AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5018982-83.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
AGRAVANTE: EBERSON DE SOUZA ALEXANDRE
Advogado do(a) AGRAVANTE: MARIA REGINA DE SOUSA JANUARIO - MG99038-A
AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5018982-83.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AGRAVANTE: EBERSON DE SOUZA ALEXANDRE Advogado do(a) AGRAVANTE: MARIA REGINA DE SOUSA JANUARIO - MG99038-A AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por EBERSON DE SOUZA ALEXANDRE FERREIRA contra decisão proferida nos autos de ação ordinária que move contra a UNIÃO FEDERAL. Sustenta a parte agravante, em síntese, ter incorporado as fileiras do Exército em 01/03/2012 para fins de serviço militar obrigatório. Afirma ter, em 13/03/2015, começado a sentir fortes dores no joelho direito, de modo que após a instauração de sindicância, foi comprovada a ocorrência de acidente em serviço. Alega que em 07/06/2016 teve a sua incorporação anulada com fundamento na preexistência de sua condição de saúde. Narra ter ajuizado ação judicial (processo nº 0000102-28.2017.4.03.6007) visando à anulação do ato administrativo que o licenciou, bem como a sua reintegração como adido. Referida ação foi julgada parcialmente procedente (trânsito em julgado em 12/08/2020), tendo o agravante sido reintegrado ao Exército como adido em 19/03/2019. Aduz que em 27/07/2021 foi equivocadamente considerado apto para o serviço militar por médico perito militar, sendo licenciado em 31.10.2021. Pugna pela concessão de tutela antecipada para que seja reintegrado como adido com acesso a tratamento médico. Foi proferida decisão que indeferiu o pedido de antecipação de tutela. Foram apresentadas contrarrazões. É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5018982-83.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AGRAVANTE: EBERSON DE SOUZA ALEXANDRE Advogado do(a) AGRAVANTE: MARIA REGINA DE SOUSA JANUARIO - MG99038-A AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: No presente caso, nenhuma das partes trouxe qualquer argumento apto a infirmar o entendimento já manifestado na decisão que apreciou o pedido antecipação de tutela. Passo a transcrever os fundamentos da decisão por mim lavrada: O art. 142, da Constituição de 1988, prevê que as Forças Armadas (constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica) são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, destinando-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. Nos moldes desse art. 142 § 3º, X, da ordem de 1988 (na redação dada pela Emenda nº 18/1998), os membros das Forças Armadas são denominados militares, sendo que “a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra.”. O art. 142, §3º, X, da Constituição, delimitou o âmbito da reserva absoluta de lei (ou estrita legalidade) e recepcionou vários diplomas normativos, dentre eles a Lei nº 4.375/1964 (Lei do Serviço Militar), a Lei nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), e a Lei nº 6.391/1976 (Lei do Pessoal do Exército), com os correspondentes regulamentos. A solução jurídica do problema posto nos autos deve se dar pelos atos normativos vigentes à época da ocorrência do objeto litigioso, razão pela qual não são aplicáveis as disposições da posterior Lei nº 13.954/2019 (DOU de 17/12/2019). Em vista do art. 3º da Lei nº 6.880/1980, os membros das Forças Armadas compreendem servidores na ativa ou na inatividade. Os militares da ativa são: a) de carreira; b) temporários, incorporados ou matriculados para prestação de serviço militar (obrigatório ou voluntário) durante os prazos previstos na legislação e suas eventuais prorrogações; c) componentes da reserva, quando convocados, reincluídos, designados ou mobilizados; d) alunos de órgão de formação de militares da ativa e da reserva; e) em tempo de guerra, todo cidadão brasileiro mobilizado para o serviço ativo nas Forças Armadas. Por sua vez, os militares em inatividade abrangem: a) os da reserva remunerada, quando pertençam à reserva das Forças Armadas e percebam remuneração da União, porém sujeitos, ainda, à prestação de serviço na ativa, mediante convocação ou mobilização; b) os reformados, quando, tendo passado por uma das situações anteriores e estejam dispensados, definitivamente, da prestação de serviço na ativa, mas continuem a perceber remuneração da União; c) os da reserva remunerada e, excepcionalmente, os reformados, que estejam executando tarefa por tempo certo, segundo regulamentação para cada Força Armada. O art. 3º da Lei nº 6.391/1976 (Lei do Pessoal do Exército) complementa as disposições do art. 3º da Lei 6.880/1980 no que tange ao pessoal da ativa, mencionando que o militar de carreira é aquele cujo vínculo com o serviço público (sempre voluntário) é permanente, ao passo em que o militar temporário tem vínculo (voluntário ou obrigatório) por prazo determinado para complementação de pessoal em várias áreas militares: Art. 3º O Pessoal Militar da Ativa pode ser de Carreira ou Temporário. I - O Militar de Carreira é aquele que, no desempenho voluntário e permanente do serviço militar, tem vitaliciedade assegurada ou presumida. II - O Militar Temporário é aquele que presta o serviço militar por prazo determinado e destina-se a completar as Armas e os Quadros de Oficiais e as diversas Qualificações Militares de praças, conforme for regulamentado pelo Poder Executivo. Quanto à duração, o serviço do militar de carreira é permanente, de modo que cessará nas hipóteses descritas na Lei nº 6.880/1980 (dentre elas a reforma). No que concerne ao serviço militar temporário obrigatório inicial, a Lei nº 4.375/1964 estabeleceu o prazo de 12 meses como regra geral em tempo de paz (contados do momento da incorporação), podendo ser reduzido ou ampliado por atos normativos regulamentares da administração militar competente (vale dizer, não se trata de matéria subordinada à reserva absoluta mas sim à reserva relativa de lei): Art. 5º A obrigação para com o Serviço Militar, em tempo de paz, começa no 1º dia de janeiro do ano em que o cidadão completar 18 (dezoito) anos de idade e subsistirá até 31 de dezembro do ano em que completar 45 (quarenta e cinco) anos. § 1º Em tempo de guerra, êsse período poderá ser ampliado, de acôrdo com os interêsses da defesa nacional. § 2º Será permitida a prestação do Serviço Militar como voluntário, a partir dos 17 (dezessete) anos de idade. Art. 6º O Serviço Militar inicial dos incorporados terá a duração normal de 12 (doze) meses. § 1º Os Ministros da Guerra, da Marinha e da Aeronáutica poderão reduzir até 2 (dois) meses ou dilatar até 6 (seis) meses a duração do tempo do Serviço Militar inicial dos cidadãos incorporados às respectivas Fôrças Armadas. § 2º Mediante autorização do Presidente da República, a duração do tempo do Serviço Militar inicial poderá: a) ser dilatada por prazo superior a 18 (dezoito) meses, em caso de interêsse nacional; b) ser reduzida de período superior a 2 (dois) meses desde que solicitada, justificadamente, pelo Ministério Militar interessado. § 3º Durante o período de dilação do tempo de Serviço Militar, prevista nos parágrafos anteriores, as praças por ela abrangidas serão consideradas engajadas. Art. 7º O Serviço Militar dos matriculados em Órgãos de Formação de Reserva terá a duração prevista nos respectivos regulamentos. Art. 8º A contagem de tempo de Serviço Militar terá início no dia da incorporarão (sic – incorporação). Parágrafo único. Não será computado como tempo de serviço o período que o incorporado levar no cumprimento de sentença passada em julgado. (...) Já a duração do serviço militar temporário voluntário depende dos fundamentos normativos e administrativos da correspondente autorização de ingresso (note-se que o art. 27, §3º, da Lei 4.375/1964, incluído pela Lei nº 13.964/2019, explicitou prazo mínimo e máximo). O período de duração do serviço militar temporário obrigatório e do voluntário pode ser prorrogado, conforme previsto no art. 33 dessa Lei nº 4.375/1964: Art. 33. Aos incorporados que concluírem o tempo de serviço a que estiverem obrigados poderá, desde que o requeiram, ser concedida prorrogação desse tempo, uma ou mais vezes, de acordo com a conveniência da Força Armada interessada. § 1º As condições de prorrogação serão estabelecidas em ato dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. § 2º Não há direito subjetivo à prorrogação ao final de cada período. Assim, o militar temporário integra o efetivo das Forças Armadas em caráter transitório e se submete aos ditames da Lei nº 4.375/1964, da Lei nº 6.880/1980 e demais aplicáveis, sem estabilidade na carreira; após concluir o tempo a que estiver obrigado, poderá pedir prorrogação (uma ou mais vezes), daí permanecendo como engajados ou reengajados. A concessão da prorrogação do tempo de serviço além do previsto está submetida à discricionariedade da autoridade militar competente, cujos limites estão na Constituição, na legislação ordinária e também em atos normativos hierárquicos da administração militar (especialmente do Comando de cada uma das Forças Armadas), respeitados os âmbitos próprios da reserva absoluta (estrita legalidade) ou da reserva relativa de lei (legalidade). Já a exclusão do serviço ativo das Forças Armadas (com consequente desligamento e inatividade) pode se dar por vários motivos, elencados no art. 94 da Lei 6.880/1980: transferência para a reserva remunerada (art. 96 e seguintes, podendo ser suspensa na vigência do estado de guerra, estado de sítio, estado de emergência ou em caso de mobilização); reforma (art. 104 e seguintes, marcando o desligamento definitivo); demissão de oficiais (art. 115 e seguintes, com ou sem indenização das despesas efetuadas pela União com a sua preparação, formação ou adaptação); perda de posto e patente (art. 118 e seguintes, em casos de o oficial ser declarado indigno ou incompatível ao oficialato); licenciamento (art. 121 e seguintes, para militares de carreira, da reserva ou temporários, após concluído o tempo de serviço, por conveniência do serviço, ou também a bem da disciplina e outras hipóteses legais); anulação de incorporação ou desincorporação da praça (art. 124, em casos de interrupção do serviço militar ativo previstas na legislação); exclusão da praça a bem da disciplina (art. 125 e seguintes, mesmo que o militar tenha estabilidade assegurada, em caso de infrações descritas na legislação); deserção (art. 128, atrelada à tipificação criminal correspondente); falecimento (art. 129); e extravio (art. 130, em casos de desaparecimento do militar). O marco temporal do desligamento é a publicação do ato oficial correspondente em Diário Oficial, em Boletim ou em Ordem de Serviço de sua organização militar, e não poderá exceder 45 dias da data da primeira publicação oficial; ultrapassado o prazo, o militar será considerado desligado da organização a que estiver vinculado, deixando de contar tempo de serviço, para fins de transferência para a inatividade. O entendimento pacífico da jurisprudência, com base no conjunto normativo da Lei nº 6.880/1980, é no sentido de que, em se tratando de militar (de carreira ou temporário), havendo incapacidade não definitiva para os serviços da vida castrense decorrente de acidente ou doença ocorrida durante o período de vínculo com as Forças Armadas, independentemente do nexo causal, não cabe reforma e nem licenciamento, motivo pelo qual o militar deve ser reincorporado aos quadros da organização como adido, para tratamento médico-hospitalar, sendo assegurada a percepção de soldo e demais vantagens remuneratórias da data do indevido licenciamento até sua recuperação. Destaco precedentes quanto ao tema: STJ, AgInt no REsp 1763436/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, 1ª Turma, julgado em 19/08/2019, DJe 22/08/2019; STJ, AgRg no AREsp nº 625.828/RS, 1ª Turma, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe 11/03/2015; STJ, AgRg no AREsp nº 563.375/PE, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 04/12/2014. No caso dos autos, o agravante narra ter sido incorporado as fileiras do Exército em 01/03/2012 para fins de serviço militar obrigatório. Afirma que, em 13/03/2015, começou a sentir fortes dores no joelho direito, de modo que após a instauração de sindicância, foi comprovada a ocorrência de acidente em serviço. Alega que em 07/06/2016 teve a sua incorporação anulada com fundamento na preexistência de sua condição de saúde. Narra ter ajuizado ação judicial (processo nº 0000102-28.2017.4.03.6007) visando anular o ato administrativo que o licenciou, bem como a sua reintegração como adido. Referida ação foi julgada parcialmente procedente (trânsito em julgado em 12/08/2020), tendo o agravante sido reintegrado ao Exército como adido em 19/03/2019. Aduz que em 27/07/2021 foi equivocadamente considerado apto para o serviço militar por médico perito militar, sendo licenciado de maneira ilegal em 31/10/2021. Pugna, portanto, pela concessão de tutela antecipada para que seja novamente reintegrado como adido com acesso a tratamento médico. A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos: Trata-se de ação, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada por EBERSON DE SOUZA ALEXANDRE em face da UNIÃO FEDERAL. Afirma o autor, em breve síntese, que foi incorporado às fileiras do Exército em 01/03/2012 em perfeitas condições físicas e de saúde. Todavia, em 13/03/2015 sofreu acidente em serviço, lesionando seu joelho direito. Em 21/09/2015, ao pegar fuzil em armário, teria lesionado seu ombro direito. Em 30/04/2016 foi incluído na condição de agregado e, em 07/06/2016, o autor teve a sua incorporação anulada, pois em parecer médico concluiu-se que suas patologias preexistiam à data da incorporação, sendo excluído do serviço ativo. Proposta ação nº 0000102-28.2017.403.6007, os pedidos foram julgados parcialmente procedentes, declarando a nulidade de seu licenciamento e determinando que a União reintegrasse o autor, na condição de adido, até a sua recuperação ou caracterizada a incapacidade definitiva, devendo ser emitido parecer definitivo, quando do licenciamento, desincorporação ou reforma, a depender da hipótese. Foi concedida tutela de urgência na ocasião. Em 21/03/2019 o demandante foi reintegrado ao serviço ativo, como adido. A sentença foi mantida em acórdão proferido pelo E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ocorrendo o trânsito em julgado em 12/08/2020. Relata que em inspeção médica militar, realizada em 27/07/2021, foi considerado apto, apesar de as patologias de que é portador persistirem, incapacitando-o ao labor. Desse modo, teria sido licenciado ilegalmente em 31/10/2021. Argumenta que deveria ter sido reformado ex officio, uma vez que permaneceu como agregado por mais de 2 anos, nos termos do art. 106, III, da Lei nº 6.880/80, aplicando-se a ele a redação anterior às modificações efetuadas pela Lei nº 13.954/19. Diante disso, requereu: (...) g) no mérito, seja o pedido julgado procedente para: g1) confirmar a tutela de urgência antecipada ou cautelar anteriormente deferida e decretar a nulidade do ato de licenciamento do Autor, com a subsequente reintegração às fileiras militares na condição de agregado (artigo 82, inciso I e art. 84, da Lei n.º 6.880/80), para que seja assegurada a recuperação de sua saúde na condição de militar da ativa até seu completo restabelecimento, sem limitações e em condições de competir no mercado de trabalho com os demais cidadãos quando incorporado, com o pagamento de todas as parcelas remuneratórias e vantagens a que teria direito se na ativa estivesse, tudo acrescido de juros e correção monetária, a partir da data do ilegal ato de licenciamento; ou g2) confirmar a tutela de urgência antecipada ou cautelar anteriormente deferida e decretar a nulidade do ato de licenciamento do Autor, com a subsequente reforma, com os proventos integrais da graduação que detinha na ativa, nos termos do art. 106, III, da Lei nº 6.880/80, vigente à época do nascimento do seu direito, com o pagamento de todas as parcelas remuneratórias e vantagens a que teria direito se reformado estivesse, incluindo a isenção de imposto de renda e a ajuda de custo de transferência para a inatividade remunerada, tudo acrescido de juros e correção monetária, a partir de 30.04.2018, data em que passou a fazer jus a reforma ex-officio; ou g3) confirmar a tutela de urgência antecipada ou cautelar anteriormente deferida e decretar a nulidade do ato de licenciamento do Autor, com a subsequente reforma, em conformidade com a Lei nº 6.880/80 vigente à época da ocorrência do acidente sofrido em ato de serviço que deu origem a sua incapacidade (13.03.2015), com os proventos integrais da graduação que detinha na ativa (ou com os proventos integrais do grau hierárquico superior, se for constatada a invalidez), com o pagamento de todas as parcelas remuneratórias e vantagens a que teria direito se reformado estivesse, incluindo a isenção de imposto de renda e a ajuda de custo de transferência para a inatividade remunerada, tudo acrescido de juros e correção monetária, a partir da data do ilegal ato de licenciamento; ou g4) confirmar a tutela de urgência antecipada ou cautelar anteriormente deferida para declarar, inter partes, a inconstitucionalidade do artigo 106, incisos II e II-A e artigo 109, §§2º e 3º, ambos da Lei nº 6.880/80, para decretar a nulidade do ato de licenciamento do Autor, com a subsequente reforma, com os proventos integrais da graduação que detinha na ativa (ou com os proventos integrais do grau hierárquico imediato, caso constatada a invalidez), com o pagamento de todas as parcelas remuneratórias e vantagens a que teria direito se reformado estivesse, incluindo a isenção de imposto de renda e a ajuda de custo de transferência para a inatividade remunerada, tudo acrescido de juros e correção monetária, a partir da data do ilegal ato de licenciamento; ou g5) confirmar a tutela de urgência antecipada ou cautelar anteriormente deferida e decretar a nulidade do ato de licenciamento do Autor, com a subsequente reintegração ao serviço ativo, para que seja readaptado ao serviço militar em função compatível com a sua limitação funcional, com o pagamento de todas as parcelas remuneratórias e vantagens a que teria direito se na ativa estivesse, incluindo as promoções a que faria jus, tudo acrescido de juros e correção monetária, a partir da data do ato de licenciamento; g6) seja a Requerida condenada nas custas e honorários, estes fixados por Vossa Excelência nos termos do art. 85, § 2º do CPC. (ID254504465, p. 55-57 – grifo no original). A petição inicial foi instruída com procuração, declaração de hipossuficiência e documentos. É a síntese do necessário. DECIDO. 1. Inicialmente, mister analisar a prevenção do feito em relação aos autos nº 0000102-28.2017.403.6007. Verifica-se que a matéria discutida neste feito difere na julgada nos autos pretéritos, pois se refere a fatos posteriores. Com efeito, o autor foi reintegrado às forças militares, como adido, em razão do julgamento exarado nos autos nº 0000102-28.2017.403.6007, ficando consignado que deveria ser reavaliado periodicamente, até a sua recuperação ou caracterização da incapacidade definitiva (ID254504814, p. 12). Assim, busca-se a anulação do licenciamento ocorrido em 31/10/2021, posterior à reintegração determinada judicialmente e cumprida em 21/03/2019, diante de fato novo, de modo que não há coisa julgada sobre este nem, tampouco, a questão deve ser discutida em cumprimento de sentença da ação anterior. Nesse prisma, afasto a prevenção em relação aos autos nº0000102-28.2017.403.6007. 2. Concedo ao autor os benefícios da Justiça Gratuita, diante do expresso requerimento e da declaração apresentada. ANOTE-SE. 3. Em relação ao pedido de concessão de tutela de urgência, verifico que tal pleito não comporta acolhimento. Examinando o pedido de medida antecipatória formulado pela parte autora, verifico não se acharem presentes os pressupostos necessários à sua concessão sem a realização da respectiva instrução, em especial a efetivação de perícia médica. Ademais, a despeito da possibilidade de desconstituição do ato administrativo, goza ele de presunção de legalidade, razão pela qual deve ser aguardado o contraditório. Em relação à argumentação de reforma ex officio, nos moldes do art. 106, III, do Estatuto Castrense, a jurisprudência fixou entendimento que tal dispositivo deve ser conjugado com os art. 108 e 109 do mesmo regramento, de modo que, além de ficar agregado por período superior a dois anos, diante de incapacidade temporária, mostra-se necessário também a incapacidade tanto para vida militar quanto para os atos da vida civil. Cite-se: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. MILITAR TEMPORÁRIO. REFORMA EX OFFICIO. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA PARA AS ATIVIDADES CIVIS E MILITARES. REINTEGRAÇÃO COMO ADIDO. POSSIBILIDADE. AGREGAÇÃO POR PERÍODO SUPERIOR A DOIS ANOS. DIREITO ADQUIRIDO À REFORMA COMPULSÓRIA. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE DANOS MORAIS INDENIZÁVEIS. (...) 6. Dispõe a legislação militar, ipsis litteris, que havendo a permanência na condição de adido por mais de dois anos e não recuperada a sua higidez física, deverá ser procedida a reforma, nos termos do art. 106, III da Lei 6.880/80. A jurisprudência, no entanto, entende que a interpretação de tal dispositivo deve ser conjugada com o disposto nos artigos 108 e 109 do mesmo regramento. Isso porque, em casos tais, ao se considerar apenas o disposto no art. 106, III, o agregado, diagnosticado somente com incapacidade temporária, teria tratamento mais benéfico que o incapaz definitivamente do artigo 106, II, da lei adrede mencionada. Assim, em observância ao princípio constitucional da isonomia, para o militar fazer jus à reforma ex offício, prevista no art. 106, III do Estatuto dos Militares, deve, além de ficar agregado por período superior a dois anos, em razão da moléstia que o incapacitou temporariamente, mostra-se necessária, ainda, a incapacidade tanto para o atos da vida militar quanto para os da vida civil, afluindo idêntica inteligência dispensada à incapacidade definitiva, em conformidade com o tratamento igualitário exigido na interpretação legislativa. De certo que, não se verificando a presença de limitação para o labor, inequívoca a ausência do direito à reforma, revelando-se indevido, por consequência lógica, estender tal benesse àqueles que possuem perspectiva de recuperação de sua enfermidade, ainda que agregado por prazo superior a dois anos. Ao prevalecer entendimento diverso, estar-se-ia autorizando, por via oblíqua, que pessoas no auge de sua capacidade laborativa possam passar à inatividade, recebendo proventos indevidamente, onerando sobremaneira toda a sociedade brasileira e sob pena de desvirtuamento da referida previsão legislativa, mormente, tendo em conta a natureza precária de sua permanência na caserna, uma vez que albergada por decisão judicial passível de reforma. 7. "A Administração tem o poder-dever de decidir os assuntos de sua competência e de rever seus atos, pautada sempre nos princípios que regem a atividade administrativa, sem que a demora não prolongada no exame do pedido, a sua negativa ou a adoção de entendimento diverso do interessado, com razoável fundamentação, importe em dano moral ao administrado. O direito se restaura pelo reconhecimento judicial do direito, em substituição à atividade administrativa, e não mediante indenização por danos morais" (AC 0023878-85.2011.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 de 13/04/2016). 8. Não comprovada a existência de incapacidade definitiva para as atividades militares e persistindo a limitação temporária adquirida durante a prestação do serviço castrense, deve ser assegurada a reintegração do requerente à caserna, como adido, para tratamento médico adequado, até a sua recuperação - caso ainda não tenha sido diagnosticada - ou eventual reforma, e vencimentos, incluindo valores em atraso, desde a data de seu licenciamento. 9. Nos termos do art. 83 da Lei 6.880/80, o militar adido fica à disposição da Administração Militar, de modo que, por consequência, permanece sujeito às obrigações disciplinares, não lhe sendo escusável abster-se de cumprir com suas obrigações militares impostas pelo comando da caserna, desde que compatíveis com as limitações do seu quadro de saúde. 10. Honorários recursais fixados em 2% (dois por cento) sobre o valor da condenação, a serem pagos pela parte autora à União, ficando suspensa a execução desse comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, § 3º do CPC. Os honorários a cargo da requerida devem ser majorados em 2% (dois por cento), a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e 11 do CPC, totalizando o quantum de 12% (doze por cento) calculado sobre as parcelas vencidas até a data da sentença. 11. Remessa oficial não conhecida e apelações desprovidas. (TRF da 1ª Região; AC 0000899-26.2012.4.01.4102, JUIZ FEDERAL ALYSSON MAIA FONTENELE (CONV.), TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 28/05/2020; grifou-se) Ressalta-se a incapacidade que fundamentou a reintegração do autor como adido era, além de temporária, apenas para as atividades militares, como inclusive restou consignado do acórdão proferido nos autos nº nº0000102-28.2017.403.6007: “(...) Na hipótese dos autos, o autor não comprovou a ocorrência de dano de natureza moral, atém mesmo porque a sua incapacidade é temporária e apenas para as atividades militares (...)” (ID254504814, p. 28 – grifou-se). Desse modo, em um juízo perfunctório, resta afastado tal argumento para concessão da tutela de urgência. Mister destacar, outrossim, que o licenciamento teria se operado há quase oito meses, o que afasta a urgência da medida. Nesse passo, ausentes elementos que evidenciem a probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo – requisitos indispensáveis à concessão da medida antecipatória pretendida, nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil - INDEFIRO o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, sem prejuízo de eventual reanálise do pedido por ocasião da sentença, caso alterado o quadro fático-probatório. 4. CITE-SE e INTIME-SE a União para, querendo, apresentar contestação. Deverá, ainda, a UNIÃO, no mesmo prazo da resposta, juntar aos autos cópia do respectivo processo de licenciamento e eventuais sindicâncias que foram instauradas que se refiram ao autor, em especial após a data da reintegração por determinação judicial, em 21/03/2019, bem como indicar de forma justificada as provas que pretende produzir. 5. Com a vinda da contestação, INTIME-SE a parte autora para eventual réplica e para que, no prazo de 15 (quinze) dias, especifique eventuais outras provas que pretenda produzir, justificando sua pertinência e relevância. 6. Oportunamente, retornem os autos conclusos. Com efeito, extrai-se dos autos de origem (id. 254504814, fls. 2/3 dos autos subjacentes) que o agravante foi licenciado do Exército em razão da conclusão do seu tratamento conforme laudo especializado BAR Nr 80 do 47º BI que o considerou “Apto A” e concedeu alta médica (id. 254504814, fl. 1). Desse modo, não obstante o inconformismo do agravante com o laudo médico que o considerou apto para o serviço, tem-se que, em uma análise perfunctória, não restou demonstrada a ilegalidade do ato de licenciamento por parte das Forças Armadas, tendo em vista a presunção relativa de legitimidade dos atos administrativos. Nesse sentido, eventual equívoco do laudo exarado pelos médicos do Exército deverá ser apurado em momento oportuno, por meio de eventual realização de prova pericial e preservado o contraditório. Ademais, como bem consignou o juízo de primeiro grau, o licenciamento do agravante se deu em outubro de 2021, tendo a presente ação sido ajuizada apenas em junho de 2022, fato que enfraquece a alegação de perigo na demora. Ausente qualquer motivo para alteração, entendo que a decisão deve ser mantida. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento interposto. É o voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. MILITAR. LICENCIAMENTO. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS.
- O art. 142, §3º, X, da Constituição, delimitou o âmbito da reserva absoluta de lei (ou estrita legalidade) e recepcionou vários diplomas normativos, dentre eles a Lei nº 4.375/1964 (Lei do Serviço Militar), a Lei nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), e a Lei nº 6.391/1976 (Lei do Pessoal do Exército), com os correspondentes regulamentos. A solução jurídica do problema posto nos autos deve se dar pelos atos normativos vigentes à época da ocorrência do objeto litigioso, razão pela qual não são aplicáveis as disposições da posterior Lei nº 13.954/2019 (DOU de 17/12/2019).
- O entendimento pacífico da jurisprudência, com base no conjunto normativo da Lei nº 6.880/1980, é no sentido de que, em se tratando de militar (de carreira ou temporário), havendo incapacidade não definitiva para os serviços da vida castrense decorrente de acidente ou doença ocorrida durante o período de vínculo com as Forças Armadas, independentemente do nexo causal, não cabe reforma e nem licenciamento, motivo pelo qual o militar deve ser reincorporado aos quadros da organização como adido, para tratamento médico-hospitalar, sendo assegurada a percepção de soldo e demais vantagens remuneratórias da data do indevido licenciamento até sua recuperação. Destaco precedentes quanto ao tema: STJ, AgInt no REsp 1763436/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, 1ª Turma, julgado em 19/08/2019, DJe 22/08/2019; STJ, AgRg no AREsp nº 625.828/RS, 1ª Turma, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe 11/03/2015; STJ, AgRg no AREsp nº 563.375/PE, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 04/12/2014.
- Extrai-se dos autos de origem que o agravante foi licenciado do Exército em razão da conclusão do seu tratamento conforme laudo especializado BAR Nr 80 do 47º BI que o considerou “Apto A” e concedeu alta médica. Desse modo, não obstante o inconformismo do agravante com o laudo médico que o considerou apto para o serviço, tem-se que não restou demonstrada a ilegalidade do ato de licenciamento por parte das Forças Armadas, tendo em vista a presunção relativa de legitimidade dos atos administrativos.
- Agravo de instrumento desprovido.