Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0004601-55.2017.4.03.6104

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: EDUARDO DE PAULA SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: ALEX VICENTE FERNANDES - SP296356-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0004601-55.2017.4.03.6104

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: EDUARDO DE PAULA SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: ALEX VICENTE FERNANDES - SP296356-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

A JUÍZA FEDERAL CONVOCADA MONICA BONAVINA: 

 

Trata-se de recurso de Apelação interposto pela Defesa de EDUARDO DE PAULA SOUZA, nascido em 21.07.1971, em face da r. sentença proferida pelo Exmo. Juiz Federal Roberto Lemos dos Santos Filho (1ª Vara Federal de Santo André/SP – ID 150855177 p. 92/119), publicada em 30.04.2019 (ID 150855177 p. 120), que julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado pela r. denúncia e (a) CONDENOU o réu, pela prática do crime previsto no artigo 299, do Código Penal (por três vezes), à pena corporal de 03 (três) anos de reclusão, a ser cumprido em regime inicial ABERTO, acrescida ao pagamento de 30 (trinta) dias-multa, cada qual fixado em 01/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Restou substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena aplicada, e prestação pecuniária no valor de 03 (três) salários mínimos, destinados a instituição pública ou privada com destinação social e (b) ABSOLVER Paulo Hermínio Forseto, Hilário da Graça Dias Pelegrino e Rodrigo Oliveira Dias, na forma do artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal.  

 

Consta da r. denúncia, em síntese, que (ID 150855176 p. 11/16): 

 

“(...) 

Nos dias 08.01.2014 e 10.01.2014 na Alfândega do Porto de Santos/SP, em conluio e unidade de desígnios, EDUARDO DE PAULA SOUZA, administrador da pessoa jurídica EJJE COMÉRCIO IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA ME, importadora das cargas amparadas pelos Conhecimentos marítimos M5C0Q2864265, M5CUQ2864240 (palhetas de limpador de para-brisas, transportadas pelo navio MSC ALGHERO) e 5HA5T513120379 (lâmpadas halógenas para autos, transportada pelo navio VALENCE), todas provenientes da República Popular da China, PAULO HERNÍNIO FORSETO, despachante aduaneiro administrador da pessoa jurídica COMEX SERVIÇOS ESPECIALIZADOS LTDA, articulador da interposição fraudulenta, HILÁRIO DA GRAÇA DIAS PELEGRINO, administrador das pessoas jurídicas RUCHI IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO AUTOMOTIVOS LTDA e CERTA IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO DE PEÇAS E ACESSÓRIOS AUTOMOTIVOS LTDA, e RODRIGO OLIVEIRA DIAS, administrador da pessoa jurídica NA TELA IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO DE AUTO PEÇAS E ACESSÓRIOS LTDA, verdadeiras adquirentes daquelas mercadorias, os denunciados inseriram em documentos particulares (DIs n° 14/0049866-1, 14/0068708-1 e 14/0068991-2) declaração falsa com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, a identidade dos reais adquirentes das mercadorias importadas. 

Consoante o Processo Administrativo Fiscal nº 11128.725.049/2014-62 (Apenso I), as três declarações de importação registradas pela EJJE foram parametrizadas no canal vermelho de conferência em razão da existência de indícios da ocultação do real adquirente das mercadorias. 

Em resposta ao Termo de Início de Ação Fiscal e de Intimação (fls. 85/258 - Apenso 1), recebido no dia 23.01.2014 (fls. 80/81 - Apenso 1), a importadora alegou que os recursos necessários para a empresa operar no comércio exterior foram originados de dois empréstimos: o primeiro, datado de 25.09.2013, concedido pela pessoa jurídica COMEX, comissária de despacho que atuou nos processos de importação, no montante de R$ 182.100,00 (fl. 96 - Apenso 1); o segundo, datado de 18.11.2013, concedido por Janaína Melo de Paula Souza, sócia da EJJE, no valor de R$ 140.545,92 (fls. 94/95 - Apenso 1). 

A sócia Janaína Melo de Paula Souza alegou que os recursos disponibilizados à EJJE foram oriundos da venda de um bem imóvel de sua propriedade, pelo valor de R$ 170 mil, mas esta importância não transitou na sua conta bancária pessoal porque o pagamento se deu em cheque e em espécie. Sustentou que depositou o dinheiro na conta bancária da EJJE nos dias 27.11.2013 (R$ 109.900,00) e 03.12.2013 (R$ 30 mil). 

No entanto, de acordo com os extratos de movimentação da conta-corrente da EJJE (fl. 111 - Apenso 1), aqueles depósitos foram realizados mediante transferência especial de crédito (TEC) de uma conta bancária cuja titularidade não foi identificada. 

De outro lado (fls. 91/92 - Apenso 1), a COMEX realmente efetuou o depósito do empréstimo por ela concedido na conta-corrente da EJJE nos dias 27.09.2013 (R$ 40 mil), 07.10.2013 (R$ 100 mil), 08.10.2013 (R$ 37 mil), 09.10.2013 (R$ 3 mil), 15.10.2013 (R$ 1.500,00) e 31.10.2013 (R$ 600,00). 

Na mesma resposta à Alfandega (fls. 117/123 - Apenso I), a importadora apresentou o controle de pagamentos e os recibos dos boletos de pagamento dos seus clientes, quais sejam, as pessoas jurídicas RUCHI, CERTA e NA TELA, todas do ramo de comércio por atacado de peças e acessórios novos para veículos automotores (fls. 115/116, 117/119 e 122/123).  

Anote-se que na data dos fatos a EJJE tinha como objeto social o comércio varejista de produtos alimentícios e serviços de escritório. Contudo, no dia 12.02.2014, i.e., após o recebimento do Termo de Início de Ação Fiscal e de Intimação, a importadora alterou o seu objeto social para incluir o comércio por atacado de peças e acessórios novos para veículos automotores (ficha cadastral anexa). 

Após a instrução processual (fls. 260/269 - Apenso 1), a Receita Federal julgou procedente a ação fiscal e aplicou a pena de perdimento das mercadorias apreendidas. 

Ouvida perante a autoridade policial (fls. 22/23), Janaína Melo de Paula Souza, sócia da EJJE e esposa do acusado EDUARDO DE PAULA SOUZA, afirmou que o seu marido foi o responsável pelas operações de importação e que as mercadorias se destinavam à distribuidora de peças automotivas RUCHI, que foi indicada pelo acusado PAULO HERMÍNIO FORSETO. Informou que uma pessoa chamada “RODRIGO”, representando a pessoa jurídica RUCHI, procurou o seu marido para tratar das importações. Por fim, disse que estas foram as únicas importações realizadas pela empresa. 

Por sua vez (fls. 25/26 e 59), EDUARDO DE PAULA SOUZA, administrador da EJJE, reiterou as informações prestadas pela sua esposa e acrescentou que as mercadorias estavam sendo oferecidos às pessoas jurídicas RUCHI, CERTA, e na TELA, todas indicadas pelo despachante aduaneiro PAULO HERMÍNIO FORSETO, quem, inclusive, concedeu um empréstimo à EJJE para custear, parcialmente, as importações. 

Inquirido pela autoridade policial (fl. 27), PAULO HERMÍNIO FORSETO, administrador da comissária de despachos COMEX, confirmou as informações prestadas pelos sócios da EJJE. Afirmou que indicou clientes em potencial a EDUARDO DE PAULA SOUZA para a revenda das mercadorias e que concedeu um empréstimo para custear as importações. Finalmente, disse que foi o responsável pelo registro das três declarações de importação e que estas foram as únicas importações realizadas pela empresa. 

O denunciado HILÁRIO DA GRAÇA DIAS PELEGRINO (fls. 162/163), administrador das pessoas jurídicas RUCHI e CERTA, apesar de ter negado a realização da transação comercial com a EJJE, afirmou conhecer EDUARDO DE PAULA SOUZA e PAULO HERMÍNIO FORSETO, tendo este, inclusive, prestado-lhe serviços de despachante. 

Já RODRIGO OLIVEIRA DIAS (fls. 147/148), administrador da pessoa jurídica NA TELA e filho do acusado HILÁRIO DA GRAÇA DIAS PELEGRINO, afirmou que manteve contato por e-mail com EDUARDO DE PAULA SOUZA, respondendo mensagens enviadas ao seu pai, mas alegou não se recordar se efetuou transação comercial com as pessoas jurídicas investigadas. Finalmente, informou que PAULO HERMÍNIO FORSETO prestava serviços para a sua empresa. 

Conclui-se, portanto, que as pessoas jurídicas RUCHI, CERTA e NA TELA, todas clientes da comissária de despacho COMEX, eram as verdadeiras adquirentes das mercadorias apreendidas. 

 (...). ” 

 

A r. denúncia foi recebida em 21.08.2017 (ID 150855176 p. 19/21). 

 

A Defesa de EDUARDO DE PAULA SOUZA apresentou razões de Apelação (ID 150855177 p. 130/139), pleiteando, em síntese: i) ilegitimidade passiva do acusado e sua consequente absolvição; ii) existência de prejuízo à Defesa causada pela perda do áudio da primeira audiência de instrução e iii) absolvição do acusado por ausência de provas suficientes para sustentar uma condenação. 

 

Contrarrazões pelo Ministério Público Federal (ID 150855177 p. 148/154). 

 

A Procuradoria Regional da República ofertou parecer (ID 150855177 p. 173/180) manifestando-se pelo desprovimento da Apelação. 

 

É o relatório. 

 

À revisão. 

 

  

 

 


APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0004601-55.2017.4.03.6104

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: EDUARDO DE PAULA SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: ALEX VICENTE FERNANDES - SP296356-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

Acompanho integralmente a e. Relatora quanto ao mérito, mas peço vênia para dela divergir apenas para, de ofício, aplicar a continuidade delitiva, pelos motivos que passo a expor.

 

Segundo narra a denúncia, in verbis:

 

“(...) 

Nos dias 08.01.2014 e 10.01.2014 na Alfândega do Porto de Santos/SP, em conluio e unidade de desígnios, EDUARDO DE PAULA SOUZA, administrador da pessoa jurídica EJJE COMÉRCIO IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA ME, importadora das cargas amparadas pelos Conhecimentos marítimos M5C0Q2864265, M5CUQ2864240 (palhetas de limpador de para-brisas, transportadas pelo navio MSC ALGHERO) e 5HA5T513120379 (lâmpadas halógenas para autos, transportada pelo navio VALENCE), todas provenientes da República Popular da China, PAULO HERNÍNIO FORSETO, despachante aduaneiro administrador da pessoa jurídica COMEX SERVIÇOS ESPECIALIZADOS LTDA, articulador da interposição fraudulenta, HILÁRIO DA GRAÇA DIAS PELEGRINO, administrador das pessoas jurídicas RUCHI IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO AUTOMOTIVOS LTDA e CERTA IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO DE PEÇAS E ACESSÓRIOS AUTOMOTIVOS LTDA, e RODRIGO OLIVEIRA DIAS, administrador da pessoa jurídica NA TELA IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO DE AUTO PEÇAS E ACESSÓRIOS LTDA, verdadeiras adquirentes daquelas mercadorias, os denunciados inseriram em documentos particulares (DIs n° 14/0049866-1, 14/0068708-1 e 14/0068991-2) declaração falsa com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, a identidade dos reais adquirentes das mercadorias importadas

Consoante o Processo Administrativo Fiscal nº 11128.725.049/2014-62 (Apenso I), as três declarações de importação registradas pela EJJE foram parametrizadas no canal vermelho de conferência em razão da existência de indícios da ocultação do real adquirente das mercadorias.  Negritei.

 

Analisando o conjunto probatório, tenho que as condutas de inserir as declarações falsas nas três DIs acima descritas foram praticadas em continuidade delitiva.

Isso porque depreende-se dos autos que as informações falsas foram inseridas nas DIs n° 14/0049866-1, 14/0068708-1 e 14/0068991-2, respectivamente, nos dias 08.01.2014 e 10.01.2014, nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução.

Assim dispõe o art. 71 do Código Penal, in verbis:

 

Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.    

 

Nesse sentido, já decidiu esta E. Décima Primeira Turma, conforme ementa a seguir descrita:

 

“APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 299 DO CP. INSERÇÃO DE INFORMAÇÃO FALSA EM DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO. PRESCRIÇÃO PARCIAL EM RELAÇÃO AOS FATOS PRATICADOS ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DA LEI 12.234/10. AFASTADO O PEDIDO DE REUNIÃO DE PROCESSOS. DENÚNCIA PREENCHE OS REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. ART. 396 DO CPP. MÉRITO. CONDENAÇÃO MANTIDA. REDIMENSIONAMENTO DA DOSIMETRIA.

(...)

A empresa High Tech Importação Exportação e Comércio de Equipamentos Elétricos do Brasil LTDA registrou Declarações de Importação contendo informações ideologicamente falsas no tocante ao real adquirente das mercadorias e ao exportador, tendo sido identificada, ainda, omissão em relação à vinculação entre exportador e importador.

Nos moldes em que realizadas, as operações de importações enquadravam-se nas modalidades “por conta e ordem de terceiro” ou “importação sob encomenda”, sendo que em ambos os casos devem ser informados na Declaração de Importação o verdadeiro adquirente/encomendante e a modalidade de importação praticada, uma vez que nessas hipóteses incide regramento tributário específico, inclusive havendo responsabilidade solidária entre a empresa importadora e a adquirente, nos termos da Lei 11.281/06.

Em todas as DIs emitidas entre 01/07/2010 e 22/10/2010 houve a inserção de informação ideologicamente falsa no que se refere ao exportador (MN Trade), uma vez que na data das importações a empresa MN Trade Inc já estava inativa por dissolução administrativa.

Os réus dolosamente optaram por inserir nas DIs informação inverídica, como se as mercadorias fossem destinadas à High Tech, de modo a ocultar o real adquirente. Dolo específico evidenciado.

Mantida a condenação pela prática do crime previsto no art. 299 do CP, na forma do art. 71 do CP.

Redimensionamento, de ofício, da pena imposta aos réus em razão da prescrição parcial. Pena definitivamente fixada em 2 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial aberto, e 25 dias-multa, mantido o valor unitário fixado na sentença. Redução da prestação pecuniária, de ofício, para o equivalente a 50 (cinquenta) salários mínimos em favor da União, considerando que uma parcela dos fatos foi atingida pela prescrição.

Apelações parcialmente providas.” Negritei. (11ª Turma – ACR 0006340-94.2016.4.03.6105 – Rel. Des. Fed. José Lunardelli – Julgada em 24.06.2021).

 

Considerando que foram praticadas três infrações em continuidade delitiva, deve ser aplicada a fração de aumento em 1/5, em consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

 

PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ROUBO DUPLAMENTE CIRCUNSTANCIADO. DOSIMETRIA. AUMENTO SUPERIOR A 1/3 PELA INCIDÊNCIA DAS DUAS MAJORANTES. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA/STJ 443. CONTINUIDADE DELITIVA ENTRE AS TRÊS CONDUTAS PERPETRADAS. EXASPERAÇÃO DE 1/5 CABÍVEL. WRIT NÃO CONHECIDO E HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO. [...] 4. A exasperação da pena do crime de maior pena, realizado em continuidade delitiva, será determinada, basicamente, pelo número de infrações penais cometidas, parâmetro este que especificará no caso concreto a fração de aumento, dentro do intervalo legal de 1/6 a 2/3. Nesse diapasão, esta Corte Superior de Justiça possui o entendimento consolide de que, em se tratando de aumento de pena referente à continuidade delitiva, aplica-se a fração de aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4 para 4 infrações; 1/3 para cinco infrações; 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações. Precedentes. (STJ, 5ª Turma, HC 2356275/RJ, Relator(a) Ministro RIBEIRO DANTAS (1181), Dje 19/12/2016)

 

DOSIMETRIA DAS PENAS

 

A dosimetria das penas foi fundamentada nos seguintes termos, pela sentença apelada (e mantida pela e. Relatora), in verbis:

 

“(...)

EDUARDO DE PAULA SOUZA não registra antecedentes criminais; sua culpabilidade não é acima da média para o delito; não há nos autos registros desabonadores da sua conduta social e personalidade.

Diante dessas considerações, na primeira fase, fixo a pena-base no mínimo legal de 1 (um) ano de reclusão, em regime aberto, e o pagamento de 10 (dez) dias-multa para cada um dos 3 (três) delitos imputados ao réu.

Prosseguindo, à míngua de circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como de causas de aumento e de diminuição de pena e, diante do disposto no artigo 69 do Código Penal (concurso material de crimes), fica estabelecido o total da condenação imposta a EDUARDO DE PAULO SOUZA em 3 (três) anos de reclusão, em regime inicial aberto, mais o pagamento de 30 (trinta) dias-multa, que deverão ser calculados à razão de 1/30 (um trigésimo) do valor do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.

Por força do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos consistentes em: (1) prestação de serviços à comunidade ou entidades filantrópicas ou assistenciais pelo prazo da pena privativa de liberdade substituída, na forma e condições a serem definidas pelo juízo da execução penal; (2) prestação pecuniária, no valor de 3 (três) salários mínimos, a ser pago a instituição pública ou privada, com destinação social, a ser designada pelo juízo da execução. (...). ”

 

Divirjo, portanto, apenas para aplicar a continuidade delitiva (e não o concurso material), majorando a pena de 01 (um) ano, fixada para cada um dos delitos, em 1/5 (um quinto), totalizando a pena definitiva do réu em 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.

Mantido o regime inicial aberto, bem como substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena aplicada, e prestação pecuniária no valor de 03 (três) salários mínimos, destinados a instituição pública ou privada com destinação social.

No mais, acompanho o voto da e. Relatora.

Dispositivo

Diante do exposto, nego provimento à apelação da defesa e, de ofício, aplico a continuidade delitiva (art. 71, CP), fixando a pena definitiva do réu em 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, no regime inicial aberto, e 12 (doze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos. Substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena aplicada, e prestação pecuniária no valor de 03 (três) salários mínimos, destinados a instituição pública ou privada com destinação social

É o voto.


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0004601-55.2017.4.03.6104

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: EDUARDO DE PAULA SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: ALEX VICENTE FERNANDES - SP296356-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

A JUÍZA FEDERAL CONVOCADA MONICA BONAVINA:

 

Segundo constou na exordial acusatória (ID 150855176 p. 11/16), nos dias 08.01.2014 e 10.01.2014, na Alfândega do Porto de Santos/SP, EDUARDO DE PAULA SOUZA na qualidade de administrador da pessoa jurídica EJJE Comércio Importação e Exportação Ltda. ME, importadora das cargas amparadas pelos Conhecimentos Marítimos MSCUQ2864265, MSCUQ2864240 (palhetas de limpador de para-brisas, transportadas pelo navio MSC ALGHERO) e SHASTS13120379 (lâmpadas halógenas para autos, transportada pelo navio VALENCE), todos provenientes da República Popular da China, teria inserido em documentos particulares (DIs 14/0049866-1, 14/0068708-1 e 14/0068991-2), declaração falsa com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, os reais adquirentes das mercadorias importadas, em conluio e com unidade de desígnios com Paulo Herminio Forseto (despachante aduaneiro administrador da pessoa jurídica COMEX SERVIÇOS ESPECIALIZADOS LTDA), o qual teria sido o articulador da imputada interposição fraudulenta, Hilário da Graça Dias Pelegrino (administrador das pessoas jurídicas RUCHI IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO AUTOMOTIVOS LTDA e CERTA IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO DE PEÇAS E ACESSÓRIOS AUTOMOTIVOS LTDA) e Rodrigo Oliveira Dias (administrador da pessoa jurídica NA TELA IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO DE AUTO PEÇAS E ACESSÓRIOS LTDA), empresas que, segundo a denúncia, seriam as verdadeiras adquirentes das mercadorias.

 

DA INVOCAÇÃO DE PREJUÍZO CAUSADO PELA PERDA DO ÁUDIO POR PROBLEMAS TÉCNICOS DA PRIMEIRA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO PROCESSUAL

 

Aduz a Defesa que a perda da primeira audiência de instrução processual, causada por problemas técnicos, não obstante a repetição da prova, teria causado prejuízo ao acusado pois a testemunha Fábio Vietti dos Santos teria alterado no segundo depoimento a versão dos fatos (ID 150855177 p. 130/139).

 

Foi lavrada nos autos certidão informando a análise e constatação de que a mídia, na qual foram registradas as audiências de 26.09.2018, encontrava-se inaudível (ID. 150855176, p. 243). Ato contínuo, o r. juízo de origem determinou a repetição do ato, nos seguintes termos: “Quanto aos problemas detectados na mídia de gravação acostada à fl. 375, os quais impossibilitam a oitiva dos depoimentos tomados em audiência, verifico a necessidade da repetição do ato. Destarte, designo nova audiência de instrução para o dia 27 de novembro de 2018, às 14 horas. Intimem-se.” (ID. 150855176, p. 244).

 

Importante ser dito que o Código de Processo Penal, em seu artigo 563, aduz que nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa, razão pela qual qualquer decretação de nulidade passa pela perquirição da sobrevinda de prejuízo àquele que foi prejudicado pelo ato impugnado sob o pálio do princípio pas de nullité sans grief. Ressalte-se que a jurisprudência de nossas C. Cortes Superiores acolhe a dicção do preceito transcrito, fazendo coro à disposição do legislador no sentido de que qualquer nulidade somente será decretada caso efetivamente haja a comprovação do prejuízo daquele que a requer, a propósito: STF, HC 119372, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-019 DIVULG 01-02-2016 PUBLIC 02-02-2016, e STJ, AgRg no HC 327.638/PA, Rel. Min. RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 14/09/2017, DJe 21/09/2017.

 

Alega a Defesa ter sofrido prejuízo em razão da perda do conteúdo da primeira audiência de instrução e repetição do ato na sequência, com a realização de nova audiência de instrução e julgamento, dada a alteração do depoimento que teria sido prestado pela testemunha. Contudo, não trouxe aos autos qualquer comprovação do prejuízo alegado, não se desincumbindo do ônus de comprovar sua alegação a teor do artigo 156 do Código de Processo Penal.

 

De qualquer modo em tendo havido defeito na gravação do áudio, a repetição do ato processual mostrou-se imprescindível para a garantia do registro das provas, não tendo havido notícias que a Defesa tenha se insurgido durante a realização da nova audiência acerca de eventual irregularidade no depoimento  pretérito da testemunha.

 

Em seus memoriais a Defesa postulou a absolvição, sustentando, em suma, insuficiência probatória, ilegitimidade de parte e, por fim, a necessidade de aplicação ao caso do princípio do in dubio pro reo (ID 150855177 – fls. 70/75). Assim,  conforme afirmado pelo Ministério Público Federal, em contrarrazões de Apelação (ID. 150855177, p. 148/154): “Outrossim, sendo o caso de nulidade, o momento oportuno para a sua arguição é em sede de alegações finais, a teor do art. 571, II, CPP, o que não foi aventado pelo apelante quando da apresentação da referida peça processual às fls. 494/499. Ressalte-se, ainda, que o princípio da ‘pas de nullité sans grief’ exige a demonstração de prejuízo concreto à parte que suscita o vício, pois não se declara nulidade por mera presunção (STF. RHC nº 123.092, Relatora Ministra Carmen Lúcia, Dje 14/11/2014)”.

 

Dessa forma, fica afastada a alegação de prejuízo pela Defesa.

 

 

DO MÉRITO

 

O requerimento Defensivo dirigido ao reconhecimento da ilegitimidade passiva do acusado confunde-se com mérito e será adiante analisado, juntamente com o pedido de absolvição por ausência de provas suficientes para a condenação (ID 150855177 p. 130/139).

 

Pois bem. A inicial acusatória imputa ao acusado EDUARDO DE PAULA SOUZA a prática do delito previsto no artigo 299 do Código Penal (falsidade ideológica) porquanto, na condição de administrador da empresa EJJE Comércio, Importação e Exportação Ltda. ME, teria inserido, nas Declarações de Importação 14/0049866-1, 14/0068708-1 e 14/0068991-2, informações falsas com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, as identidades dos reais adquirentes das mercadorias importadas.

 

Isto porque a empresa EJJE teria figurado nos documentos apresentados à Receita Federal como importadora e a adquirente das mercadorias (com apresentação de mesmo CNPJ), sem, no entanto, após instada pelas autoridades fazendárias, demonstrar efetivamente esta condição, porquanto não comprovou ter disponibilidade financeira para arcar com os custos das operações e ainda porque as três empresas por ela apontadas como intervenientes nas operações efetivamente negaram qualquer participação nas importações, sendo de registro terem sido os corréus Hilário da Graça Dias Pelegrino e Rodrigo Oliveira Dias absolvidos da imputação sem que tenha havido insurgência ministerial (ID 150855176 p. 11/16).

 

A Representação Fiscal para fins penais considerou que os dados coletados evidenciaram a existência de terceiros desconhecidos da fiscalização aduaneira que teriam se ocultado por trás das importações efetuadas pela empresa EJJE.

 

A materialidade delitiva vem devidamente demonstrada nos autos, conforme Representação Fiscal Para Fins Penais n.º 11128.725049/2014.62 (ID. 150855106, p. 04/289 e documentos que a acompanham), bem como, especificamente, pelas DIs n.ºs 14/0049866-1, 14/0068708-1 e 14/0068991-2 (ID. 150855106, p. 37/41, 51/55 e 65/69).

 

Da mesma forma, autoria delitiva e o elemento subjetivo do tipo estão confirmados pelo conjunto probatório colhido durante a instrução processual, conforme pode ser extraído da transcrição do respectivo excerto da fundamentação do decisum (ID 150855177 p. 92/119):

 

“(...) Indagada acerca da origem dos recursos repassados à EJJE, a Sra. Janaína alegou que estes originaram da venda de um bem imóvel de sua propriedade pelo valor de R$ 170.000,00 às pessoas de Adriano Antunes e Taísa de Freitas Antunes, tendo apresentado às autoridades a cópia de um contrato particular de compromisso de compra e venda (fls. 96/98).

No aventado instrumento foi ajustado o pagamento de R$ 170.000,00 pelo imóvel, a ser pago da seguinte forma: R$ 45.000,00 na data da assinatura através de um automóvel discriminado no contrato, e mais 5 parcelas de R$ 25.000,00 a serem pagas por meio de cheques pós-datados (fls. 96/98).

(...)

Ouvido em Juízo, o Auditor Fiscal responsável pela elaboração da Representação Fiscal para Fins Penais acima mencionada, Dr. Fábio Vietti dos Santos, esclareceu que no bojo do Auto de Infração constava três enquadramentos legais, contudo na conclusão só foi constada a interposição fraudulenta de terceiros.

Asseverou que não foi obtida prova suficiente acerca da existência de documentos falsos que instruíram o despacho de importação, bem como de falsa declaração de conteúdo, somente de interposição fraudulenta de terceiros. Ressaltou que esta foi presumida, pois não foi identificada a pessoa oculta.

Aduziu que a empresa foi intimada a comprovar a origem dos recursos empregados na operação e importação, tendo ela apresentado um contrato relativo à venda de um terreno realizado em 2013, sendo que a importação se deu no início de 2014. Salientou que apesar desse contrato não ter sido registrado no cartório de registro de imóveis, este não foi o único fato que consubstanciou a lavratura do auto de infração.

Afirmou que, no que toca ao depósito efetuado pela comissária de despachos aduaneiros no montante de R$ 140.000,00, a empresa importadora apresentou ao fisco apenas um contrato de empréstimo sem reconhecimento de firma, não tendo comprovado a transferência e nem a disponibilidade do dinheiro.

(...)

2.1. EDUARDO DE PAULA SOUZA

A autoria em relação a este corréu é certa. Com efeito, ouvido em Juízo, EDUARDO DE PAULA SOUZA relatou que à época dos fatos era administrador da empresa EJJE e que efetuou a importação descrita na denúncia, com auxílio do corréu PAULO HERMÍNIO FORSETO, despachante aduaneiro administrador da COMEX.

Explicou, ainda, que os produtos importados não estavam destinados exclusivamente às empresas RUCHI, CERTA e NA TELA, as quais eram administradas pelos corréus HILÁRIO DA GRAÇA DIAS PELEGRINO e RODRIGO OLIVEIRA DIAS.

Alegou que a mercadoria foi primeiramente importada para depois ser vendida no mercado nacional, e que as empresas referenciadas faziam parte de sua clientela. Pontuou que as importações foram realizadas com recursos próprios da EJJE, provenientes da venda de um terreno e um empréstimo.

Asseverou que o terreno foi adquirido de um amigo e, decorridos dois anos, foi alienado a uma terceira pessoa, tendo sido formalizado um contrato por intermédio de uma imobiliária. Aduziu que forneceu à Receita Federal o aludido contrato, indicando inclusive os dados completos do comprador. Sustentou, ainda, que forneceu todos os extratos solicitados pela fiscalização, tanto de 2013 como de 2014.

Narrou conhecer o corréu PAULO HERMÍNIO FORSETO desde 1998 e que esta foi sua primeira importação de palhetas, tendo atuado anteriormente somente com a exportação de madeira. Salientou que a empresa era nova e que esta importação foi realizada por indicação do referido despachante. Não se recorda quando foi efetuada a alteração no objeto social da empresa para incluir como atividade o comércio de peças automotivas.

Afirmou ter descoberto as empresas RUCHI, CERTA e NA TELA como potenciais compradoras das palhetas também por indicação de PAULO HERMÍNIO FORSETO e que as mercadorias não estavam designadas ainda a nenhum comprador; a ideia era vendê-las. Asseverou que investiu nessa importação algo em torno de R$ 180.000,00 a 200.000,00 e que o dinheiro oriundo tanto da venda do aventado imóvel, como também do empréstimo tomado junto ao corréu PAULO e da venda de madeira exterior.

Relatou que a empresa foi encerrada após a decretação de perdimento das mercadorias e que os impostos devidos na operação foram todos pagos. Questionado acerca dos recibos acostados às fls. 120/123 do Apenso I, o que afirmou que tais valores nunca foram recebidos e que acredita que tais documentos tenham sido confeccionados por um equívoco de sua ex-esposa.

Pois bem, de acordo com as declarações de EDUARDO (fl. 439), bem como as de sua ex-esposa, Sra. Janaína Meio de Paula Souza (fls. 22/23), ele era de fato o administrador da empresa EJJE à época dos fatos, tendo sido o responsável pelas operações de importação sob análise.

(...)

2.2 PAULO HERMÍNIO FORSETO [corréu absolvido]

(...)

Com efeito, ao ser interrogado em Juízo, PAULO HERMÍNIO FORSETO aduziu que todas as empresas citadas na denúncia eram suas clientes. Explicou que apresentou à EJJE em torno de 8 a 10 clientes para que eles pudessem desenvolver algum trabalho.

Informou ter realizado no total 5 despachos de importação para a EJJE: os dois primeiros ainda em 2013; os outros três foram aqueles descritos na inicial acusatória. Explicou estes últimos três de fato caíram no canal vermelho de conferência aduaneira. Afirmou, contudo, que apesar de a documentação se encontrar em ordem, a Alfândega obstou o desembaraço da mercadoria.

Asseverou acreditar que a EJJE dispunha de capital para realizar essas importações, apesar de não ter acompanhado a compra do aludido terreno. Salientou que a EJJE estava cadastrada no RADAR simplificado, o que permitia a ela realizar importações de até US$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil dólares).

(...)

2.3. HILÁRIO DA GRAÇA DIAS PELEGRINO e RODRIGO OLIVEIRA DIAS [corréus absolvidos]

(...)

Ouvido em Juízo, HILÁRIO DA GRAÇA DIAS PELEGRINO declarou que as importações explícitas na denúncia não foram realizadas para a sua empresa. Segundo ele, um de seus sócios possui uma fábrica na China, sendo que a ROCHI dispõe de RADAR suficiente para realizar suas próprias importações, não precisando recorrer a terceiros.

Narrou já ter realizado uma compra pequena junto à empresa EJJE - por indicação de PAULO -, meramente para compor estoque. Negou ter entabulado qualquer negócio para aquisição das mercadorias objeto das importações descriminadas na denúncia, bem como conhecer Janaina Melo de Paula Souza, esposa do acusado EDUARDO.

Ao seu turno, RODRIGO OLIVEIRA DIAS relatou nunca ter feito negócios com o correu EDUARDO; encontrou-o apenas uma vez chegando à empresa de seu pai, por volta de 2013 a 2014, e nunca mais tiveram contato. Afirmou, por fim, que a NA TELA nunca adquiriu produtos da EJJE; que à época não comercializava palhetas e lâmpadas halógenas; e que dispunha do RADAR simplificado para realizar suas próprias importações. (...). ”

 

Cumpre destacar que o objeto social da pessoa jurídica EJJE COMÉRCIO IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA ME, inicialmente, não era o comércio atacado de peças e acessórios para veículos automotores (e que foram objetos das excogitadas DI’s). Somente após o início da fiscalização pela Receita Federal do Brasil é que esse objeto foi inserido no contrato social da empresa, pela alteração do contrato social de 12.02.2014 (ID. 150855176, p. 17/18).

 

Como visto precedentemente, na tentativa de comprovar a posse de recursos necessários à importação, a empresa EJJE Comércio Importação e Exportação Ltda. ME informou ao Fisco que os valores foram provenientes de dois empréstimos. Um seria oriundo da COMEX SERVIÇOS ESPECIALIZADOS LTDA (empresa de titularidade do corréu absolvido Paulo Hernínio Forseto), no valor de R$ 182.100,00 (cento e oitenta e dois mil e cem reais), e o segundo fornecido pela sócia da empresa, Janaína Melo de Paula Souza, no valor de R$ 140.545,92 (cento e quarenta mil, quinhentos e quarenta e cinco reais e noventa e dois centavos).

 

A despeito de Janaína ter informado que os recursos para o empréstimo foram originados da venda de um imóvel, a Autoridade Fiscal não identificou dados contábeis da alegada transação, bem como elucidou a dinâmica das operações de importação. Confira-se relatório da Receita Federal (ID 150855106 – fls. 15/17):

 

“(...)

DA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA DA Sra. JANAÍNA

Da análise da conta-corrente da Sra. Janaína Melo de P. Souza, Banco Itaú agência/conta 9657/09173-3 destaca-se:

- Se formos considerar o acertado na Cláusula VI do Contrato de Compromisso de Compra e Venda acima exposto, confrontando com os extratos bancários da Sra. Janaína, percebe-se que os cheques de maio e junho de 2013 não transitaram na conta-corrente da sócia da empresa EJJE.

(...)

O importador na resposta da terceira intimação permanece se esquivando de apresentar as informações solicitadas: extratos bancários (EJJE Com. Imp. Exp. Ltda), notadamente do período de novembro 2013 em diante, quando foi realizada a operação em análise. Também não apresentou as planilhas das despesas incidentes sobre cada uma das operações de importação registradas em 1, nome da empresa, a partir do segundo semestre de 2013. Tampouco indicou nos extratos bancários os pagamentos referentes às NF 439, 440 e 441 solicitados.

(...)

Segundo a nomenclatura do Banco Itaú, "TEC Depósito em Dinheiro" significa Transferência Entre Contas, em Dinheiro.

A Sra. Janaína afirma que o dinheiro de sua propriedade que abasteceu a conta da EJJE não transitou na sua conta pessoal, todavia, o lançamento na conta da EJJ indica que houve um depósito em dinheiro entre duas contas.

Se a Sra. Janaína não utilizou sua conta pessoal para enviar dinheiro para a EJJE, deduz-se que tal depósito foi efetuado por uma terceira pessoa, que não foi possível identificar.

ANÁLISE DAS NOTAS FISCAIS DE VENDA DA EJJE COM IMP. EXP. LTDA

Conforme se constata na relação de notas fiscais eletrônicas de saída, emitidas pela EJJE, a empresa emite as notas fiscais de venda sem destacar o valor a ser tributável pelo IPI. Estabelece a legislação: São equiparados a estabelecimento industrial: a) os estabelecimentos importadores de produtos de procedência estrangeira, que derem saída a esses produtos; Base Legal: arts. 40, 8° e 35 caput do RIPI/2010, aprovado pelo Decreto n°7.212/2010.

A empresa EJJE não se comporta como o real importador ao não recolher o IPI na saída das mercadorias. E mais, permite que o verdadeiro adquirente oculto deixe de ser equiparado a industrial, não pagando IPI na saída das mercadorias, quebrando a cadeia desse imposto, conforme já comentado. Trata-se de mais uma evidência que a empresa EJJE funciona como uma empresa ‘de fachada’ para acobertar os reais adquirentes das mercadorias.

2) INTERPOSIÇÃO

(...)

Em resumo, restou demonstrado inequivocamente não ser a EJJE a real adquirente das mercadorias importadas, ou seja, verifica-se a ocultação do real adquirente das mercadorias e a interposição fraudulenta da EJJE. Corroboram tal conclusão:

- a não concretização da operação de compra e venda do imóvel da Sra. Janaína;

- as inconsistências nas respostas às intimações: num primeiro momento foi dado um automóvel como entrada do negócio imobiliário; depois afirmaram que tal parcela foi paga em espécie;

- a esquiva do importador em apresentar as informações solicitadas;

- a quebra da cadeia do IPI.

5- CONCLUSÃO

Diante dos fatos apresentados podemos concluir que estão tipificadas as hipóteses de dano ao erário em razão da: Interposição fraudulenta de terceiros uma vez que a empresa EJJE não é a real  adquirente das mercadorias objeto das DI’s em análise. Os dados coletados mostram que existem terceiros desconhecidos da fiscalização aduaneira que se ocultam por trás das importações efetuadas pela empresa EJJE. Em obediência aos dispositivos anteriormente mencionados, não resta outra medida a ser tomada pela fiscalização aduaneira a não ser a de efetuar a apreensão das mercadorias aqui analisadas.”

 

Assim, cumpre rememorar que não foi localizado, pelo Fisco, registro da alegada transação imobiliária, ainda que o empréstimo concedido pelo corréu absolvido Paulo Hermínio Forseto para lastrear as operações de importação aparentemente tenha sido efetivado a favor de sua empresa. De toda sorte o apelante não demonstrou a disponibilidade financeira para arcar com os custos totais das operações.

 

De outro turno, o acusado EDUARDO DE PAULA SOUZA, em juízo, afirmou ser o administrador da empresa EJJE COMÉRCIO IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA ME, confirmando que efetuou as importações descritas na denúncia. Disse que as mercadorias foram importadas para posterior venda no mercado nacional. Insistiu que as importações foram efetivadas com recursos próprios, advindos da venda de um terreno e de um empréstimo. O acusado disse que forneceu à Receita Federal o contrato de venda do terreno e indicando os dados do comprador, bem ainda que forneceu à Autoridades Fazendárias todos os extratos solicitados, de 2013 e 2014.

 

Quanto à alteração do contrato social, o réu afirmou não se recordar quando foi realizada a mudança do objeto do contrato social de sua empresa para a inclusão do comércio de autopeças. Portanto, conforme declarações oferecidas por ele próprio e pela testemunha Janaína Melo de Paula, devidamente comprovado que cabia ao acusado a gerência administrativa e financeira da sociedade empresária EJJE à época dos fatos e, dessa forma, foi o responsável pelas importações realizadas de forma fraudulenta.

 

Deve ser registrado que os alegados boletos (ID 150855106- fls. 124/127 do Apenso 1) que teriam sido expedidos pela importadora EJJE, apresentados ao Fisco, e descritos na denúncia com vistas a demonstrar que as empresas RUCHI IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO AUTOMOTIVOS LTDA, CERTA IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO DE PEÇAS E ACESSÓRIOS AUTOMOTIVOS LTDA e NA TELA IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO DE AUTO PEÇAS E ACESSÓRIOS LTDA seriam efetivamente as reais adquirentes das mercadorias importadas, não se prestam a fazer prova a favor do apelante, já que ele próprio afirmou que os valores consignados em tais boletos nunca foram recebidos por sua empresa e que acreditava que estes documentos tenham sido confeccionados por um equívoco de sua ex-esposa.

 

Dessa forma, comprovadas materialidade e autoria delitivas, bem como o elemento subjetivo do tipo por parte de EDUARDO DE PAULA SOUZA, fica mantida a condenação pela prática do delito previsto no artigo 299, c.c o artigo 69 (por três vezes), ambos do Código Penal.

 

DOSIMETRIA DA PENA

 

O cálculo da pena deve atentar aos critérios dispostos no artigo 68 do Código Penal, de modo que, na primeira etapa da dosimetria, observando as diretrizes do artigo 59 do Código Penal, o magistrado deve atentar à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, e estabelecer a quantidade de pena aplicável, dentro de uma discricionariedade juridicamente vinculada, a partir de uma análise individualizada e simultânea de todas as circunstâncias judiciais.

 

Na segunda fase de fixação da pena, o juiz deve considerar as agravantes e atenuantes, previstas nos artigos 61 a 66, todos do Código Penal. 

 

Finalmente, na terceira etapa, incidem as causas de diminuição e de aumento da pena.

 

DA DOSIMETRIA DA PENA NO CASO CONCRETO

 

O r. juízo a quo fundamentou a dosimetria da pena nos seguintes termos (ID 150855177 p. 92/119):

 

“(...)

EDUARDO DE PAULA SOUZA não registra antecedentes criminais; sua culpabilidade não é acima da média para o delito; não há nos autos registros desabonadores da sua conduta social e personalidade.

Diante dessas considerações, na primeira fase, fixo a pena-base no mínimo legal de 1 (um) ano de reclusão, em regime aberto, e o pagamento de 10 (dez) dias-multa para cada um dos 3 (três) delitos imputados ao réu.

Prosseguindo, à míngua de circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como de causas de aumento e de diminuição de pena e, diante do disposto no artigo 69 do Código Penal (concurso material de crimes), fica estabelecido o total da condenação imposta a EDUARDO DE PAULO SOUZA em 3 (três) anos de reclusão, em regime inicial aberto, mais o pagamento de 30 (trinta) dias-multa, que deverão ser calculados à razão de 1/30 (um trigésimo) do valor do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.

Por força do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos consistentes em: (1) prestação de serviços à comunidade ou entidades filantrópicas ou assistenciais pelo prazo da pena privativa de liberdade substituída, na forma e condições a serem definidas pelo juízo da execução penal; (2) prestação pecuniária, no valor de 3 (três) salários mínimos, a ser pago a instituição pública ou privada, com destinação social, a ser designada pelo juízo da execução. (...). ” 

 

Ausentes recursos das partes em face da dosimetria da pena, e não sendo verificadas quaisquer ilegalidades, fica mantida a pena do acusado na forma como determinada pelo magistrado sentenciante.

 

PENA DEFINITIVA

 

Mantida a condenação, nos termos da r. sentença, à pena corporal de 03 (três) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicial ABERTO, acrescida do pagamento de 30 (trinta) dias-multa, cada qual fixado em 01/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Restou substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena aplicada, e prestação pecuniária no valor de 03 (três) salários mínimos, destinados a instituição pública ou privada com destinação social

 

DISPOSITIVO

 

Diante do exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO à Apelação da DEFESA.

 

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


E M E N T A

 

 

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA. CONCURSO MATERIAL. ARTIGO 229, C.C O ARTIGO 69, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. IMPRESTABILIDADE DO ÁUDIO DE AUDIÊNCIA GRAVADA. ATO REFEITO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. MATERIALIDADE, AUTORIA E ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO COMPROVADOS. DOSIMETRIA PENAL. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. DE OFÍCIO APLICADA A CONTINUIDADE DELITIVA (ART. 71, CP). APELAÇÃO DEFENSIVA NÃO PROVIDA.

- O Código de Processo Penal, em seu artigo 563, aduz que nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa, razão pela qual qualquer decretação de nulidade passa pela perquirição da sobrevinda de prejuízo àquele que foi prejudicado pelo ato impugnado sob o pálio do princípio pas de nullité sans grief. Alega a Defesa ter sofrido prejuízo em razão da perda do conteúdo da primeira audiência de instrução e repetição do ato na sequência, com a realização de nova audiência de instrução e julgamento, contudo, não trouxe aos autos qualquer comprovação do prejuízo alegado, não se desincumbindo de ônus de comprovar sua alegação a teor do artigo 156 do Código de Processo Penal. Ausência de prejuízo concreto.

- Comprovadas materialidade e autoria delitiva do delito de falsidade ideológica, bem como dolo na conduta do acusado, ficando demonstrada a imputação contida denúncia de que o réu, de forma dolosa e conscientemente, inseriu nas Declarações de Importação informações falsas, com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, as identidades dos reais adquirentes das mercadorias importadas.

- Ausentes recursos das partes em face da dosimetria da pena, e não sendo verificadas quaisquer ilegalidades, fica mantida a pena do acusado na forma como determinada pelo magistrado sentenciante.

- Mantida a condenação, nos termos da r. sentença.

- Dosimetria da pena. De ofício, aplicada a continuidade delitiva (art. 71, CP), tendo em vista que as condutas de inserir as declarações falsas nas três DIs descritas na denúncia foram praticadas em continuidade delitiva, ou seja, as informações falsas foram inseridas nas DIs n° 14/0049866-1, 14/0068708-1 e 14/0068991-2, respectivamente, nos dias 08.01.2014 e 10.01.2014, nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução.

 - Pena definitiva reduzida para 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, no regime inicial aberto, e 12 (doze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos. Substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena aplicada, e prestação pecuniária no valor de 03 (três) salários mínimos, destinados a instituição pública ou privada com destinação social.

- Apelação da Defesa a que se nega provimento. De ofício, aplicada a continuidade delitiva (art. 71, CP).

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por maioria, decidiu negar provimento à apelação da defesa e, de ofício, aplicar a continuidade delitiva (art. 71, CP), fixando a pena definitiva do réu em 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, no regime inicial aberto, e 12 (doze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos, substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena aplicada, e prestação pecuniária no valor de 03 (três) salários mínimos, destinados a instituição pública ou privada com destinação social, nos termos do voto do Des. Fed. José Lunardelli, acompanhado pelo Des. Fed. Nino Toldo, vencida a Relatora que NEGAVA PROVIMENTO à Apelação da DEFESA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.