Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015411-30.2019.4.03.6105

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: JANIO CARLOS FRANCISCO

Advogado do(a) APELANTE: JOAQUIM PAULO LIMA SILVA - SP155004-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015411-30.2019.4.03.6105

RELATOR: Gab. 03 - JUIZ CONVOCADO RENATO BECHO

APELANTE: JANIO CARLOS FRANCISCO

Advogado do(a) APELANTE: JOAQUIM PAULO LIMA SILVA - SP155004-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de Apelação interposta por JÂNIO CARLOS FRANCISCO contra sentença que julgou improcedente o pedido de reconhecimento de nulidade do procedimento administrativo disciplinar n. 0000037-89.2018.5.15.0895, que lhe impôs a pena de demissão, bem como o pedido de sua consequente reintegração no cargo de Técnico Judiciário do TRT da 15ª Região, com o pagamento de todos os vencimentos retroativos, condenada a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, suspensa a exigibilidade por conta da gratuidade deferida.

 

Em suas razões recursais, o autor requer o total provimento do pedido inicial, alegando, em síntese:

a) o procedimento administrativo disciplinar contrariou os artigos 26 e 28 da Lei n. 9.784/99, estando eivado de vício formal quando da intimação do servidor acerca da instauração do pad, em afronta aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, pugnando pela nulidade do processo e respectiva pena de demissão aplicada;

b) questiona a legalidade do afastamento preventivo e da prorrogação, fundado no art. 147 caput e parágrafo único da Lei n. 8.112/90, uma vez que o procedimento investigatório foi instaurado na forma física na sede do Tribunal, na cidade de Campinas, distante 270 quilômetros da lotação do servidor (Jaboticabal);

c) inadequação do tipo legal descrito no ato demissório, uma vez que o fundamento legal para a demissão - improbidade administrativa (inciso IV do art. 132 da Lei n. 8.112/90) - só poderia ser efetivada quando o servidor estivesse no exercício da função pública, o que não ocorreu no caso, uma vez que o autor estava incurso em ações penais de caráter privado, legisladas pelo Código Penal, destacando nesse sentido a fundamentação contida na decisão proferida no mandado de segurança n. 5012403-79.2018.403.6105, que teria suspendido a aplicação dos efeitos da pena aplicada;

d) questiona a atuação do administrador, que exercitou uma atribuição que a lei não lhe confere, qual seja, assistente de acusação do Ministério Público, em latente desvio de finalidade, emitindo ainda juízo de valor sobre a conduta do acusado, demonstrando total ausência de imparcialidade e desrespeito;

e) suscita o total descaso da Administração para com o autor, ocorrido no dia 29.10.2019, que deixou que comparecesse ao local de lotação e trabalhasse normalmente no período da manhã, bloqueando o acesso ao sistema após as 13 horas, ocasião em que o autor foi informado por seu chefe imediato que recebera um e-mail com cópia do ATO de demissão e do Diário Oficial que publicou o referido ato, em desrespeito o disposto nos artigos 26 e 28 da Lei n. 9784/99, não sendo o autor formalmente intimado, mas tomando ciência de sua demissão por terceiros;

f) sustenta a omissão da decisão sobre o regramento legal previsto (Lei n. 8112/90 e Código Penal), quanto a eventual cometimento de crimes de ordem privada, alegando que as decisões administrativa e judicial impingindo ao autor uma pena de demissão, com fundamento em regra legal incabível, uma vez que a pena de improbidade aplicada está diretamente relacionada com o exercício da função pública e não atos da vida privada;

g) finaliza que o Processo Administrativo está em afronta aos princípios constitucionais do devido processo legal, da presunção de inocência, da razoabilidade, da proporcionalidade, da dignidade da pessoa humana, desrespeito a dispositivos legais (artigos 2º, 3º, 26 e 28, Lei n. 8.429/92), desvio de finalidade, usurpação de competência e aos 23 anos de conduta profissional irretocável do servidor.

 

Com as contrarrazões da União, subiram os autos a este E. Tribunal Regional.

Dispensada a revisão, nos termos regimentais.

É o relatório.

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015411-30.2019.4.03.6105

RELATOR: Gab. 03 - JUIZ CONVOCADO RENATO BECHO

APELANTE: JANIO CARLOS FRANCISCO

Advogado do(a) APELANTE: JOAQUIM PAULO LIMA SILVA - SP155004-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Adiro ao entendimento do Exmo. Des. Fed. Hélio Nogueira:

 

 

 

Da admissibilidade da apelação

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e passo à análise.

 

Da regularidade do processo administrativo disciplinar

 

A garantia do devido processo legal, com respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa constitui preceito constitucional (art. 5º, LV, CF), de observância obrigatória tanto nos processos judiciais quanto nos administrativos.

Referido ditame constitucional tem previsão legal específica para o processo administrativo disciplinar nos arts. 143 e 153, caput, Lei 8.112/90.

Apela a parte autora sustentado a nulidade do procedimento administrativo por inobservância dos artigos 26 e 28 da Lei n. 9.784/99 e art. 147 caput e parágrafo único da Lei 8.112/90.

 

Da análise da legalidade do ato administrativo

 

Consolidou-se na jurisprudência pátria o entendimento de que o controle jurisdicional sobre o processo administrativo disciplinar limita-se à verificação da regularidade do procedimento e da legalidade do ato administrativo, sendo defeso ao Poder Judiciário adentrar no mérito administrativo, sob pena de violação do princípio constitucional da separação dos poderes. Somente em casos de manifesta, inequívoca ou objetiva violação de direitos e de garantias fundamentais de servidores é que se viabiliza o controle do mérito de decisões administrativas.

Neste sentido os julgados do E. STJ:

 

ADMINISTRATIVO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCPLINAR. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE IRREGULARIDADE NA TRAMITAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE NA VIA ESTREITA DO MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO.

INEXISTENTE. INÍCIO DO PRAZO A PARTIR DA CIÊNCIA.

I - O controle do Poder Judiciário, no tocante aos processos administrativos disciplinares, restringe-se ao exame do efetivo respeito aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sendo vedado adentrar no mérito administrativo.

II - O controle de legalidade exercido pelo Poder Judiciário sobre os atos administrativos diz respeito ao seu amplo aspecto de obediência aos postulados formais e materiais presentes na Carta Magna, sem, contudo, adentrar o mérito administrativo. Para tanto, a parte dita prejudicada deve demonstrar, de forma concreta, a mencionada ofensa aos referidos princípios. Nesse sentido: MS 21.985/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 10/5/2017, DJe 19/5/2017; MS 20.922/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 8/2/2017, DJe 14/2/2017).

(...)

(STJ, AgInt no RMS 47.608/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/03/2018, DJe 12/03/2018)

ADMINISTRATIVO. SERVIDORES PÚBLICOS. DEMISSÃO. NULIDADES NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. OFENSA AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INOCORRÊNCIA. REEXAME DE PROVAS PRODUZIDAS. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE PELO PODER JUDICIÁRIO DO MÉRITO ADMINISTRATIVO. AGRAVAMENTO DA PENA SUGERIDA PELA COMISSÃO PROCESSANTE. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO. ART. 168 DA LEI Nº 8.112/90. EXCESSO DE PRAZO. NÃO COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS ADMINISTRATIVA E PENAL. "WRIT" IMPETRADO COMO FORMA DE INSATISFAÇÃO COM O CONCLUSIVO DESFECHO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. ORDEM DENEGADA. I - Em relação ao controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário circunscreve-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato demissionário, sendo-lhe defesa qualquer incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade. II - ... III - ... IV - ... V- ... VI - ... VII - Ordem denegada. (MS 9384 / DF, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/06/2004, DJ 16/08/2004, p. 130)

"ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PENA DE DEMISSÃO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NULIDADES. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. 1. Não se verifica nenhuma ilegalidade no procedimento administrativo o fato do Contencioso Administrativo - órgão de assessoramento e direção da Presidência - ter manifestado opinião por meio de parecer jurídico, máxime por estar em perfeita consonância com o Regulamento Interno do Tribunal de Justiça Estadual. 2. O processo administrativo, que culminou na aplicação da pena de demissão à Recorrente, teve regular processamento, com a estrita observância aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. 3. Em relação ao controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário circunscreve-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato, sendo-lhe defesa qualquer incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade. Dessa forma, mostra-se inviável a análise das provas constantes no processo administrativo. 4. Recurso desprovido." (RMS 19863 / SE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 29/11/2007, DJ 17/12/2007, p. 224)

 

No mesmo sentido o entendimento deste E. Tribunal:

 

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - AGRAVO LEGAL - ART. 557, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - DIREITO ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO - NULIDADE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO QUE CULMINOU EM DEMISSÃO - PRETENDIDA REINTEGRAÇÃO NO CARGO - ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO RESTRITA AOS ASPECTOS DA LEGALIDADE DO ATO - OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMLPA DEFESA - AGRAVO LEGAL IMPROVIDO. 1. ... 2. ... 3. É vedado ao Poder Judiciário adentrar no mérito administrativo, sob pena de violação ao princípio da separação dos Poderes. A sua atuação é restrita aos aspectos de legalidade do ato. Assim, não é cabível o reexame do mérito das provas colhidas no corpo do procedimento administrativo, mas tão somente a análise formal de sua validade. 4. No decorrer do processo administrativo foram asseguradas à autora as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, haja vista que formulou sua defesa e teve oportunidade de produzir as provas e contraprovas que achasse conveniente. 5. O processo administrativo que ensejou a demissão da recorrente está em estrita consonância com os princípios previstos na Constituição Federal e na Lei n° 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. 6. Agravo legal improvido. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, Agr. Legal em Apel. 94.03.105114-0/SP, Rel. Des. Fed. Johonsom di Salvo, j. 28.009.10)

CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. PROCESSO ADMINISTRATIVO. NULIDADE. DEFESA TÉCNICA EM PROCESSO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. SÚMULA VINCULANTE N.º 5 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PENA DE DEMISSÃO. LEGALIDADE. INOVAÇÃO EM SEDE RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. 1. A adoção das razões de decidir expendidas em precedente não importa nulidade da sentença. 2. O recurso de apelação é instrumento processual que não se presta à introdução de fundamento novo, não deduzido na petição inicial. 3. Da mesma forma como ocorre no direito penal, no direito administrativo-disciplinar o acusado se defende dos fatos que lhe são imputados; e não da sua capitulação legal (STF, MS n.º 23.299-2/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence). 4. A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição - Súmula Vinculante n.º 5 do Supremo Tribunal Federal. 5. Não é dado ao Poder Judiciário rediscutir o mérito do julgamento administrativo, mas tão-somente verificar a regularidade do processo. 6. Apelação parcialmente conhecida; na parte conhecida, desprovida. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, AC 200061000056067, Rel. Des. Fed. NELTON DOS SANTOS, DJF3 DATA: 04/12/2008 PÁGINA: 821)

 

A verificação da legalidade do procedimento passa pela análise da existência de justa causa para a aplicação da penalidade disciplinar ao servidor, ou seja, cumpre ao Poder Judiciário verificar se os fatos imputados a ele de fato ocorreram.

Por tudo o que consta dos autos e pelos motivos que passo a expor, resta evidente o respeito, pela Administração Pública, ao princípio da legalidade, não havendo qualquer nulidade a ser verificada.

 

Da regularidade da intimação do servidor

 

Sustenta o apelante que o procedimento administrativo disciplinar contrariou os artigos 26 e 28 da Lei n. 9.784/1999, quando da intimação acerca da instauração e de todo o teor do processo, inclusive do seu afastamento preventivo, do prazo para apresentar defesa prévia, requerer provas e apresentar rol de testemunhas.

Narra que a Portaria CPV nº 194 foi disponibilizada no dia 23/03/2018, então o dia útil, considerado para efeito de publicação seria 29/03/2018 (quinta-feira) e não como mencionado pela autoridade julgadora, de que havia sido publicada no dia 02/04/2018.

Alega que, considerado que o teor da Portaria é bem vago, não havia informação acerca dos motivos do seu afastamento preventivo, o que ocorreu somente após 12 dias, quando da sua intimação formal em 11/04/2018.

Afirma que, nos termos da Instrução Normativa nº 9, de 24 de março de 2020, a notificação poderá ser encaminhada ao servidor por meio de correio eletrônico de uso pessoal ou aplicativo de mensagem eletrônica (celular de uso pessoal), mas que, mesmo ciente que os dados cadastrais do autor estavam atualizados, a Administração não notificou o autor, por e-mail ou celular, conforme previsão acima.

Reitera que no período de doze dias, a Administração se omitiu de cumprir seu dever formal, disposto nos artigos 26 e 28 da Lei n. 9.784/99 (Art. 26 § 3º A intimação pode ser efetuada por ciência no processo, por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado), qual seja a ciência do afastamento, pois o autor soube apenas que tinha sido afastado por informação de uma colega de trabalho, que visualizou a portaria no Diário Oficial, mas não sabia a efetiva motivação, que induziu a tal ato.

Não procede a alegação da parte autora.

 

De início, verifico a impossibilidade de aplicação da Instrução Normativa n. 9, de 24 de março de 2020, para ato administrativo praticado dois anos antes, em março e abril de 2018.

 

Dispõe os artigos 26 e 28 da Lei n. 9.784/99:

 

Art. 26. O órgão competente perante o qual tramita o processo administrativo determinará a intimação do interessado para ciência de decisão ou a efetivação de diligências.

§ 1o A intimação deverá conter:

I - identificação do intimado e nome do órgão ou entidade administrativa;

II - finalidade da intimação;

III - data, hora e local em que deve comparecer;

IV - se o intimado deve comparecer pessoalmente, ou fazer-se representar;

V - informação da continuidade do processo independentemente do seu comparecimento;

VI - indicação dos fatos e fundamentos legais pertinentes.

§ 2o A intimação observará a antecedência mínima de três dias úteis quanto à data de comparecimento.

§ 3o A intimação pode ser efetuada por ciência no processo, por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado.

§ 4o No caso de interessados indeterminados, desconhecidos ou com domicílio indefinido, a intimação deve ser efetuada por meio de publicação oficial.

§ 5o As intimações serão nulas quando feitas sem observância das prescrições legais, mas o comparecimento do administrado supre sua falta ou irregularidade.

Art. 27. O desatendimento da intimação não importa o reconhecimento da verdade dos fatos, nem a renúncia a direito pelo administrado.

Parágrafo único. No prosseguimento do processo, será garantido direito de ampla defesa ao interessado.

Art. 28. Devem ser objeto de intimação os atos do processo que resultem para o interessado em imposição de deveres, ônus, sanções ou restrição ao exercício de direitos e atividades e os atos de outra natureza, de seu interesse.

 

 

Consoante cópia do processo administrativo disciplinar n. 0000037-89.2018.5.15.0895, foi instaurada sindicância para apurar a mensagem eletrônica encaminhada pelo Juiz Titular da 2ª Vara do Trabalho de Jaboticabal, informando acerca da prisão em flagrante do servidor por suposta fraude na realização da prova da OAB/TO. Considerado os termos do parecer da assessoria jurídica, em 06.03.2018, o Desembargador Presidente do TRT da 15ª Região determinou o afastamento cautelar do servidor, pelo prazo de 60 dias, nos termos do disposto no art. 148 da lei 8.112/90 (fl. 210 do pad, id 257469865).

Tendo em vista que o objeto e a possível autoria da infração disciplinar já estava definida, o Presidente da Comissão Permanente de Disciplina determinou a instauração do processo administrativo disciplinar, nos termos do art. 143 da lei n. 8.112/90, o que foi cumprido em 04.04.2018 (fls. 214/215, 229 do pad, id 257469866).

Assim, em 10.04.2018 foi expedida notificação ao servidor acerca da instauração do pad, bem como do prazo para arrolar testemunhas, apresentar defesa prévia e requerer a produção de outras provas que entender necessárias, nos termos dos arts. 153, 155 e 156 da lei 8.112/90 e arts. 26 a 28 da Lei 9.784/99, tendo o servidor recebido a notificação pessoalmente em 11.04.2018, em conformidade com o §3º do art. 26 da Lei n. 9.784/99 (fls. 216/217 do pad). Confira-se o teor da notificação:

 

O(a) Presidente DA COMISSÃO PERMANENTE DE DISCIPLINA 1 DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15". REGIÃO, no uso de suas atribuições legais, NOTIFICA o Sr. JÂNIO CARLOS FRANCISCO de que foi instaurado Processo Disciplinar (cópia anexa) para apuração de responsabilidade contra ele imputada, constante da portaria CPD I n° 002/2018, podendo acompanhar, por si ou por procurador devidamente constituído, todos os atos e diligências a serem praticados pela Comissão e de que, no prazo de 10 (dez) dias, a contar da data do recebimento deste, poderá apresentar rol de testemunhas, devidamente qualificadas, com domicílio completo, que pretende sejam ouvidas em audiência a ser oportunamente designada, apresentar defesa prévia e requerer a produção de outras provas que entender necessárias.

Nos termos do art. 26, Inc. V, da Lei n. 9.784/1999, fica V. Sa. ciente de que a continuidade do processo independe de seu comparecimento aos atos realizados e que somente poderá gozar férias, afastar-se do seu local de trabalho a serviço, tirar licenças especiais, bem como mudar-se de domicílio por período superior a três (03) dias, após comunicar, previamente e por escrito, o endereço e telefones atuais a esta Comissão.

Campinas, 10 de abril de 2018.

 

Assim, o servidor pôde protocolar sua defesa prévia em 17.04.2018 (fls. 218/221 do pad).

 

 

Do afastamento preventivo

 

No tocante ao afastamento preventivo, em 06.03.2018, o Desembargador Presidente do TRT-15 acolheu o parecer da assessoria jurídica e determinou o afastamento cautelar do servidor, pelo prazo de 60 (sessenta) dias, conforme disposto no art. 147 da Lei n. 8.112/90 (fl. 210 do pad, id 257469865, pag. 25). Assim, foi editada a Portaria CPV nº 194, de 23/03/2018, publicada no DOU de 27.03.2018 (fl. 228 do pad, id 257469866), nos seguintes termos:

 

De 23/03/2018

PORTARIA CPV Nº 194 - Afastando, preventivamente, pelo prazo de 60 (sessenta) dias, a partir da publicação desta portaria, JANIO CARLOS FRANCISCO, do exercício do cargo de Técnico Judiciário, área Administrativa, na 2ª Vara do Trabalho de Jaboticabal, sem prejuízo da remuneração, nos termos do artigo 147 da Lei n.º 8112/1990.

 

 

O Desembargador Presidente do TRT determinou em 28.05.2018 a prorrogação do afastamento preventivo por mais 60 dias, nos termos do parágrafo único do art. 147 da Lei 8.112/90, como medida cautelar de preservação do procedimento apuratório, considerado que a instrução do procedimento disciplinar não havia se encerrado (fl. 239 do pad, id 257469866, pag. 29).

 

“Vistos,

Considerando que o presente processo administrativo ainda se encontra em fase instrutória;

Considerando a necessidade de manutenção do afastamento do servidor Jânio Carlos Francisco, como medida cautelar de preservação do procedimento apuratório,

Determino a prorrogação do afastamento preventivo por mais 60 (sessenta) dias, sem prejuízo da remuneração, nos termos do parágrafo único do art. 147 da Lei n. 8.112/90.”

 

Não há que se falar em ilegalidade do afastamento preventivo e da prorrogação. As decisões de afastamento e de prorrogação foram fundamentadas como medida cautelar de preservação do procedimento apuratório. Como mencionado acima, não cabe ao judiciário apreciar o mérito administrativo discricionário, mas tão somente a legalidade dos atos e eventuais excessos nas escolhas, sob pena de invasão de competência.

Ademais, o próprio servidor requereu em 24.05.2018 a redesignação da audiência que estava inicialmente agendada para o dia 25.05.2018, para que fosse realizada no dia 08.06.2018 (fls. 233/235 do pad, id 257469866), o que foi acatado pela Comissão Processante, sendo as testemunhas e o servidor investigado ouvidos em 08.06.2018 (fls. 245/246 do pad, id 257469866).

Assim, ao contrário do alegado pelo apelante, a oitiva das testemunhas ocorreu na vigência da prorrogação do afastamento do servidor, e não durante o primeiro período de afastamento preventivo.

 

 

 

Da suspeição da Assessoria Jurídica da Presidência do TRT

 

O apelante questiona a suspeição do Assessor Jurídico da Presidência do TRT-15 que elaborou o parecer de fls. 198/203 do pad (id 257469865), alegando que exercitou uma atribuição que a lei não lhe confere, qual seja, a de assistente de acusação do Ministério Público, em latente desvio de finalidade, emitindo ainda juízo de valor sobre a conduta do acusado, demonstrando total ausência de imparcialidade e desrespeito.

Não procede a alegação.

Consoante decidido pelo Órgão Especial do TRT-15, na sessão de julgamento de 20/08/2020, no julgamento do MS 0008055-34.2019.5.15.0000, impetrado por JANIO CARLOS FRANCISCO contra decisão do Desembargador Presidente do TRT-15 nos autos do Processo Administrativo nº 0000037-89.2018.5.15.0895, "Ao contrário do arguido, o parecer do assessor jurídico, de fls. 661/684, fornece informações técnicas acerca do tema, com opiniões jurídicas fundamentadas em bases legais, doutrinárias e jurisprudências, não havendo nisso nenhum abuso ou ilegalidade”.

 

Do vício na intimação do resultado do processo disciplinar

 

O apelante suscita o total descaso da Administração para com o autor, ocorrido no dia 29/10/2019, que deixou que comparecesse ao local de lotação e trabalhasse no período da manhã normalmente, bloqueando o acesso ao sistema após as 13 horas, ocasião em que foi informado por seu chefe imediato que recebera um e-mail com cópia do ato de demissão e do diário oficial que publicou o referido ato, em desrespeito o disposto nos artigos 26 e 28 da lei 9784/99, não sendo o autor formalmente intimado, mas tomando ciência de sua demissão por terceiros.

Não procede a alegação.

Conforme OFÍCIO Nº 072/2020- AJUR, encaminhado pela assessoria jurídica do TRT da 15ª Região (id 257469856), em 19/10/2018 o então presidente do TRT impôs ao autor a penalidade de demissão, o autor tomou ciência da penalidade e interpôs recurso administrativo em 30/11/2018 e impetrou mandado de segurança n. 5012403-79.2018.4.03.6105 em 12/12/2018 perante a Justiça Federal de Campinas.

Em 14/12/2018, o Juízo Federal concedeu liminar de forma parcial, para suspender a publicação da penalidade de demissão a suspensão dos seus efeitos, se já publicada, e em 18/06/2019 reconheceu sua incompetência para processar e julgar o mandamus, determinando sua remessa ao TRT-15.

Em 08/10/2019, o então Desembargador Relator do MS 0008055-34.2019.5.15.0000, considerando as condutas ilícitas cometidas pelo impetrante e que a penalidade administrativa de demissão lhe fora aplicada em conformidade com o procedimento legal, revogou a liminar parcialmente concedida originariamente pelo Juízo Federal de Campinas, mantendo o efeito devolutivo do recurso administrativo interposto pelo impetrante e a aplicação imediata da penalidade imposta.

O impetrante opôs embargos de declaração, que foram acolhidos em parte em 14/10/2019 apenas para acrescentar à decisão os esclarecimentos prestados.

Considerada a decisão proferida no Mandado de Segurança 0008055-34.2019.5.15.0000, que revogou a liminar concedida e determinou a aplicação imediata da penalidade de demissão ao servidor, a Desembargadora Presidente do Tribunal deliberou em 09/10/2019 pelo cumprimento dessa decisão, com encaminhamento do processo à Diretoria-Geral.

Assim, em 29/10/2019, foi publicado o Ato CPV nº 0120/2019, no Diário Oficial da União, em que a Desembargadora Presidente deste Tribunal demite o servidor Janio Carlos Francisco, nos termos do art. 132, inciso IV, da Lei nº 8.112/90:

 

“Dessarte, em 19/11/2018, o então Desembargador Presidente deste Tribunal, Fernando da Silva Borges, acolhendo o relatório e conclusão da Comissão Processante e verificando, portanto, resultar estreme de dúvidas que os atos praticados pelo servidor traduziam grave desvio de conduta, com intensidade tal que impossibilitava a continuidade do vínculo jurídico-administrativo com ele mantido, decidiu pela imposição da penalidade de demissão ao servidor Janio Carlos Francisco, com fulcro no art. 132, inciso IV, da Lei nº 8.112/1990 (fls. 318/321 do PADServ).

Irresignado, o servidor interpôs, tempestivamente, recurso administrativo, protocolizado em 30/11/2018, que foi recebido em seu efeito meramente devolutivo, determinando-se, nessa mesma decisão de fl. 343, o encaminhamento dos autos à Diretoria-Geral deste Tribunal, para que fossem tomadas as providências atinentes à demissão do servidor Janio e, em sequência, à Vice-Presidência Administrativa, para o processamento do recurso, nos termos das disposições do art. 293 do Regimento Interno desta Corte.

Ocorre que, contemporaneamente à interposição do recurso administrativo, o servidor impetrou, em 12/12/2018, Mandado de Segurança perante a 8ª Vara Federal de Campinas (Processo nº 5012403-79.2018.4.03.6105), contra ato do então Desembargador Presidente deste Tribunal, que lhe houvera aplicado a penalidade de demissão, requerendo, na oportunidade, em sede liminar, o deferimento do efeito suspensivo de tal decisão, até que seu recurso administrativo fosse analisado.

O Juízo da 8ª Vara Federal de Campinas deferiu, em parte, a liminar pleiteada, para determinar a suspensão da publicação da decisão impugnada ou a suspensão dos seus efeitos, se já publicada, até que fossem juntadas aos autos, as manifestações da Autoridade coatora, da União Federal e do Ministério Público Federal.

Em cumprimento à determinação judicial, a publicação da demissão do servidor foi suspensa, neste Tribunal, em 27/12/2018. Contudo, nas informações prestadas ao Juízo da 8ª Vara Federal de Campinas, o então Desembargador Presidente deste Tribunal manifestou-se em prol da incompetência absoluta da Justiça Federal para a análise e julgamento do Mandado de Segurança então impetrado, por conta da interpretação conjugada do art. 109, VIII, da Constituição Federal e do art. 21, VI, da Lei Complementar nº 35/1979, ressaltando, na oportunidade, que, nos termos do que dispõe o art. 21-F do Regimento Interno deste Tribunal, compete originalmente ao Órgão Especial desta Corte o julgamento de mandado de segurança contra atos do Presidente.

Assim, após a prestação de informações pela autoridade coatora, bem como tendo em vista os pareceres da União e do Ministério Público Federal, o Juízo Federal reconheceu sua incompetência absoluta para processar e julgar o referido Mandado, determinando a remessa dos autos para este E. Tribunal, sendo o processo aqui autuado, em 12/9/2019, sob o nº 0008055- 34.2019.5.15.0000.

Em 8/10/2019, o então Desembargador Relator do mandamus, já no âmbito deste Tribunal, considerando as condutas ilícitas cometidas pelo impetrante e que a penalidade administrativa de demissão lhe fora aplicada em conformidade com o procedimento legal, não vislumbrando, outrossim, na espécie, a presença dos requisitos previstos no art. 300 do CPC e no art. 7º da Lei nº 12.016/2009, revogou a liminar parcialmente concedida, mantendo o efeito devolutivo do recurso administrativo interposto pelo impetrante e determinando a aplicação imediata da penalidade de demissão originariamente imposta.

Em face da referida decisão, o servidor opôs Embargos de Declaração, conhecidos e providos parcialmente em 14/10/2019, apenas para acrescentar à v. decisão, os esclarecimentos ali prestados e, em sequência, interpôs Agravo Regimental (Agravo Interno), não provido pelo Órgão Especial Judicial em Sessão Ordinária Virtual, realizada em 13/2/2020, mantendo-se, de tal sorte, a decisão impugnada.

Outrossim, no que diz respeito ao recurso administrativo, a Desembargadora Vice-Presidente Administrativa, considerando a judicialização da matéria (referindo-se, ainda, naquela oportunidade, à decisão liminar proferida no Mandado de Segurança, originariamente impetrado pelo servidor perante a 8ª Vara Federal de Campinas, que determinara a suspensão da publicação do ato de demissão ou a suspensão de seus efeitos, se já publicada) e considerando, outrossim, o cumprimento dessa decisão do Juízo da 8ª Vara Federal de Campinas, à época, pela área técnica deste Tribunal, determinou, em 21/3/2019, o sobrestamento do feito, por aplicação analógica do art. 313, V, “a”, do CPC, para aguardar, portanto, a solução final daquele mandamus.

Contudo, a Desembargadora Presidente do Tribunal, à vista da r. decisão proferida no Mandado de Segurança 0008055-34.2019.5.15.0000, em trâmite neste Tribunal, que revogou, a posteriori, a liminar concedida originariamente pelo Juízo da 8ª Vara Federal de Campinas e determinou a aplicação imediata da penalidade de demissão ao servidor, deliberou, em 9/10/2019, pelo cumprimento dessa decisão, dando ciência à Vice-Presidência Administrativa do Tribunal dessa determinação.

De tal sorte, em 29/10/2019, foi publicado o Ato CPV nº 0120/2019, no Diário Oficial da União, expediente esse, em que a Desembargadora Presidente deste Tribunal demite o servidor Janio Carlos Francisco, nos termos do art. 132, inciso IV, da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990."

 

Como se observa, o servido já tinha ciência acerca do resultado do processo administrativo disciplinar, que culminou na aplicação da penalidade de demissão em 19/10/2018, bem como que o Desembargador do TRT havia revogado a liminar parcialmente concedida e determinado a aplicação imediata da penalidade imposta em 08/10/2019, sendo que a expedição do ato de demissão mero cumprimento da decisão já tomada pelo Presidente do TRT em 19/10/2018.

 

 

Da inadequação do tipo legal descrito no ato demissório

 

Suscita o apelante a inadequação do tipo legal descrito no ato demissório, argumentando que o fundamento legal utilizado para justificar a sua demissão - improbidade administrativa (inciso IV do art. 132 da Lei n. 8.112/90) - só poderia ser efetivada se o servidor estivesse no exercício da função pública, o que não ocorreu no caso, uma vez que o autor estava incurso em ações penais de caráter privado, legisladas pelo Código Penal, destacando nesse sentido a fundamentação contida na decisão liminar proferida no mandado de segurança nº 5012403-79.2018.403.6105 que teria suspendido a aplicação dos efeitos da pena aplicada.

Alega o autor que, para a configuração dos atos de improbidade tipificados no art. 11 da Lei n. 8.429/92, exige-se que a conduta seja praticada por agente público (ou a ele equiparado), atuando no exercício de seu múnus público, havendo, ainda, a necessidade do preenchimento dos seguintes requisitos: (a) conduta ilícita; (b) improbidade do ato, configurada pela tipicidade do comportamento, ajustado em algum dos incisos do artigo 11 da LIA; (c) elemento volitivo, consubstanciado no DOLO de cometer a ilicitude e causar prejuízo ao Erário; (d) ofensa aos princípios da Administração Pública.

Sustenta que o STJ fixou tese reconhecendo a impossibilidade de condenação de agentes públicos que incorressem nas condutas previstas na LIA, sem a devida promoção da ação civil pública ou faltante a esta os requisitos legais.

Reitera que o tipo legal descreve de maneira inequívoca que a improbidade requer o exercício da função pública, inclusive prevendo imposição pecuniária.

Sustenta o apelante a ocorrência de omissão acerca de regramento legal aplicado quando de eventual cometimento de crimes de ordem privada (Lei n. 8112/90 e Código Penal), alegando que as decisões administrativa e judicial impingiram ao autor uma pena de demissão, com fundamento em regra legal incabível, uma vez que a pena de improbidade aplicada está diretamente relacionada com o exercício da função pública e não atos da vida privada.

 

Não procedem as alegações do apelante.

 

Em 19.11.2018, o Desembargador Presidente do TRT da 15ª Região proferiu decisão final no pad 000037-89.2018.5.15.0895, acolhendo a conclusão da Comissão Processante para aplicar a penalidade de demissão ao servidor, em virtude da transgressão aos deveres previstos no inciso IX do art. 116 da Lei nº 8.112/1990, c/c o disposto no inciso V do art. 11 da Lei nº 8.429/1992, à luz do permissivo previsto no art. 128 do Estatuto do Servidor Público Federal.

A penalidade administrativa foi suspensa por conta de liminar concedida no mandado de segurança n. 5012403-79.2018.4.03.6105, sendo essa liminar revogada em 08.10.2019 (mandado de segurança n. 0008055-34.2019.5.15.0000).

Assim, o apelante foi demitido através do ATO CPV Nº 120, DE 21 DE OUTUBRO DE 2019, publicada em 29.10.2019 (id 257469080), que assim determinou:

 

“TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO

ATO CPV Nº 120, DE 21 DE OUTUBRO DE 2019

A DESEMBARGADORA PRESIDENTE DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO, no uso de suas atribuições legais e regimentais, e considerando o que consta do Processo PADServ nº 0000037-89.2018.5.15.0895, de acordo com as conclusões do trabalho apuratório regularmente realizado pela Comissão Permanente de Disciplina, resolve:

Demitir, nos termos do artigo 132, inciso IV, da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, o servidor JANIO CARLOS FRANCISCO do cargo de Técnico Judiciário, área Administrativa, do Quadro Permanente da Secretaria deste Tribunal.”

 

O ato de demissão da apelante deu-se com fundamento no artigo 132, inciso IV, da Lei nº 8.112/90, por ter praticado atos que traduziam grave desvio de conduta, com intensidade tal que impossibilitava a continuidade do vínculo jurídico-administrativo com ele mantido.

 

Analisando os fundamentos da pena:

 

"Art. 132. A demissão será aplicada nos seguintes casos:

...

IV - improbidade administrativa;”

 

Do art. 116, extrai-se:

 

" Art. 116.  São deveres do servidor:

...

IX - manter conduta compatível com a moralidade administrativa;

 

 

E quanto ao artigo 128, transcrevo:

 

" Art. 128.  Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais.

Parágrafo único.  O ato de imposição da penalidade mencionará sempre o fundamento legal e a causa da sanção disciplinar.                    (Incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)”

 

 

Por fim, a Lei n. 8.429/92, na redação vigente ao tempo dos fatos, descreve como ato de improbidade administrativa qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente frustrar a licitude de concurso público

 

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

(...)

V - frustrar a licitude de concurso público;

 

Fixada, assim, a conduta que, em conclusão final, foi imputada ao apelante por praticar ato de Improbidade Administrativa que Atentam contra os Princípios da Administração Pública, por ter sido preso em flagrante em 26.07.2015 com dispositivo eletrônico escondido em sua camisa durante a aplicação de prova do concurso público para provimento de cargos de servidores do TRT da 3ª Região, tendo inclusive sido preso novamente em flagrante em 21.01.2018 na cidade de Palmas-TO após apresentar identidade falsa a comissão responsável pela aplicação da prova da segunda fase da OAB, aplicada pela Fundação Getulio Vargas.

Conforme decisão do Desembargador Presidente do TRT da 15 Região, restaram comprovados os atos infracionais imputados ao recorrente (id 257469075):

 

Vistos.

Cuida-se neste processo administrativo disciplinar de aferir conduta levada a efeito pelo servidor Jânio Carlos Francisco, que teria sido flagrado em prova realizada no concurso público promovido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3' Região portando dispositivo eletrônico capaz de gravar imagens do caderno de questões.

Além desse fato e posteriormente a ele, o mesmo servidor foi novamente flagrado fraudando o concurso para admissão aos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil — Secção Tocantins, ocasião em que fora surpreendido utilizando documento de Identidade falso, de forma a poder se passar por outra pessoa e assim realizar a prova em seu lugar.

Em ambos os casos mencionados o servidor foi preso em flagrante, com destaque para o fato de, em relação ao último episódio, haver expressa confissão de que utilizara de documento falso e recebera adiantamento cie valores para fraudar a prova da OAB/Tocantins (fl. 155, verso e 156).

Por outro lado, nesta seara administrativa, quer na fase de sindicância, quer na fase de processo disciplinar, propriamente, o servidor jamais negou os fatos que lhe foram imputados, apenas tentando lhes empreender contornos jurídicos diversos, em especial modo defendendo a tese do não enquadramento dos referidos atos ao conceito de improbidade administrativa e da inexistência de repercussão desses atos em relação ao serviço público por ele prestado.

 A análise dos autos e do relatório apresentado pela Comissão Permanente de Disciplina deste Tribunal, juntado às fls. 255/264, não permite atribuir razão ao servidor sindicado.

O inciso IX do artigo 116 da Lei 8.112/90 estabelece como dever funcional do servidor público a observância de "conduta compatível com a moralidade administrativa", o ue, na visão dê José Cretella Júnior traduz-se como o dever de:

“o funcionário não só no desempenho de suas atividades públicas, como também, em vida particular, conduzir-se de modo impecável, evitando maus costumes, a frequentar lugares suspeitos, o alcoolismo, escândalos, tudo, enfim, que, pela publicidade, possa influir no prestigio da função pública. (CRETELLA JÚNIOR, José. Direito Administrativo do Brasil: Regime jurídico dos funcionários públicos. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1964, p. 468).”

O Princípio da Moralidade Administrativa foi elevado ao patamar constitucional, como se verifica dos termos do capuz do artigo 37 da Constituição Federal, sendo certo que o descumprimento exacerbado desse mandamento pode configurar "improbidade administrativa", hipótese ainda mais gravosa de descomprimem° do dever funcional, com graves consequências ao agente público infrator, como previsto no parágrafo 40 do mesmo artigo constitucional acima referido. A esse respeito, confira-se Inocêncio Mártires Coelho:

“Sendo o direito o mínimo ético indispensável à convivência humana, a obediência ao princípio da moralidade, em relação a determinados atos, significa que eles só serão considerados válidos se forem duplamente conformes à eticidade, ou seja, se forem adequados não apenas às exigências jurídicas, mas também às de natureza moral. A essa luz, portanto, o princípio da moralidade densifica o conteúdo dos atos jurídicos, e em grau tão elevado que a sua inobservância pode configurar improbidade administrativa e acarretar-lhe a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, sem prejuízo da ação penal cabível, se a sua conduta configura, também, a prática de ato tipificado como crime, consoante o disposto no § 4° do art. 37 da Constituição. (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 883)”

Aliás, a Lei 8112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores da União, é expressa ao contemplar a improbidade administrativa como uma das hipóteses ensejadoras dei demissão do servidor público, como se vê do seu artigo 132, inciso IV, o que, na visão de Sandro Lucia Dezan,

“Refere-se a ilícitos disciplinares de elevada gravidade, denotando uma essência degradada de personalidade do servidor faltoso, caracterizando-o como ímprobo, não detentor da necessária honestidade e higidez de caráter para compor os quadros do serviço público. (DEZAN, Sandro Lucio. Ilícito Administrativo Disciplinar em Espécie. Curitiba: Juruá, 2012, p. 218).”

No caso analisado neste processo disciplinar não há dúvidas de que esse grave desvio de conduta está presente, com intensidade tal que impossibilita a própria continuidade do vínculo jurídico-administrativo mantido com o servidor sindicado.

Relembre-se que mencionado servidor foi surpreendido utilizando-se de dispositivo eletrônico capaz de captar as imagens do caderno de questões que lhe foi entregue em concurso público, sendo certo ainda que, mais grave do que isso, em outra oportunidade foi flagrado participando de prova em lugar de outro candidato, inclusive fazendo uso de identidade falsa.

E nas duas oportunidades houve prisão em flagrante.

A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429192) tem seção específica que cuida de condutas que atentam contra os princípios da administração pública, valendo destacar que o caput do seu artigo 11 preconiza que "constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade e lealdade às instituições", o que, sem dúvida, é o caso ora tratado.

É certo, e aqui não se nega, que a tutela da moralidade administrativa não implica fiscalizar a vida privada do servidor, os seus vícios, os seus descompassos pessoais, e sim os efeitos que a sua conduta pessoal possa ter no trato da coisa pública.

Como asseverou a Comissão Disciplinar à fl. 258, não se espera do servidor público comum a "reputação ilibada" que deve marcar a conduta dos exercentes de cargos na alta administração, o que não significa dizer, entretanto, que os atos ilícitos praticados na vida privada não possam repercutir na sua vida funcional.

A esse respeito José Armando da Costa destaca que atos da vida particular do servidor poderão repercutir no âmbito da responsabilidade disciplinar, se a moralidade e a seriedade da Administração Pública caírem em descrédito por conta disso (in, Direito administrativo disciplinar. Brasília: Brasília Jurídica, 2004. p. 201).

E esta é a hipótese dos autos. O mínimo que se espera de servidores do Poder Judiciário é o respeito às instituições, é o comportamento probo, honesto, capaz de fazer transparecer ao cidadão que acorre às barras da Justiça a segurança de que os seus interesses serão tratados de modo adequado e justo.

Servidor que assim não se comporta, que pratica atos reprováveis na vida particular, denotadores de desonestidade, comete grave descumprimento disciplinar, passível de punição máxima, porque desacredita a própria instituição da qual faz parte.

Por todo o exposto, considerando os fatos relatados nestes autos, que dizem da participação fraudulenta do servidor em concursos públicos realizados perante o Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais e no âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Tocantins;

Considerando que nestes autos em nenhum momento o servidor Jânio Francisco negou os fatos que lhe foram imputados;

Considerando que as condutas descritas no relatório da Comissão Processante configuram atos maculadores do dever de probidade administrativa previsto no inciso IX do artigo 116 da Lei 8.112/90;

Considerando que tais condutas, em seu conjunto, também violam o dever maior de obediência aos princípios informadores da Administração Pública, previstos no caput do artigo 11 da Lei 8.429/92;

Considerando a independência das responsabilidades penal e administrativa, tal como previsto no artigo 125 da Lei 8.112/90,

Acolho o relatório e a conclusão a que chegou a Comissão Processante às fls. 255/264, para aplicar ao servidor Jânio Carlos Francisco a pena de demissão, com base no artigo 132, inciso IV, da Lei 8.112/90.

Encaminhem-se os autos à Diretoria-Geral para as providências necessárias.

Dê-se ciência ao servidor, à sua Procuradora e à Comissão Permanente de Disciplina.

Campinas, 19 de novembro de 2018.

 

 

Não procede a alegação do apelante acerca da necessidade de instauração de ação de improbidade administrativa para que se possa aplicar a penalidade de demissão com esse fundamento.

Dispõe o art. 12 da lei n. 8.429/92, na redação dada pela Lei n. 12.120/2009, vigente ao tempo dos fatos, que “independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato”. Nesse sentido, o art. 125 da Lei n. 8.112/90 prescreve que “as sanções civis, penais e administrativas poderão cumular-se, sendo independentes entre si”.

No caso em tela, a penalidade de demissão não foi aplicada com base na Lei 8.429/92, e sim na Lei n. 8.112/90. A Lei de Improbidade Administrativa serviu como parâmetro para a configuração do ato ímprobo que lhe foi imputado (violação de dever de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e frustração a licitude de concurso público) para fins de aplicação do disposto no art. 132, inciso IV, da Lei n. 8.112/90.

 

Nesse sentido:

 

EMENTA Agravo regimental em recurso ordinário em mandado de segurança. Processo administrativo disciplinar. Ausência de obrigatoriedade de decisão judicial em processo de improbidade administrativa para aplicação da sanção de demissão. Sanção aplicada de acordo com a apuração dos fatos no âmbito do processo administrativo disciplinar. Impossibilidade de rediscussão de fatos e provas em sede de mandado de segurança. Agravo regimental não provido. 1. A jurisprudência da Suprema Corte é pacífica no sentido da independência entre as instâncias cível, penal e administrativa, não havendo que se falar em violação dos princípios da presunção de inocência e do devido processo legal pela aplicação de sanção administrativa por descumprimento de dever funcional fixada em processo disciplinar legitimamente instaurado antes de finalizado o processo cível ou penal em que apurados os mesmo fatos. Precedentes. 2. A análise da proporcionalidade da sanção aplicada, mediante rediscussão de fatos e provas produzidas no PAD, é incompatível com a via do mandado de segurança. Precedentes. 3. Agravo regimental não provido.

(STF, RMS 28919 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 16/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-029  DIVULG 11-02-2015  PUBLIC 12-02-2015)

 

 

Registre-se ainda que, ao contrário do sustentado pela apelante, os Atos de Improbidade Administrativa não se restringem aos que importam em enriquecimento ilícito e que causam prejuízo ao erário.

O art. 11 da Lei n. 8.429/92 enumera os atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública, como a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada pela conduta de “V - frustrar a licitude de concurso público”, como é o caso dos autos.

Quanto ao ponto, registro precedentes do STJ do sentido de que o ato de improbidade administrativa não precisa estar necessariamente vinculado ao exercício do cargo público:

 

MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. AUDITOR DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NULIDADES DO PAD NÃO CONFIGURADAS. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. IMPOSSIBILIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. PODER JUDICIÁRIO. COMPETÊNCIA PARA AFERIR A REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO E LEGALIDADE DA DEMISSÃO. SANÇÕES DISCIPLINARES DA LEI N. 8.112/1990. APLICAÇÃO. INDEPENDÊNCIA EM RELAÇÃO ÀS PENALIDADES DA LIA. TRÂNSITO EM JULGADO DA AÇÃO DE IMPROBIDADE. DESNECESSIDADE. VARIAÇÃO PATRIMONIAL A DESCOBERTO. LICITUDE DA EVOLUÇÃO. ÔNUS DO INVESTIGADO. CONDUTA ÍMPROBA NÃO PRECISA ESTAR VINCULADA AO EXERCÍCIO DO CARGO. ART. 11 DA LEI N. 8.429/1992. DOLO GENÉRICO. FALTA DE TRANSPARÊNCIA E APRESENTAÇÃO DE DECLARAÇÕES DE BENS FALSAS. CONDUTA QUE SE AMOLDA NA HIPÓTESE DE CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA INEXISTENTE. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO CONFIGURADO.

- Não há falar em nulidade do Processo Administrativo Disciplinar.

(...)

- O STJ tem jurisprudência firmada no sentido de que não cabe ao Poder Judiciário analisar o mérito administrativo, mas somente aferir a regularidade do procedimento e a legalidade do ato de demissão.

- Orienta-se esta Corte no sentido de que as sanções disciplinares previstas na Lei n. 8.112/1990 são independentes em relação às penalidades previstas na LIA, não havendo necessidade de se aguardar o trânsito em julgado da ação de improbidade administrativa para aplicação das penas de demissão ou de cassação de aposentadoria.

- Restou comprovado no Processo Administrativo Disciplinar a existência de variação patrimonial a descoberto e que o indiciado não conseguiu comprovar a origem desse patrimônio. É do servidor acusado o ônus da prova no sentido de demonstrar a licitude da evolução patrimonial constatada pela administração. Precedentes.

- A conduta do servidor tida por ímproba não precisa estar necessariamente vinculada com o exercício do cargo público.

 Precedente.

- É entendimento deste Tribunal o de que os atos de improbidade administrativa, descritos no art. 11, caput, da Lei n. 8.429/1992, dependem da presença de dolo genérico, ou seja, dispensam a demonstração de ocorrência de dano para a administração pública ou enriquecimento ilícito do agente.

- No caso dos autos, o dolo se configura pela manifesta vontade do agente em realizar conduta contrária ao dever de legalidade, consubstanciada na falta de transparência da evolução patrimonial e da movimentação financeira, principalmente se considerado que foram apresentadas declarações de bens falsas, referentes aos anos calendários sob exame.

- Esta Corte firmou orientação no sentido de que a Administração Pública, quando se vê diante de situações em que a conduta do investigado se amolda nas hipóteses de demissão e de cassação de aposentadoria de servidor público, não dispõe de discricionariedade para aplicar pena menos gravosa.

Segurança denegada.

(STJ, MS n. 12.660/DF, relatora Ministra Marilza Maynard (desembargadora Convocada do Tj/se), Terceira Seção, julgado em 13/8/2014, DJe de 22/8/2014.)

 

MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. AUDITOR FISCAL DA RECEITA FEDERAL. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. REMESSA DE VALORES PARA O EXTERIOR, SEM DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. CONDUTA ÍMPROBA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR ? PAD. PROVA EMPRESTADA DO JUÍZO CRIMINAL. OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS CIVIL, PENAL E ADMINISTRATIVA. PENA DE DEMISSÃO IMPOSTA PELA ADMINISTRAÇÃO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. DIREITO LÍQUIDO E CERTO INDEMONSTRADO.

1. A análise das ponderações lançadas pelo Impetrante concernentes à má interpretação dos fatos pela Autoridade Administrativa demandam, necessária e inequivocamente, revolvimento das provas examinadas no PAD, o que é sabidamente vedado na estreita via do mandamus.

2. O direito líquido e certo, passível de ser argüido na via mandamental, deve ser demonstrado com prova documental pré-constituída, prescindindo de dilação probatória. Precedentes.

3. Não há qualquer impeço ao aproveitamento no PAD de provas produzidas no Juízo criminal, desde que devidamente submetidas ao contraditório, como ocorreu no caso em tela. Precedentes.

4. Embora possam se originar a partir de um mesmo fato, a apuração de falta administrativa realizada no PAD não se confunde com a ação de improbidade administrativa, esta sabidamente processada perante o Poder Judiciário, a quem cabe a imposição das sanções previstas nos incisos do art. 12 da Lei n.º 8.429/92. Há reconhecida independência das instâncias civil, penal e administrativa.

5. A pena de demissão não é exclusividade do Judiciário. Na realidade, é dever indeclinável da Administração apurar e, eventualmente, punir os servidores que vierem a cometer ilícitos de natureza disciplinar.

6. A conduta do servidor tida por ímproba não precisa estar, necessária e diretamente, vinculada com o exercício do cargo público. Com efeito, mesmo quando a conduta é perpetrada fora das atividades funcionais, se ela evidenciar incompatibilidade com o exercício das funções do cargo, por malferir princípios basilares da Administração Pública, é sim passível de punição na esfera administrativa, inclusive com a pena máxima de demissão, mormente como no caso em apreço em que o servidor, Auditor Fiscal da Receita Federal, apresenta enriquecimento ilícito, por acumular bens desproporcionais à evolução do patrimônio e da renda ? fato esse, aliás, que também está em apuração na esfera penal ?, remetendo significativo numerário para conta em banco na Suíça, sem a correspondente declaração de imposto de renda. Inteligência do art. 132, inciso IV, da Lei n.º 8.112/90, c.c. o art. 11 da Lei n.º 8.429/92.

7. Segurança denegada. Agravo regimental prejudicado.

(STJ, MS n. 12.536/DF, relatora Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, julgado em 28/5/2008, DJe de 26/9/2008.)

 

Como consabido, é possível o reexame do ato administrativo à luz da razoabilidade, mas não cabe ao Poder Judiciário, como pretende a parte autora, imiscuir-se no juízo e discricionariedade administrativos, reapreciando provas administrativamente apresentadas e devidamente rebatidas, uma vez que não se trata de ato ilegal ou de abuso de poder, em respeito ao princípio da separação de poderes.

De fato, ao Judiciário não cabe apreciar o mérito administrativo discricionário, mas tão somente a legalidade dos atos e eventuais excessos nas escolhas, sob pena de invasão de competência. Pelo relatado nos autos, não há manifesta, inequívoca ou objetiva violação de direitos e de garantias fundamentais de servidores, inviabilizando o controle do mérito da decisão administrativa atacada. Logo, pelos argumentos trazidos pelo apelante, não vislumbro motivos para infirmar a r. sentença, razão pela qual impõe-se a sua manutenção.

 

Das verbas sucumbenciais

 

Custas ex lege.

Diante da sucumbência recursal da parte autora quanto ao objeto da ação, que teve seu recurso improvido no mérito, é de se majorar o valor dos honorários a teor do art. 85, §11, CPC/2015.

Assim, com base no art. 85 e parágrafos do CPC, devem ser majorados os honorários advocatícios a serem pagos pela parte autora, levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, razão pela qual majoro os honorários para 11% sobre o valor atualizado da causa, suspensa a exigibilidade nos termos do art. 98, §3º, do CPC.

 

 

Dispositivo

 

Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora.

É o voto.

 



E M E N T A

 

 

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. MÉRITO DO ATO ADMINISTRATIVO. VEDAÇÃO AO PODER JUDICIÁRIO. SEPARAÇÃO DOS PODERES. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE DE VINCULAÇÃO AO EXERCÍCIO DO CARGO PÚBLICO. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Apelação interposta pelo autor contra sentença que julgou improcedente o pedido de reconhecimento de nulidade do procedimento administrativo disciplinar n. 0000037-89.2018.5.15.0895, que lhe impôs a pena de demissão, bem como o pedido de sua consequente reintegração no cargo de Técnico Judiciário do TRT da 15ª Região, com o pagamento de todos os vencimentos retroativos, condenada a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, suspensa a exigibilidade por conta da gratuidade deferida.

2. A garantia do devido processo legal, com respeito ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LV, CF), é de observância obrigatória tanto nos processos judiciais quanto nos administrativos.

3. O controle jurisdicional sobre o processo administrativo disciplinar limita-se à verificação da regularidade do procedimento e da legalidade do ato administrativo. Somente em casos de manifesta, inequívoca ou objetiva violação de direitos e de garantias fundamentais de servidores é que se viabiliza o controle do mérito de decisões administrativas, sob pena de violação à separação dos poderes.

4. Ausência de ilegalidade do afastamento preventivo e da prorrogação. As decisões de afastamento e de prorrogação foram fundamentadas como medida cautelar de preservação do procedimento apuratório.

5. Desnecessidade de instauração de ação de improbidade administrativa para que se possa aplicar a penalidade de demissão com esse fundamento. Dispõe o art. 12 da lei n. 8.429/92, na redação dada pela Lei n. 12.120/2009, vigente ao tempo dos fatos, que “independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato”. Nesse sentido, o art. 125 da Lei n. 8.112/90 prescreve que “as sanções civis, penais e administrativas poderão cumular-se, sendo independentes entre si”.

6. No caso, a penalidade de demissão não foi aplicada com base na Lei 8.429/92, e sim na Lei n. 8.112/90. A Lei de Improbidade Administrativa serviu como parâmetro para a configuração do ato ímprobo que lhe foi imputado (violação de dever de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e frustração a licitude de concurso público) para fins de aplicação do disposto no art. 132, inciso IV, da Lei n. 8.112/90.

7. Os Atos de Improbidade Administrativa não se restringem aos que importam em enriquecimento ilícito e que causam prejuízo ao erário. O art. 11 da Lei n. 8.429/92 enumera os atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública, como a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada pela conduta de “V - frustrar a licitude de concurso público”, como é o caso dos autos. Precedentes do STJ do sentido de que o ato de improbidade administrativa não precisa estar necessariamente vinculado ao exercício do cargo público.

8. O art. 85, §11 do CPC prevê a majoração dos honorários pelo Tribunal levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal.

9. Apelação desprovida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.