Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000337-52.2017.4.03.6182

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: BCV - BANCO DE CREDITO E VAREJO S/A., UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogado do(a) APELANTE: ALESSANDRO MENDES CARDOSO - MG76714-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, BCV - BANCO DE CREDITO E VAREJO S/A.

Advogado do(a) APELADO: ALESSANDRO MENDES CARDOSO - MG76714-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000337-52.2017.4.03.6182

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: BCV - BANCO DE CREDITO E VAREJO S/A., UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogado do(a) APELANTE: ALESSANDRO MENDES CARDOSO - MG76714-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, BCV - BANCO DE CREDITO E VAREJO S/A.

Advogado do(a) APELADO: ALESSANDRO MENDES CARDOSO - MG76714-A

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:

Agravo interno interposto pelos apelantes (embargante e embargado) contra decisão que negou provimento às apelações.

Os embargos à execução foram opostos em 12/01/2017 por BCV - BANCO DE CREDITO E VAREJO S/A. (incorporador de BCV CORRETORA DE CÂMBIO E VALORES MOBILIÁRIOS S.A. - EM LIQUIDAÇÃO) em face de execução fiscal (EF 0029646-89.2015.4.03.6182) proposta pela UNIÃO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL visando a cobrança dívida ativa (CDA 80214072126-35, R$ 1.979.139,68; CDA 80214073511-63, R$ 99.157,51; CDA 80614146975-75, R$ 712.490,28; CDA 80614150516-87, R$ 28.999,22; CDA 80614150517-68, R$ 120.569,61; CDA 80714034601-34, R$ 19.592,55).

Em apertada síntese, narra que foi autuada para recolhimento de IRPJ e CSLL por “desmutualização” das bolsas ocorrido em 2007 e que em 2013 quitou à vista referidos débitos, com os benefícios da Lei 11.941/11 (efeitos prorrogados pela Lei 12.865/13).

Alega que o Fisco indeferiu a inclusão da multa isolada objeto do mesmo auto de infração por entender que sua constituição só teria ocorrido no ano de 2010, ao passo que a data limite para o vencimento dos débitos passíveis de inclusão no REFIS seria novembro/2008 e, assim, passou a exigir o “saldo remanescente” das multas lançadas de ofício tendo realizado a chamada imputação proporcional do pagamento, em relação ao valor atualizado da multa, sem qualquer redução.

Alega que apesar de não concordar que o vencimento da multa isolada só se deu ao tempo da lavratura do Auto de Infração, com o advento da Lei 12.996/14, que veio ampliar os benefícios concedidos pela Lei 11.941/09 e estender o prazo de vencimento dos débitos aptos a serem pagos no REFIS para 31/12/2013, o embargante solicitou a inclusão da multa isolada neste novo parcelamento, já tendo realizado o pagamento de todo o valor cobrado, realizando inclusive pagamento a maior.

Afirma que peticionou no processo administrativo informando que o pagamento realizado era suficiente para quitar o débito, mas a Fiscalização manteve a cobrança.

Sustenta que a multa isolada não poderia ser objeto de cobrança após a edição da Portaria n° 20 das próprias PGFN e RFB, ao passo que esta isentou a cobrança de quaisquer multas dos contribuintes que pagaram os referidos IRPJ e CSLL, à vista, como ocorreu na presente situação.

Salienta que os presentes embargos referem-se apenas às CDAs 80214072126-35 e 80614146975-75 (as demais foram canceladas).

Conclui ter efetuado o pagamento.

Argumenta com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Requer sejam julgados procedentes os presentes Embargos, com o cancelamento dos débitos executados, uma vez demonstrado que:

(i) o procedimento do Embargante de incluir no REFIS a multa isolada decorrente da ausência de antecipações mensais de IRPJ e CSLL do ano-calendário de 2007 está correto, uma vez que o vencimento da multa isolada não ocorreu com o seu lançamento em 2010, mas sim a partir do mês subsequente em que o Embargante deixou de cumprir a obrigação acessória (2007/janeiro2008).

(ii) mesmo que se entenda que o vencimento da multa isolada só ocorreu em 2010, com a lavratura do Auto de Infração, o que apenas se admite por argumentar, o Embargante reincluiu o seu pagamento na Anistia da Lei 12.996/2014, que alargou o vencimento dos débitos parceláveis para 31/12/2013, não havendo que se falar na presente cobrança.

(iii) subsidiariamente, requer seja considerado que os valores executados sequer poderiam ser cobrados, nos termos da Portaria Conjunta n°20/2014 que prevê a redução de 100% de juros, multa de mora e multa de ofício (isolada) em casos de pagamento à vista de IRPJ e CSLL relativos à alienação das ações objeto de desmutualização das Bolsas de Valores, como ocorreu no caso concreto.

Valor atribuído à causa: R$ 3.161.651,25.

Em sua impugnação a União defende que o vencimento da multa isolada não guarda relação com a data do vencimento do tributo e que não há como confundir-se as multas aqui exigidas (que guardam relação com a operação contábil de aumento e redução de capital da corretora mediante transferência de bens integrante de seu patrimônio ativo permanente - títulos patrimoniais e ações CBLC - para o Banco Shahin S/A (Atual BCV — Banco de Crédito e Varejo S/A.), com possibilidade de anistia de multas previstas no artigo 42 da Lei 13.043/2014 e da Portaria Conjunta PGFN/RFB no 20 de 17/11/2014 (que trata da hipótese de ganho de capital na alienação de "ações que tenham sido originadas da conversão de títulos patrimoniais de associações civis sem fins lucrativos)." Requer a improcedência da ação.

Manifestação da embargante.

Em 05/03/2020 sobreveio a r. sentença de procedência dos embargos para declarar a nulidade das CDAs combatidas. Honorários advocatícios fixados em R$ 15.000,00. Determinado o reexame necessário.

Inconformada quanto ao valor fixado a título de honorários advocatícios, apela a embargante. Defende que não é possível a apreciação equitativa dos honorários fora das hipóteses taxativas do artigo 85, § 8º, do CPC. Requer a reforma da r. sentença para que a condenação sucumbencial observe o disposto no § 3º do artigo 85 do CPC.

Por sua vez, apela a embargada. Insiste em que, no caso dos autos, o vencimento da dívida ocorre na data indicada na notificação da autoridade fiscal, após a lavratura de auto de infração. Assim, conclui que a Fiscalização indeferiu a inclusão no REFIS (Lei n. 11.941/09) das multas isoladas decorrente da ausência de antecipações mensais de IRPJ e CSLL no ano-calendário de 2007, tendo em vista que o vencimento da referida multa só teria ocorrido em 2010 com o lançamento de ofício do crédito tributário (por auto de infração) e não há que se falar em nulidade da CDA. Requer o provimento do recurso.

Recursos respondidos.

Sobreveio a decisão ora agravada (ID 262118488).

Em suas razões recursais, a agravante/embargante alega ser necessária observância do entendimento vinculante do E. STJ e requer a reforma da decisão para que a condenação do agravado em honorários sucumbenciais observe os critérios do artigo 85, §2º e § 3º do CPC/15 (ID 263284602).

Por sua vez, a agravante/embargada defende a necessidade de esgotamento de instância para que não ocorra cerceamento de defesa. No mais, repisa os argumentos expendidos em seu apelo e requer a reforma da r. decisão e o provimento do agravo interno (ID 263646744).

Recursos respondidos.

É o relatório.

 

 


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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000337-52.2017.4.03.6182

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: BCV - BANCO DE CREDITO E VAREJO S/A., UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogado do(a) APELANTE: ALESSANDRO MENDES CARDOSO - MG76714-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, BCV - BANCO DE CREDITO E VAREJO S/A.

Advogado do(a) APELADO: ALESSANDRO MENDES CARDOSO - MG76714-A

 

 

 

V O T O

 

 

O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:

Pretendem as agravantes a reforma da decisão monocrática que negou provimento às apelações.

Não há empeço à decisão unipessoal, no caso.

No âmbito do STJ rejeita-se a tese acerca da impossibilidade de julgamento monocrático do relator fundado em hipótese jurídica não amparada em súmula, recurso repetitivo, incidente de resolução de demanda repetitiva ou assunção de competência, louvando-se na existência de entendimento dominante sobre o tema. Até hoje, aplica-se, lá, a Súmula 586 de sua Corte Especial (DJe 17/03/2016). Confira-se: AgInt no AgRg no AREsp 607.489/BA, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 20/03/2018, DJe 26/03/2018 - AgInt nos EDcl no AREsp 876.175/RS, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 21/06/2018, DJe 29/06/2018 - AgInt no AgInt no REsp 1420787/RS, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 26/06/2018 - AgRg no AREsp 451.815/SC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 29/06/2018.

Ademais, cumpre lembrar o pleno cabimento de agravo interno - POR SINAL UTILIZADO PELA PARTE, AQUI - contra o decisum, o que afasta qualquer alegação de violação ao princípio da colegialidade e de cerceamento de defesa, a despeito da impossibilidade de realização de sustentação oral, já que a matéria pode, desde que suscitada, ser remetida à apreciação da Turma, onde a parte poderá acompanhar o julgamento colegiado, inclusive valendo-se de prévia distribuição de memoriais (AgRg no AREsp 381.524/CE, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 17/04/2018, DJe 25/04/2018 - AgInt no AREsp 936.062/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2018, DJe 27/03/2018 - AgRg no AREsp 109.790/PI, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 06/09/2016, DJe 16/09/2016). Deveras, "Eventual mácula na deliberação unipessoal fica superada, em razão da apreciação da matéria pelo órgão colegiado na seara do agravo interno " (AgInt no AREsp 999.384/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/08/2017, DJe 30/08/2017 - REsp 1677737/RJ, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 29/06/2018).

No âmbito do STF tem-se que "A atuação monocrática, com observância das balizas estabelecidas nos arts. 21, § 1°, e 192, caput, do RISTF, não traduz violação ao Princípio da Colegialidade, especialmente na hipótese em que a decisão reproduz compreensão consolidada da Corte" (HC 144187 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 04/06/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-116 DIVULG 12-06-2018 PUBLIC 13-06-2018). Nesse sentido: ARE 1089444 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 25/05/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-111 DIVULG 05-06-2018 PUBLIC 06-06-2018.

Na verdade, o ponto crucial da questão é sempre o de assegurar à parte acesso ao colegiado.

Por tal razão o STF já validou decisão unipessoal do CNJ, desde que aberta a via recursal administrativa (MS 30113 AgR-segundo, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 25/05/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-121 DIVULG 18-06-2018 PUBLIC 19-06-2018).

A possibilidade de maior amplitude do julgamento monocrático - controlado por meio do agravo - está consoante os princípios que se espraiam sobre todo o cenário processual, tais como o da eficiência (art. 37, CF; art. 8º do NCPC) e da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF; art. 4º do NCPC).

Eficiência e utilitarismo podem nortear interpretações de normas legais de modo a que se atinja, com rapidez sem excessos, o fim almejado pelas normas e desejado pela sociedade a justificar a ampliação interpretativa das regras do NCPC que permitem as decisões unipessoais em sede recursal, para além do que a letra fria do estatuto processual previu, dizendo menos do que deveria.

De todo modo, os argumentos expendidos pela agravante não abalaram a fundamentação e a conclusão exaradas por este Relator, razão pela qual as reitero na parte que interessa ao deslinde do recurso, adotando-as como razão de decidir deste agravo.

“A primeira causa de pedir veiculada na peça inicial destes embargos refere-se à aferição da higidez do comportamento administrativo da embargada em interditar o acesso da empresa embargante ao REFIS, em face do não recolhimento do IRPJ e da CSLL por estimativa vencidos no exercício financeiro de 2007, o que gerou a lavratura do auto de infração lançado no ano de 2010, sendo este, portanto, segundo a União, o fato constitutivo que deu azo à penalidade pecuniária e não o simples o transcurso do prazo do pagamento da obrigação tributária principal, para os fins previstos no art. 1º, 2º, da Lei nº 11.949/09.

Em outras palavras, para a embargada, o fato gerador da obrigação tributária acessória ocorreu em 2010 e não com o mero escoamento do lapso temporal previsto na lei para a quitação das estimativas (2007), esbarrando no óbice normativo já mencionado no "decisum", segundo o qual somente as dívidas constituídas até 30/11/2008 poderiam ser objeto do programa de parcelamento.

Com razão a embargante.

Realmente, a glosa efetuada pela embargada no sentido de excluir a multa isolada resultante do não recolhimento das estimativas de IRPJ e CSLL vencidas em 2007 sob o pretexto de que a penalidade pecuniária foi constituída em 2010 não encontra amparo no CTN e na doutrina pátria que leciona sobre o surgimento do fato gerador da obrigação tributária principal e da obrigação tributária acessória.

A obrigação tributária principal encontra-se plasmada no art. 113, 1º, do CTN. O seu nascimento ocorrerá quando presentes os elementos constitutivos do fato gerador em concreto da relação jurídica de tributação, gerando, por conseguinte, a obrigação de o sujeito passivo pagar o montante devido após o procedimento de lançamento tributário efetuado por ele próprio (lançamento por homologação) ou pelo Fisco (lançamento de ofício), sob pena de inscrição do débito em dívida ativa para futura cobrança executiva.

Por outro lado, a obrigação tributária acessória, prevista no art. 113, 2º, do CTN tem por escopo dar suporte à cobrança da obrigação principal, impondo ao contribuinte o dever de se abster da prática de atos que inviabilizem a execução do ofício arrecadatório estatal, além de estabelecer ao contribuinte a obrigatoriedade de efetuar atividades de natureza eminentemente administrativa, transformando-o em uma "longa manus" do Estado durante o procedimento de fiscalização dos tributos devidos.

Confira-se a redação do preceito:

Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.

§ 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.

Por sua vez, a doutrina se posiciona da seguinte forma, in verbis:

"Obrigação acessória. Deveres formais. Obrigação acessória é obrigação de fazer em sentido amplo (fazer, não fazer, tolerar) no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. Ao lado da obrigação de dar, o Código Tributário Nacional coloca as acessórias, que têm por objeto prestações positivas ou negativas, previstas em lei, no interesse da fiscalização. A acessória dá um suporte grande ao direito tributário na medida em que fiscaliza e controla esses recursos. A melhor doutrina não considera tais obrigações como acessórias da obrigação de dar; prefere ver nelas deveres de natureza administrativa, isso porque a relação obrigacional é passageira, dissolvendo-se sobretudo pelo pagamento, enquanto os comportamentos impostos em caráter permanente, as pessoas designadas em lei o são sob um vínculo de durabilidade ou permanência não suscetível de exaurir-se com o mero cumprimento. A conclusão é que nem todos os comportamentos que o Código Tributário nacional considera como obrigações devem ser efetivamente tidos como tais." (Leandro Paulsen - Direito Tributário, Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência - 13º edição - página 934).

No caso dos autos, não houve o descumprimento de uma obrigação acessória em sentido estrito, como, a título de exemplo, a inobservância do dever do contribuinte de escriturar e apresentar os seus livros contábeis quando solicitados pelas autoridades fazendárias competentes, mas, sim, a imposição de uma multa de ofício em decorrência do inadimplemento da obrigação principal, transformando a penalidade pecuniária, outrora cognominada de obrigação acessória em sentido amplo, em obrigação principal para fins de cobrança pela via do executivo fiscal, sendo a ela equiparada para todos os efeitos, nos termos do art. 113, 3º, do CTN, que possui a seguinte redação:

Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.

§ 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.

§ 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.

Confira-se o entendimento doutrinário sobre o tema, in verbis:

" O fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação (CTN, art. 115). Nos termos do Código Tributário Nacional esse fato gerador pode ser definido pela legislação, e não apenas pela lei. A situação de quem pretende instalar um estabelecimento comercial, por exemplo, faz nascer o dever de requerer inscrição nos cadastros fiscais correspondentes. É uma situação de fato que, nos termos da legislação tributária, faz nascer a obrigação acessória de pedir as inscrições correspondentes. A situação de quem é estabelecido comercialmente faz nascer as obrigações acessórias de não receber mercadorias sem o documento fiscal correspondente e de tolerar a fiscalização em seus livros e documentos. Uma determinada situação de fato pode ser, ao mesmo tempo, fato gerador de uma obrigação tributária principal e de uma obrigação tributária acessória. Assim, a situação na qual um comerciante promove a saída de mercadorias de seu estabelecimento faz nascer, ao mesmo tempo, a obrigação de pagar o ICMS (obrigação principal) e também a obrigação de emitir a nota fiscal correspondente (obrigação acessória)." (Hugo de Brito Machado - Curso de Direito Tributário - 32º Edição - Página 127).

Como se vê, é perfeitamente possível que a obrigação tributária principal e acessória advenham ao mundo jurídico no mesmo espaço temporal, máxime quando a segunda for uma mera decorrência do descumprimento da primeira, razão pela qual não deve ser adotado o entendimento da embargada que, além de inadmitir a coincidência de hipótese de incidência entre ambas em nenhum instante, transfere para o lançamento tributário o momento do nascimento do fato gerador da obrigação acessória.

Com efeito, a doutrina pátria sedimentou o entendimento da natureza jurídica biforme do lançamento tributário, sendo, ao mesmo tempo, declaratório da obrigação tributária pretérita e constitutivo do crédito tributário a ser inscrito em dívida ativa da União, não havendo maiores questionamentos a esse respeito.

A propósito, veja-se o entendimento doutrinário, in verbis:

"A natureza jurídica do lançamento tributário já foi objeto de grandes divergências doutrinárias. Hoje, porém, é praticamente pacífico o entendimento segundo o qual o lançamento não cria direito. Seu efeito é simplesmente declaratório. Entretanto, no Código Tributário Nacional o crédito tributário é algo diverso da obrigação tributária. Ainda que, em essência, crédito e obrigação sejam a mesma relação jurídica, o crédito é um momento distinto. É um terceiro estágio na dinâmica da relação obrigacional tributária. E o lançamento é precisamente o procedimento administrativo de determinação do crédito tributário. Antes do lançamento existe a obrigação. A partir do lançamento surge o crédito. O lançamento, portanto, é constitutivo do crédito tributário, e apenas declaratório da obrigação correspondente." (Hugo de Brito Machado - Curso de Direito Tributário - 32º Edição - Página 175).

Assim, considerando-se que o art. 2º, caput, da Lei nº 9.430/96 faculta às pessoas jurídicas tributadas pela sistemática do lucro real a opção pelo recolhimento dos tributos devidos de maneira mensal e por estimativa, ao passo que o art. 44, II, "b", do mesmo diploma estabelece que a multa isolada de cinquenta por cento sobre o valor do pagamento mensal será devida após o mero escoamento do prazo para o pagamento da exação fiscal, deve-se concluir, a partir de uma interpretação sistemática de todos os diplomas incidentes sobre a matéria, que o fato gerador da obrigação acessória em tela ocorreu com a superveniência do inadimplemento da obrigação tributária principal (2007), não havendo razão jurídica alguma para a glosa fazendária efetuada com base no art. 1º, § 2º, da Lei 11.941/09, eis que a obrigação encontrava-se ativa e exigível, repita-se, desde o seu vencimento.

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado nos presentes embargos à execução para declarar a nulidade das CDAs nºs 80 2 14 072126-35 e 80 6 14 146975-75, albergadas nos autos da execução fiscal de origem (processo nº 0029646-89.2015.403.6182), tornando insubsistente a cobrança tributária em tela. Em consequência, JULGO EXTINTO O PROCESSO, COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, nos termos do art. 487, I, do CPC.

No tocante ao valor da verba honorária, fixo, com base no art. 85, 8º, do CPC/15 e no art. 884 do CC/02, por critério de equidade, o montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), considerado o zelo profissional desempenhado ao longo da marcha processual e o grau de complexidade da controvérsia instaurada em juízo.

Realmente, tratando-se a controvérsia de mero reconhecimento do direito subjetivo da embargante de figurar em programa de refinanciamento de dívidas perante a União, ocasionando a glosa da cobrança fiscal, a fixação da verba honorária em percentual fixo sobre o valor da causa ou do proveito econômico auferido pelo contribuinte redundaria em notório incremento econômico exagerado dos patronos do autor perante o ente público, razão pela qual o princípio de sobredireito da vedação do enriquecimento sem causa deve preponderar sobre a regra esculpida no diploma processual, conforme reiteradamente vem decidindo o E. STJ.

.........................................................................................”

Trata-se de excelente sentença, que honra a figura de seu prolator, o qual perscrutou com intensidade as alegações postas pela parte embargante, bem como a documentação colacionada nos autos, e julgou os embargos procedentes.

No tocante aos honorários advocatícios, embora respeitando o recente posicionamento do STJ em sentido contrário, penso que é possível a aplicação do § 8º do artigo 85 do CPC no caso de verba honorária excessiva, a caracterizar autêntico enriquecimento sem causa, eis que deve haver proporcionalidade entre a remuneração do advogado e o serviço por ele prestado, por mais respeitável que seja (como é o caso dos autos).

A proporcionalidade na honorária é vetor de aplicação da mesma, de longa data recomendado pelo STJ, e que vem sendo adotado mesmo depois do NCPC (AgInt nos EREsp 1673456/DF, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, CORTE ESPECIAL, julgado em 22/03/2022, DJe 29/03/2022).

Os honorários advocatícios devem remunerar condignamente o trabalho do advogado, considerando que um dos fundamentos do nosso Estado Democrático de Direito consiste no valor social do trabalho (artigo 1°, IV, da Constituição Federal). Mas não se pode olvidar da necessária proporcionalidade que deve existir entre a remuneração e o trabalho visível feito pelo advogado. Inexistindo proporcionalidade, deve-se invocar o § 8º do artigo 85 do CPC de 2015: "Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do parágrafo 2º", mesmo que isso seja feito para o fim de reduzir os honorários, levando-se em conta que o empobrecimento sem justa causa do adverso que é vencido na demanda significa uma penalidade, e é certo que ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal, vale dizer, sem justa causa. Nesse âmbito, a fixação exagerada de verba honorária - se comparada com o montante do trabalho prestado pelo advogado - é enriquecimento sem justa causa, proscrito pelo nosso Direito e pela própria Constituição polifacética, a qual prestigia os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

O saudoso Limongi França ensinava: "Enriquecimento sem causa, enriquecimento ilícito ou locupletamento ilícito é o acréscimo de bens que se verifica no patrimônio de um sujeito, em detrimento de outrem, sem que para isso tenha um fundamento jurídico" (Enriquecimento sem Causa. Enciclopédia Saraiva de Direito. São Paulo: Saraiva, 1987).

No atual Código Civil, legislação infraconstitucional permeada de razoabilidade e proporcionalidade constitucionais, há fundamento para obstar o enriquecimento sem causa no art. 844: "Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários...".

Na posição de Celso Antônio Bandeira de Melo, "Enriquecimento sem causa é o incremento do patrimônio de alguém em detrimento do patrimônio de outrem, sem que, para supeditar tal evento, exista uma causa juridicamente idônea. É perfeitamente assente que sua proscrição constitui-se em um princípio geral do direito...os princípios gerais de direito estão subjacentes ao sistema jurídico-positivo, não porém, como um dado externo, mas como uma inerência da construção em que se corporifica o ordenamento, porquanto seus diversos institutos jurídicos, quando menos considerados em sua complexidade íntegra, traem, nas respectivas composturas, ora mais ora menos visivelmente, a absorção dos valores que se expressam nos sobreditos princípios..." (RDA, 210: 25/35).

Indo mais acima, o próprio STF elegeu o enriquecimento sem causa como uma situação contrária à Magna Carta, no AI-AgR182458, rel. Min. Marco Aurélio, Data da Decisão: 04/03/1997.

O plenário do Supremo Tribunal Federal acolhe o mesmo entendimento aqui manifestado, como se vê do recente julgamento (18 de fevereiro de 2022) dos ED na ACO no 2.988/DF, quando aplicou o § 8º do artigo 85 do CPC para o fim de, aplicando a equidade, reduzir os honorários fixados em desfavor da Fazenda Pública. Outros precedentes plenários da Suprema Corte: ACO 637 ED, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno - ACO 1.650-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno.

Logo, mantenho os honorários advocatícios em desfavor da parte embargada no quantum fixado na r. sentença.”

Ante o exposto, voto por negar provimento aos agravos internos.

É como voto.

 



E M E N T A

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. ARTIGO 1.021 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. MULTA ISOLADA. FATO GERADOR. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS POR EQUIDADE. POSSIBILIDADE DA DECISÃO UNIPESSOAL, AINDA QUE NÃO SE AMOLDE ESPECIFICAMENTE AO QUANTO ABRIGADO NO NCPC. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DAS EFICIÊNCIA (ART. 37, CF), ANÁLISE ECONÔMICA DO PROCESSO E RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO (ART. 5º, LXXVIII, CF - ART. 4º NCPC). ACESSO DA PARTE À VIA RECURSAL (AGRAVO). APRECIAÇÃO DO TEMA DE FUNDO: AGRAVOS INTERNOS IMPROVIDOS.

1. Eficiência e utilitarismo podem nortear interpretações de normas legais de modo a que se atinja, com rapidez sem excessos, o fim almejado pelas normas e desejado pela sociedade a justificar a ampliação interpretativa das regras do NCPC que permitem as decisões unipessoais em sede recursal, para além do que a letra fria do estatuto processual previu, dizendo menos do que deveria. A possibilidade de maior amplitude do julgamento monocrático - controlado por meio do agravo - está consoante os princípios que se espraiam sobre todo o cenário processual, tais como o da eficiência (art. 37, CF; art. 8º do NCPC) e da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF; art. 4º do NCPC).

2. O ponto crucial da questão consiste em, à vista de decisão monocrática, assegurar à parte acesso ao colegiado. O pleno cabimento de agravo interno - AQUI UTILIZADO PELA PARTE - contra o decisum, o que afasta qualquer alegação de violação ao princípio da colegialidade e de cerceamento de defesa; ainda que haja impossibilidade de realização de sustentação oral, a matéria pode, desde que suscitada, ser remetida à apreciação da Turma, onde a parte poderá acompanhar o julgamento colegiado, inclusive valendo-se de prévia distribuição de memoriais.

3. A glosa efetuada pela embargada no sentido de excluir a multa isolada resultante do não recolhimento das estimativas de IRPJ e CSLL vencidas em 2007 sob o pretexto de que a penalidade pecuniária foi constituída em 2010 não encontra amparo no CTN e na doutrina pátria que leciona sobre o surgimento do fato gerador da obrigação tributária principal e da obrigação tributária acessória.

4. A obrigação tributária principal encontra-se plasmada no art. 113, 1º, do CTN. O seu nascimento ocorrerá quando presentes os elementos constitutivos do fato gerador em concreto da relação jurídica de tributação, gerando, por conseguinte, a obrigação de o sujeito passivo pagar o montante devido após o procedimento de lançamento tributário efetuado por ele próprio (lançamento por homologação) ou pelo Fisco (lançamento de ofício), sob pena de inscrição do débito em dívida ativa para futura cobrança executiva.

5. A obrigação tributária acessória, prevista no art. 113, 2º, do CTN tem por escopo dar suporte à cobrança da obrigação principal, impondo ao contribuinte o dever de se abster da prática de atos que inviabilizem a execução do ofício arrecadatório estatal, além de estabelecer ao contribuinte a obrigatoriedade de efetuar atividades de natureza eminentemente administrativa, transformando-o em uma "longa manus" do Estado durante o procedimento de fiscalização dos tributos devidos.

6. No caso dos autos houve a imposição de uma multa de ofício em decorrência do inadimplemento da obrigação principal, transformando a penalidade pecuniária, outrora cognominada de obrigação acessória em sentido amplo, em obrigação principal para fins de cobrança pela via do executivo fiscal, sendo a ela equiparada para todos os efeitos,  nos termos do art. 113, 3º, do CTN.

7. É perfeitamente possível que a obrigação tributária principal e acessória advenham ao mundo jurídico no mesmo espaço temporal, máxime quando a segunda for uma mera decorrência do descumprimento da primeira, razão pela qual não deve ser adotado o entendimento da embargada que, além de inadmitir a coincidência de hipótese de incidência entre ambas em nenhum instante, transfere para o lançamento tributário o momento do nascimento do fato gerador da obrigação acessória.

8. A doutrina pátria sedimentou o entendimento da natureza jurídica biforme do lançamento tributário, sendo, ao mesmo tempo, declaratório da obrigação tributária pretérita e constitutivo do crédito tributário a ser inscrito em dívida ativa da União, não havendo maiores questionamentos a esse respeito.

9. Considerando-se que o art. 2º, caput, da Lei nº 9.430/96 faculta às pessoas jurídicas tributadas pela sistemática do lucro real a opção pelo recolhimento dos tributos devidos de maneira mensal e por estimativa, ao passo que o art. 44, II, "b", do mesmo diploma estabelece que a multa isolada de cinquenta por cento sobre o valor do pagamento mensal será devida após o mero escoamento do prazo para o pagamento da exação fiscal, deve-se concluir, a partir de uma interpretação sistemática de todos os diplomas incidentes sobre a matéria, que o fato gerador da obrigação acessória em tela ocorreu com a superveniência do inadimplemento da obrigação tributária principal (2007), não havendo razão jurídica alguma para a glosa fazendária efetuada com base no art. 1º, § 2º, da Lei 11.941/09, eis que a obrigação encontrava-se ativa e exigível, repita-se, desde o seu vencimento.

10. Honorários advocatícios fixados na sentença em desfavor da União em R$ 15.000,00 pelo critério da equidade, considerado o zelo profissional desempenhado ao longo da marcha processual e o grau de complexidade da controvérsia instaurada em juízo, mantidos na decisão ora agravada.

11. É possível a aplicação do § 8º do artigo 85 do CPC no caso de verba honorária excessiva, a caracterizar autêntico enriquecimento sem causa, eis que deve haver proporcionalidade entre a remuneração do advogado e o serviço por ele prestado, por mais respeitável que seja (como é o caso dos autos); o plenário do Supremo Tribunal Federal acolhe o mesmo entendimento aqui manifestado, como se vê do recente julgamento (18 de fevereiro de 2022) dos ED na ACO no 2.988/DF, quando aplicou o § 8º do artigo 85 do CPC para o fim de, aplicando a equidade, reduzir os honorários fixados em desfavor da Fazenda Pública. Outros precedentes plenários da Suprema Corte: ACO 637 ED, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno - ACO 1.650-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno.

12. Agravos internos desprovidos.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento aos agravos internos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.