Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015822-83.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - JUIZ CONVOCADO RENATO BECHO

APELANTE: BANCO PAN S.A.

Advogado do(a) APELANTE: LUIZ HENRIQUE SILVA SANT ANNA - SP289005-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015822-83.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: BANCO PAN S.A.

Advogado do(a) APELANTE: LUIZ HENRIQUE SILVA SANT ANNA - SP289005-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de apelação à sentença denegatória de mandado de segurança impetrado para afastar a incidência de PIS/COFINS sobre rendimentos de depósitos ou recolhimentos compulsórios ao BACEN.

Alegou-se que: (1) extrai-se o direito postulado da ratio decidendi dos Temas 808 (RE 855.091 – IRPF sobre juros de mora) e 962 (RE 1.063.187 – IRPJ/CSL sobre SELIC na repetição de indébito), julgados pelo Supremo Tribunal Federal; (2) os juros recebidos por recolhimentos compulsórios não podem ser considerados receita para incidência do PIS/COFINS; (3) “nem todas as receitas obtidas pelas instituições financeiras, ainda que indiretamente relacionadas ao seu objeto social, constituem elementos integrantes da base de cálculo do PIS e da COFINS”; e (4) “os valores decorrentes de fatores como os recolhimentos compulsórios não devem ser considerados integrantes da base de cálculo do PIS e da COFINS, mormente considerando que não decorrem de atividades 'voltada(s) ao mercado, no propósito de entregar-lhe utilidades, conveniência valores e benefícios', extrapolando, portanto, o exercício efetivo do objeto social das instituições financeiras”.

Houve contrarrazões e parecer ministerial pelo prosseguimento do feito.

É o relatório.

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015822-83.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: BANCO PAN S.A.

Advogado do(a) APELANTE: LUIZ HENRIQUE SILVA SANT ANNA - SP289005-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

  

 

V O T O

 

  

 

 Senhores Desembargadores, instituição financeira deduziu pretensão no sentido de afastar a exigibilidade do PIS/COFINS sobre rendimentos auferidos em depósitos ou recolhimentos compulsórios ao Banco Central do Brasil, nos termos do artigo 10, III e IV, da Lei 4.595/1964.

O diploma legal referido corresponde à lei regulatória do sistema financeiro nacional, enquanto  estrutura institucional constituída pelo Conselho Monetário Nacional, Banco Central do Brasil, Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (atualmente BNDES), e demais instituições financeiras públicas e privadas (artigo 1º).

Ao órgão central do sistema, o Conselho Monetário Nacional, incumbe formular política monetária e de crédito, objetivando progresso econômico e social (artigos 2º e 3º), orientando-se por diretrizes fixadas pelo chefe do Poder Executivo quanto a certas atribuições (artigo 4º). Já o Banco Central do Brasil, dentre outras funções, exerce a de órgão executivo da política monetária e de crédito fixada pelo Conselho Monetário Nacional, competindo-lhe, dentre outros deveres:

 

"Art. 10 (...)

(...)

III - determinar o recolhimento de até cem por cento do total dos depósitos à vista e de até sessenta por cento de outros títulos contábeis das instituições financeiras, seja na forma de subscrição de Letras ou Obrigações do Tesouro Nacional ou compra de títulos da Dívida Pública Federal, seja através de recolhimento em espécie, em ambos os casos entregues ao Banco Central do Brasil, a forma e condições por ele determinadas, podendo:       

a) adotar percentagens diferentes em função:    

1. das regiões geoeconômicas;       

2. das prioridades que atribuir às aplicações;     

3. da natureza das instituições financeiras;       

b) determinar percentuais que não serão recolhidos, desde que tenham sido reaplicados em financiamentos à agricultura, sob juros favorecidos e outras condições por ele fixadas.        

IV - receber os recolhimentos compulsórios de que trata o inciso anterior e, ainda, os depósitos voluntários à vista das instituições financeiras, nos termos do inciso III e § 2° do art. 19."    

 

Os recolhimentos compulsórios previstos nos dispositivos acima são considerados instrumentos de política financeira e monetária. A retirada de valores do circuito financeiro regula a liquidez do sistema e expansão de crédito, por consequência controlando efeitos inflacionários. Ademais, os depósitos obrigatórios funcionam como eventual reserva em momentos de crise financeira.

Neste contexto é que se coloca o pleito formulado pelo contribuinte, no sentido de que a remuneração ou rendimentos de recolhimentos compulsórios ao Banco Central do Brasil, no tocante aos juros recebidos, não podem ser considerados como receita para efeito de incidência do PIS/COFINS, na linha do decidido pela Suprema Corte no julgamento dos Temas 808 e 962, pois “nem todas as receitas obtidas pelas instituições financeiras, ainda que indiretamente relacionadas ao seu objeto social, constituem elementos integrantes da base de cálculo do PIS e da COFINS”; sendo que tais depósitos e recolhimentos compulsórios "não decorrem de atividades 'voltada(s) ao mercado, no propósito de entregar-lhe utilidades, conveniência valores e benefícios', extrapolando, portanto, o exercício efetivo do objeto social das instituições financeiras”.

Perscrutando a base legal da tributação de instituições financeiras a título de PIS/COFINS, é clara a legislação específica em dispor que estas são excluídas do regime de não cumulatividade do PIS/COFINS (Leis 10.637/2002 e 10.833/2003: artigo 8º, I), permanecendo vinculadas, portanto, ao regime originário de cumulatividade, atualmente regido pelas Leis 9.718/1998 e 12.973/2014.

O artigo 2º da Lei 9.718/1998 estipula que pessoas jurídicas vinculadas ao regime cumulativo respondem por tais contribuições calculadas sobre o faturamento respectivo. Tal conceito, a teor do artigo 3º, compreende a receita bruta de que trata o artigo 12 do Decreto-lei 1.598/1977, cuja redação foi alterada pela Lei 12.973, de 13/05/2014, passando a ter o seguinte teor:

 

"Art. 12. A receita bruta compreende:  

I - o produto da venda de bens nas operações de conta própria;     

II - o preço da prestação de serviços em geral;    

III - o resultado auferido nas operações de conta alheia; e   

IV - as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas nos incisos I a III.

(...)  

§ 4o Na receita bruta não se incluem os tributos não cumulativos cobrados, destacadamente, do comprador ou contratante pelo vendedor dos bens ou pelo prestador dos serviços na condição de mero depositário.

§ 5o Na receita bruta incluem-se os tributos sobre ela incidentes e os valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, das operações previstas no caput, observado o disposto no § 4º."  

 

Delineado o panorama legal, passando ao exame das razões recursais, não se verifica influxo decisório do que foi objeto de discussão e julgamento nos Temas 808 (RE 855.091) e 962 (RE 1.063.187) na solução da espécie, seja porque envolveram tributos distintos - IRPF e IRPJ/CSL, respectivamente -, sujeitos a regimes constitucionais e legais específicos, como porque não existe inconstitucionalidade por analogia nem por interpretação extensiva, prevalecendo, ao contrário, a presunção de constitucionalidade das leis e, bem assim, e da tributação.

No julgamento do RE 1.063.187 (Tema 962), o acolhimento dos embargos de declaração pela Suprema Corte, ao delimitar com precisão o conteúdo e alcance da declaração de inconstitucionalidade, confirmou que não cabe extrair efeito vinculante do paradigma, envolvendo cobrança de IRPJ/CSL sobre SELIC, percebida por contribuinte em razão de repetição de indébito tributário, para outras hipóteses e situações, que se diferenciem seja pela origem ou natureza do pagamento da taxa (valores vinculados a depósitos judiciais), seja pelo tipo ou espécie tributária (PIS/COFINS).

Tanto assim é que o Superior Tribunal de Justiça, mesmo após os julgamentos dos paradigmas mencionados, segue entendendo que os juros moratórios, tal como os juros remuneratórios, constituem base de cálculo de PIS/COFINS.

Neste sentido:

 

AgInt no REsp 1.977.308, Rel. Min. CAMPBELL MARQUES, DJe de 19/8/2022: “TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES AO PIS/PASEP E COFINS. BASE DE CÁLCULO. DISCUSSÃO SOBRE A EXCLUSÃO DOS JUROS SELIC INCIDENTES QUANDO DA DEVOLUÇÃO DE VALORES EM DEPÓSITO JUDICIAL FEITO NA FORMA DA LEI N. 9.703/98 (JUROS REMUNERATÓRIOS) E QUANDO DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO NA FORMA DO ART. 167, PARÁGRAFO ÚNICO DO CTN (JUROS MORATÓRIOS). APLICAÇÃO DAS CLASSIFICAÇÕES CONTÁBEIS FEITAS NOS PRECEDENTES DO STJ. A RECEITA BRUTA COMPREENDE O LUCRO OPERACIONAL, AS RECEITAS FINANCEIRAS E AS RECUPERAÇÕES OU DEVOLUÇÕES DE CUSTOS. ART. 44, III, LEI Nº 4.506/64. OBRIGAÇÃO DO TRIBUNAL DE MANTER SUA JURISPRUDÊNCIA COERENTE NÃO PODENDO ALTERAR A CLASSIFICAÇÃO LEGAL CONTÁBIL DE UMA VERBA CONFORME O TRIBUTO DE QUE SE TRATA. 1. É pacífico nesta Casa o entendimento de que os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais possuem natureza remuneratória, se enquadrando como Receitas Financeiras, e que os juros moratórios incidentes na repetição do indébito tributário possuem natureza de lucros cessantes, compondo o Lucro Operacional da empresa. Se a base de cálculo das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS compreende a Receita Bruta (art. 1°, §1°, das Leis n.n. 10.637/2002 e 10.833/2003 e arts. 2º e 3º, da Lei n. 9.718/98) por óbvio, tais valores são tributados pelas ditas contribuições, visto que Receita Bruta se trata de conceito mais amplo que engloba tanto o Lucro Operacional quanto as Receitas Financeiras. Assim o precedente repetitivo desta Casa perfeitamente aplicável ao caso em que foram efetuadas as ditas classificações: REsp. n. 1.138.695 / SC, Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22.05.2013. 2. Ainda que se compreenda que especialmente os juros de mora (não os juros remuneratórios dos depósitos judiciais e extrajudiciais) não correspondam a lucros cessantes mas sim a danos emergentes (como o foi recentemente definido pelo Supremo Tribunal Federal em suas razões de decidir no julgamento dos Temas ns. 808 e 962 da Repercussão Geral no RE n. 855.091/RS - para os juros no atraso no pagamento de remuneração por exercício de cargo, emprego ou função - e RE n. 1.063.187/SC - para os juros recebidos em razão de repetição de indébito tributário), tal não lhes retira a condição de verba indenizatória (tanto danos emergentes quanto lucros cessantes são verba indenizatória), o que significa a sua classificação contábil como recuperação ou devolução de custos, o que não lhes permite escapar da classificação como Receita Bruta Operacional, na forma do inciso III, do artigo 44, da Lei n. 4.506/1964. Precedentes: REsp. n. 1.605.245/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 25.06.2019; AgInt no REsp. n. 1.702.295 / PR, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 20.03.2018; REsp. n. 1.466.501 / CE, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 26.05.2015). 3. O fundamento para a negativa da exclusão dos juros remuneratórios ou compensatórios, em quaisquer das situações pleiteadas, da base de cálculo das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS é o mesmo: a sua condição de Receita Bruta, seja porque a integram como Receita Financeira, seja porque constituem Lucro Operacional ou seja porque se classificam como recuperações ou devoluções de custos (e estas classificações não são excludentes, pois receita financeira pode estar dentro ou fora do lucro operacional e ser ou não indenizatória). Em todas as hipóteses os juros (moratórios ou remuneratórios) são Receita Bruta. 4. A condição de verba indenizatória (como dano emergente ou lucro cessante - Temas nsº 808 e 962 da Repercussão Geral do STF, RE nº 855.091 e RE nº 1.063.187) não retira a natureza de Receita Financeira a qual é determinante para o deslinde da causa para as contribuições ao PIS/PASEP e COFINS. Tudo isto porque a base de cálculo das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS é a Receita Bruta e a base de cálculo do IRPJ é o Lucro Real (conceito bem mais restrito que o de Receita Bruta). Sendo assim, retirar os juros da base de cálculo do IRPJ não significa retirá-los da base de cálculo das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS, contudo, reconhecer os juros como integrantes da base de cálculo do IRPJ significa sim os incluir na base de cálculo das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS. 5. O caso é que tanto os juros remuneratórios quanto os juros de mora integram a Receita Bruta Operacional na condição de Receitas Financeiras, ora aliados ao produto da venda de bens e serviços (juros remuneratórios) - art. 44, I, da Lei n. 4.506/64, ora na condição de recuperação de custos/indenizações (juros de mora) - art. 44, III, da Lei n. 4.506/64. Daí a correta aplicação da Súmula n. 568/STJ: "O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema". 6. A ratio decidendi aplicada no REsp. n. 1.138.695-SC e no REsp. n. 1.089.720-RS de que "o acessório segue o destino do principal" diz respeito exclusivamente ao conceito de renda e não ao conceito de receita, que é bem mais largo, não sendo, portanto aplicável no presente caso onde se julga a base de cálculo das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS (receita) e não a base de cálculo do IRPJ e da CSLL (renda e lucro). O precedente REsp. n. 1.138.695-SC o foi invocado exclusivamente para dele extrair a natureza jurídica das verbas em questão e não o destino da tributação, pois o precedente trata de tributos diversos. 7. Agravo interno não provido.”

 

Em verdade, a discussão da base de cálculo de PIS/COFINS de instituições financeiras, perante o Supremo Tribunal Federal, é questão afeta a tema específico: no RE 609.096 foi reconhecida, em 03/03/2011, repercussão geral acerca da "a) Exigibilidade do PIS e da COFINS sobre as receitas financeiras das instituições financeiras; b) Exigência de reserva de plenário para as situações em que se afasta a incidência do disposto no art. 3º, §§ 5º e 6º, da Lei nº 9.718/1998" (Tema 372). Não houve, ainda, julgamento de mérito, para efeito de orientar, vinculativamente, a solução da causa.

Não obstante, como adiantado, a jurisprudência da Corte Superior e deste Tribunal tem sido firmada no sentido de que as receitas financeiras de instituições financeiras se sujeitam à incidência do PIS/COFINS, por externarem resultado da atividade econômica desenvolvida.

Ilustrativamente:

 

REsp 1.187.726, Rel. Min. GURGEL DE FARIA, DJe 11/09/2018: "TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO AO PIS. BASE DE CÁLCULO. RECEITA BRUTA. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RECEITAS FINANCEIRAS. INCLUSÃO. 1. O Supremo Tribunal Federal, há muito, tem pacífico entendimento jurisprudencial segundo o qual a receita bruta ou o faturamento decorre das vendas de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços, sendo, pois, o somatório das receitas resultantes das atividades empresariais. 2. De acordo com esse posicionamento, na base de cálculo da contribuição ao PIS devem ser inseridas as receitas financeiras das atividades desenvolvidas por instituições financeiras, já que fazem parte das receitas oriundas da atividade empresarial. 3. O entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal foi, posteriormente, corroborado pelo legislador ordinário, com a edição da Lei n. 12.976/2014, a qual acresceu o inciso IV ao art. 12 do DL n. 1.598/1977, esclarecendo que "a receita bruta compreende as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica", sendo certo que a referida lei não inovou no ordenamento legal até então vigente, mas tão somente nele inseriu pacífico entendimento jurisprudencial. 4. Hipótese em que o acórdão recorrido está em conformidade com o entendimento do STF. 5. Recurso especial não provido."

 

Nesta Turma, a propósito, já se decidiu que:

 

ApCivRemNec 0003393-34.2006.4.03.6100, Rel. Juiz Conv. RUBENS CALIXTO, julgado em 07/08/2014: "TRIBUTÁRIO. JUROS SOBRE O CAPITAL PRÓPRIO. LEIS 10.637/02 e 10.833/03. INCIDÊNCIA. COFINS. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS E EQUIPARADAS. LEI 9.718/98. CONCEITO DE "RENDA BRUTA OPERACIONAL". INSUFICIÊNCIA DA LEGISLAÇÃO ORDINÁRIA. MISSÃO INTEGRATIVA DO PODER JUDICIÁRIO. INOVAÇÕES DO MERCADO FINANCEIRO MUNDIAL. NOVAS PERSPECTIVAS DE NEGÓCIOS. APLICAÇÕES FINANCEIRAS QUE SE AFIGURAM NOVAS OPÇÕES COMERCIAIS DOS BANCOS E SIMILARES. INSERÇÃO EM SUA ATIVIDADE -FIM. RECEITAS FINANCEIRAS. INCLUSÃO NA RENDA BRUTA OPERACIONAL. 1. A Jurisprudência das duas Turmas do E. Superior Tribunal de Justiça já há muito pacificou-se no de sentido de que sob "a égide das Leis n°s 10.637/02 e 10.833/03, os juros sobre capital próprio integram a base de cálculo da COFINS e do PIS, não se equiparando aos dividendos por possuírem naturezas jurídicas diversas" (AgRg no REsp 964.411/SC, 2ª T., Mi Castro Meira, DJe de 05.10.2009). 2. Controvérsia sobre o conceito de faturamento para o recolhimento da COFINS pelas instituições financeiras e entidades equiparadas. 3. A legislação pátria não contribui satisfatoriamente para esclarecer se as receitas financeiras integram ou não a receita bruta operacional das instituições financeiras e entidades equiparadas. 4. O que se percebe é que nenhum diploma legal esclarece perfeitamente o alcance da receita bruta operacional das instituições financeiras, - pois servem quase exclusivamente à definição de faturamento das empresas que têm como objeto social o oferecimento de bens ou serviços convencionais, como se depreende do art. 44 da Lei 4.506/64, do art. 12 do Decreto-lei 1.598/77 e do art. 44 do Decreto 1.041/94 (RIR). 5. O mesmo ocorre com as Leis 9.701/98 e 9.718/98, as quais, em momento algum, excluem as receitas financeiras do faturamento ou receita operacional dos bancos e similares. 6. Para as instituições financeiras, aplicar seus recursos em títulos públicos, no mercado de derivativos e em outras formas de investimento passou a ser parte de uma estratégia comercial, como forma de adaptação ao mercado financeiro mundial. 7. Enquanto para as empresas comuns as aplicações financeiras são uma garantia contra a desvalorização da moeda ou forma de angariar recursos adicionais, para as instituições financeiras elas consistem numa opção mercadológica de obter maiores lucros com os recursos disponíveis. 8. Estando inseridas na atividade-fim dos bancos, não há como ignorar que as receitas financeiras também integram o seu faturamento e, nesta condição, devem ser incluídas na base de cálculo da COFINS. 9. Não se vislumbra inconstitucionalidade da Lei 9.718/98 na parte em que cuida da matéria referente ao faturamento ou receita bruta das instituições financeiras e entidades equiparadas. 10. Ordem denegada. Sentença reformada 11. Apelação da impetrante que se nega provimento. Apelação da União e remessa oficial providas."

 

Cabe destacar que tal acórdão foi confirmado pela Suprema Corte, que não admitiu recurso extraordinário, por decisão da Presidência em 17/02/2023, por considerar como meramente reflexa eventualmente inconstitucionalidade, inapta a autorizar o exame do mérito ventilado.

Com efeito, esta Turma, por vezes, ao interpretar o consolidado entendimento do Supremo Tribunal Federal de que a receita bruta é o produto das atividades típicas do exercício empresarial, no caso de instituições financeiras, sistematizou os pontos de aproximação e distanciamento entre as noções de “receita financeira”, “receita operacional”, “atividade típica”, “atividade-fim” e “atividade-meio”:

 

ApCiv 0015344-10.2015.4.03.6100, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, e-DJF3 29/11/2017: “APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PIS. COFINS. APLICAÇÃO FINANCEIRA DE VALORES. RESERVAS TÉCNICAS. ATÍVIDADE TÍPICA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Pacífica a jurisprudência do STF quanto à abrangência das receitas advindas das atividades típicas da empresa no conceito de faturamento e receita bruta. 2. A aplicação financeira de valores pelas seguradoras e resseguradoras, para fim de constituição de reservas técnicas à garantia de suas obrigações, é investimento compulsório, determinado pela legislação de regência da matéria. 3. A má administração das reservas técnicas sujeita a seguradora à cessação compulsória, nos termos do Decreto 60.459/1967. 4. A aplicação financeira de valores para a manutenção de ativo garantidor não é investimento discricionário, mas, pelo contrário, integra a própria atividade das seguradoras, enquanto requisito do próprio exercício empresarial, na forma em que regulamentado pelo ordenamento pátrio. 5. O estabelecimento de reserva técnica é atividade típica da seguradora (ou resseguradora), receita que se afigura de cunho operacional. Neste liame, não há identidade entre "atividade típica" e "atividade-fim". Assim, a apelante não tem por objetivo a aplicação financeira de ativos, mas por certo se trata de atividade inerente ao seu exercício empresarial. 6. Apelação desprovida.”

 

ApCiv 0003471-76.2016.4.03.6100, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, e-DJF3 29/08/2017: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. NULIDADE DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. EXAME DE MÉRITO NESTA CORTE. ARTIGO 1.013, § 3º, IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. SOCIEDADE DE CAPITALIZAÇÃO. PIS E COFINS. RECEITA BRUTA OU FATURAMENTO. ATIVIDADES EMPRESARIAIS TÍPICAS. PRETENSÃO DE RESTRIÇÃO À REMUNERAÇÃO DIRETA (QUOTAS DE CARREGAMENTO). DESCABIMENTO. 1. Limitando-se a sentença a mencionar matéria estranha à lide e a apontar precedentes sem demonstração de pertinência com a causa, reconhece-se nulidade por ausência de fundamentação, nos termos do artigo 489, §1º, V, do CPC, sem prejuízo do exame direto do mérito, pela Corte, nos termos do artigo 1.013, § 3º, IV, do Código de Processo Civil. 2. À luz da prova dos autos, especialmente modelos contratuais juntados, a reserva de capitalização, a ser resgatada pelo subscritor do titulo, é formada por quota de capitalização, a ser remunerada, atualizada e capitalizada segundo índices contratuais, de sorte que, na eventualidade de que a aplicação de tais reservas, segundo os critérios definidos pela legislação, proporcione rendimento superior ao devido, pela sociedade de capitalização, aos contratantes, tais montantes serão absorvidos pela empresa. Descabe, portanto, afirmar que a integralidade de tais valores meramente transita pela escrituração contábil da empresa. 3. Independentemente da segmentação do prêmio recebido pelas sociedades de capitalização em quotas (de capitalização, de sorteio e de carregamento), há apropriação integral dos valores. Com efeito, as sociedades de capitalização captam recursos e deles usufruem (prerrogativa típica de direito de propriedade), seja por remuneração direta ou a partir do investimento dos montantes, compulsório ou não, disponíveis ou não os resultados financeiros respectivos, que passam a integrar seu patrimônio. O fato de, em contrapartida à apropriação de tais valores, prever-se futuro lançamento em conta de passivo - que, por definição, não equivalerá ao montante captado, tampouco à soma do montante investido com o total de rendimentos a partir daí auferido - não permite descaracterizar sua qualificação como receita bruta. 4. A tributação de PIS e COFINS ocorre na entrada de recursos financeiros. O fato gerador, no caso do regime cumulativo, incide quando auferidos valores, no momento de sua integração à esfera patrimonial do contribuinte, desde logo verificado o incremento de ativo que ampara a subsunção normativa. A caracterização de determinado ingresso especificamente como receita bruta depende, assim, de sua origem, e não de sua destinação posterior - conforme as hipóteses constantes do artigo 12 do Decreto-Lei 1.598/1977. Desta maneira, a pretensão de desconto de lançamentos em conta de passivo da base de cálculo tende a paulatinamente afastar a tributação do faturamento e, indevidamente, aproximá-la do lucro - tributação de saída, exemplificada na CSLL. 5. A rigor, o legislador, por suas razões, autoriza exclusões da base de cálculo. Não se quer dizer, porém, que tais valores não sofreram incidência da norma exacional - ou seja, não caracterizavam matéria, a priori, tributável. A representação dogmática de tal estrutura legal, em verdade, é a de que, não obstante tais ingressos configurem, no caso do PIS e COFINS cumulativos, receita bruta, há autorização para sua exclusão da base de cálculo: a norma incide, mas sua eficácia é inibida. 6. Especificamente no regime cumulativo a que sujeito a apelante, e no que atinente à espécie, a legislação de regência autoriza a exclusão de determinadas rubricas integrantes da base de cálculo, conforme os artigos 1º, VI, da Lei 9.701/1998, e 3º, § 6º, IV e § 7º, da Lei 9.718/1998: parcela dos prêmios destinada à constituição de provisões ou reservas técnicas e rendimentos auferidos nas aplicações financeiras destinadas ao pagamento de resgate de títulos - dedução restrita aos rendimentos de aplicações financeiras proporcionados pelos ativos garantidores das provisões técnicas, no limite do valor de tais reservas. 7. Consolidada a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a receita bruta traduz-se na totalidade dos ingressos decorrentes das atividades empresariais típicas, e não só o produto de venda de mercadorias e serviços. 8. Se determinada receita financeira origina-se da persecução do objeto social da empresa, tal ingresso integrará a receita bruta. Não há incompatibilidade ontológica entre receita financeira e receita operacional, pelo que nada impede a convergência da classificação sobre determinado recebimento. 9. Não há identidade entre "atividade típica" e "atividade-fim" e, no caso, a apelante não tem por objetivo a aplicação financeira de ativos, mas por certo se trata de atividade inerente ao exercício empresarial. Nestes termos, o estabelecimento de reserva técnica é, à toda vista, atividade típica da empresa de capitalização, pelo que se conclui que a receita daí decorrente possui natureza operacional. Cabível, por conseguinte, sua inclusão na base de cálculo do PIS e da COFINS, como exigido pela autoridade impetrada. 10. Apelo parcialmente acolhido para anular a sentença para, em prosseguimento, nos termos do artigo 1.013, § 3º, VI, CPC/2015, denegar a ordem.

 

Como se vê, é da jurisprudência desta Turma que “atividade típica” é aquela inerente à prática do objetivo principal da empresa, seja esta a própria atividade-fim ou qualquer operação efetuada para viabilizá-la. Daí se conclui tanto que receitas financeiras podem advir de atividades típicas (assim se qualificando como receitas operacionais) como também que entradas derivadas de atividades legalmente impostas como condicionantes do exercício econômico principal são, ao fim e ao cabo, expressões do objeto empresarial.

Não há por que considerar que as receitas devem advir necessariamente de atividades típicas e voluntárias da empresa. Se para o Direito Tributário é indiferente até mesmo a ilicitude da operação pelo qual consubstanciado o fato gerador ("non olet"), a suposta involuntariedade do ganho econômico não poderia ensejar conclusão diversa.

Não há nada no conceito de receita bruta que exija voluntariedade. De fato, toda a exegese empreendida na jurisprudência nas últimas décadas sobre o conceito de faturamento teve como propósito justamente superar a noção de que tal grandeza deve ser adstrita à prestação de serviços ou venda de bens, enquanto operações sinalagmáticas clássicas do direito comercial (modais de relações contratuais, volitivas por definição, de prestação e contraprestação) e dos primórdios da conceituação de empresa. A evolução das estruturas tecnológicas, econômicas e financeiras no bojo das quais a atividade empresarial é exercida oportunizou, igualmente, a idealização de novos métodos e arranjos organizacionais capazes de produção de riqueza. É possível identificar, atualmente, inúmeras operações econômicas que não são plenamente contraprestacionais – pense-se, por todos, no modelo negocial das holdings

O que prevalece, assim (e, como de resto, é regra de lógica e hermenêutica), para se identificar um gênero de agrupamento de objetos, não são características acessórias ou contingentemente individuais, mas sim o elemento nuclear partilhado por todos os itens sob estudo. Assim foi a lapidação empreendida pela jurisprudência: receita bruta advém do objeto principal da empresa. As espécies ou subgêneros de operações desempenhadas no exercício econômico da atividade principal podem ser segregadas a partir da identificação de relações contratuais sinalagmáticas (como é, usualmente, a prestação de serviços e venda de bens) ou não, finalísticas ou não, voluntárias ou legalmente impostas (inclusive porque não há porque se assumir aprioristicamente que dever legal que gera receita seria economicamente desinteressante), porém tal classificação é inócua para tentativamente afastar a percepção de que estão compreendidas perante o mesmo denominador comum conceitual.

Neste liame, observa-se que, ao contrário de outros setores, as pessoas jurídicas que atuam e integram o sistema financeiro nacional sujeitam-se à detalhada regulação, forte disciplina e permanente fiscalização das atividades que, inclusive, apenas podem ser exercidas com autorização do Banco Central do Brasil, nos termos do artigo 10, X, da Lei 4.595/1964, cujas alíneas enumeram a extensão das atribuições autárquicas, que abrangem, inclusive, a expedição de autorização para alteração dos estatutos das instituições financeiras.

Não é livre, pois, o objeto social estatutariamente descrito nos atos constitutivos das instituições financeiras, de modo que sinalizam conteúdo autorizado pelo Banco Central do Brasil e deve, portanto, ser alinhado à previsão legal específica, diferentemente de outros setores em que prevalece o princípio da liberdade econômica, de que deriva maior aptidão para definição, em livre iniciativa, dos diversos aspectos da atuação econômica empresarial.

Neste sentido é que se insere a própria exigência legal de depósitos ou recolhimentos compulsórios ao Banco Central do Brasil, nos termos do artigo 10, III e IV, da Lei 4.595/1964, que, como visto de início, se destinam a controlar a oferta e a liquidez da moeda no mercado para efeito de administração da política monetária e de crédito, importantes instrumentos diretivos do desenvolvimento econômico e social no regime de liberdade de iniciativa econômica com garantia de direitos fundamentais.

Por conceito legal e natureza jurídica, evidencia-se que tais depósitos ou recolhimentos são compulsórios porque têm relação direta com o próprio desenvolvimento da atividade principal das instituições financeiras, na medida em que servem de instrumento legal para o controle da oferta da moeda e de crédito, repercutindo, assim, direta e incisivamente na própria atividade de captação e concessão de créditos das instituições financeiras ao respectivo mercado.

No caso dos autos, é indissociável, por definição legal, da atividade típica das instituições financeiras, o cumprimento da obrigação legal de depositar e recolher compulsoriamente certa parcela de valores captados nas atividades típicas realizadas, segundo respectivo objeto social e previsão legal, para viabilidade do próprio sistema financeiro, em parâmetros e em ambiente de segurança, equilíbrio e estabilidade monetária, na perspectiva da consecução da política de controle da inflação e dos juros, essencial ao desenvolvimento eficiente da atuação econômica das instituições financeiras e do mercado em geral.

Por este enfoque, portanto, os recolhimentos compulsórios tratados nestes autos não fogem à regra geral que se vislumbra da formação da jurisprudência desta Turma sobre o tema, no sentido de que a remuneração de aplicações obrigatórias, por lei, efetuadas por instituições financeiras, configuram receita de atividade principal destas empresas (artigo 12, IV, do Decreto-lei 1.598/1977) e, assim, sujeitam-se à incidência de PIS/COFINS (artigo 3º, caput, da Lei 9.718/1998).

O caso assim, é de denegação da segurança, restando prejudicado o pedido de compensação dos supostos indébitos indicados.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

É como voto.

 


   



E M E N T A

 

 

DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DEPÓSITOS COMPULSÓRIOS. BACEN. RENDIMENTOS. REGULAÇÃO SETORIAL. PIS E COFINS. INCIDÊNCIA. RECEITA FINANCEIRA E OPERACIONAL VINCULADA AO OBJETO SOCIETÁRIO. TIPICIDADE. CARACTERIZAÇÃO.

1. Instituição financeira deduziu pretensão no sentido de afastar a exigibilidade do PIS/COFINS sobre rendimentos auferidos em depósitos ou recolhimentos compulsórios ao Banco Central do Brasil, nos termos do artigo 10, III e IV, da Lei 4.595/1964.

2. Não se verifica influxo decisório do que foi objeto de discussão e julgamento nos Temas 808 (RE 855.091) e 962 (RE 1.063.187) na solução da espécie, porque envolveram tributos distintos - IRPF e IRPJ/CSL, respectivamente -, sujeitos a regimes constitucionais e legais específicos. Tanto assim é que o Superior Tribunal de Justiça, mesmo após os julgamentos dos paradigmas mencionados, segue entendendo que os juros moratórios, tal como os juros remuneratórios, constituem base de cálculo de PIS/COFINS.

3. Esta Turma, por vezes, ao interpretar o consolidado entendimento do Supremo Tribunal Federal de que a receita bruta é o produto das atividades típicas do exercício empresarial, no caso de instituições financeiras, sistematizou os pontos de aproximação e distanciamento entre as noções de “receita financeira”, “receita operacional”, “atividade típica”, “atividade-fim” e “atividade-meio”. Nesta linha, se determinada receita financeira origina-se da persecução do objeto social da empresa, tal ingresso integrará a receita bruta. Não há incompatibilidade ontológica entre receita financeira e receita operacional, pelo que nada impede a convergência da classificação sobre determinado recebimento (ApCiv 0003471-76.2016.4.03.6100, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, e-DJF3 29/08/2017). De outra parte, o estabelecimento, por exemplo, de reservas técnicas (no caso de seguradoras) é atividade típica, e os juros desses aportes configuram receita operacional, pois não há sinonímia entre “atividade típica” e “atividade-fim”. Seguradoras não têm por objetivo a aplicação financeira de ativos (trata-se de "atividade-meio", derivada de exigência legal), mas por certo se trata de operação inerente ao seu exercício empresarial (ApCiv 0015344-10.2015.4.03.6100, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, e-DJF3 29/11/2017).

4. É da jurisprudência desta Turma, portanto que “atividade típica” é aquela inerente à prática do objetivo principal da empresa, seja esta a própria atividade-fim ou qualquer operação efetuada para viabilizá-la. Daí se conclui tanto que receitas financeiras podem advir de atividades típicas (assim se qualificando como receitas operacionais) como que entradas derivadas de atividades legalmente impostas como condicionantes do exercício econômico principal são, ao fim e ao cabo, expressões do objeto empresarial.

5. Não há por que considerar que as receitas devem advir necessariamente de atividades típicas e, adicionalmente, voluntárias da empresa. Se para o Direito Tributário é indiferente até mesmo a ilicitude da operação pelo qual consubstanciado o fato gerador ("non olet"), a suposta involuntariedade do ganho econômico não poderia ensejar conclusão diversa. Não há nada no conceito de receita bruta que exija voluntariedade. De fato, toda a exegese empreendida na jurisprudência nas últimas décadas sobre o conceito de faturamento teve como propósito justamente superar a noção de que tal grandeza deve ser adstrita à prestação de serviços ou venda de bens, enquanto operações sinalagmáticas clássicas do direito comercial (modais de relações contratuais, volitivas por definição, de prestação e contraprestação) e dos primórdios da conceituação de empresa. A evolução das estruturas tecnológicas, econômicas e financeiras no bojo das quais a atividade empresarial é exercida oportunizou, igualmente, a idealização de novos métodos e arranjos organizacionais capazes de produção de riqueza. O que prevalece, assim (e, como de resto, é regra de lógica e hermenêutica), para se identificar um gênero de agrupamento de objetos, não são características acessórias ou contingentemente individuais, mas sim o elemento nuclear partilhado por todos os itens sob estudo. As espécies ou subgêneros de operações desempenhadas no exercício econômico da atividade principal podem ser segregadas a partir da identificação de relações contratuais sinalagmáticas ou não, finalísticas ou não, voluntárias ou legalmente impostas, porém tal classificação é inócua para tentativamente afastar a percepção de que estão compreendidas perante o mesmo denominador comum conceitual.

6. Não é livre, pois, o objeto social estatutariamente descrito nos atos constitutivos das instituições financeiras, de modo que sinalizam conteúdo autorizado pelo Banco Central do Brasil e deve, portanto, ser alinhado à previsão legal específica, diferentemente de outros setores em que prevalece o princípio da liberdade econômica, de que deriva maior aptidão para definição, em livre iniciativa, dos diversos aspectos da atuação econômica empresarial. Neste sentido é que se insere a própria exigência legal de depósitos ou recolhimentos compulsórios ao Banco Central do Brasil, nos termos do artigo 10, III e IV, da Lei 4.595/1964, que se destinam a controlar a oferta e a liquidez da moeda no mercado para efeito de administração da política monetária e de crédito, importantes instrumentos diretivos do desenvolvimento econômico e social no regime de liberdade de iniciativa econômica com garantia de direitos fundamentais.

7. É indissociável, por definição legal, da atividade típica das instituições financeiras, o cumprimento da obrigação legal de depositar e recolher compulsoriamente certa parcela de valores captados nas atividades típicas realizadas, segundo respectivo objeto social e previsão legal, para viabilidade do próprio sistema financeiro, em parâmetros e em ambiente de segurança, equilíbrio e estabilidade monetária, na perspectiva da consecução da política de controle da inflação e dos juros, essencial ao desenvolvimento eficiente da atuação econômica das instituições financeiras e do mercado em geral. Por este enfoque, portanto, os recolhimentos compulsórios tratados nestes autos não fogem à regra geral que se vislumbra da formação da jurisprudência desta Turma sobre o tema, no sentido de que a remuneração de aplicações obrigatórias, por lei, efetuadas por instituições financeiras, configuram receita de atividade principal destas empresas (artigo 12, IV, do Decreto-lei 1.598/1977) e, assim, sujeitam-se à incidência de PIS/COFINS (artigo 3º, caput, da Lei 9.718/1998).

8. Apelação desprovida.

 


 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.