RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Nº 5000466-87.2020.4.03.6142
RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW
RECORRENTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
RECORRIDO: MURILO HENRIQUE FARIA NASCIMENTO
Advogado do(a) RECORRIDO: ROSELENE MARFIL FERNANDES - SP394637-A
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Nº 5000466-87.2020.4.03.6142 RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW RECORRENTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP RECORRIDO: MURILO HENRIQUE FARIA NASCIMENTO Advogado do(a) RECORRIDO: ROSELENE MARFIL FERNANDES - SP394637-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Federal contra a decisão Id n. 270426171, por meio da qual o Juízo da 1ª Vara Federal de Lins (SP), com fundamento no art. 395, III, do Código de Processo Penal, rejeitou a denúncia oferecida contra Murilo Henrique Faria Nascimento pela prática, em tese, do delito do art. 289, § 1º, do Código Penal. O Juízo a quo rejeitou a denúncia ofertada por considerar que o papel moeda utilizado havia sido grosseiramente falsificado, e entendeu pela desclassificação da conduta para o delito de estelionato, de competência da Justiça Estadual, com fundamento na Súmula n. 73 do Superior Tribunal de Justiça. Em suas razões de recurso em sentido estrito, o Ministério Público Federal requer o reconhecimento da competência da Justiça Federal para o julgamento da acusação pela prática de crime de circulação de moeda falsa em sua forma privilegiada (CP, art. 289, § 2º) e o recebimento da denúncia. Aduz o seguinte: 2. A Súmula nº 73 do STJ dispõe: A utilização de papel moeda grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, da competência da Justiça Estadual. Foi aprovada pela 3ª Seção do STJ em 15.04.1993 a partir dos seguintes precedentes: CC 337-SC (3ª S, 31.08.1989 – DJ 25.09.1989) CC 619-GO (3ª S, 21.09.1989 – DJ 16.10.1989) CC 938-RJ (3ª S, 23.08.1990 – DJ 24.09.1990) CC 1.040-SP (3ª S, 05.04.1990 – DJ 23.04.1990) CC 1.041-SP (3ª S, 05.04.1990 – DJ 30.04.1990) CC 1.886-RO (3ª S, 03.10.1991 – DJ 16.10.1991) CC 1.972-SP (3ª S, 06.06.1991 – DJ 24.06.1991) CC 3.564-RO (3ª S, 15.10.1992 – DJ 26.10.1992) Naqueles precedentes, que aspectos qualificavam as falsificações como grosseiras? Vejamos: CC 337 Falsificação (...) constatável a olho nu CC 619 inidôneas para enganar o homem médio CC 938 As cédulas apreendidas têm todas elas, no meio, tarjas em branco perfeitamente visíveis, com dizeres como “Clube de Jogos” ou “Financeira Progresso” ou ainda espaços destinados ao preenchimento com indicações sobre “nome, depósito, número da conta, data”. É possível que os preços [rectius: presos] as detivessem com a intenção de aplicarem o conto do paco modalidade de estelionato... CC 1.040 incapaz de enganar o homem comum CC 1.041 incapaz (...) de enganar o homem comum CC 1.886 “Má qualidade do papel; inexistência da marca d’água; ausência de talho- doce; falta de nitidez nos desenhos que por sua vez encontravam-se invertidos; inexistência do fio de segurança com legenda microimprensa e à direita do retrato de Juscelino Kubitschek, vista parcial da parte posterior do prédio ‘Senado Federal; Palácio da Alvorada’, através de processo off-set.” (...) No caso não há duvidar-se da péssima figuração do material apreendido, segundo afirmado pela perícia e a olho nu se constata das pseudocédulas apreendidas. CC 1.972 A investigação policial apoiada em laudos técnicos mostra que a única cédula posta em circulação é de fabricação grosseira. Aliás, isso foi possível porque quem a recebeu foi um menor de 13 anos de idade, que começara a trabalhar no estabelecimento comercial. CC 3.564 constatável a olho nu 3. No caso ora sob análise – apesar de a Polícia Federal haver juntado aos autos apenas cópia em preto e branco do Laudo de Perícia Criminal Federal –, o MPF destaca que: a) (aparentemente) um “homem comum” (João dos Santos Brito) foi enganado; b) a falsificação não era “constatável a olho nu” (a PC-SP juntou aos autos cópia colorida da cédula),[15] especialmente quando se considera que a cédula estava “em mau estado de conservação” [16] e tinha inclusive “simulacros dos elementos de segurança”; c) a falsificação foi caracterizada pela Polícia Federal “mediante o uso de instrumentos ópticos adequados (lupas manuais, aparelhos documentoscópicos com iluminação artificial emergente, incidente rasante, e ultravioleta e réguas milimetradas), verificação de tipos e qualidade de impressão, qualidade do papel e demais elementos de segurança”, ou seja, através de análise muito diferente daquela realizada pelo “homem comum”; e d) o laudo reconhece que, “dependendo das circunstâncias em que as cédulas forem apresentadas, tais como recebimento em meio a outras cédulas, confiança no portador, pressa desatenção, pouca iluminação etc., é possível que confunda pessoas e levem-nas a aceitá-la como se autêntica fosse.” (Id n. 270426174) A decisão recorrida foi mantida por seus próprios fundamentos (Id n. 270426175). Foram apresentadas contrarrazões pelo desprovimento do recurso interposto (Id n. 270426187). O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. João Francisco Bezerra de Carvalho, manifestou-se pelo desprovimento do recurso em sentido estrito (Id n. 270688922). É o relatório. Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Nº 5000466-87.2020.4.03.6142 RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW RECORRENTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP RECORRIDO: MURILO HENRIQUE FARIA NASCIMENTO Advogado do(a) RECORRIDO: ROSELENE MARFIL FERNANDES - SP394637-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Imputação. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra Murilo Henrique Faria Nascimento pela prática do crime do art. 289, § 2º, do Código Penal. Narra a denúncia o seguinte: Em data incerta, mas anterior a 02.03.2020, MURILO recebeu 1 cédula falsa com valor impresso de R$ 50,00. No dia 02.03.2020, às 15h50min, MURILO (junto com Marcos Junior) foi até a Rua Carlos Rodrigues Pinto, n.º 264, em Promissão-SP, onde João dos Santos Brito residia com seu genro, Sergio Vicente dos Santos. Nesse local João vendia as vassouras de palha que fazia. Inicialmente MURILO (e Marcos Junior) foram atendidos por Sergio; posteriormente, porém, João “saiu de lá do fundo onde ele estava fabricando e terminou o atendimento”. MURILO então comprou de João uma vassoura, que custava R$ 10,00, pagando com a cédula – que sabia ser falsa – com valor impresso de R$ 50,00, assim a restituindo à circulação. João entregou o troco (R$ 40,00) a MURILO “e eles já foram embora”. A cédula falsa continha “simulacros dos elementos de segurança” e estava “bem suja”, “parecia uma cédula antiga”, de modo que João não percebeu sua falsidade de imediato. Como a intenção de MURILO e Marcos Junior era apenas a de trocar a cédula falsa por cédulas verdadeiras, eles “deixaram a vassoura jogada na rua [“duas quadras depois da casa” de João”] e sumiram, saíram correndo”. Por outro lado: após alguns instantes João estranhou “a textura da nota” e chamou Sergio, que com sua experiência trabalhando em um posto de combustíveis, concluiu que a cédula era falsa. Ele então correu “até a esquina” e viu MURILO e Marcos Junior “correndo”; depois “não vi[u] mais eles”. Sergio então voltou até sua casa, pegou seu carro e foi “na redondeza e encontr[ou] os dois”, na Rua São Silvestre. Marcos Junior, nesse momento, fugiu. MURILO ficou e contou a Sergio que eles “já tinham ido num supermercado e já tinham gasto um pouco do dinheiro” (haviam sobrado apenas R$ 6,00). Por fim, Sergio chamou a Polícia Militar (PM); os Cabos (Cbs.) Jocelito Telli da Silva e Cleber Batalha Rodrigues foram até o local e conduziram MURILO até a Delegacia de Polícia Civil de Promissão, onde ele devolveu os R$ 6,00 a João. Em síntese: no dia 02.03.2020 MURILO dolosamente restituiu à circulação uma cédula com valor impresso de R$ 50,00, sabendo que era falsa e assim causando dano material a João. Assim agindo praticou crime de circulação de moeda falsa em sua forma privilegiada (Código Penal - CP, art. 289, § 2º). (Id n. 270425997) Do processo. A sentença recorrida foi proferida nos seguintes termos: Trata-se de inquérito policial instaurado para apuração do delito previsto no artigo 289, § 1º, do Código Penal, praticado, em tese, por MURILO HENRIQUE FARIA NASCIMENTO, qualificado às páginas 24/26 do ID 37522388. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face do indiciado, em razão de que “no dia 02.03.2020 MURILO dolosamente restituiu à circulação uma cédula com valor impresso de R$ 50,00, sabendo que era falsa e assim causando dano material a João”. É a síntese do necessário. Passo a decidir. Tenho que a hipótese é de rejeição da denúncia, porquanto, a meu ver, há que se desclassificar para o delito de estelionato, de competência da Justiça Estadual (Súmula Nº 73 do STJ). Para que o delito de moeda falsa se configure é preciso que a cédula falsa seja parecida com verdadeira a ponto de ser apta a enganar homem médio. O fato narrado na peça acusatória não constitui crime de moeda falsa, vez que o papel moeda utilizado foi grosseiramente falsificado. Deveras, o Laudo nº 361/2020 (documentoscopia) acostado no ID 44418744, pág. 1/6, descreve: “a cédula em tela apresentou simulacros dos elementos em péssima qualidade, assim como a sensação tátil e aspecto pictório distintos do observado em cédulas autênticas. A falsificação pode ser facilmente detectada, o que diminui o seu potencial de enganar o usuário em meio circulante”. Além do que concluiu o Laudo, relevante destacar os seguintes pontos: 1) A conduta foi praticada durante o dia; 2) A vítima possuía comércio de vassouras; 3) A própria vítima, João dos Santos Brito, segundo a declaração de Sérgio Vicente dos Santos ao MPF (ID 268541000, pág. 22/28), desconfiara que a cédula era falsa, eis que João achou a nota estranha - estranhou a textura da nota. Nos termos da Súmula nº 73 do Colendo Superior Tribunal de Justiça “A utilização de papel moeda grosseiramente falsificado configura, em tese, o crime de estelionato, da competência da Justiça Estadual”. Nesse diapasão, o reconhecimento da falsificação grosseira do papel moeda acarreta a rejeição da denúncia pela atipia do crime de moeda falsa. Diante do exposto, pela ausência de justa causa para propositura da ação penal (artigo 395, inciso III, do CPP), NÃO RECEBO A DENÚNCIA oferecida em face de MURILO HENRIQUE FARIA NASCIMENTO, pela prática, em tese, do delito tipificado no art. 289, § 1º, do Código Penal. Determino a remessa dos autos à Justiça Estadual de Promissão/SP, para as providências que entender cabíveis em relação ao crime, em tese, de estelionato, nos termos da Súmula nº 73 do STJ. Intime-se. (Id n. 270426171) Preliminar. Preliminarmente, suscito a incompetência deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região para processar e julgar o recurso em sentido estrito. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra o ora recorrido em razão de suposta restituição à circulação de uma cédula falsa com valor impresso de R$ 50,00 (cinquenta reais), conduta que em tese tipifica o crime do art. 289, § 2º, do Código Penal. Ainda que, ao rejeitar a denúncia, o Juízo a quo tenha feito referência ao crime previsto no parágrafo 1º e não propriamente no parágrafo 2º do art. 289 do Código Penal, é possível concluir tratar-se de erro material da decisão, pois não há na sua fundamentação qualquer indicativo de desclassificação dos fatos narrados na denúncia para a forma do art. 289, § 1º, do Código Penal. Assim, observa-se que o crime imputado, previsto no art. 289, § 2º, do Código Penal, é punido com pena máxima de 2 (dois) anos de detenção, tratando-se, portanto, de crime de menor potencial ofensivo, nos termos do art. 61 da Lei n. 9.099/95, conforme reconhecido pelo próprio Ministério Público Federal na cota de oferecimento à denúncia (Id n. 270425984). Conforme determina o art. 2º da Lei n. 10.259/01, no âmbito da Justiça Federal compete ao Juizado Especial Federal Criminal processar e julgar os feitos de competência da Justiça Federal relativos às infrações de menor potencial ofensivo. Logo, o crime apurado no presente feito insere-se na competência do Juizado Especial Federal Criminal, razão pela qual a apreciação de recurso interposto contra a decisão proferida pelo Juízo a quo compete à Turma Recursal do Juizado Especial Federal Criminal, conforme previsto na Lei n. 10.259/01 e regulamentado pelas Resoluções ns. 110 e 111, de 10.01.02, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, atos normativos que implantaram os Juizados Especiais Federais Criminais Adjuntos e as Turmas Recursais Criminais. Nesse sentido o seguinte precedente desta 5ª Turma: APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 48 DA LEI 9.605/98. CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. INCOMPETÊNCIA DA CORTE REGIONAL. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO SENTIDO ESTRITO. REMESSA À TURMA RECURSAL DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CRIMINAL. 1. Crime ambiental. Artigo 48 da Lei nº 9.605/98. Pena de detenção de 06 (seis) meses a 01 (um) ano. Infração de menor potencial ofensivo - pena máxima cominada inferior a 2 anos. Artigo 61 da Lei nº 9.099/95. (TRF da 3ª Região, ReSe n. 0000186-71.2013.4.03.6006, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, Rel. p/ ac. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 14.12.20) Revejo meu entendimento anterior a fim de aderir ao posicionamento prevalente supra. Ademais, conforme Provimento n. 359, de 27.08.12, do Conselho da Justiça Federal da 3ª Região, desde 30.11.12 o Juizado Especial Federal de Lins (SP) integra a 1ª Vara Federal mista da 42ª Subseção Judiciária em Lins como Juizado Especial Adjunto Cível e Criminal. Dessa forma, proferida a decisão pelo Juízo da 1ª Vara Federal de Lins (SP), conclui-se que compete a uma das Turmas Recursais da Seção Judiciária de São Paulo com competência criminal apreciar o recurso interposto contra referida decisão. Ante o exposto, DE OFÍCIO, suscito preliminar de incompetência deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região, determinando a remessa dos autos a uma das Turmas Recursais com competência criminal da Seção Judiciária de São Paulo. É o voto.
2. Recurso. Competência da Turma Recursal do Juizado Especial Federal Criminal. Lei 10.259/01 e Resoluções nº 110 e 111, de 10.01.2002, do Tribunal Regional Federal da Terceira Região.
3. Incompetência desta Corte Regional. Não conhecimento do recurso. Remessa dos autos ao Juízo competente.
E M E N T A
PENAL. PROCESSUAL PENAL. MOEDA FALSA. CP, ART. 289, § 2º. DENÚNCIA REJEITADA. FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. COMPETÊNCIA DA TURMA RECURSAL. PRELIMINAR. DECLINAÇÃO DA COMPETÊNCIA.
1. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra o ora recorrido em razão de suposta restituição à circulação de uma cédula falsa com valor impresso de R$ 50,00 (cinquenta reais), conduta que em tese tipifica o crime do art. 289, § 2º, do Código Penal.
2. O crime imputado, previsto no art. 289, § 2º, do Código Penal, é punido com pena máxima de 2 (dois) anos de detenção, tratando-se, portanto, de crime de menor potencial ofensivo, nos termos do art. 61 da Lei n. 9.099/95, conforme reconhecido pelo próprio Ministério Público Federal na cota de oferecimento à denúncia.
3. Conforme determina o art. 2º da Lei n. 10.259/01, no âmbito da Justiça Federal compete ao Juizado Especial Federal Criminal processar e julgar os feitos de competência da Justiça Federal relativos às infrações de menor potencial ofensivo.
4. O crime apurado no presente feito insere-se na competência do Juizado Especial Federal Criminal, razão pela qual a apreciação de recurso interposto contra a decisão proferida pelo Juízo a quo compete à Turma Recursal do Juizado Especial Federal Criminal, conforme previsto na Lei n. 10.259/01 e regulamentado pelas Resoluções ns. 110 e 111, de 10.01.02, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, atos normativos que implantaram os Juizados Especiais Federais Criminais Adjuntos e as Turmas Recursais Criminais.
5. Incompetência deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Remessa dos autos a uma das Turmas Recursais com competência criminal da Seção Judiciária de São Paulo.