da união estável, nos termos do voto do senhor Desembargador Federal Wilson Zauhy, Relator, acompanhado pelo voto do senhor Desembargador Federal Valdeci dos Santos e pelo senhor Juiz Federal Convocado Alessandro Diaferia; vencida, nesta parte, a senhora Juíza Federal Convocada Mônica Bonavina, que lhe negava provimento, acompanhada pela senhora Juíza Federal Convocada Audrey Gasparini, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.