Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000514-05.2022.4.03.6133

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA

APELANTE: CS BRASIL TRANSPORTES DE PASSAGEIROS E SERVICOS AMBIENTAIS LTDA.

Advogado do(a) APELANTE: GUILHERME AMARAL DALLA LIBERA - RS67684-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM MOGI DAS CRUZES

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000514-05.2022.4.03.6133

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA

APELANTE: CS BRASIL TRANSPORTES DE PASSAGEIROS E SERVICOS AMBIENTAIS LTDA.

Advogado do(a) APELANTE: GUILHERME AMARAL DALLA LIBERA - RS67684-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM MOGI DAS CRUZES

 

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R E L A T Ó R I O

 

 

 

 

Trata-se de apelação interposta pela impetrante contra sentença que denegou a segurança, pleiteada com o objetivo de obter provimento jurisdicional que reconheça o direito de proceder ao creditamento de PIS e COFINS sobre as despesas financeiras. Não houve condenação em honorários advocatícios, tendo em vista o disposto no art. 25 da Lei 12.016/2009.

 

Em suas razões, o contribuinte alega, em síntese, que:

(i) não é possível interpretar a norma do § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/2004 – que autoriza a manipulação das alíquotas do PIS/COFINS – de forma dissociada do caput do artigo, que trata da concessão do crédito, já que o parágrafo complementa o caput;

(ii) não pode prosperar argumentação no sentido de que a Lei nº 10.865/04 não autorizaria interpretação de que a redução e o restabelecimento de alíquotas exijam, necessariamente, a concessão do crédito das contribuições sobre as despesas financeiras (em favor do contribuinte);

(iii) Possui o contribuinte, então, o direito ao crédito dessas Contribuições sobre despesas financeiras, sob pena de violação do referido art. 27 da Lei nº 10.865/2004 e, ainda, violação ao artigo 195, § 12, da CF/88;

(iv) o direito ao crédito é corolário do princípio da não-cumulatividade, pois as Leis n. 10.637/02 e 10.833/03 criaram contribuições não-cumulativas;

(v) conquanto as Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03 tenham estabelecido, taxativamente, a instituição de um sistema de não- cumulatividade, de outro lado, contraditoriamente, a Lei n.º 10.865/04 e o Decreto 8.426/2015, ao não permitirem o direito ao crédito sobre a despesa financeira, acabaram por esvaziar por completo o propósito do aludido texto normativo;

(vi) o legislador ordinário se encontra adstrito ao princípio da não cumulatividade e que se deve considerar compreendidos no conceito de insumo não apenas os gastos com itens essenciais, mas, também, aqueles gastos relevantes em relação à atividade econômica desenvolvida pelo contribuinte;

(vii) conforme corrobora a documentação acostada à exordial, tem-se que a Apelante, para desenvolver suas atividades, precisa recorrer a operações que geram despesas financeiras, as quais representam passivos para a empresa;

(viii) o gasto com despesas financeiras apresenta-se não apenas como relevante, mas, inclusive, como essencial ao desenvolvimento da atividade econômica da Apelante, ao reverso sendo inviabilizada sua operação, a qual se mostra dependente de ingresso de recursos de terceiros;

(ix) o conceito de insumo deve ser interpretado de maneira ampla e extensiva;

(x) todo gasto relevante ou essencial correlato ao desempenho da atividade econômica, cuja subtração possa comprometê-la, deve ser incluído nas bases de créditos do PIS e da COFINS;

(xi) Logo, a possibilidade de se creditar das despesas financeiras deve ser analisada sob o novel prisma sacramentado em sede de casos repetitivos.

Com o acolhimento de sua pretensão, pugna pelo reconhecimento do direito à compensação/restituição do indébito apurado nos cinco anos que antecederam a propositura da ação.

 

Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.

 

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo prosseguimento do feito.

 

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000514-05.2022.4.03.6133

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA

APELANTE: CS BRASIL TRANSPORTES DE PASSAGEIROS E SERVICOS AMBIENTAIS LTDA.

Advogado do(a) APELANTE: GUILHERME AMARAL DALLA LIBERA - RS67684-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM MOGI DAS CRUZES

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

 

O § 12 do art. 195 da Constituição Federal atribui à lei a definição dos setores da atividade econômica para os quais o PIS e a COFINS, na qualidade de contribuições sociais incidentes sobre a receita ou o faturamento, serão não-cumulativas.

 

Além de outras questões relativas à legislação aduaneira e tributária, as Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 dispõem, respectivamente, sobre a não-cumulatividade do PIS e da COFINS. Ambas previam, no art. 3º, V, a possibilidade de desconto de créditos relativos a despesas de empréstimos e financiamentos, porém essa possibilidade deixou de existir a partir do advento da Lei 10.865/2004, que deu nova redação ao referido dispositivo.

 

Não há mácula na alteração legislativa em apreço, pois a lei consubstancia veículo legislativo apto a definir quais são as despesas passíveis de gerar créditos de PIS e COFINS ao contribuinte, de forma que a inovação trazida nesse ponto pela Lei 10.865/2004 está em sintonia com a disciplina do art. 195, § 12, da Constituição Federal.

 

A constitucionalidade dessa inovação legislativa foi, inclusive, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal em acórdão julgado sob a sistemática da repercussão geral (RE 1.043.313 – Tema 939), ocasião em que foi ressaltado que referida mudança não desnatura o modelo não cumulativo dessas contribuições:

 

Recurso extraordinário. Repercussão geral. Direito Tributário. Princípio da legalidade tributária. Necessidade de análise de cada espécie tributária e de cada caso concreto. Contribuição ao PIS/PASEP e à Cofins. Parágrafo 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04. Possibilidade de o Poder Executivo reduzir e restabelecer alíquotas da contribuição ao PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de não-cumulatividade das referidas contribuições, nas hipóteses que fixar. Presença de função extrafiscal a ser desenvolvida. Não cumulatividade. Revogação de norma que concedia direito a apuração de crédito. Possibilidade.

1. A observância do princípio da legalidade tributária é verificada de acordo com cada espécie tributária e à luz de cada caso concreto, sendo certo que não existe ampla e irrestrita liberdade para o legislador realizar diálogo com o regulamento no tocante aos aspectos da regra matriz de incidência tributária.

2. Para que a lei autorize o Poder Executivo a reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins, é imprescindível que o valor máximo dessas exações e as condições a serem observadas sejam prescritos em lei em sentido estrito, bem como exista em tais tributos função extrafiscal a ser desenvolvida pelo regulamento autorizado.

3. Na espécie, o § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04 permite ao Poder Executivo reduzir e restabelecer, até os percentuais legalmente fixados, as alíquotas da contribuição ao PIS/PASEP e da Cofins incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de não cumulatividade dessas contribuições, nas hipóteses que fixar. Além da fixação de tetos, houve, na lei, o estabelecimento das condições para que o Poder Executivo possa alterar essas alíquotas. Ademais, a medida em tela está intimamente conectada à otimização da função extrafiscal presente nas exações em questão. Verifica-se, ainda, que o diálogo entre a lei tributária e o regulamento se dá em termos de subordinação, desenvolvimento e complementariedade.

4. É constitucional a Lei nº 10.865/04 na parte em que, ao dar nova redação ao inciso V do art. 3º das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03, revogou as normas legais que davam ao contribuinte direito de apurar, no âmbito do sistema não cumulativo de cobrança das referidas contribuições, créditos em relação a despesas financeiras decorrente de empréstimos e financiamentos. A alteração vale para todos aqueles que estão submetidos à sistemática não cumulativa de cobrança da contribuição ao PIS/PASEP e da Cofins. Ademais, tal mudança não desnatura o próprio modelo não cumulativo dessas contribuições.

5. Recurso extraordinário a que se nega provimento.

6. Tese proposta para o Tema 939 da sistemática de repercussão geral: “É constitucional a flexibilização da legalidade tributária constante do § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04, no que permitiu ao Poder Executivo, prevendo as condições e fixando os tetos, reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas por pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo, estando presente o desenvolvimento de função extrafiscal”.

(RE 1043313, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 10/12/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-057  DIVULG 24-03-2021  PUBLIC 25-03-2021)   -   destaque nosso.

 

Passo a analisar a possibilidade de enquadramento das referidas despesas como insumo.

 

As Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, em seu art. 3º, II, preceituam sobre a possibilidade de o contribuinte proceder, após a apuração da base de cálculo destas contribuições, ao desconto de créditos concernentes a bens e serviços utilizados como insumos na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes.

 

A definição do conceito de insumos, essencial para a fruição desse benefício, tem sido alvo de divergências entre fisco e contribuinte.

 

O Supremo Tribunal Federal alçou à sistemática da repercussão geral a questão atinente ao alcance do art. 195, § 12, da Constituição Federal (RE 841.979 – Tema 756). Em julgamento virtual finalizado em 25.11.2022, firmou compreensão pela autonomia do legislador ordinário para disciplinar a não-cumulatividade prevista no referido dispositivo, desde que respeitados os preceitos constitucionais, e assinalou também que a discussão sobre a expressão “insumo”, presente no art. 3, II, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, é infraconstitucional.

 

O aresto em referência está assim ementado:

 

Repercussão geral. Recurso extraordinário. Direito tributário. Regime não cumulativo da contribuição ao PIS e da COFINS. Autonomia do legislador ordinário para tratar do assunto, respeitadas as demais normas constitucionais. Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03. Conceito de insumo. Matéria infraconstitucional. Artigo 31, § 3º, da Lei nº 10.865/04. Constitucionalidade.

1. O art. 195, § 12, da Constituição Federal, incluído pela EC nº 42/03, conferiu autonomia para o legislador tratar do regime não cumulativo de cobrança da contribuição ao PIS e da COFINS, devendo ele, não obstante, respeitar os demais preceitos constitucionais, como a matriz constitucional das citadas exações, mormente o núcleo de sua materialidade, e os princípios da razoabilidade, da isonomia, da livre concorrência e da proteção da confiança.

2. Nesse contexto, são válidas as Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03 no que, v.g., estipularam como se deve aproveitar o crédito decorrente de ativos produtivos, de edificações e de benfeitorias (art. 3º, § 1º, inciso III) e no que impossibilitaram o crédito quanto ao valor de mão de obra paga a pessoa física e ao valor da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento do PIS ou da COFINS, inclusive no caso de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição (art. 3º, § 2º, incisos I e II).

3. Não se depreende diretamente do texto constitucional o que se deve entender, de maneira estanque, por insumo para fins da não cumulatividade de PIS/COFINS, cabendo, assim, ao legislador dispor sobre tal assunto. De mais a mais, é certo que o art. 3º, inciso II, das referidas leis, considerada a interpretação conferida pelo Superior Tribunal de Justiça (Temas repetitivos nºs 779 e 780), não viola aqueles ou outros preceitos constitucionais.

4. É constitucional o § 3º do art. 31 da Lei nº 10.865/04, na medida em que a vedação dele constante também se encontra em harmonia com o texto constitucional, mormente com a irretroatividade tributária e com os princípios da proteção da confiança, da isonomia, da razoabilidade.

5. Recurso extraordinário não provido.

6. Foram fixadas as seguintes teses para o Tema nº 756: “I. O legislador ordinário possui autonomia para disciplinar a não cumulatividade a que se refere o art. 195, § 12, da Constituição, respeitados os demais preceitos constitucionais, como a matriz constitucional da contribuição ao PIS e da COFINS e os princípios da razoabilidade, da isonomia, da livre concorrência e da proteção à confiança; II. É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a discussão sobre a expressão insumo presente no art. 3º, inciso II, das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03 e sobre a compatibilidade com essas leis das IN SRF nºs 247/02 (considerada a atualização pela IN SRF nº 358/03) e 404/04. III. É constitucional o § 3º do art. 31 da Lei nº 10.865/04”.

(RE 841979, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 28/11/2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-023  DIVULG 08-02-2023  PUBLIC 09-02-2023)

 

Restou consignado no voto condutor do precedente paradigmático em apreço que o art. 195, § 12, da Constituição Federal permite ao legislador ordinário estabelecer restrições a crédito dos recolhimentos relativos ao PIS e à COFINS no regime não cumulativo de cobrança dessas contribuições.

 

No julgamento do recurso especial repetitivo 1.221.170/PR (Temas 779 e 780), o Superior Tribunal de Justiça já assentara orientação no sentido de que O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.

 

O respectivo acórdão recebeu a seguinte ementa:

 

TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. NÃO-CUMULATIVIDADE. CREDITAMENTO. CONCEITO DE INSUMOS. DEFINIÇÃO ADMINISTRATIVA PELAS INSTRUÇÕES NORMATIVAS 247/2002 E 404/2004, DA SRF, QUE TRADUZ PROPÓSITO RESTRITIVO E DESVIRTUADOR DO SEU ALCANCE LEGAL. DESCABIMENTO. DEFINIÇÃO DO CONCEITO DE INSUMOS À LUZ DOS CRITÉRIOS DA ESSENCIALIDADE OU RELEVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL DA CONTRIBUINTE PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO, SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC/1973 (ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015).

1. Para efeito do creditamento relativo às contribuições denominadas PIS e COFINS, a definição restritiva da compreensão de insumo, proposta na IN 247/2002 e na IN 404/2004, ambas da SRF, efetivamente desrespeita o comando contido no art. 3o., II, da Lei 10.637/2002 e da Lei 10.833/2003, que contém rol exemplificativo.

2. O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.

3. Recurso Especial representativo da controvérsia parcialmente conhecido e, nesta extensão, parcialmente provido, para determinar o retorno dos autos à instância de origem, a fim de que se aprecie, em cotejo com o objeto social da empresa, a possibilidade de dedução dos créditos relativos a custo e despesas com: água, combustíveis e lubrificantes, materiais e exames laboratoriais, materiais de limpeza e equipamentos de proteção individual-EPI.

4. Sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015), assentam-se as seguintes teses: (a) é ilegal a disciplina de creditamento prevista nas Instruções Normativas da SRF ns. 247/2002 e 404/2004, porquanto compromete a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal como definido nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003; e (b) o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de terminado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo Contribuinte.

(REsp n. 1.221.170/PR, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 22/2/2018, DJe de 24/4/2018)

 

A análise do enquadramento de determinado bem ou serviço ao conceito de insumo é tarefa a ser realizada em cada caso concreto.

 

Para realizar tal mister, deve-se ter por parâmetro a aferição da essencialidade ou relevância (Temas 779 e 780 do STJ) em relação a uma atividade de prestação de serviços ou de produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda (art. 3º, II, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003). A essencialidade ou relevância, portanto, se refere, necessariamente, a atividades voltadas ao processo produtivo ou à prestação de serviços.

 

De acordo com seu CNPJ, a impetrante tem como atividade econômica principal o transporte rodoviário coletivo interestadual de passageiros, com itinerário fixo, exercendo de forma secundária diversas outras atividades, relacionadas também ao transporte de passageiros, bem como à coleta e tratamento de resíduos, usinas de compostagem, manutenção e reparação mecânica de veículos, locação de veículos, serviços de reboque, engenharia e fornecimento e gestão de recursos humanos para terceiros (ID 263556866).

 

Em seu entender, faz jus à apropriação de créditos de PIS e COFINS com relação a diversas despesas financeiras, a exemplo das despesas bancárias, despesas com captações, financiamentos, juros e encargos bancários, juros passivos e juros sobre remuneração de capital, dentre outras.

 

Embora os itens mencionados possam consubstanciar uma despesa ou custo relevante para o contribuinte, eles não são essenciais a um processo produtivo ou à prestação de serviços, não se relacionando à atividade-fim da empresa, e, por esta razão, não comportam a pretendida caracterização como insumos, de modo a não ser cabível o creditamento postulado nestes autos.

 

Em síntese: a pretensão manifestada nestes autos não encontra amparo legal no ordenamento vigente (a Lei 10.865/2004, que deu nova redação ao art. 3º, V, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2033, excluiu a possibilidade de créditos de despesas de empréstimos e financiamentos), além de não encontrar suporte na decisão paradigmática proferida pelo STJ nos Temas 779 e 780, tendo em vista que as despesas financeiras da impetrante não se amoldam ao conceito de insumos.

 

Sobre o tema, cumpre destacar didático precedente do Superior Tribunal de Justiça:

 

TRIBUTÁRIO. PIS E CONFINS. CREDITAMENTO. DESPESAS COM EMPRÉSTIMOS E FINANCIAMENTO. PROIBIÇÃO LEGAL. NÃO INCLUSÃO NO CRITÉRIO DE INSUMO.

1. Cuida-se de inconformismo com acórdão do Tribunal de origem que não autorizou dedução de créditos de PIS e COFINS, no âmbito do regime não cumulativo das contribuições, das despesas financeiras.

HISTÓRICO DA DEMANDA

2. Na origem, trata-se de Mandado de Segurança impetrado pelo recorrente contra ato imputado ao Delegado da Receita Federal em Maringá, no qual requer, em síntese, a compensação dos valores indevidamente recolhidos a título de PIS e Cofins sem a utilização dos créditos das despesas financeiras.

3. Na sentença, indeferiu o pleito, decidindo que não tem o contribuinte o direito de deduzir crédito, no âmbito do regime não cumulativo das contribuições, das despesas financeiras incorridas, com base na mesma alíquota aplicável, nos termos do Decreto n.º 8.426, de 2015, às receitas financeiras. A Corte a quo, por sua vez, ratificou a sentença denegando o Mandado de Segurança.

DISCIPLINA LEGAL DA NÃO CUMULATIVIDADE PARA O PIS E COFINS

4. Coube às Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 regulamentar a sistemática da não cumulatividade na apuração do PIS e da Cofins. Originalmente, ambas as leis admitiam a apuração de créditos de PIS e Cofins sobre as despesas financeiras decorrentes de empréstimos e financiamento.

5. Todavia, a Lei 10.865/2004 excluiu a possibilidade de apurar os créditos das mesmas contribuições sobre as despesas financeiras ao dar nova redação ao inciso V do citado preceito legal. Nenhum vício afigura-se em tal procedimento, já que é dado à lei estabelecer as despesas passíveis de gerar créditos, bem como sua forma de apuração, introduzindo novas hipóteses de creditamento ou revogando outras.

 INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL AUTORIZANDO O CRÉDITO DE PIS E COFINS SOBRE AS DESPESAS FINANCEIRAS

6. Assim sendo, não há mais previsão legal possibilitando o creditamento de PIS e Cofins sobre as despesas financeiras decorrentes de empréstimos e financiamentos. Cabendo somente à lei estabelecer as despesas que serão passíveis de gerar créditos, não faz jus a impetrante aos créditos pleiteados.

DESPESAS COM EMPRÉSTIMOS E FINANCIAMENTO NÃO SE INCLUEM NO CONCEITO DE INSUMOS

7. Acresce que o inciso II do art. 3º das leis 10.637, de 2002, e 10.833, de 2003, por seu turno, permite o desconto de créditos calculados em relação a bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes.

Isso significa dizer que insumos, no sentido restrito das referidas leis, são somente aqueles bens ou serviços empregados fisicamente "na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda", e não todas as despesas necessárias à consecução das suas atividades ou que sejam incorridas para a geração de suas receitas, como defende a impetrante. No caso de despesas, as Leis 10.637, de 2002, e 10.833, de 2003, arrolam taxativamente, nos incisos IV a X de seu art. 3º, quais aquelas dedutíveis da base de cálculo, e entre elas não se encontram as despesas financeiras.

8. Logo, sobre a caracterização das despesas financeiras como verdadeiros insumos, uma vez que viabilizariam o processo produtivo, autorizando o creditamento, entende-se como insumos, para fins de creditamento e dedução dos valores da base de cálculo da contribuição para o PIS e Cofins (arts. 3º, II, da Lei 10.637/2002, e 3º, II, da Lei 10.833/2003, respectivamente) apenas os elementos com aplicação direta na elaboração do produto ou na prestação do serviço.

9. Conforme o objeto social da recorrente, não há dúvida de que as despesas financeiras decorrentes de empréstimos e financiamentos não se relacionam à atividade-fim da empresa, não se incluindo, portanto, no conceito de insumo.

10. Consoante orientação firmada em repetitivo no STJ (REsp 1.221.170/PR, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, DJe 24/4/2018) e nas circunstâncias delineadas pelo Tribunal de origem, os custos incorridos não se incluem no conceito de insumo.

CONCLUSÃO

11. Enfim, a inobservância às regras de hermenêutica jurídica - mesmo àquelas positivadas no art. 11 da Lei Complementar 95, de 1998 ("Dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal, e estabelece normas para a consolidação dos atos normativos que menciona"), invocadas pela impetrante - não implica permissão ao Poder Judiciário para, atuando como legislador positivo, suprir eventual omissão legislativa e autorizar a dedução de créditos, como quer a impetrante. Dessarte, não tem a impetrante o direito de deduzir créditos, no âmbito do regime não cumulativo do PIS e da Cofins, das suas despesas financeiras.

12. Recurso Especial não provido.

(REsp n. 1.810.630/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11/6/2019, DJe de 1/7/2019)   -   destaques nossos.

 

Tendo em vista o entendimento ora manifestado, resta prejudicada a pretensão de recuperação de valores que teriam sido indevidamente suportados pelo contribuinte.

 

Em face do exposto, nego provimento à apelação da impetrante.

 

É como voto.



E M E N T A

 

TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. DESPESAS FINANCEIRAS. LEI 10.865/2004. TEMAS 779 E 780 DOS RECURSOS REPETITIVOS. IMPOSSIBILIDADE DE CREDITAMENTO.

1. O § 12 do art. 195 da Constituição Federal atribui à lei a definição dos setores da atividade econômica para os quais o PIS e a COFINS, na qualidade de contribuições sociais incidentes sobre a receita ou o faturamento, serão não-cumulativas.

2. Além de outras questões relativas à legislação aduaneira e tributária, as Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 dispõem, respectivamente, sobre a não-cumulatividade do PIS e da COFINS. Ambas previam, no art. 3º, V, a possibilidade de desconto de créditos relativos a despesas de empréstimos e financiamentos, porém essa possibilidade deixou de existir a partir do advento da Lei 10.865/2004, que deu nova redação ao referido dispositivo.

3. Não há mácula na alteração legislativa em apreço, pois a lei consubstancia veículo legislativo apto a definir quais são as despesas passíveis de gerar créditos de PIS e COFINS ao contribuinte, de forma que a inovação trazida nesse ponto pela Lei 10.865/2004 está em sintonia com a disciplina do art. 195, § 12, da Constituição Federal.

4. A constitucionalidade dessa inovação legislativa foi, inclusive, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal em acórdão julgado sob a sistemática da repercussão geral (RE 1.043.313 – Tema 939), ocasião em que foi ressaltado que referida mudança não desnatura o modelo não cumulativo dessas contribuições.

5. As Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, em seu art. 3º, II, preceituam sobre a possibilidade de o contribuinte proceder, após a apuração da base de cálculo destas contribuições, ao desconto de créditos concernentes a bens e serviços utilizados como insumos na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes.

6. O Supremo Tribunal Federal alçou à sistemática da repercussão geral a questão atinente ao alcance do art. 195, § 12, da Constituição Federal (RE 841.979 – Tema 756). Em julgamento virtual finalizado em 25.11.2022, firmou compreensão pela autonomia do legislador ordinário para disciplinar a não-cumulatividade prevista no referido dispositivo, desde que respeitados os preceitos constitucionais, e assinalou também que a discussão sobre a expressão “insumo”, presente no art. 3, II, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, é infraconstitucional.

7. Restou consignado no voto condutor do precedente paradigmático em apreço que o art. 195, § 12, da Constituição Federal permite ao legislador ordinário estabelecer restrições a crédito dos recolhimentos relativos ao PIS e à COFINS no regime não cumulativo de cobrança dessas contribuições.

8. No julgamento do recurso especial repetitivo 1.221.170/PR (Temas 779 e 780), o Superior Tribunal de Justiça já assentara orientação no sentido de que O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.

9. A análise do enquadramento de determinado bem ou serviço ao conceito de insumo é tarefa a ser realizada em cada caso concreto.

10. Para realizar tal mister, deve-se ter por parâmetro a aferição da essencialidade ou relevância (Temas 779 e 780 do STJ) em relação a uma atividade de prestação de serviços ou de produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda (art. 3º, II, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003). A essencialidade ou relevância, portanto, se refere, necessariamente, a atividades voltadas ao processo produtivo ou à prestação de serviços.

11. De acordo com seu CNPJ, a impetrante tem como atividade econômica principal o transporte rodoviário coletivo interestadual de passageiros, com itinerário fixo, exercendo de forma secundária diversas outras atividades, relacionadas também ao transporte de passageiros, bem como à coleta e tratamento de resíduos, usinas de compostagem, manutenção e reparação mecânica de veículos, locação de veículos, serviços de reboque, engenharia e fornecimento e gestão de recursos humanos para terceiros.

12. Em seu entender, faz jus à apropriação de créditos de PIS e COFINS com relação a diversas despesas financeiras, a exemplo das despesas bancárias, despesas com captações, financiamentos, juros e encargos bancários, juros passivos e juros sobre remuneração de capital, dentre outras.

13. Embora os itens mencionados possam consubstanciar uma despesa ou custo relevante para o contribuinte, eles não são essenciais a um processo produtivo ou à prestação de serviços, não se relacionando à atividade-fim da empresa, e, por esta razão, não comportam a pretendida caracterização como insumos, de modo a não ser cabível o creditamento postulado nestes autos.

14. Em síntese: a pretensão manifestada nestes autos não encontra amparo legal no ordenamento vigente (a Lei 10.865/2004, que deu nova redação ao art. 3º, V, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2033, excluiu a possibilidade de créditos de despesas de empréstimos e financiamentos), além de não encontrar suporte na decisão paradigmática proferida pelo STJ nos Temas 779 e 780, tendo em vista que as despesas financeiras da impetrante não se amoldam ao conceito de insumos. Precedente do STJ.

15. Apelação da impetrante improvida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação da impetrante, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.