APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003549-48.2017.4.03.6100
RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MAIRAN MAIA
APELANTE: DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAEST DE TRANSPORTES
APELADO: ITAU SEGUROS DE AUTO E RESIDENCIA S.A.
Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS VAN CLEEF DE ALMEIDA SANTOS - SP273843-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003549-48.2017.4.03.6100 RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MAIRAN MAIA APELANTE: DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAEST DE TRANSPORTES APELADO: ITAU SEGUROS DE AUTO E RESIDENCIA S.A. Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS VAN CLEEF DE ALMEIDA SANTOS - SP273843-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Cuida-se de ação de conhecimento, processada sob o rito comum, ajuizada por Itaú Seguros de Auto e Residência S.A em face do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes - DNIT, com o objetivo de reaver, no exercício do direito de regresso, quantia paga por força de contrato de seguro veicular. De acordo com a inicial, a parte autora firmou contrato de seguro com Francisco Caninde Damasseno, na modalidade RCFV Auto – Responsabilidade Civil de Proprietário de Veículo Automotor de Via Terrestre –, por meio do qual se obrigou a garantir o veículo Toyota, modelo Etios, de placas QGE-5708, contra, dentre outros, riscos oriundos de acidentes de trânsito. Narra-se que, em 03/01/2017, o segurado trafegava pela BR-116, quando, na altura do km 40,8, foi surpreendido pela existência de buraco na pista, e, ao tentar desviar, perdeu o controle do veículo e capotou. Considerando as relevantes avarias no veículo, foi necessário o pagamento de indenização integral ao segurado. Aduz-se que, por negligência do réu, teve de suportar o prejuízo de R$ 45.728,49 (quarenta e cinco mil, setecentos e vinte e oito reais e quarenta e nove centavos), restando pendente a venda do salvado. Nesse sentido, com espeque nos art. 786 do CC, requer o ressarcimento do montante despendido. Com a inicial, foram juntados documentos. Regularmente citado, o DNIT contestou o feito. Suscitou, inicialmente, a inépcia da inicial e a denunciação da lide em relação à Construtora Centro Leste Engenharia LTDA. No mérito, aduz, em síntese, não estar demonstrada a relação de causalidade entre a omissão e o dano, tampouco o dolo ou culpa na provocação do acidente. Subsidiariamente, insurgiu-se contra a fixação dos juros de mora e da correção. Em réplica, a parte autora rebateu os termos da contestação. A sentença julgou procedente o pedido, para condenar o réu a pagar à parte autora o valor desembolsado ao segurado, como descrito na inicial, com juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir do evento danoso (data do desembolso), e correção monetária até a data do pagamento. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. Opostos embargos de declaração pela parte autora, estes foram acolhidos para sanar vício apontado na fixação dos honorários advocatícios. Em apelação, o DNIT pugnou a reforma da decisão, reiterando a argumentação expendida na contestação. Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta Corte. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003549-48.2017.4.03.6100 RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MAIRAN MAIA APELANTE: DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAEST DE TRANSPORTES APELADO: ITAU SEGUROS DE AUTO E RESIDENCIA S.A. Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS VAN CLEEF DE ALMEIDA SANTOS - SP273843-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Inicialmente, não merece acolhida o pedido de denunciação à lide da empresa CONSTRUTORA CENTRO LESTE ENGENHARIA LTDA. Com efeito, desde o advento do Código de Processo Civil de 2015, a denunciação à lide deixou de ser obrigatória no sistema processual pátrio (art. 125, § 1º). Em verdade, intenta o DNIT eximir-se da responsabilidade pelo evento danoso, atribuindo-a com exclusividade a terceiro. Lapidar nesse sentido o entendimento expendido pelo C. Superior Tribunal de Justiça e por esta E. Turma, conforme se depreende das ementas abaixo transcritas: AGRAVO INTERNO EM AGRAVO RECURSO ESPECIAL. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. PRETENSÃO DE TRANSFERIR A OUTREM A RESPONSABILIDADE PELO EVENTO DANOSO. NÃO CABIMENTO DA DENUNCIAÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 125, I, DO NOVO CPC. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência consolidada nesta Corte Superior, o Código de Processo Civil de 2015 não prevê a obrigatoriedade da denunciação da lide em nenhuma de suas hipóteses. Ao contrário, assegura o exercício do direito de regresso por ação autônoma quando indeferida, não promovida ou proibida (CPC/2015, art 125, caput, e § 1º). 2. Consoante orientação do STJ, "não se admite a denunciação da lide com fundamento no art. 125, II, do CPC se o denunciante objetiva eximir-se da responsabilidade pelo evento danoso, atribuindo-o com exclusividade a terceiro" (AgInt no AREsp 1.483.427/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 24//2019, DJe 30/9/2019). 3. O Tribunal estadual entendeu pelo não cabimento da denunciação da lide aos fundamentos de que não é obrigatória no presente caso e de que o objetivo do denunciante é eximir-se da obrigação, atribuindo a responsabilidade dos danos causados no acidente, com exclusividade a terceiro. 4. O acórdão recorrido encontra-se em harmonia com o entendimento consolidado no STJ, não merecendo reforma. Incidência da Súmula 83/STJ. 5. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1850758/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 30/08/2021, DJe 09/09/2021) APELAÇÃO CÍVEL. DANO MATERIAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. DESNECESSÁRIA. DIREITO DE REGRESSO. INTACTO. DANO, EVENTO DANOSO, CONDUTA DO AGENTE E NEXO DE CAUSALIDADE. COMPROVADOS. DEVER DE INDENIZAR POR DANOS MATERIAIS. CONFIGURADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Cinge-se a controvérsia em apurar se a responsabilidade pelo acidente de trânsito, narrado na inicial, ocorrido em 15/11/2015, envolvendo um segurado da autora, deve ser atribuída ao réu, ensejando a condenação no dever de indenizar por dano. 2. A existência de contrato administrativo e a responsabilidade do terceiro prestador do serviço, pelos danos causados à própria Administração ou a terceiros, em razão da execução de contrato administrativo, não impõe o deferimento da denunciação da lide em relação ao contratado pelo DNIT, até porque se trata de hipótese de responsabilidade objetiva do Estado e, além disso, o acolhimento do requerimento de denunciação da lide, na espécie, atua em desfavor da parte prejudicada, sob o ponto de vista da celeridade processual. Ademais, isso não exclui ou inviabiliza o exercício do direito de regresso, que permanece intacto, uma vez que a relação entre a Administração Pública e o terceiro, de forma distinta da sua relação como o cidadão, é contratual. 3. Diferentemente do que defende o DNIT, O Boletim de Ocorrência de Acidente de Trânsito é descrição do acidente feita em face do que a autoridade policial verificou no local, apto a fazer prova do ocorrido, diferentemente do Boletim de Ocorrência Policial, que se trata de simples relato unilateral da vítima, documento este que acaba por caracterizar somente uma declaração, insuficiente para servir como prova dos fatos. 4. É dever do Estado fiscalizar e, na impossibilidade de eliminar o risco, providenciar a devida sinalização de alerta, garantindo a segurança para a trafegabilidade, não bastando apenas a manutenção e conservação do leito carroçável. 5. O conjunto probatório acostado aos autos demonstra que a omissão do réu, em cumprir com o seu dever de manutenção da rodovia, com a finalidade de garantir a segurança e trafegabilidade, foi o motivo do acidente envolvendo o veículo segurado pela autora, o que configura a omissão estatal a demonstrar o nexo de causalidade entre o evento danoso e a conduta do agente. Diante disso, é de se reconhecer o dano, o evento danoso e a relação de causalidade entre eles e a omissão estatal, ensejando o dever de indenizar por dano. 6. No que diz respeito à correção monetária e a incidência de juros de mora, observe-se o disposto no Tema 905 e na Súmula 54, ambos do C. STJ. 7. Nega-se provimento à apelação do DNIT, para manter a r. sentença, por seus próprios fundamentos. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0004005-20.2016.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal DIVA PRESTES MARCONDES MALERBI, julgado em 19/06/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 23/06/2020) Vale ressaltar, outrossim, que a responsabilização do réu não acarreta a perda do direito de regresso em face de eventual falha da contratada. Superado esse ponto, passo à apreciação do mérito. De acordo com o art. 37, § 6º, da Constituição Federal, o Estado responde por comportamentos comissivos de seus agentes que, agindo nessa qualidade, causem prejuízos a terceiros. Transcrevo: "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa." Em se tratando de responsabilidade extracontratual por dano causado por agente público, impõe-se, tão-somente, a demonstração do dano e do nexo causal, prescindindo a responsabilidade objetiva da comprovação de culpa do agente. Assevera Hely Lopes Meirelles (in Direito Administrativo Brasileiro, 32ª Edição, Editora RT, 2006, p. 654): "Para a vítima é indiferente o título pelo qual o causador direto do dano esteja vinculado à Administração; o necessário é que se encontre a serviço do Poder Público, embora atue fora ou além de sua competência administrativa". (...) "Nessa substituição da responsabilidade individual do servidor, pela responsabilidade genérica do Poder Público, cobrindo o risco da sua ação ou omissão, é que se assenta a teoria da responsabilidade objetiva da Administração, vale dizer, da responsabilidade sem culpa, pela só ocorrência da falta anônima do serviço porque esta falta está, precisamente, na área dos riscos assumidos pela Administração para a consecução de seus fins." Particularmente na hipótese de omissão, a jurisprudência predominante do STF e do STJ sempre apontou ser o caso de responsabilidade subjetiva. Não obstante, é necessário não perder de vista a posição que o C. Supremo Tribunal Federal vem assumindo diante da matéria sub examine, conforme se depreende das ementas abaixo transcritas: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. FISCALIZAÇÃO DO COMÉRCIO DE FOGOS DE ARTIFÍCIO. TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. NECESSIDADE DE VIOLAÇÃO DO DEVER JURÍDICO ESPECÍFICO DE AGIR. 1. A Constituição Federal, no art. 37, § 6º, consagra a responsabilidade civil objetiva das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas de direito privado prestadoras de serviços públicos. Aplicação da teoria do risco administrativo. Precedentes da CORTE. 2. Para a caracterização da responsabilidade civil estatal, há a necessidade da observância de requisitos mínimos para aplicação da responsabilidade objetiva, quais sejam: a) existência de um dano; b) ação ou omissão administrativa; c) ocorrência de nexo causal entre o dano e a ação ou omissão administrativa; e d) ausência de causa excludente da responsabilidade estatal. 3. Na hipótese, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concluiu, pautado na doutrina da teoria do risco administrativo e com base na legislação local, que não poderia ser atribuída ao Município de São Paulo a responsabilidade civil pela explosão ocorrida em loja de fogos de artifício. Entendeu-se que não houve omissão estatal na fiscalização da atividade, uma vez que os proprietários do comércio desenvolviam a atividade de forma clandestina, pois ausente a autorização estatal para comercialização de fogos de artifício. 4. Fixada a seguinte tese de Repercussão Geral: “Para que fique caracterizada a responsabilidade civil do Estado por danos decorrentes do comércio de fogos de artifício, é necessário que exista a violação de um dever jurídico específico de agir, que ocorrerá quando for concedida a licença para funcionamento sem as cautelas legais ou quando for de conhecimento do poder público eventuais irregularidades praticadas pelo particular”. 5. Recurso extraordinário desprovido. (RE 136861, Relator(a): EDSON FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 11/03/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-201 DIVULG 12-08-2020 PUBLIC 13-08-2020 REPUBLICAÇÃO: DJe-011 DIVULG 21-01-2021 PUBLIC 22-01-2021) EMENTA. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO. PESSOA CONDENADA CRIMINALMENTE, FORAGIDA DO SISTEMA PRISIONAL. DANO CAUSADO A TERCEIROS. INEXISTÊNCIA DE NEXO CAUSAL ENTRE O ATO DA FUGA E A CONDUTA DANOSA. AUSÊNCIA DE DEVER DE INDENIZAR DO ESTADO. PROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 1. A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público baseia-se no risco administrativo, sendo objetiva, exige os seguintes requisitos: ocorrência do dano; ação ou omissão administrativa; existência de nexo causal entre o dano e a ação ou omissão administrativa e ausência de causa excludente da responsabilidade estatal. 2. A jurisprudência desta CORTE, inclusive, entende ser objetiva a responsabilidade civil decorrente de omissão, seja das pessoas jurídicas de direito público ou das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público. 3. Entretanto, o princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configuradoras de situações liberatórias como o caso fortuito e a força maior ou evidências de ocorrência de culpa atribuível à própria vítima. 4. A fuga de presidiário e o cometimento de crime, sem qualquer relação lógica com sua evasão, extirpa o elemento normativo, segundo o qual a responsabilidade civil só se estabelece em relação aos efeitos diretos e imediatos causados pela conduta do agente. Nesse cenário, em que não há causalidade direta para fins de atribuição de responsabilidade civil extracontratual do Poder Público, não se apresentam os requisitos necessários para a imputação da responsabilidade objetiva prevista na Constituição Federal - em especial, como já citado, por ausência do nexo causal. 5. Recurso Extraordinário a que se dá provimento para julgar improcedentes os pedidos iniciais. Tema 362, fixada a seguinte tese de repercussão geral: “Nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, não se caracteriza a responsabilidade civil objetiva do Estado por danos decorrentes de crime praticado por pessoa foragida do sistema prisional, quando não demonstrado o nexo causal direto entre o momento da fuga e a conduta praticada”. (RE 608880, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 08/09/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-240 DIVULG 30-09-2020 PUBLIC 01-10-2020) Ademais, cumpre destacar que o C. Superior Tribunal de Justiça também já aplicou a responsabilidade objetiva à hipótese de omissão do Estado. Confira-se: ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. FALECIMENTO DE ADVOGADO NAS DEPENDÊNCIAS DO FÓRUM. MORTE CAUSADA POR DISPAROS DE ARMA DE FOGO EFETUADOS POR RÉU EM AÇÃO CRIMINAL. OMISSÃO ESTATAL EM ATIVIDADE DE RISCO ANORMAL. ART. 927, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL. NEXO DE CAUSALIDADE CONFIGURADO. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Cuida-se, na origem, de "ação de indenização" em que se buscam o reconhecimento da responsabilidade civil e a condenação da Fazenda do Estado de São Paulo ao pagamento de danos materiais e morais em virtude do falecimento de advogado dentro do Fórum de São José dos Campos, decorrente de disparo de arma de fogo efetuado por réu em processo criminal, no qual a vítima figurava como patrono da parte autora. A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos. O Tribunal de origem, por sua vez, reformou o decisum por entender que "não restou evidenciado (art. 333, I do CPC), à luz dos elementos trazidos aos autos, o nexo de causalidade a gerar a responsabilidade civil do Estado." NÃO INCIDÊNCIA DO ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ 2. Os fatos foram devidamente descritos no acórdão impugnado, razão pela qual não incide o óbice da Súmula 7/STJ no conhecimento do recurso. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO POR OMISSÃO: HIPÓTESE EXCEPCIONAL QUANDO CARACTERIZADO RISCO ANORMAL DA ATIVIDADE 3. A regra geral do ordenamento brasileiro é de responsabilidade civil objetiva por ato comissivo do Estado e de responsabilidade subjetiva por comportamento omissivo. Contudo, em situações excepcionais de risco anormal da atividade habitualmente desenvolvida, a responsabilização estatal na omissão também se faz independentemente de culpa. 4. Aplica-se igualmente ao Estado a prescrição do art. 927, parágrafo único, do Código Civil, de responsabilidade civil objetiva por atividade naturalmente perigosa, irrelevante seja a conduta comissiva ou omissiva. O vocábulo "atividade" deve ser interpretado de modo a incluir o comportamento em si e bens associados ou nele envolvidos. Tanto o Estado como os fornecedores privados devem cumprir com o dever de segurança, ínsito a qualquer produto ou serviço prestado. Entre as atividades de risco "por sua natureza" incluem-se as desenvolvidas em edifícios públicos, estatais ou não (p. ex., instituição prisional, manicômio, delegacia de polícia e fórum), com circulação de pessoas notoriamente investigadas ou condenadas por crimes, e aquelas outras em que o risco anormal se evidencia por contar o local com vigilância especial ou, ainda, com sistema de controle de entrada e de detecção de metal por meio de revista eletrônica ou pessoal. 5. A Resolução 104, de 6 de abril de 2010, do Conselho Nacional de Justiça determinou o controle de acesso das pessoas aos Tribunais, bem como a instalação de aparelhos de detecção de metal nas áreas de ingresso nos prédios dos fóruns. É incontestável nos autos que a porta do Fórum com detector de metal encontrava-se avariada e que não havia seguranças na entrada do estabelecimento público que pudessem inspecionar os que adentrassem o local. 6. Ademais, também presente o nexo causal, apto a determinar a responsabilização do Poder Público no caso concreto. Se não fosse por sua conduta omissiva, tendo deixado de agir com providências necessárias a garantir a segurança dos magistrados, autoridades, servidores e usuários da Justiça no Fórum Estadual, o evento danoso não teria ocorrido. É certo ainda que a exigência de atuação nesse sentido - de forma a impedir ou, pelo menos, dificultar que réu em Ação Penal comparecesse à audiência portando arma de fogo - não está, de forma alguma, acima do razoável. CONCLUSÃO 7. Recurso Especial provido. (REsp 1869046/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/06/2020, DJe 26/06/2020) Refletindo sobre a questão, tenho por despicienda, para fins de aplicação da responsabilidade objetiva do Estado, a distinção entre atos comissivos e omissivos. Na verdade, se após a análise da extensão do dever de agir e da real possibilidade de impedimento do resultado, concluir-se pela irrelevância da conduta omissiva, sequer emerge a responsabilidade do Estado. De outro lado, comprovada a exigibilidade da atuação estatal no caso concreto, a responsabilidade do Estado será sempre objetiva, a teor do precitado artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. Essa solução, vale frisar, prima pela conveniência de homenagear o texto constitucional, o qual não aparta, para fins de aplicação da responsabilidade sem culpa, os casos em que o prejuízo advém de comportamento positivo dos agentes públicos das hipóteses em que o dano deflui de conduta negativa. Esse, aliás, o escólio de Yussef Said Cahali (in Responsabilidade Civil do Estado, 2ª edição, ampliada, revista e atualizada, 2ª tiragem, Malheiros Editores, 1996, p. 286), cuja lição reproduzo: "Por outro lado, desde que exigível da Administração a execução da obra ou prestação do serviço que teriam prevenido ou evitado o evento danoso sofrido pelo particular, identifica-se na conduta omissiva estatal a causa bastante para determinar a responsabilidade objetiva do Estado por sua reparação: no simples conceito de descumprimento de obrigação exigível já está embutida a idéia de culpa, só elidível se não demostrada a excludente da inexigibilidade do ato omitido, posto como causa do dano, se demonstradas as exceções convencionais do caso fortuito, da força maior ou do ato próprio do ofendido. A questão, portanto, desloca-se para o âmbito da exigibilidade da conduta estatal omitida, invocada como causa do dano reparável; mais propriamente, a questão se insere, com melhor adequação, em se de exigibilidade da obra não executada ou do serviço não prestado. Notoriamente elástico o conceito de exibilidade do ato estatal, no caso, a carga de subjetivismo que caracteriza a sua identificação é que terá induzido alguns autores ao exame das hipóteses da perspectiva da responasbilidade subjetiva do Estado, com perquisição necessária do elemento 'culpa ou dolo'. Na amplitude conceitual de conduta estatal exigível, embora se pretenda comportar as causas da obrigação 'à lei, ao contrato ou ato ilícito' (Toshio Mukai), mais adequadamente se permite identificar na causa da obrigação indenizatória o 'descumprimento de um dever jurídico estatal' (Celso Antônio Bandeira de Mello); aliás, a própria inexigibilidade da conduta administrativa pretendida, desqualificando a noção de 'dever jurídico', para transformá-la em obrigação convencionalmente natural, conceitualmente não exigível." Importa anotar que a noção estrita de causa, concebida como nexo físico entre conduta e resultado (visão mecanicista), não tem aplicação às hipóteses de responsabilidade por omissão, porquanto a abstenção não tem o condão de engendrar alterações no mundo fenomênico, a priori. Todavia, existindo dever de agir imposto por lei, a conduta omissiva ganha relevância na cadeia fática, podendo gerar efeitos jurídicos diretos e imediatos, consistentes na obrigação de indenizar. Dessarte, sob o prisma lógico-jurídico, poder-se-ia falar em nexo de causalidade normativo. Na mesma senda, os seguintes precedentes das Cortes Regionais: DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. QUEDA SOFRIDA POR PASSAGEIRA NA SALA DE EMBARQUE DO AEROPORTO DE BRASÍLIA. ATENDIMENTO MÉDICO SUBSEQÜENTE. ALEGADA DEFICIÊNCIA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO, DESDE O INGRESSO DA PASSAGEIRA NA SALA DE EMBARQUE ATÉ O TRATAMENTO MÉDICO NO HOSPITAL DAS FORÇAS ARMADAS. DANO DECORRENTE DE OMISSÃO. CAUSALIDADE NORMATIVA. AUSÊNCIA DE PROVA. 1. Alega-se que as filhas da Autora não puderam acompanhá-la até a sala de embarque do Aeroporto de Brasília, local em que, desassistida, sofrera uma queda, não tendo recebido em seguida o devido socorro. Atribui-se, por isso, à INFRAERO e à TAM - Serviços Aéreos Regionais omissão na prestação do serviço de transporte aéreo de passageiros. 2. Só é causal a omissão quando haja o dever de impedir o resultado (causalidade normativa). Esse dever de impedir o evento danoso tem origem: a) em um mandamento expresso ou tácito da ordem jurídica (Constituição, lei, norma infralegal ou direito costumeiro, que imponham obrigação de cuidado, proteção ou vigilância); b) na submissão particular do agente a essa espécie de obrigação (contrato ou posição de garante); c) em comportamento anterior que crie o risco de ocorrência do resultado. 3. Na sentença, foi colocado em evidência que o "Manual do Usuário do Transporte Aéreo", trazido aos autos pela própria Autora, estabelece que "passageiros com problemas de saúde devem solicitar à empresa aérea, de forma antecipada, o atendimento especial durante toda a viagem. A solicitação deve ser acompanhada de informações sobre a necessidade do uso de macas, cadeiras de rodas, ambulância etc". 4. Essa providência não foi tomada e a própria Autora diz, em seu depoimento, que "anda normalmente, não tem quaisquer problemas de desequilíbrio". Não havia, pois, obrigação especial, particularmente da INFRAERO, de acompanhamento da Autora. 5. No mais, não ficou provada ausência de assistência normal, que se dá a todos os passageiros, até o momento em que aconteceu o acidente. Da mesma forma, em seguida ao evento, foi dado atendimento compatível com as circunstâncias ou, no mínimo, não está demonstrado que o atendimento tenha sido inferior à média que se espera em tais situações. 6. Negado provimento à apelação. (AC 199834000284447, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA MOREIRA, TRF1 - QUINTA TURMA, 29/10/2009) PROCESSUAL PENAL E PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO - CRIME AMBIENTAL - ART. 54, §2º, II, da LEI Nº 9.605/98 C/C OS ARTIGOS 13, § 2º, "A" E 29, DO CÓDIGO PENAL - DENÚNCIA COM RELAÇÃO À AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO NÃO RECEBIDA - AUSÊNCIA DE PROVA DE ELEMENTOS SUFICIENTES DE AUTORIA. I - A Agência Nacional do Petróleo - ANP foi denunciada, pois segundo narra a denúncia, a autarquia não observou o dever legal de fiscalizar satisfatoriamente a base petrolífera Vila Carioca da Shell do Brasil a fim de evitar o dano ambiental (crime omissivo impróprio). II - A ANP tem o dever legal de fiscalizar diretamente, ou por meio de convênios, as atividades da indústria de petróleo. III - A fim de que a ANP seja responsabilizada na esfera penal por omissão deve estar comprovado que havia a possibilidade de agir para evitar o resultado, assim como deve haver um nexo de causalidade normativa entre o fato e a omissão. IV - Embora a ANP tivesse ciência de que tinha o dever de agir, não há nos autos nenhum elemento de prova demonstrando que a ANP tivesse conhecimento da situação fática. V - Os empregados da empresa contratada pela ANP para a realização da fiscalização, estão sendo acusados de terem elaborado relatório atestando a total regularidade da base da Vila Carioca, quando esta não a era real situação fática. Diante deste relatório, a ANP não tinha como ter o conhecimento de que era necessário tomar atitudes para impedir o resultado danoso. VI - Em razão da inexistência de prova do dolo abrangente, e, por conseguinte de indícios da relevância penal da omissão da ANP, conclui-se pela sua atipicidade. VII - A responsabilização penal nesta hipótese seria objetiva, o que é inadmissível no Direito Penal. VIII - Recurso a que se nega provimento (RSE 200461810037379, JUIZ COTRIM GUIMARÃES, TRF3 - SEGUNDA TURMA, 08/04/2010) In casu, analisando os elementos de prova coligidos aos autos, verifico a presença dos pressupostos do dever de indenizar, tais como delineados supra, sendo de rigor a incidência do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Consoante dispõe o artigo 82, inciso I, da Lei nº 10.233/01, compete ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes estabelecer padrões, normas e especificações técnicas para os programas de segurança operacionais, sinalização, manutenção ou conservação, restauração ou reposição de vias, terminais e instalações. Nesse passo, no exercício de suas atribuições, o DNIT deve tomar todas as medidas necessárias para prevenir acidentes e assegurar a segurança dos usuários. Nesse diapasão, é certo incumbir à autarquia federal o dever de zelar pelo bom estado de conservação das pistas – o que abrange, evidentemente, o recapeamento asfáltico –, sob pena de se configurar omissão na prestação do serviço público cuja execução legalmente lhe compete. Na hipótese vertente, vale mencionar os apontamentos feitos no Boletim de Acidente de Trânsito, elaborado pelo Departamento de Polícia Rodoviária Federal. Transcrevo: “APOS AVERIGUAR O LOCAL, CONCLUI-SE QUE O V1 SEGUIA NO SENTIDO DECRESCENTE DA RODOVIA, QUANDO SEU CONDUTOR, AO APROXIMAR-SE DE UM BURACO, DESVIOU DO MESMO, CONTUDO, PERDEU O CONTROLE DA DIREÇÃO, SAIU DA PISTA E CAPOTOU.” (id. 266431142 – fl. 02). Considerando os dados gerais da ocorrência, nota-se que, ao tratar da condição da pista, foi destacada a existência de buraco (id. 266431142 – fl. 01). Ex positis, desponta cristalino que o capotamento do veículo, após manobra defensiva do condutor para desviar de buraco, tem como causa imediata a má conservação da pista, agravada pela existência de buraco. Não procede, outrossim, a alegação de que o condutor poderia ter realizado manobra defensiva mais eficiente e, consequentemente, evitado o acidente. Exigir tal providência, em verdade, implicaria transferir a responsabilidade legal pela conservação da pista a terceiro. Melhor sorte não socorre ao apelante quanto à alegação de excesso de velocidade, eis que não existe nos autos qualquer elemento de prova nesse sentido. Não se comprovou, em suma, indicativo de imprudência, negligência ou imperícia do condutor, ônus que incumbia ao réu, ex vi do artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil. Assim sendo, na condição de ente responsável pela guarda e manutenção da estrada de rodagem em questão, competia ao DNIT adotar as medidas acautelatórias pertinentes, zelando pela segurança dos que nela transitam. Em síntese, o ato omissivo do réu, materializado no estado de má conservação da via, contribuiu para a ocorrência do acidente, sendo de rigor sua responsabilização - na modalidade objetiva, ressalte-se - pelos prejuízos advindo à parte. No que tange ao montante da indenização, de rigor a manutenção do valor fixado pelo juízo a quo, considerando a doação do salvado como sucata (id. 266431160). Observadas as premissas do art. 85, § 11, do CPC, majoro a verba honorária em 1%. Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL, ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – DNIT – ACIDENTE DE VEÍCULO – BURACO NA PISTA – CONDUTA OMISSIVA – ART. 37, § 6º, DA CF – APLICABILIDADE – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – DIREITO DE REGRESSO – RESPONSABILIDADE DA AUTARQUIA – RESSARCIMENTO DEVIDO.
1. A responsabilidade objetiva pressupõe seja o Estado responsável por comportamentos de seus agentes que, agindo nessa qualidade, causem prejuízos a terceiros. Impõe, tão-somente, a demonstração do dano e do nexo causal, por prescindir da culpa do agente, nos moldes do art. 37, § 6º, da Constituição Federal.
2. Na hipótese de omissão, melhor refletindo sobre a questão, entendo que, uma vez comprovada a exigibilidade da atuação estatal no caso concreto, a responsabilidade do Estado será objetiva, orientação que homenageia o texto constitucional.
3. In casu, considerando o conjunto probatório acostado aos autos, não remanescem dúvidas de que o acidente decorreu da existência de buraco na pista.
4. Competia ao DNIT, nos termos de suas competências legais, promover a manutenção e restauração das vias, bem assim prover a sinalização adequada, sob pena de transferir integralmente à vítima o ônus de suportar acidentes dessa natureza.
5. Não demonstrada a conduta culposa do condutor do veículo, ônus que incumbia ao réu (art. 373, II, CPC).
6. Afirmada a responsabilidade do réu pelo acidente automobilístico – e, consequentemente, pelos danos materiais daí decorrentes -, impõe-se sua condenação ao ressarcimento do valor despendido pela seguradora, ex vi do art. 786 do Código Civil.
7. Observadas as premissas do art. 85, § 11, do CPC, majoro a verba honorária em 1%.
8. Apelação não provida.